Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS AO DISCURSO DO SENADOR ADEMIR ANDRADE. CONSIDERAÇÕES SOBRE APARTE OFERECIDO, NA SEMANA PASSADA, AO DISCURSO DO SENADOR FERNANDO BEZERRA, EM DEFESA DO GOVERNADOR DO RIO GRANDE DO NORTE, POR MALVERSAÇÃO DE VERBAS PUBLICAS.

Autor
José Agripino (PFL - Partido da Frente Liberal/RN)
Nome completo: José Agripino Maia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), GOVERNO ESTADUAL.:
  • COMENTARIOS AO DISCURSO DO SENADOR ADEMIR ANDRADE. CONSIDERAÇÕES SOBRE APARTE OFERECIDO, NA SEMANA PASSADA, AO DISCURSO DO SENADOR FERNANDO BEZERRA, EM DEFESA DO GOVERNADOR DO RIO GRANDE DO NORTE, POR MALVERSAÇÃO DE VERBAS PUBLICAS.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/1999 - Página 15264
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, RESPOSTA, ORADOR, PRONUNCIAMENTO, ADEMIR ANDRADE, SENADOR, ANALISE, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, REFORMA POLITICA, ESPECIFICAÇÃO, IMPORTANCIA, PROGRESSÃO, REELEIÇÃO, TOTAL, CARGO ELETIVO.
  • REGISTRO, ENCERRAMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, APLICAÇÃO, RECURSOS, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA DE SERVIÇOS ELETRICOS DO RIO GRANDE DO NORTE (COSERN).
  • APRESENTAÇÃO, RESULTADO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), COMPROVAÇÃO, OCORRENCIA, SUPERFATURAMENTO, OBRA PUBLICA, GOVERNO ESTADUAL.

O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL-RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, inicialmente, gostaria de responder ao apelo do Senador Ademir Andrade. Lamento que S. Exª não esteja presente, porque fui tão citado por S. Exª, que desejaria que estivesse presente para ouvir as minhas colocações com relação à reforma política.  

Gostaria que S. Exª ouvisse que eu, como Senador, singular, à época da discussão da reeleição, apresentei uma tese que foi amplamente discutida. E hoje, principalmente depois de tudo que estamos vendo acontecer, desejaria que ela tivesse prevalecido: era a tese da progressividade na questão da reeleição.  

Aprovar-se, sim, a tese da maturidade política e democrática da reeleição, mas em etapas. Experimentar-se a tese da reeleição para Presidente da República; avaliar-se o processo, o pleito; corrigir-se os erros porventura cometidos; e, em função das ocorrências e das correções, aí, sim, em eleições sucessivas, promover-se a reeleição de Governadores. E, após isso, com as correções ocorridas nos pleitos de reeleição de Governador, fazer-se a reeleição de prefeitos municipais.  

Minha tese foi colocada em discussão, mas, ao final, foi preterida à tese da reeleição maciça. De modo que registrei minha posição e o fiz com veemência; ela foi inclusive objeto de editoriais em jornais de circulação nacional, mas, infelizmente, não prevaleceu. Essa era a minha posição pessoal.  

Mas S. Exª me instou também como Presidente da Comissão de Constituição e Justiça, pedindo-me que colocasse na pauta das discussões, como se dependesse de mim, a reforma política como um todo. Quero dizer a S. Exª que, ao final da gestão do Senador Bernardo Cabral, algumas propostas de emenda à Constituição versando sobre reformas políticas foram analisadas e mereceram relatórios, que não se transformaram em pareceres porque não chegaram a ser votados. E pelo Regimento Interno da Casa, ao não transformar-se o relatório em parecer, a matéria volta ao Arquivo, para ser reapresentada na nova legislatura. Foi o que aconteceu.  

Ainda não foram reapresentadas as PECs. Na hora em que as PECs sobre reforma política forem reapresentadas, elas constarão daquilo que é tarefa e responsabilidade minha: ordenar a pauta de acordo com a gradação da importância dos fatos a analisar.  

