Discurso no Senado Federal

CRESCIMENTO INCONTROLAVEL DO VIRUS DA AIDS EM VARIOS PAISES DO MUNDO, CONFORME DADOS ANUNCIADOS NA XII CONFERENCIA MUNDIAL DE COMBATE E CONTROLE DA AIDS. NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO PROGRAMA DE CONTROLE E PREVENÇÃO DA AIDS NO BRASIL.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • CRESCIMENTO INCONTROLAVEL DO VIRUS DA AIDS EM VARIOS PAISES DO MUNDO, CONFORME DADOS ANUNCIADOS NA XII CONFERENCIA MUNDIAL DE COMBATE E CONTROLE DA AIDS. NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO PROGRAMA DE CONTROLE E PREVENÇÃO DA AIDS NO BRASIL.
Aparteantes
Emília Fernandes, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 03/06/1999 - Página 14306
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • GRAVIDADE, AUMENTO, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS), MUNDO, ESPECIFICAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE, TERCEIRO MUNDO, REGISTRO, DADOS, CONTAMINAÇÃO, REDUÇÃO, INDICE.
  • NECESSIDADE, PARTICIPAÇÃO, SOCIEDADE, IGREJA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, CIENTISTA, PODER PUBLICO, RESPONSABILIDADE, COMBATE, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS).

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que trago à discussão no Plenário do Senado Federal é de responsabilidade universal e se encontra em uma declaração oficial da 12ª Conferência Mundial de Combate e Controle da Aids, ocorrida no mês de julho de 1998, em Genebra. A comunidade científica internacional afirmou, naquele encontro, que o mundo estaria perdendo a batalha contra o vírus HIV. Essa afirmativa foi baseada em números alarmantes. Temos uma população de 30,3 milhões de pessoas infectadas pelo vírus da Aids. Se a esse número somarmos os 14 milhões que já morreram, vítimas do vírus da Aids, e os 2,5 milhões de óbitos ocorridos em 1998, chegaremos a uma população de quase 46 milhões de pessoas. Trata-se, portanto, de uma pandemia que agride e assola todo o Planeta e, de modo mais estarrecedor, as populações pobres do Planeta.  

Hoje, no continente africano, de cada cinco pessoas que morrem, uma tem como registro de sua causa de morte o vírus da Aids. Portanto, pode-se dizer que o vírus está dizimando a população africana e as conseqüências poderão ser muito graves.  

No nosso País há registro de 145 mil casos de pessoas infectadas pelo vírus HIV e a possibilidade estimada de 450 mil portadores ainda não-notificados pelo Ministério da Saúde. Se o Ministério da Fazenda fizesse uma aplicação de recursos ideal para o controle, prevenção e tratamento dessa doença, tiraria do Orçamento da União R$2,5 bilhões ao ano. Portanto, um Ministério que tem o orçamento que tem, uma União sacrificada como está a nossa no sentido da sua disponibilidade de recursos, a sangria dos juros das dívidas interna e externa - R$250 bilhões são destinados a esses pagamentos - não pode mais se dar o luxo de não ter um alcance maior no êxito ao combate do vírus da Aids.  

Se fizermos uma averiguação, veremos que é dramático o comportamento do vírus que, oriundo de uma comunidade exposta ao preconceito, como os homossexuais, prostitutas, pessoas promíscuas, usuários de drogas intravenosas, hoje tem a população feminina como a mais vulnerável. Se em 1986 tínhamos dezesseis homens contaminados pelo vírus da Aids para uma mulher, hoje temos três homens contaminados para cada mulher. Houve, portanto, uma total inversão de pessoas vulneráveis a esse vírus.  

Um outro fato que traz profunda preocupação é o crescimento do índice de contaminação em adolescentes e jovens. As autoridades chamam a atenção também para a interiorização do vírus HIV. Há dez ou quinze anos a doença atingia mais ou menos 170 municípios; hoje, são mais de 1.400 municípios deste País que apresentam registros de Aids.  

Sr. Presidente, a situação é preocupante. Há regiões da África do Sul com 7,5% das pessoas infectadas. Encontram-se, do outro lado, a Etiópia, o Zimbabue e Botsuana com 25 a 35% da sua população contaminada. Se não for tomada medida efetiva de controle, daqui a dez anos teremos 60% daquelas populações mortas em função do vírus HIV. É inaceitável.  

