Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESCA NO BRASIL, DESTACANDO A SITUAÇÃO DO SETOR NO ESTADO DO PARA, A PROPOSITO DO 'DIA DO PESCADOR'.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PESCA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESCA NO BRASIL, DESTACANDO A SITUAÇÃO DO SETOR NO ESTADO DO PARA, A PROPOSITO DO 'DIA DO PESCADOR'.
Publicação
Publicação no DSF de 30/06/1999 - Página 17500
Assunto
Outros > PESCA.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, PESCADOR, OPORTUNIDADE, ANALISE, SITUAÇÃO, PESCA, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, IMPORTANCIA, ATIVIDADE ECONOMICA, FALTA, POLITICA, GOVERNO, INCENTIVO, SETOR.
  • ENUMERAÇÃO, DEFICIENCIA, SETOR PESQUEIRO, ORIENTAÇÃO, GOVERNO, ADOÇÃO, POLITICA, VIABILIDADE, PESCA, MELHORIA, CONDIÇÕES DE TRABALHO, PESCADOR.
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, REPRESENTANTE, SETOR PESQUEIRO, REGIÃO AMAZONICA, DISCUSSÃO, IDENTIFICAÇÃO, PROBLEMA, SOLUÇÃO, BUSCA, INTEGRAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, SETOR.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já em fase final antes do recesso e depois de tantos temas polêmicos, trago à Casa uma manifestação amena, que pretende contribuir com o Governo e com os pescadores da Amazônia e mais especialmente do Pará.  

Hoje, dia 29 de junho, Dia de São Pedro, que é considerado o padroeiro dos pescadores, comemora-se o Dia do Pescador. Aproveito esta oportunidade para, além de homenagear os pescadores do meu País, falar sobre a pesca, essa importante atividade econômica que coloca o Pará como o terceiro maior produtor de pescado do Brasil, sendo superado pelos Estados de Santa Catarina e Rio de Janeiro.  

É imenso o potencial da pesca na região amazônica dada a sua grande bacia hidrográfica, a maior do mundo. Além disso, os Estados do Pará e Amapá são banhados, em grande extensão, pelo Oceano Atlântico, permitindo também a pesca marinha. Apesar do grande potencial, a pesca na Região Norte ainda é carente de organização e de estrutura, padecendo de uma política mais definida para o setor.  

Há poucos meses, mais precisamente em março último, levei representantes de inúmeras entidades ligadas à pesca no Pará ao Ministro da Agricultura, Francisco Turra, quando foram apresentados os principais problemas existentes no setor pesqueiro. Resultou dessa audiência a ida ao Estado do Pará de um representante do Ministério, o Sr. Gabriel Causavara, que chefia o recém- criado Departamento de Pesca e Aqüicultura do Ministério.  

De lá para cá, vem ocorrendo uma crescente organização, aglutinando várias entidades ligadas à pesca, como: colônias de pescadores, entidades sindicais de trabalhadores e patronais, entidades de ensino e pesquisa e mesmo órgãos governamentais, pois já estão envolvidos nesse processo a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia - Sudam - e a Secretaria de Agricultura do Estado do Pará.  

Na semana passada, estiveram aqui vários representantes dessas entidades de classe e órgãos públicos, formando uma comitiva de quinze pessoas, que cumpriram uma extensa agenda de reuniões nos Ministérios da Agricultura, do Trabalho, do Meio Ambiente e no Ibama. Além disso, mantiveram um encontro com a Bancada do Pará, solicitando apoio para o setor pesqueiro no Estado.  

A essas lideranças do setor pesqueiro no Pará, a outros que não estiveram aqui na semana passada, mas também estão empenhadas na luta por melhores condições de trabalho e de produtividade do setor e, enfim, a todos os pescadores e ribeirinhos do meu Estado, que fazem da pesca o seu principal sustento, a minha homenagem neste dia.  

Lamentavelmente, entretanto, não há muito para eles comemorarem. São precárias até mesmo as informações sobre a pesca, sobre o consumo e, inclusive, sobre a exportação do pescado. O peixe é, na Região Norte, sem dúvida, o principal alimento, sobretudo para o caboclo, para o ribeirinho e para a população de baixa renda.  