É verdade que algumas matérias políticas foram entregues à Comissão de Constituição e Justiça e estão em análise, em discussão, em caráter de prioridade. De modo que, no que depender do Presidente da Comissão de Constituição e Justiça, ao serem reapresentadas, as PECs obedecerão à devida prioridade na ordem dos trabalhos, como estão merecendo prioridade a discussão de temas políticos por projetos de lei, ordinários ou complementares, que tratem de fidelidade partidária, de cláusula de barreira para partidos políticos, enfim, os temas que exigem discussão profunda.  

O que desejo neste começo de noite abordar - e o tema tem muito a ver com o tema da reeleição - diz respeito ao aparte que ofereci a discurso pronunciado semana passada pelo Senador Fernando Bezerra, cuja ausência lamento, ao defender seu correligionário, o Governador do Rio Grande do Norte, cujo governo é objeto de investigação com relação à aplicação dos recursos decorrentes da venda da companhia de eletricidade. São R$771 milhões entre o valor auferido no leilão e a aplicação decorrente de investimentos no sistema financeiro. Entre o principal e a aplicação, foram gerados R$771 milhões.  

Enquanto o Senador defendia seu Governador, com as considerações singelas que ofereci naquele momento, pedi uma única coisa: que a bem do interesse da sociedade potiguar e a bem do que deve ser o interesse desta Casa - não premiar a impunidade - se associasse à tese, que não era apenas da Oposição do Rio Grande do Norte, mas da sociedade do nosso Estado, com suas entidades de classe, com sua representação política, da prorrogação do prazo, estabelecido em 60 dias, para que os trabalhos de investigação pudessem ser completados, para que se o Governador, que o Senador Fernando Bezerra dizia nada temer, realmente nada temia, tivesse a grande oportunidade, com a prorrogação dos trabalhos da CPI, de mostrar o que havia sido feito com os R$771 milhões. Era a grande oportunidade que a sociedade tinha para ver a Oposição e o Governo digladiando em torno de um interesse que era público: desvendar um fato que para mim é mistério, o gasto de R$771 milhões – é verdade que em período eleitoral, e aí está a ilação com a questão que aqui foi discutida, a reeleição –, sem que tivesse ficado registrado nenhum marco, nenhum emblema real que justificasse a aplicação ou o fim dos R$771 milhões.  

Era interesse dos que são Governo e dos que são Oposição oferecer à sociedade as explicações que ela estava desejando. Era interesse do Governo obter o tempo de prorrogação para conseguir o atestado de bom governo. Pedi, nesse rumo e nesse sentido, a participação na tese da prorrogação do Senador Fernando Bezerra.  

O que quero registar nesta Casa é que, infelizmente, apesar de todos os apelos, a CPI foi encerrada sexta-feira passada e de forma curiosa. Para votar o encerramento da CPI, deputados estaduais ligados ao Governo vieram do exterior, da Europa, só para votar o fim da CPI e retornar para lá.  

O fato é que os trabalhos da CPI foram encerrados. E eu quero dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que não estamos aqui tratando de uma CPI para apurar uma aplicação de 10, 15 ou 20 milhões de reais. Estamos aqui para comentar a aplicação de R$771 milhões, o que é muito dinheiro em qualquer lugar do mundo.  

E a minha preocupação - e abordo esse tema - é porque a CPI dos Deputados Estaduais, a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte tinham a obrigação diante da sociedade do Rio Grande do Norte. Ela era responsável por oferecer respostas às indagações da sociedade, no âmbito estadual. Mas essa CPI, com as denúncias que foram feitas, com os fatos que foram constatados, assumiu tal importância pela gravidade das denúncias oferecidas, terminou produzindo um escândalo nacional, registrado na grande Imprensa, em edições seguidas do Jornal Nacional e do Jornal da Record

E aí quem se expôs foi a imagem do meu Estado, e aqui estou para dizer que se o relatório final da CPI, que daqui a pouco comentarei, foi apresentado, se a CPI foi encerrada antes do prazo desejado pela sociedade, esse escândalo, que é hoje nacional, que foi objeto de interesse de redes nacionais de televisão, pelo nosso desejo, daqueles que fazem Oposição e que se associam ao desejo da sociedade potiguar, ela não vai se encerrar, porque se a CPI tinha obrigações com a sociedade potiguar, pela dimensão da gravidade dos fatos denunciados e da transformação da CPI num escândalo nacional, o Rio Grande do Norte deve explicações à sociedade brasileira. Para isso aqui estou.  

