Discurso no Senado Federal

DEFESA DE NOVO PACTO FEDERATIVO, TENDO EM VISTA A CARENCIA DE RECURSOS DOS MUNICIPIOS BRASILEIROS EM FACE DAS SUAS OBRIGAÇÕES E COMPETENCIAS.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • DEFESA DE NOVO PACTO FEDERATIVO, TENDO EM VISTA A CARENCIA DE RECURSOS DOS MUNICIPIOS BRASILEIROS EM FACE DAS SUAS OBRIGAÇÕES E COMPETENCIAS.
Publicação
Publicação no DSF de 08/06/1999 - Página 14646
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, FINANÇAS, MUNICIPIOS, FALTA, RECURSOS, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, CRITICA, ORÇAMENTO, DIVISÃO, TRIBUTAÇÃO.
  • ANALISE, DADOS, ESTATISTICA, COMPOSIÇÃO, RECEITA, MUNICIPIOS, REGISTRO, VARIAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, INTERIOR, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • DEFESA, REFORMA TRIBUTARIA, ALTERAÇÃO, PACTO, FEDERAÇÃO, AJUSTE, COMPETENCIA, ARRECADAÇÃO, MUNICIPIOS.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL-RR. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é de aflitiva carência de recursos a situação da esmagadora maioria dos Municípios brasileiros. O Poder Público local presencia a penúria e as necessidades da população, recebe dela as demandas, as pressões e pouco pode fazer, dada a atual estrutura das finanças públicas, estrutura que desfavorece o Município, deixa-o sempre como pedinte, "de pires na mão", a mendigar verbas. Lamentável situação, quando o ideal seria o inverso, seria vermos as prefeituras dotadas dos recursos necessários, promovendo, com soluções criativas, a educação, a saúde, a geração de empregos, a segurança, o estímulo à atividade produtiva.  

Ainda tem muito valor, e deve sempre ser relembrado, o velho dito de que o cidadão vive no Município, antes de viver no Estado ou na União. É no Município que a sociedade tem oportunidade de se tornar coesa, de fincar raízes, de criar projetos de vida, de mobilizar-se, de participar, de gerir-se, de fiscalizar, de exigir.  

É no Município que se estruturam as associações de produtores rurais e as associações comerciais, mobilizadoras das capacidades produtivas, geradoras de prosperidade. É no Município que estão as bases dos sindicatos e das cooperativas. É no nível local que se dá a participação comunitária e a democracia participativa. É lá que os pais podem se organizar para melhorar a educação, base para a construção de qualquer projeto nacional sério. É lá que a população pode contribuir para iniciativas coletivas da comunidade e do Poder Público, na alfabetização, na habitação popular, na urbanização, na extensão dos serviços de saúde, no aperfeiçoamento do transporte coletivo, na segurança, nas mais variadas saídas criativas para a melhoria das condições de vida das populações, como testemunham tantos programas bem-sucedidos por este Brasil afora.  

Para que se realize o potencial de criatividade e de mobilização contido nos Municípios, para que as necessidades rurais prementes do povo lá sejam atendidas são necessários recursos. Recursos que faltam na atual divisão do bolo tributário e orçamentário que temos no Brasil. É verdade que a Constituição de 88 esboçou uma tendência descentralizadora, aumentando potencialmente as receitas municipais. Mas esse movimento foi frustrado por vários fatores.  

Primeiro, a União, ameaçada pela insolvência, tratou de aumentar sua fatia no bolo, criando tributos não partilháveis com os Municípios, como são as conhecidas "contribuições" que incidem sobre as empresas. Além disso, procurou aliviar seu déficit por meio do mecanismo do Fundo de Estabilização Fiscal, desastroso para os Municípios.  

Outro fator é o freqüentemente decepcionante desempenho do ICMS. Alguns Estados arrecadam muito pouco, reduzindo o que devem compartilhar com os Municípios. Depois, com o mesmo efeito, temos a praga das isenções fiscais, algumas delas fruto da chamada guerra fiscal.  