Na América do Norte e nos países do leste europeu há registro de apenas 75 mil pessoas contaminadas pelo vírus da Aids no ano de 1998, enquanto temos um descontrole absoluto na população da África, na população do sudeste asiático e na população da América do Sul.  

O Brasil ainda consegue algum destaque graças a uma comissão altamente responsável da Coordenação de Aids do Ministério da Saúde. Lá se um trabalho efetivo de prevenção ao crescimento da doença. Principalmente após o empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento, houve redução: 31 mil pessoas deixaram de ser infectadas pelo vírus HIV, no ano passado, em função dessa prevenção, tão importante aos olhos de quem conhece a epidemiologia. Não é que não tenhamos o aumento do número de casos, mas temos um freio no aumento da propagação desordenada em relação ao vírus da Aids.  

O que registro hoje é a mais elevada responsabilidade que tem o Poder Público. Não temos condições de enfrentar o tratamento ideal da epidemia de Aids neste País - combate, prevenção e tratamento. O chamado coquetel multidrogas, para combater a propagação da doença e a redução de óbitos, teve um valor inestimável na história da epidemiologia no Brasil. No Rio de Janeiro, a taxa de redução de morte foi de 48%, comparável a um dos melhores centros de tratamentos nos Estados Unidos. Isso ocorreu em função do coquetel multidrogas de combate à Aids.  

Portanto, é fundamental que o País tenha a responsabilidade de dar continuidade, de forma intensa, ao programa que reduziu os índices de contaminação, evitando-a em 31 mil pessoas. Em relação ao investimento na prevenção, devem-se rever conceitos. Precisamos saber por que está havendo aumento de casos da Aids em pessoas com menor escolaridade, por que aumenta a contaminação em mulheres casadas e em adolescentes e jovens.  

O alerta, Sr. Presidente, é no sentido de que é impossível imaginar a extinção de um Continente inteiro, como o Africano, onde, de cada cinco pessoas que morrem, uma já tem como registro de morte o vírus HIV.  

Está nas mãos da comunidade científica internacional dividir a responsabilidade com os poderes públicos dos países; está nas mãos dos países, dos governos, a responsabilidade de traçar um plano efetivo de prevenção. Não dá para entender que se discuta com tão pouca responsabilidade o comportamento sexual das pessoas; não dá para entender a distância das Igrejas em relação ao combate efetivo do vírus da Aids. Quanto aos meios de comunicação, se não é pela venda de serviços a órgãos públicos ou a entidades privadas, não promovem debate sobre tema dessa importância.  

Portanto, repito: devemos rever as responsabilidades entre os setores envolvidos com o futuro das gerações, com a integridade física das pessoas, uma vez que se sabe da violência e da crueldade com que o vírus ataca, tornando os doentes vítimas também de preconceito.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB-RR) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT-AC) - Concedo o aparte ao eminente Senador Romero Jucá.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB-RR) - Senador Tião Viana, V. Exª expressa muito bem a necessidade de se fortalecer o Programa de Combate e Prevenção da AIDS do Governo brasileiro e também da sociedade. É importante que entendamos que essa responsabilidade não é apenas do Governo. O Governo tem responsabilidade e tem atuado. Vale registrar o avanço que o Ministério da Saúde vem realizando nesse campo. O Brasil é um dos poucos países que distribui gratuitamente, independentemente da renda do paciente, remédios para tratamento da AIDS. A equipe técnica do Ministério da Saúde vem há anos trabalhando - e tem avançado - nessa questão. V. Exª expressou muito bem que, assim como faz a doença, que evolui em determinados setores, é importante que o Governo e a sociedade se aparelhem para atuar mias especificamente nas camadas onde o crescimento se dá de forma mais acentuada. Parabenizo-o e registro que V. Exª, ao tratar dessa questão, dá uma contribuição importante ao Governo e ao Ministério da Saúde. Entendo que o Ministério quer acertar, que busca caminhos. E V. Exª e o Senado contribuem ao apontar caminhos e ao aprovar recursos necessários para que o Programa de Combate e Prevenção da AIDS possa ser fortalecido em nosso País. Meus parabéns.  

A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PDT-RS) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT-AC) - Concedo um aparte à eminente Senadora Emilia Fernandes.  

