Discurso no Senado Federal

CRITICAS A ALTERAÇÃO NO CODIGO DE TRANSITO PARA ABRANDAMENTO DA PONTUAÇÃO EXIGIDA NA SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO. (COMO LIDER)

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO DE TRANSITO BRASILEIRO.:
  • CRITICAS A ALTERAÇÃO NO CODIGO DE TRANSITO PARA ABRANDAMENTO DA PONTUAÇÃO EXIGIDA NA SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO. (COMO LIDER)
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/1999 - Página 19934
Assunto
Outros > CODIGO DE TRANSITO BRASILEIRO.
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, GOVERNO, ANISTIA, REDUÇÃO, PUNIÇÃO, MOTORISTA, INFRAÇÃO, CODIGO NACIONAL DE TRANSITO.
  • DEFESA, RESPEITO, CODIGO DE TRANSITO BRASILEIRO, COMENTARIO, ESTATISTICA, REDUÇÃO, ACIDENTE DE TRANSITO, MORTE, CRITICA, IMPUNIDADE, EFEITO, VIOLENCIA, TRANSITO.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB-AL. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, agradeço a gentileza do Líder do meu Partido - o PMDB -, Senador Jader Barbalho, por haver me concedido este tempo para uma regimental e também muito rápida comunicação de Liderança.  

Há exatos 50 dias, no Fórum das Américas para Segurança e Educação no Trânsito, aqui em Brasília, o Governo brasileiro destacava as evoluções conquistadas a partir do novo Código de Trânsito e anunciava que não permitiria o afrouxamento das regras de civilidade no trânsito.  

Sr. Presidente, na última semana, estarrecido, vi o Governo propor o abrandamento da pontuação para suspender a habilitação de 20 para 30 pontos. Vamos dar mais 10 pontos de chance para o troglodita do trânsito? É a oportunidade para que ele, quem sabe, mate alguém. Mais grave, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a sugestão simplista e até irresponsável de anistiar cerca de 20 mil maus motoristas que já foram punidos.  

Mais uma vez, lamentavelmente, mudamos de via, e agora vamos na contramão da cidadania. O Código, discutido por seis anos no Congresso Nacional, com um ano e meio de vigência, é um instrumento de convivência civilizada e de preservação de vidas. Sua concepção em educação e segurança revelam resultados verdadeiramente alentadores.  

A eloqüência dos números não comporta contraditas. No primeiro ano de vigência do Código, o número de mortes foi reduzido em 25%; 6 mil vidas foram poupadas - há quem ache pouco. Os acidentes caíram 22%; menos 70 mil acidentes - há quem ache pouco. Os feridos diminuíram em 26%; 83 mil pessoas a menos - há quem ache pouco. O número de veículos envolvidos em acidentes também foi menor, em 26%.  

Em 1998, três mil e quinhentos maus motoristas tiveram sua habilitação suspensa; outros dezenove mil e oitocentos já tinham ultrapassado os limites dos 20 pontos e estavam prestes a perder a autorização para dirigir. São apenas, Sr. Presidente, 23 mil infratores contumazes, menos de 1% de condutores do Brasil. A mácula de sangue e sofrimento vinham sendo reduzida.  

A experiência internacional já nos provou que multas significativas, efetivamente aplicadas, diminuem os números de acidentes, as infrações e as próprias multas. A nossa incipiente experiência ratifica também esta equação.  

Sr. Presidente, todos os países do mundo que resolveram seus problemas de violência no trânsito o fizeram com leis claras, com multas significativas, rigorosamente aplicadas. Não é a multa pela multa, não é a multa pela indústria, não é a indústria da multa, não é a multa para arrecadar mais. É que a população somente observa melhor as regras, as leis, se temer multas significativas, se verdadeiramente doer no bolso.  

A Polícia Rodoviária Federal aplicou, em 1997, antes do Código, 2 milhões e 300 mil multas. Em 1998, em vigência o Código, esse número foi de apenas 1 milhão e 200 mil multas.  

A perspectiva da impunidade elimina e desfaz a esperança de cidadania. É preciso uma razão muito forte para pensarmos em mudar uma lei tão recente e que, segundo os números, já demonstrou sua eficácia. Que não se iluda a sociedade. A tolerância proposta pelo Governo representará a morte de 6 mil pessoas por ano. Se a infelicidade familiar for pouco, consideremos o acessório: o aumento dos custos médico-hospitalares e previdenciários.  

A propensão de retorno à selvageria e ao canibalismo no trânsito é gerada pelo interesse ilegítimo de atender maus motoristas, que tiveram suspensas suas habilitações. Isto, Sr. Presidente, repito, representa menos de 1% dos condutores de todo o País.  

Sinal verde para premiar os transgressores, verdadeiros pit bulls do trânsito, e, exemplarmente, punirmos os outros 30 milhões de condutores, que respeitaram as leis, contribuindo para melhorar nossas melancólicas estatísticas.  

Prefiro, sinceramente, não acreditar que a espinha dorsal do Governo tenha se curvado à barbárie sobre rodas para atender a uma sedução populista. Fica no ar uma suspeita de demagogia. Se o Governo for adiante nessa insensatez, irá, com a expressão indiferente de um coveiro, lamentavelmente, sepultar um de nossos melhores e mais eficazes instrumentos de cidadania.  

Tenho certeza, Sr. Presidente, de que essa luz vermelha que está à frente da Mesa Diretora irá se acender permanentemente para qualquer proposta que vise ressuscitar a mancha de sangue infiltrada em nossas estradas. Estou certo de que o Senado da República não irá reforçar na sociedade a idéia de que aqui fazemos leis em cima da perna, leis que pegam, leis que não pegam, e que a toda hora precisam ser modificadas.  

É admissível, claro, que possamos aprimorar qualquer legislação. São obras humanas, sujeitas a erros e a imperfeições. Intolerável, Srªs e Srs. Senadores, é permitir qualquer flexibilização que implique a reedição da guerra no trânsito, que dá uma triste notoriedade ao Brasil.  

Ao lançar a idéia, se é que podemos considerá-la como tal, o Governo já contribuiu para o arrefecimento da legislação e acrescentou uma desnecessária contribuição à banalização da violência no trânsito. Transigir na preservação de vidas, sob qualquer argumento, é uma inaceitável subordinação a uma minoria e a certeza de reconquistarmos o nefasto pódio de campeões mundiais em acidentes de trânsito.  

Será, Sr. Presidente, que depois de tanto esforço para aprovar a lei, para regulamentá-la e para convencermos a população da sua necessidade, vamos contribuir para que o Código de Trânsito se torne inócuo? Certamente este Plenário não concordará com o sangue no asfalto.  

Muito obrigado, Sr .Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/1999 - Página 19934