Por fim, a arrecadação federal compartilhável com os Municípios também está longe de atingir o seu potencial, haja vista o depoimento recente do Secretário da Receita Federal nesta Casa, que apontou toda sorte de perdas por sonegação e evasão fiscal.  

Por outro lado, nos últimos anos, cresceram enormemente as despesas dos Municípios. Pressionados pelas carências da população, eles assumem forçadamente responsabilidades cada vez maiores na prestação de serviços de educação, saúde, transporte coletivo, bem como em investimento de infra-estrutura, como saneamento, e habitação popular.  

Para tudo o que os Municípios estão realizando e para o muito que ainda deveriam fazer, são necessárias maiores receitas, receitas próprias e receitas de transferências.  

Hoje, na grande média dos Municípios brasileiros, as receitas dependem, em cerca de dois terços, de transferências da União e dos Estados, ficando um terço por conta da arrecadação própria. Essa grande média inclui todas as regiões do País, na sua diversidade, capitais e interior, Municípios grandes ou pequenos, prósperos ou pobres.  

Das receitas próprias, os principais componentes são, pela ordem, ISS, IPTU, taxas diversas e o ITBI. Das receitas de transferências, 63,7% das receitas totais, 30,4 vêm do ICMS; 18,7 do FPM; e 10,6 são transferências voluntárias, não impostas pela Constituição .  

Essa grande média encobre uma enorme variedade de situações, como, por exemplo, diferenças entre capitais e interior. O interior depende de transferências em 74, 3%; as capitais, na média, somente em 43%. A participação relativa do FPM é quatro vezes maior, na média, nos Municípios do interior; a do ISS é quatro vezes maior, na média, nas capitais. Muito pesa também a gestão regional. As receitas próprias dos Municípios, com percentual de suas receitas totais, são em ordem crescente: no Nordeste, 17,5%; no Norte, 19,7%; no Centro-Oeste, 20,1%; no Sul, 27,9%; e no Sudeste, 39,2%.  

Como seria de esperar, a Região Norte é das mais desfavorecidas.  

Todas essas estatísticas, no entanto, não conseguem revelar o mais importante: a disparidade, o abismo existente entre essas receitas e os desafios que os Municípios enfrentam, abismo que torna urgente repensar a estrutura tributária do Brasil. Precisamos de uma reforma tributária no Brasil. Precisamos de uma reforma tributária que, por um lado, desonere as empresas das penalidades contra a produção e, por outro, reconheça que os Municípios precisam de mais recursos. E não basta a reforma pura e simples. É preciso o verdadeiro e novo pacto federativo, que ajuste as muitas atribuições e competências que vêm recaindo sobre os Municípios, e uma arrecadação condigna. É preciso reforçar a ação do Poder Público nos Municípios, já que é ali que o brasileiro vive.  

Junto com essa reforma, com esse novo pacto federativo, é necessário criar mecanismos que apoiem, incentivem e assessorem os Municípios no sentido de que possam reforçar e tornar mais eficaz sua arrecadação própria. E a reforma tributária não pode deixar de prever medidas que garantam, na transição do atual sistema para o sistema futuro, o crescimento seguro das receitas municipais, a salvo de acidentes devidos à súbita alteração do perfil dos tributos.  

Sr. Presidente, os Municípios, principalmente os mais carentes, precisam ver reforçadas as suas receitas. A causa municipalista vai tornando-se uma prioridade nacional. Os cofres municipais se acham lamentavelmente insuficientes frente às necessidades que devem atender. Em meu Estado, por exemplo, é desoladora a impotência das pequenas prefeituras diante dos desafios com que se deparam, por pura falta de recursos.  

É preciso descentralizar o Brasil também sob a ótica fiscal. Não faltam propostas e boas idéias, do movimento municipalista e de diversos estudiosos da questão. Esta Casa tem de se postar receptiva a essas idéias e propostas.  

Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/06/1999 - Página 14646