Srªs e Srs. Senadores, durante 60 dias, a CPI investigou fatos e circunstâncias. Perguntou ao Governo, por exemplo, onde ele havia gasto o dinheiro. O governo respondeu que havia gasto o dinheiro na construção de dez mil casas. Fomos investigar a aplicação dos recursos. Como não se poderiam visitar 100 ou 120 Municípios, escolheu-se o Município de Serra Caiada para se investigar. A comissão, com seus membros, foi lá para verificar, por exemplo, que com o Vice-Prefeito havia sido contratada a construção de 65 casas, mediante convênio feito em período proibido pela legislação eleitoral. Esse foi o primeiro dolo.  

O segundo dolo: 65 casas envolviam uma soma de recursos que determinava a obrigação de processo licitatório, de tomada de preços, contudo verificou-se que não foi feito. Dividiu-se o total de 65 casas em dois lotes: um de 40 e um de 25. O que justificava, para o Governo, a oportunidade de entregar de mão beijada a construção das casas mediante uma simples carta-convite ao seu afilhado, supomos nós, o Vice-Prefeito da cidade, que, circunstancialmente, é construtor.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo. Fazendo soar a campainha) - Senador José Agripino, interrompo V. Exª apenas para consultar o Plenário sobre a prorrogação da sessão pelo tempo necessário para que V. Exª conclua a sua oração. (Pausa.)  

Não havendo objeção do Plenário, está prorrogada a sessão.  

O SR. JOSÉ AGRIPINO (PFL-RN) - Prossigo, Sr. Presidente. Foi, portanto, dividido em dois lotes: um de 40 e outro de 25 casas, para mais uma vez se burlar a lei, que já havia sido burlada porque o convênio foi realizado em período proibido pela Legislação Eleitoral.  

Lá em Serra Caiada, porém, verificou-se que, em vez de 65 casas, como estava publicado no Diário Oficial - e o dinheiro havia sido transferido para construí-las - , apenas 45 haviam sido construídas. Pagas 65, construídas 45 e recebidas oficialmente pelo Governo do Estado. Recebidas em que condições? Os Deputados foram lá e constataram: as paredes rachadas, o teto torto, o piso esfarelado; qualidade da pior possível que se possa imaginar. E o preço? Não sou eu que digo. Foi o Presidente do Tribunal de Contas do Estado quem declarou: "... a preço superfaturado em pelo menos R$700 por unidade".  

Esse fato foi levado ao conhecimento do controlador das contas do Estado que, em depoimento instado por um Deputado, a fim de que se manifestasse sobre todo aquele processo curioso, esquisito, ilegal, sobre o qual ele teria a obrigação de se manifestar à época, disse que realmente lhe havia sido submetido esse processo, com o qual ele não havia concordado e que o havia remetido com seu desacordo ao Procurador-Geral do Estado. Evidente que os Deputados desejaram ouvir o Procurador-Geral do Estado. E nas outras semanas, na CPI, o requerimento foi colocado para apreciação dos Deputados, sendo negada pela base governista a oitiva do Procurador do Estado que havia emitido parecer favorável àquilo que julgávamos uma indignidade. Encerra-se, portanto, a CPI sem se ouvirem pessoas fundamentais no esclarecimento de dúvidas que não são nossas, são da sociedade, porque os R$771 milhões não eram patrimônio do Governo, eram patrimônio do povo do Rio Grande do Norte. A nós, da Oposição, cabe zelar pela boa prática de governo e pela boa aplicação do recurso, que é público.

 

Perguntou-se ao Governo em que mais se havia gasto o dinheiro. Ele disse que na construção da rede de esgotos. Não se poderia ir a todos os Municípios onde se havia declarado estar sendo construída rede de esgotos, mas foi-se a Macau e foi-se a Lagoa Nova. Os Deputados foram a Lagoa Nova e verificaram que foi feito um convênio igualmente em época proibida pela legislação eleitoral, repassados R$500 milhões para construção da rede de esgotos completa. O Prefeito recebeu os recursos e fez uma licitação, vencida, curiosamente, por sua filha, que é Secretária de Administração da Prefeitura, que não executou a obra com 500, mas com um aditivo para 600 e para 700 milhões. Foi-se verificar a qualidade da obra. Verificou-se in loco que a estação de tratamento, com a primeira chuva, havia desmoronado, e que nenhuma ligação para nenhuma casa de Lagoa Nova havia sido feita. Portanto, o dinheiro pago e a obra recebida como concluída não tinham beneficiado uma só família de Lagoa Nova.  