A Srª Emilia Fernandes (Bloco/PDT-RS) - Senador Tião Viana, em primeiro lugar, cumprimento V. Exª por trazer um assunto que, embora conhecido da população brasileira e mundial, cada vez se apresenta mais atualizado e mais preocupante. Conhecemos o aumento do número de casos e sua interiorização. Anteriormente, havia registros da ocorrência da doença nos centros maiores, nas capitais. Hoje, essa realidade mudou. A interiorização da AIDS é muito grande. Por outro lado, há a transferência do foco dos grupos considerados de alto risco para as famílias constituídas. Nesse universo, o número de mulheres atingidas é muito preocupante. Ontem, eu registrava aqui a realização do V Encontro do Fórum de Mulheres do Mercosul, do qual participaram empresárias, políticas, educadoras e sindicalistas, onde se discutiram as questões específicas da inserção da mulher no processo do Mercosul. Citou-se a saúde da mulher, tema presente em todos os debates. Veio à tona, portanto, a questão da AIDS. Nesse encontro, foram abordados e reafirmados dois aspectos, com que concordamos: o primeiro refere-se ao grau de responsabilidade dos nossos governantes, por não encararem de frente essa situação; o segundo diz respeito aos recursos adequados e ao processo de educação e prevenção. V. Exª traz esse tema à tribuna com muita propriedade, porque é médico, é da área da saúde e sabe o que poderiam estar fazendo além de alguns programas, como o de distribuição de remédios. Enfim, tudo é importante, mas não diminui a responsabilidade dos governantes à medida em que não enfrentam esse problema como deveriam. O número de mulheres e adolescentes atingidos hoje é muito preocupante. Faço esse aparte não apenas para acrescentar algo ao pronunciamento de V. Exª, que está muito bem encaminhado, estruturado e fundamentado nos dados apresentados, mas para reafirmar a importância desse tema e, principalmente, a responsabilidade que os nossos governantes têm para com essas mais de 140 mil pessoas já infetadas e outras tantas que virão. Não há lar, não há família hoje que esteja imune. Dentro das próprias famílias, deve haver uma reavaliação de determinados comportamentos, principalmente porque as mulheres estão sendo vítimas num espaço de relação restrita. Precisamos, portanto, de um compromisso de ação e de destinação de recursos do Governo; caso contrário, não adianta conclamarmos a sociedade. A sociedade é chamada à medida em que é esclarecida e educada. Torna-se necessário o compromisso de lideranças maiores com esse problema, Cumprimento V. Exª pelo pronunciamento.

 

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT-AC) - Agradeço à eminente Senadora Emilia Fernandes. V. Exª tem mostrado um projeto de luta à causa da mulher, das minorias, dos direitos humanos. V. Exª fez ontem um pronunciamento admirável em relação aos avanços e à necessidade da organização de mulheres da América do Sul. Houve uma preocupação com o problema da AIDS, que apresenta hoje um crescimento assustador: três em cada 100 mil mulheres já estão contaminadas com vírus da Aids, com crescimento de 0,7% ao ano; enquanto que, para os homens, o crescimento é de apenas 0,3% ao ano. Tal fato demonstra falta de conhecimento e de instrumento de defesa por parte da mulher brasileira em relação à contaminação do vírus que, como V. Exª disse, é de responsabilidade de todos.  

O nobre Senador Romero Jucá divide também essa responsabilidade e elogia - associo-me a S. Exª - a equipe técnica da Comissão Nacional de Controle e Prevenção do HIV do Ministério da Saúde. Mas o assunto é muito maior do que o Ministério, é muito maior do que o Poder Público, porque é da responsabilidade de todos. Ele deveria estar na ordem do dia de cada família, de cada escola, de cada igreja e de cada meio de comunicação deste País.  

Foi inesquecível a figura de Nelson Mandela registrando e oficializando a sua aposentadoria da vida pública. Ele volta para a sua aldeia, para o convívio humilde e simples. É um cidadão que marcou a história da democracia e dos direitos humanos. Sua figura estará sempre ligada à realidade de seus irmãos africanos, como os de Botsuana, Zimbabue e Congo, que estão sendo exterminados. Dentro de dez anos, 60% da sua população estará morta em função da contaminação pelo vírus da AIDS. Não há como imaginarmos que o Continente africano possa ser exterminado em função de um vírus que, oriundo de lá, em 1959, ainda hoje não foi estagnado em sua proliferação. A comunidade científica internacional luta muito, mas sabe que a prevenção, que é de responsabilidade de toda a sociedade internacional, não tem sido cumprida, por falta de maturidade e de compreensão do que seja a proteção do ser humano.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/06/1999 - Página 14306