Para se ter uma idéia, o consumo per capita de peixe em Belém, segundo o IBGE, é de 14,4 kg/ano. Estima-se que, em todo o Estado do Pará, o consumo do pescado seja superior a 70 mil toneladas por ano. Este grande volume de pescado é comercializado, na sua maior parte, em estado precário de conservação, provocado principalmente pelo inadequado manuseio a bordo das embarcações por ocasião da captura, pelas precárias condições de transporte, desembarque e acondicionamento do produto. Além disso, a venda ao consumidor é, em mais de 95% dos casos, feita nos mercados municipais e feiras livres, onde as condições de higiene são também insatisfatórias.  

Mas a produção pesqueira artesanal do Pará não é consumida somente pela sua população: atende também à demanda de pescado de várias capitais de Estados nordestinos, como São Luís, Teresina, Fortaleza, Recife e Salvador. Também a região do chamado Centro-Sul recebe o pescado paraense, como, por exemplo, Belo horizonte, Goiânia e Brasília. Ao todo saem do Pará, para os demais Estados brasileiros, cerca de 37 mil toneladas por ano, o que representa mais de 50% de toda produção de pescado do Estado.  

A pesca artesanal ainda é predominante na região, representa cerca de 70% em relação à pessoa industrial, o que significa um elemento dificultador, especialmente para as exportações. No ano de 1997, o valor da produção de pescado no Pará alcançou R$82 milhões, registrando uma queda de R$7 milhões em relação ao ano anterior. Além da queda na produção do camarão rosa, principal produto de exportação, a venda ilegal e fora do controle dos órgãos competentes justificam essa redução. Com tudo isso, segundo o Ministério da Agricultura, o Pará exportou no período o equivalente a US$47,5 milhões, principalmente aos mercados japonês e americano.  

O desenvolvimento da aqüicultura na Pará ainda é experimental e incipiente. Existem algumas iniciativas, em sua maioria com o apoio do Governo do Estado, por meio da Secretaria da Agricultura, estando situadas nos Municípios de Terra Alta, Santarém e Curuçá. Também nos Municípios de Castanhal e Abaetetuba existem experimentos.  

Vejam, Srs. Senadores, que este enorme potencial do setor pesqueiro na região amazônica convive com a ausência de políticas públicas adequadas, colocando a pesca numa situação de exclusão e de abandono pelas autoridades.  

Infelizmente a pesca não é exceção. Podemos citar aqui vários outros setores da economia, em que a Região Norte, apesar de possuir grande potencial, não vem recebendo a atenção devida do Governo Federal. Há poucos dias denunciei, nesta tribuna, que 80% de toda a madeira produzida na Amazônia é extraída e comercializada de forma ilegal, não pagando imposto, não garantindo condições dignas aos trabalhadores e estando alheia a uma política de desenvolvimento sustentável, fugindo completamente ao controle dos órgãos competentes.  

O turismo, outra área de grande potencial econômico na Amazônia, é marcado por uma política pífia, de expressão infinitamente inferior, padecendo de infra-estrutura nas áreas de maior potencial.  

É assim na agricultura e na pecuária; são também diferenciados os investimentos em educação, ciência e tecnologia. Em todas as estatísticas a que temos acesso, no que tange a investimentos e outras ações governamentais, a Região Norte é a que ocupa as piores colocações. Esta é uma observação que tenho constantemente ressaltado, pois é inadmissível que uma região tão importante para o País possa permanecer em situação de quase abandono.  

Gostaria de prosseguir fazendo uma breve reflexão acerca de alguns aspectos que precisam estar contemplados na adoção de uma política pesqueira para a Região Norte. Uma primeira debilidade constatada é a deficiência nas informações sobre o potencial, sobre a produção, sobre as condições de trabalho, enfim, torna-se necessária uma radiografia que permita orientar a adoção de uma política correta para o setor. Nota-se, por exemplo, que desde a captura até a comercialização do pescado, passando pelo transporte, armazenamento e o beneficiamento - este ainda em pequeno percentual -, torna-se necessário o investimento na preparação da mão-de-obra, qualificando o trabalhador, possibilitando aumento da produtividade e da qualidade e, conseqüentemente, da rentabilidade auferida. Somente com o desenvolvimento e transmissão de tecnologia do processamento do pescado será possível atingir mercados mais exigentes dentro e fora do País.  

