Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS AO 'RELATORIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO' BASEADO NOS DADOS DE 1997, DIVULGADO PELO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO - PNUD.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • COMENTARIOS AO 'RELATORIO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO' BASEADO NOS DADOS DE 1997, DIVULGADO PELO PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO - PNUD.
Publicação
Publicação no DSF de 05/08/1999 - Página 19397
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), INDICE, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, HOMEM, ALTERAÇÃO, METODOLOGIA, AVALIAÇÃO, RENDA, SAUDE, EDUCAÇÃO, PAIS.
  • REGISTRO, CONTINUAÇÃO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, DESIGUALDADE SOCIAL, BRASIL, INFERIORIDADE, MELHORIA, QUALIDADE, SAUDE, POPULAÇÃO, EXPECTATIVA, ATUAÇÃO, GOVERNO, SOCIEDADE CIVIL.
  • ANALISE, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, PRIMEIRO MUNDO, REGISTRO, SUGESTÃO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), PROVIDENCIA, AMBITO INTERNACIONAL, SOLIDARIEDADE, ECONOMIA, TERCEIRO MUNDO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB–CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – Pnud – divulgou há poucas semanas o Relatório de Desenvolvimento Humano baseado nos dados de 1997. Desde há algum tempo venho acompanhando esse relatório que, creio, traz algumas contribuições substantivas ao debate sobre as políticas sociais a serem adotadas. Relevo desse relatório o seu caráter de estar voltado para o " desenvolvimento humano ", o que significa um avanço no modo de ver o desenvolvimento, pois, no passado, predominavam critérios de "desenvolvimento econômico" ou de "desenvolvimento social", menos centrados na pessoa. Estar centrado na pessoa é, pois, o melhor desse relatório.  

Gostaria de passar ao largo da discussão sobre melhor ou pior colocação do Brasil no Relatório, pois se trata de uma mudança na medida e não uma mudança no País. Ou seja, mudou a lente, o modo de ver, o jeito de encarar os dados.  

Como todos sabem, são três os principais fatores do IDH: poder de compra, saúde e educação. Foi justamente no item sobre a renda que o índice do Brasil decresceu, de 0,94 ano passado para 0,70, este ano, segundo a nova metodologia adotada. No cálculo, compara-se a renda per capita anual do país com a renda per capita mundial, que este ano é de US$ 6.332,00. O peso do crescimento dessa renda é diferente para cada país, de acordo com os benefícios recebidos pela população. Por exemplo, se dobrar a renda per capita anual de Serra Leoa, que é de US$ 410,00, haverá uma sensível melhora na qualidade de vida de seus habitantes; mas o mesmo efeito não ocorrerá em Luxemburgo, cuja renda per capita ultrapassa os US$ 30.000,00.  

Mas o importante é notar que, numa metodologia ou noutra, houve avanço de dois pontos na colocação do Brasil. Pela metodologia que vigorava até o ano passado, o Brasil pularia do 62º para o 60º lugar; na nova, estaria em 81º, ano passado, e em 79º este ano.  

Não obstante essa melhoria, o Brasil continua sendo um país com uma distribuição de renda muito desigual. Aqui, os 20% mais ricos detêm 63,4% da renda, enquanto que os 20% mais pobres, apenas 2,5%. Esse é um índice de desigualdade maior do que o de vizinhos nossos, como Uruguai e Peru.  

Essa desigualdade, por sinal, não ocorre apenas no Brasil. O relatório denuncia a crescente concentração de renda em todo o mundo. Em 1960, a relação de concentração de renda entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres era de 30 para 1; já em 1997, essa desigualdade pulou para uma proporção de 74 para 1.  

O relatório engloba 174 países; em primeiro está o Canadá, com um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,932; em último, Serra Leoa, com 0,254; o Brasil se situa no 79º, com um IDH de 0,739. Os que se situam acima de 0,8 são os considerados de desenvolvimento superior, e somam 45 países; os de desenvolvimento médio, como o Brasil, são 94 nações; entre os de desenvolvimento humano inferior, encontramos 35 países.  

Entre nós, continua puxando para baixo o nosso IDH a baixa qualidade de vida da população no item saúde, pois no quesito educação tivemos uma pequena melhora. Mas na saúde, em um ano, tivemos o aumento de expectativa de vida de apenas dois meses, o que é pouco, se comparado ao avanço alcançado por outros países no mesmo período. Também contribuem para a baixa pontuação na questão saúde, as mortes violentas de jovens e a combinação de mortalidade, ainda alta, por doenças infecciosas com aumento das doenças típicas de países ricos, como o câncer e o infarto.  

