Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 10/06/1999
Discurso no Senado Federal
NECESSIDADE DE APURAÇÃO DAS DENUNCIAS DE PRATICA DE TORTURA ENVOLVENDO O INDICADO PARA DIRETOR-GERAL DA POLICIA FEDERAL.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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DIREITOS HUMANOS.
ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO MUNICIPAL.:
- NECESSIDADE DE APURAÇÃO DAS DENUNCIAS DE PRATICA DE TORTURA ENVOLVENDO O INDICADO PARA DIRETOR-GERAL DA POLICIA FEDERAL.
- Publicação
- Publicação no DSF de 11/06/1999 - Página 15033
- Assunto
- Outros > DIREITOS HUMANOS. ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO MUNICIPAL.
- Indexação
-
- CRITICA, INDICAÇÃO, JOÃO BATISTA CAMPELO, CARGO PUBLICO, DIRETOR GERAL, POLICIA FEDERAL, SUSPEIÇÃO, RESPONSAVEL, TORTURA, EPOCA, DITADURA, MILITAR.
- DEFESA, INVESTIGAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, TORTURA, ANTERIORIDADE, POSSE, POLICIA FEDERAL, REGISTRO, DENUNCIA, AUTORIA, JOSE ANTONIO MONTEIRO, PROFESSOR, VITIMA, ARBITRARIEDADE, REGIME MILITAR, LEITURA, ENTREVISTA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
- APOIO, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, CAMARA DOS DEPUTADOS, SOLICITAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, ACUSAÇÃO, TORTURA.
- SOLIDARIEDADE, VEREADOR, CAMARA MUNICIPAL, CAPITAL DE ESTADO, MEMBROS, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FISCAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), OPOSIÇÃO, IMPEDIMENTO, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
O SR. EDUARDO SUPLICY
(Bloco/PT–SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Maguito Vilela, Srªs. e Srs. Senadores, o desfecho da designação do novo diretor da Polícia Federal parece estar tendo um gosto amargo para todos os partidos da base governamental. Entretanto, tem um gosto amargo também para todos aqueles que lutaram pelo direito à cidadania, pela democracia e para que nunca mais neste País pudéssemos ter métodos de repressão e de tortura contra quaisquer cidadãos.
Sr. Presidente, é preciso, antes que se consolide a designação do novo diretor da Polícia Federal, que seja esclarecido inteiramente o episódio ontem denunciado pelo professor universitário José Antônio Monteiro, de 59 anos, que disse ter sido torturado, na década de 70, sob o comando deste que foi designado ontem pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso para ser o diretor da Polícia Federal.
Sr. Presidente, os principais jornais do País trazem hoje na sua primeira página a entrevista de José Antônio Monteiro. Tal matéria já foi objeto de comentário pela Senadora Heloisa Helena, que, em sendo de Alagoas e conhecendo pessoalmente o Sr. José Antônio Monteiro, inclusive por relações familiares com seus filhos, pôde com ele conversar, conforme registrou. Assim, a Senadora tomou conhecimento de que ele foi colega de Seminário do Sr. João Batista Campelo, de como ambos se conheceram pessoalmente, nos anos 60, e, portanto, das razões pelas quais é muito difícil haver engano de pessoa nesse caso.
Se o Palácio do Planalto, ontem, observou que a acusação de José Antônio Monteiro teria falta de fundamento, se é improcedente, é preciso averiguar isso com muito cuidado, porque o Diretor da Polícia Federal tem a responsabilidade e a obrigação de conduzir apurações e inquéritos não apenas pessoalmente, mas inclusive como autoridade na condução de inquéritos em todo o Brasil. Muitas vezes, em distritos policiais, em delegacias, em lugares de responsabilidade da Polícia Civil e também da Polícia Federal, há histórias de pessoas que, infelizmente, em nosso País, foram objeto de tortura. E isso ainda ocorre hoje. Portanto, é preciso que a autoridade máxima logo abaixo do Ministro da Justiça, no âmbito da polícia, que é o Diretor da Polícia Federal, tenha total isenção, imparcialidade e que não tenha uma história como responsável por sessões de tortura.