A estrutura de transporte, de descarga e de armazenamento também constituem aspectos importantes que precisam ser considerados na adoção de uma política pesqueira para a região. No Estado do Pará, há uma clara deficiência de terminais pesqueiros. Para se ter uma idéia, somente no mercado Ver-O-Peso, em Belém, um dos mais famosos do Brasil, são desembarcados diariamente cerca de 60 toneladas de pescado e de lá distribuídos para outras feiras e mercados. A estrutura para isso é precária, gerando demora e expondo o produto por muito tempo em condições inadequadas. A produção de gelo e a estruturação de frigoríficos para o armazenamento, em áreas estratégicas, também constitui-se em problemas que precisam ser superados - inclusive é por causa dos terminais pesqueiros abandonados pela ex-Sudepe, depois Ibama e agora Ministério da Agricultura, que estamos reivindicando a sua reconstrução.  

A deficiência na regulamentação e fiscalização constitui-se outro ponto de estrangulamento para o setor pesqueiro. Existem queixas de toda ordem na atuação do Ibama. Além da falta de equipamento e de pessoal qualificado para exercer a fiscalização, os representantes da pesca do Pará reclamam o prazo na publicação das portarias que instituem o período de defeso nas várias bacias pesqueiras, causando grandes prejuízos aos pescadores e empresas, bem como dificultando o cumprimento da norma. O defeso é o período em que se suspende a pesca em determinados locais, como forma de preservar as espécies na fase de reprodução. Ocorre que o pescador pescador, nesse período, passou a ter o direito de receber seguro desemprego, um direito duramente conquistado. A não antecedência da publicação da portaria do Ibama, que determina o início e o fim do período do defeso, somado à demora da Delegacia Regional do Trabalho nos procedimentos burocráticos para a garantia do direito a cada pescador cadastrado, faz com que, mesmo assegurando a concessão do benefício, o pescador só o recebe com muito atraso.  

O dinheiro chega muitas vezes quando já terminado o defeso. Isso tem inclusive inviabilizado o cumprimento da norma, uma vez que o trabalhador não pode morrer de fome. Portanto, o despreparo e o desaparelhamento dos órgãos federais na região constituem-se no principal gerador do problema. Sobre este assunto, estou solicitando ao Ministério do Trabalho informações sobre o funcionamento do seguro desemprego para os pescadores e o porquê da demora no atendimento no caso do Pará.  

Abrindo um parêntese, Sr. Presidente, imagine que há um período em que o pescador não pode pescar para que o peixe se reproduza. Nesse período, passa a receber um salário mínimo de seguro desemprego do Governo para manter a sua família. Atualmente, creio que, em toda a Amazônia e mais especialmente no Estado do Pará, a burocracia do Governo, a ineficiência e o atraso do Ibama e da própria Delegacia do Trabalho no Estado fazem com que o dinheiro do seguro desemprego chegue após o término do período do defeso, ou seja, após o término do período em que o pescador não deveria pescar. Assim, descumpre-se uma norma, a produção evidentemente tende a diminuir, e o pescador não pode passar três meses sem receber nada e também sem pescar. Portanto, esse é um erro que precisa ser imediatamente corrigido.

 

Tivemos audiência com representantes do Ibama e do Ministério do Trabalho também nesse período em que essas lideranças estiveram em Brasília para solucionar definitivamente o problema extremamente grave. Se o pescador continua pescando na época da reprodução, a tendência é diminuir a quantidade do peixe, inviabilizando, portanto, a pesca e prejudicando milhares de pessoas que vivem dela.  

Outra razão da dificuldade no setor pesqueiro é explicada pela falta de definição de um órgão do Governo que cuide do assunto - observem o absurdo que ocorre neste País. Em poucos anos, a responsabilidade da área da pesca passou por três diferentes órgãos, gerando uma total desestruturação do setor. Primeiro era a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca - Sudepe -, órgão que era vinculado ao Ministério da Agricultura, extinto no final da década de 80, passando as atribuições para o Ibama. Ora, o Ibama constitui-se em um órgão de fiscalização, e a pesca não precisa apenas de fiscalização, mas fundamentalmente de fomento, de orientação e de apoio do Governo. Em função desse erro, muitos prejuízos foram causados ao setor. No início deste ano, a responsabilidade oficial do setor voltou ao Ministério da Agricultura com a criação do Departamento de Pesca e Aqüicultura. Essas mudanças só têm gerado confusão e prejuízos. Termina ninguém assumindo por inteiro o setor. Num País como o nosso, que possui a maior bacia hidrográfica do mundo, tendo ainda grande extensão do seu território banhado pelo oceano Atlântico, a pesca assume grande importância na vida do cidadão e na economia do País. A gestão desse importante setor caberia mais a uma secretaria do que a um departamento. Assim como existe no Ministério da Agricultura a Secretaria de Política Agrícola ou de Defesa Agropecuária, deveria - aqui faço uma sugestão ao Ministro da Agricultura e ao Governo - ser criada uma secretaria de desenvolvimento pesqueiro ou algo parecido, porque o setor precisa ser reestruturado.  