Muito bem. Questionaram-se os convênios com Prefeituras municipais: todos convênios feitos em período proibido pela legislação eleitoral, e constatou-se uma coisa no mínimo curiosa: a ocorrência de vários convênios com o Município de Pau dos Ferros que, somados, atingiam a cifra de R$13 milhões. Srs. Senadores, Srªs Senadoras, Sr. Presidente, o Município de Pau dos Ferros, um Município governado por um prefeito eleito com a participação dos que hoje são Oposição – ele era Oposição e mudou de opinião, passando a apoiar a candidatura do Governador, de quem nunca foi correligionário – recebeu R$13 milhões em diversos convênios. Treze milhões de reais é mais do que o Governo gastou com os recursos decorrentes da privatização da Cosern em educação, saúde, segurança e agricultura. E gastou num Município só.  

Investigou-se o setor em que o Governo dizia ter gasto o maior volume de recursos: a construção de adutoras. Constatou-se a compra – dita pelo próprio Governador – de 1.200 quilômetros de tubo de ferro fundido que se encontram amontoados, conforme as televisões de circuito nacional mostraram, às portas de entrada das cidades, para impressionar. Mas o mais grave é que esses tubos foram comprados – isso ficou constatado – ao preço de R$1,38 por quilo, quando, na mesma época, empresas particulares e privadas compraram tubos iguais não por R$l,38 por quilo, mas por R$0,98 centavos por quilo, 40% mais baixo para não considerar o IPI.  

Não deram à CPI o direito de, com mais tempo, investigar a fundo essa questão. E nós estamos falando de compra no valor de R$70 milhões, com pelo menos 40% de valor a mais. A empresa privada não comprou 1.200 quilômetros, comprou alguns poucos quilômetros. E quando se compra muito a tendência é baixar o preço. Não se deu oportunidade à CPI que desejava zelar pelo interesse da sociedade e dar as respostas que o povo queria ouvir. Não se deu a oportunidade à CPI para ver as respostas, nem os fatos elucidados. Emasculou-se essa CPI, e os trabalhos foram encerrados. Faço com tristeza este registro porque pode parecer a alguns que estamos trazendo para o Plenário do Senado questões provincianas, talvez até com alguma paixão. Não é verdade, e aqui disse: esse fato é minha obrigação registrar porque sou Senador da República, mas represento o Estado do Rio Grande do Norte, que está hoje com a imagem comprometida porque a CPI deveria ter dado respostas à sociedade, mas o escândalo adquiriu tal monta, tal volume, que o Rio Grande do Norte passou a constar do circuito dos escândalos nacionais.  

O que quero dizer é que se o Governo não desejou ou não quis aproveitar a oportunidade para, na comissão parlamentar de inquérito oferecer as respostas que a sociedade queria, nós que fazemos Oposição não vamos parar, vamos continuar pelo meios próprios. Confiamos na Justiça do Rio Grande do Norte. Vamos oferecer as peças, com os fatos e as circunstâncias, para a análise da Justiça.  

Se o relatório, aprovado na noite de sexta-feira passada, fosse lido por alguém que passasse três meses sem ir ao Rio Grande do Norte, essa pessoa iria entender que era uma peça de propaganda do Governo do Estado; era uma peça aprovada pela maioria governista para passar o atestado de bom-mocismo a um Governo de quem se suspeita, sobre quem pesam acusações sérias.  

O que o Governo e a sua base governista desejaram foi, com aquele relatório, obter o nada-consta para o futuro. Só que, repito, no meu Estado, existe uma Oposição não-raivosa, responsável, zelosa; existem instituições, como a Ordem dos Advogados do Brasil e os sindicatos, que vão procurar, pelos meios judiciais, pelo Ministério Público, pela mobilização da sociedade, as respostas que a sociedade deseja ouvir. Se o Governo não fez a sua parte, nós faremos a nossa, a bem da boa imagem do Estado do Rio Grande do Norte.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/1999 - Página 15264