E o Professor José Antônio Monteiro diz isso para diversos jornais, entre eles, a Folha de S.Paulo :
"Agência Folha - Como foi o episódio da sua prisão?
José Antônio Monteiro - Campelo foi me prender em Urbano Santos (município maranhense), onde eu trabalhava em 1970. Eu estava em São Luís fazendo um curso, porque era diretor de uma escola.
Soube que a Polícia Federal tinha ido à minha casa e arrombado. Eu voltei para casa e à noite ele me prendeu.
Agência Folha - O senhor chegou a ser torturado pelo próprio Campelo?
Monteiro - Propriamente pelas mãos dele, não. Mas teve uma vez que ele ajudou a me colocar no pau-de-arara. Eu ficava no pau-de-arara por várias horas; os soldados me batiam e ele comandava o interrogatório.
Agência Folha - A que tipos de torturas o senhor foi submetido?
Monteiro - De vários tipos. Eu levei choque elétrico, puxaram os meus cabelos, diziam impropérios, batiam no meu corpo, chutavam e ficavam irritados porque eu não respondia às perguntas.
Agência Folha - Quais eram as perguntas?
Monteiro - Nomes de pessoas. Perguntavam o que é que nós queríamos com as organizações que ajudávamos. Nós adotávamos o método Paulo Freire (de educação) na escola e eles entendiam que isso era um centro de formação de guerrilheiros, de subversivos, essas coisas.
Agência Folha - Que tipos de seqüelas as torturas deixaram no senhor?
Monteiro - A gente fica com aquela sensação de que não é homem, inseguro. De imediato, tive que abandonar o país e fui para o Canadá. Eu ficava paranóico quando via um militar.
Agência Folha - O senhor mora em Maceió há bastante tempo. O senhor conhece o Ministro da Justiça, Renan Calheiros?
Monteiro - Sim, eu fiz campanha para ele quando ele era do MDB. Acompanhei a trajetória de esquerda dele. Estranho muito que ele tenha nomeado esse sujeito. Ele devia ter pesquisado a vida desse torturador antes de nomeá-lo para um cargo tão importante."
Ora, Sr. Presidente, é possível que o Ministro Renan Calheiros tenha sido submetido a pressões extraordinárias nesse episódio que, conforme a imprensa registrou nestes últimos dias, deixou todos os partidos - o PMDB, o PSDB, o PFL - preocupados e com dificuldades de chegar a um entendimento. E o Presidente Fernando Henrique Cardoso teve a sua autoridade trincada em virtude da disputa na sua base de apoio. Mas que desfecho esse de o Presidente Fernando Henrique Cardoso acabar por designar alguém cuja história não foi inteiramente apurada! Espero, Sr. Presidente, ainda no dia de hoje, que o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o Ministro Renan Calheiros possam, com clareza, tranqüilizar a opinião pública, tranqüilizar a todos os brasileiros que querem ter a segurança de que jamais se terá como pessoa responsável por inquéritos, neste País, alguém que comandou uma argüição, um interrogatório em que o interrogado estava sendo submetido, sob a sua orientação, a pancadas, a choques elétricos, ao pau-de-arara. Isso, Sr. Presidente, é algo inadmissível que não podemos tolerar.
Houve casos de designação durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, como em 1995, do coronel Armando Avólio Filho e, em 1º de abril de 1998, do general Ricardo Fayad, em que se verificou, posteriormente, que haviam sido acusados de prática de tortura. Em conseqüência, ambos não foram consolidados em seus respectivos cargos.