São apontados ainda problemas ambientais causados pelo desmatamento de áreas de várzea, a poluição provocada principalmente pelo uso desmedido de mercúrio nas atividades garimpeiras e no uso de defensivos agrícolas. O Departamento Nacional de Produção Mineral deveria estar orientando, educando, ensinando os garimpeiros a produzir, a fazer o beneficiamento do ouro ou a cata do ouro com a utilização de outros processos que não utilizassem mercúrio. Lamentavelmente, os órgão do Governo só servem para proteger o interesse de grandes empresas. O garimpeiro, que é um homem presente, impossível de ser retirado, porque a Amazônia é uma área de garimpo, não tem nenhum apoio do Governo Federal e dos órgãos competentes para lhe dar a devida atenção e ensinamento. Cabe ao Ibama e ao próprio Ministério, portanto, a fiscalização disso.  

A falta de financiamento é, talvez, o que mais claramente denuncia a desatenção governamental e a inadequação de uma política para o setor pesqueiro no Pará e em toda a Região Amazônica.  

A união de todos aqueles que fazem a pesca no Pará e na região é, sem dúvida, a única forma de se estabelecer um novo ordenamento para essa atividade, que é tão peculiar da região.  

Nesta semana, exatamente nos dias 1 o e 2 de julho, como parte das ações a que me referi no início deste pronunciamento, será realizado no auditório da Sudam, em Belém, um workshop que pretende reunir representantes do setor pesqueiro da Amazônia, com a expectativa de se discutirem e identificarem os principais entraves e as prováveis soluções, buscando com isso dar passos na direção de um desenvolvimento integrado do setor. Iniciativas como essa somam-se ao esforço conjunto que se está buscando construir para se elevar a atividade pesqueira da Região Amazônica a patamares condizentes com o seu potencial. Desse workshop, do qual vou participar, deverá sair uma proposta para o desenvolvimento da pesca na Região Amazônica, apontando as ações necessárias a curto, médio e longo prazo.  

Quero dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que nós, da Oposição, não vivemos somente a fazer críticas, a condenar atitudes do Governo e a fiscalizar as suas ações. Isso, evidentemente, fazemos, mas também muitas vezes nos unimos à população para encontrar saídas e soluções que resolvam seus problemas, e trazemos essas soluções ao Governo.  

Tenho orgulho de dizer que estou, de certa forma, participando ativamente desse processo, e diria até capitaneando essa luta e essa união dos inúmeros setores ligados à área, que estavam completamente dissociados. A Sudam, a Escola Técnica Federal do Pará e a Secretaria de Agricultura, cada um agia para um lado, assim como a pesca industrial e a pesca artesanal, enfim, estava tudo solto e, agora, estamos unindo todos esses setores. Está havendo uma convivência que está integrando o setor.  

Por meio desse workshop, tenho certeza de que conseguiremos um projeto para ampliar, e muito, o poder econômico do setor de pesca no nosso Estado, bem como o seu aproveitamento. Evidentemente, deverá haver uma melhoria do preço do pescado e o melhor aproveitamento de toda a sua população.  

Amanhã, teremos o orgulho de ver a assinatura de um convênio entre a Universidade Federal da Amazônia e os dirigentes do Sivam, para que este use todo o seu instrumental de comunicação a serviço das nossas universidades, nos cursos à distância para formação dos nossos professores. Isso foi outra luta que encampamos no Congresso Nacional e que deu um resultado extremamente positivo.  

Encerro o meu pronunciamento saudando, por esta data, todos os pescadores da minha Região e do País, e dizendo-lhes que o nosso mandato continuará à disposição desta luta e de todas aquelas que objetivem o desenvolvimento do meu Estado, da minha Região, e a melhoria da qualidade de vida da população que nela vive.  

Anexo, Sr. Presidente, o pedido de informação dirigido ao Ministro do Trabalho para que S. Exª nos informe que providências estão sendo tomadas para acabar com o atraso no pagamento do seguro-desemprego na época de defesa dos pescadores artesanais do Estado do Pará.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/06/1999 - Página 17500