O nosso avanço no ranking do IDH tem se dado de maneira desigual; na década de 70 ele chegou a avançar um ponto por ano; nos primeiros cinco anos da década de oitenta, cresceu menos de meio ponto por ano (0,44%); entre 1985 e 1995, pouco mais de meio ponto (0,6%); de 1995 a 1997, nosso crescimento tem sido de 0,75% ao ano, o melhor desempenho dos últimos anos.  

Entretanto, devemos sempre perseguir a melhoria de condições de vida de nossa população; não para aumentar o nosso IDH, pois esse é apenas um índice; a questão é de justiça social. A questão da melhoria da qualidade de vida se torna mais difícil, no entanto, quando avaliamos o movimento mundial. A chamada globalização, como bem definiu o Presidente Fernando Henrique Cardoso, tem-se dado de maneira assimétrica; que quer dizer isso? Que a globalização beneficia uns poucos, em detrimento de muitos.  

Vejamos a distribuição de renda no globo: 20% da população mundial que vive nos países de renda mais elevada concentra o seguinte:  

86% do PIB mundial;

82% das exportações mundiais;

68% do investimento direto estrangeiro dirigido à produção;

74% das linhas telefônicas;

91% dos usuários da Internet.

Tal assimetria levou os técnicos do Pnud a sugerirem a instituição de uma espécie de governo mundial. Esse "governo mundial" incluiria:  

um banco central mundial, capaz de funcionar como emprestador de última instância para países em dificuldade;

também a criação de um emprestador de última instância para os indivíduos, como complemento dos pacotes financeiros de ajuda a países;

um imposto bit sobre as comunicações on line , para financiar maior acesso dos mais pobres às modernas tecnologias;

definição de códigos de conduta para multinacionais para salvaguardar os interesses dos trabalhadores;

criação de um G-20, com presença de 10 países industrializados e 10 países em desenvolvimento, além de representantes da sociedade civil; esse G-20 serviria de contraponto ao G-7, grupo dos 7 países mais industrializados;

negociações em torno da propriedade industrial e a emissão de gases carbônicos; como maneira de preservar o meio ambiente, fazer com que haja uma "socialização" das patentes (de posse dos países mais desenvolvidos) proporcional à emissão de gás carbônico (também feita por esses países).

Um relatório como esse não tem poder nenhum sobre a realidade. É, no máximo, um instantâneo da realidade. E uma fotografia é para ser vista. Desse ponto de vista, não é possível fazer retoques no retrato. Entretanto, é possível mudar a realidade daqueles que estão no retrato. E creio que esse é o grande compromisso do Governo Fernando Henrique Cardoso, e continuará sendo nos próximos anos, de modo a que possamos aumentar as taxas de matrícula, para que os brasileiros aumentem, por intermédio da educação, suas possibilidades de crescimento profissional, e financeiro. E mais que aumentar as taxas de matrícula, dar condições para a permanência dessas crianças e jovens na escola.  

Quanto à saúde, embora tenha sido grande o compromisso deste governo com sua melhora, é preciso que se continue investindo na publicização do sistema de saúde; que a assistência universal seja alcançada, no caminho que vem sendo trilhado.  

Já o terceiro item do relatório, o poder de compra, depende de muitas variáveis, entre elas o emprego, que é objeto de preocupação de nosso Executivo.  

De qualquer modo, louvo a publicação do relatório, esperando que ele sirva a nós, Parlamentares, aos técnicos e dirigentes do Executivo e, principalmente, à sociedade civil: aos sindicatos, Organizações Não-Governamentais, entidades de classe, associações de moradores, ambientalistas, cooperativistas, educadores, artistas, profissionais liberais. A sociedade é sempre maior que o governo. Pela pressão, luta e perseverança desses segmentos, este País avançou muito nos últimos anos; saímos de um regime ditatorial para uma democracia representativa; saímos de um marasmo de participação para movimentos sociais atuantes; saímos de um processo inflacionário para uma economia monetariamente estabilizada; creio que, daqui para a frente, as melhorias no desenvolvimento humano continuam dependendo dessa força da sociedade, pois é a serviço das pessoas que compõem essa sociedade que está o Estado. E qualquer iniciativa do Estado deve ser na direção da melhoria do desenvolvimento humano.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/08/1999 - Página 19397