Sr. Presidente, para exercer o cargo de Diretor da Polícia Federal, é preciso alguém que tenha autoridade moral, autoridade na sua história, para ser extremamente enérgico com qualquer um de seus subordinados que, eventualmente, abuse em suas atitudes ao interrogar uma pessoa. Não se pode admitir que o Diretor da Polícia Federal tenha tido, a se confirmar, uma história de prática de tortura.
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, por intermédio do Deputado Nilmário Miranda, tomou a iniciativa de solicitar o esclarecimento completo desse episódio. Queremos dar todo apoio ao Deputado, no sentido de tornar extremamente clara a apuração desses fatos. S. Exª está sendo prudente, assim como nós também devemos ser. É preciso averiguar se o que foi revelado, ontem, pelo professor José Antônio Monteiro é verídico. De outra forma, Sr. Presidente, resultará num fato extremamente grave para o Governo Fernando Henrique Cardoso. Não é à toa que todos os jornais brasileiros noticiaram, em primeira página, as denúncias feitas sobre João Batista Campelo pelo professor José Antônio Monteiro.
Sr. Presidente, quero fazer um registro de solidariedade àqueles vereadores, em especial José Eduardo Martins Cardoso, que, na Câmara Municipal de São Paulo, conduziu, até ontem, a Comissão Parlamentar de Inquérito da Máfia dos Fiscais.
Quero, também, solidarizar-me com todos aqueles que estão estranhando a maneira como a base de apoio ao Governo Celso Pitta e ao ex-Prefeito Paulo Maluf se juntaram, para impedir o prosseguimento da Comissão Parlamentar de Inquérito, que teve o extraordinário apoio da opinião pública paulistana, paulista e de todos os brasileiros. Essa Comissão Parlamentar de Inquérito foi capaz de desvendar uma extraordinária rede de interesses escusos que se apossou da administração pública municipal, em conluio com alguns vereadores que, infelizmente, não têm honrado o mandato que o povo de São Paulo lhes confiou, nem correspondido à confiança que neles depositou.
Quero, Sr. Presidente, fazer um registro de minha solidariedade àqueles vereadores, em especial ao vereador José Eduardo Martins Cardoso, que na Câmara Municipal de São Paulo conduziram até ontem a Comissão Parlamentar de Inquérito da Máfia dos Fiscais. Quero também solidarizar-me com todos aqueles que estão estranhando a maneira como a base de apoio ao Prefeito Celso Pitta e ao ex-prefeito Paulo Maluf se juntaram para impedir o prosseguimento da Comissão Parlamentar de Inquérito que, repito, teve o extraordinário apoio da opinião pública paulistana, paulista e de todos os brasileiros.
Ao cumprimentar o Vereador José Eduardo Martins Cardoso e todos aqueles que na Câmara Municipal de São Paulo se empenharam para que fosse realizada com seriedade essa CPI, quero também expressar a minha indignação contra a tentativa de impedir que essa CPI completasse o seu trabalho de apuração.
Cabe uma esperança: a esperança de que nas próximas eleições possa o povo de São Paulo trazer, tanto para a Prefeitura Municipal de São Paulo quanto para a Câmara Municipal de São Paulo, pessoas que inovem e sigam a trilha daqueles que têm usado de seu poder, seja como vereador, seja como prefeito da cidade de São Paulo, para caracterizar sua administração pela total transparência de ações, pela total probidade na maneira como agem, pela transparência de seus atos, pela honestidade e pela boa gestão dos recursos públicos, que são do povo.
Tenho a certeza de que, felizmente, por meio da democracia, do processo eleitoral, no ano 2000, teremos uma surpresa muito agradável na cidade de São Paulo, sobretudo em função dos trabalhos bem realizados que tiveram o apoio da opinião pública, o apoio da imprensa escrita, da mídia, do rádio e da televisão. Certamente isso contribuirá para a maior consciência dos paulistanos na hora de escolher os seus representantes na Câmara Municipal e na Prefeitura.
Muito obrigado, Sr. Presidente.