Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AO COMPOSITOR ARY BARROSO PELO TRANSCURSO DOS 60 ANOS DA PRIMEIRA GRAVAÇÃO DA MUSICA 'AQUARELA DO BRASIL'.

Autor
José Alencar (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
Nome completo: José Alencar Gomes da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM AO COMPOSITOR ARY BARROSO PELO TRANSCURSO DOS 60 ANOS DA PRIMEIRA GRAVAÇÃO DA MUSICA 'AQUARELA DO BRASIL'.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/1999 - Página 20706
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ARY BARROSO, COMPOSITOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), IMPORTANCIA, MUSICA POPULAR, BRASIL, ANIVERSARIO, GRAVAÇÃO, OBRA MUSICAL.

O SR. JOSÉ ALENCAR (PMDB-MG. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, venho hoje a esta tribuna para prestar uma homenagem ao meu mais ilustre conterrâneo, o grande compositor brasileiro Ary Barroso. Há sessenta anos, foi gravada, pela primeira vez, a "Aquarela do Brasil", que tem sido um hino em todo o nosso território e fora do País.  

Desde a semana passada, venho recebendo pedidos de autoridades do Município de Ubá, onde nasceu Ary Barroso, para que não deixasse de fazer este pronunciamento hoje.  

É certo que estamos passando por uma fase muito difícil da vida brasileira, em que cada minuto deveria ser aproveitado para trazer as nossas preocupações com o quadro que estamos vivendo. Mas não posso, neste momento, deixar de reconhecer que Ary Barroso é realmente dessas figuras que merecem o nosso aplauso e a nossa homenagem.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, este 18 de agosto de 1999 é data muito especial para a cultura brasileira. Há exatos sessenta anos, era gravada pela primeira vez, na voz do grande Francisco Alves, uma canção popular que entrou definitivamente para a história: a "Aquarela do Brasil", de Ary Barroso, o mineiro que a minha querida cidade de Ubá deu ao Brasil.  

É singular a história da "Aquarela". Afastando-se dos temas até então usuais na música popular, em que amores os mais diversos mesclavam-se às vicissitudes tão próprias das mesas de bares, Ary compôs uma canção em que a melodia alegre e contagiante acoplava-se a uma letra feita para cantar as belezas do Brasil. Estávamos no final dos anos trinta, época que assinalava o grande esforço nacional no sentido de modernizar o País.  

Ao ganhar um arranjo inovador, "Aquarela do Brasil" passou a sintetizar e a representar o mais brasileiro de todos os ritmos, o samba. Com seus versos aparentemente simples, mas de extrema força poética, conseguiu universalizar-se, exatamente por ter conseguido cantar, com perfeição, as particularidades do Brasil, sua terra e sua gente.  

Creio residir nesse ponto a monumentalidade da obra de Ary Barroso. Com sua "Aquarela", ao cantar sua aldeia, encantou ao mundo. Daí ser essa música a mais indiscutível e admirada embaixada do Brasil, em qualquer parte do mundo. A esse respeito, lembro-me, com emoção, de um episódio ocorrido há bastante tempo e que, sem dúvida, traduz uma experiência protagonizada por milhares de viajantes e turistas brasileiros. Em minha primeira viagem ao continente asiático, em meados da década de 1970, integrando um grupo de empresários, ao passar por restaurantes que contavam com música ao vivo, a homenagem que a todos nós sensibilizava: bastava sermos identificados como brasileiros para que, de imediato, fossem ouvidos os acorde da "Aquarela do Brasil".  

Nada há que a isso se equipare na cultura brasileira. O múltiplo Ary Barroso – que, com a habitual competência, foi compositor, pianista, regente e grande comunicador radiofônico – produziu uma obra que, ao mesmo tempo, penetrava na alma brasileira e atingia a sensibilidade de todos os povos. Somente os artistas verdadeiramente geniais são capazes de algo assim!  

Felizmente, Sr. Presidente, o reconhecimento nunca lhe faltou. Reconhecimento, diga-se, vindo tanto do povo — que sempre se identificou com seu trabalho — quanto de colegas e especialistas. Nesse sentido, destaco a grande homenagem que, sob chancela oficial, o Brasil lhe prestou: em 1955, o Presidente Café Filho conferiu-lhe — assim como a outro gênio da música, Heitor Villa-Lobos — a Ordem do Mérito, em cerimônia ocorrida no Palácio do Catete.  

A propósito, faço minhas as palavras do jornalista Sérgio Cabral, seguramente um dos maiores conhecedores da música popular brasileira: "Depois de sua morte, Ary Barroso foi homenageado por governos estaduais e municipais, que deram o seu nome a logradouros públicos e a escolas de todo o Brasil. O setor das cabines de rádio e televisão do Maracanã ganhou um busto do vereador que tanto lutara pela construção do estádio. No carnaval de 1988, a comunidade do samba homenageou-o, através do enredo da escola de samba União da Ilha do Governador. Num dos versos do samba-enredo, certamente, a maior homenagem: E o povo ainda canta as suas canções".  

A esse respeito, Sr. Presidente, por uma questão de elementar justiça, devo registrar o carinho com que o povo de Ubá sempre se relacionou com seu filho ilustre. Naquela cidade, onde Ary Barroso nasceu em 1903, que foi o berço de seu aprendizado no piano — estimulado pela sua avó Gabriella e pelas tias Telvina e Ritinha, especialmente esta, sua professora -, de suas primeiras composições e dos sonhos de adolescente, a admiração pelo artista nunca se arrefeceu.  

Diversas homenagens foram prestadas pela comunidade ubaense ao conterrâneo que soube, pela magia de sua arte, levar o nome de seu querido país aos quatro cantos do planeta. A mais importante via do Bairro Jardim Glória leva o nome de Ary; na Praça das Mercês, um sugestivo monumento – na forma da Clave de Sol – perpetua sua memória; um clube de serviço o tem como patrono, o Rotary Clube Ary Barroso; em 1979, com a presença do também ubaense Governador Ozanam Coelho, paradigma de homem público, a Praça Guido Marlière recebeu o busto do grande compositor. Isso sem falar da Comenda Ary Barroso, instituída em 1993, com o objetivo de homenagear os que tenham contribuído para a projeção da cultura ubaense, e do projeto cultural "Musical Ary Barroso", voltado para o apoio a novos valores musicais.  

Passado tanto tempo, a "Cidade Carinho" não se esquece de seu filho famoso. Neste 18 de agosto de 1999, celebrando a primeira gravação em disco de 78 rpm da "Aquarela do Brasil", Ubá se movimenta para saudar a data e, uma vez mais, reverenciar a memória de Ary Barroso. Povo e Poder Público unem-se no mesmo propósito: registrar o grande feito.  

Para tanto, foi especialmente criado o Comitê Pró-60 anos de Aquarela do Brasil. Personalidades como o Prefeito Narciso Michelli, Levindo Barros, Maria de Loreto Camiloto Rocha, Miguel Poggiali Gasparoni, Chiquinho de Carvalho, entre muitos outros, esmeraram-se nos preparativos da grande celebração que, ao longo de todo o dia, está mobilizando toda a comunidade.  

Assim é que neste dia, em Ubá, uma intensa e rica programação celebra os 60 anos da primeira gravação da Aquarela do Brasil . Nela estão envolvidos os meios de comunicação - Rádios Educadora AM/FM e Ubaense , TV Ubá e jornais, apresentando uma programação especial -, além de escolas públicas e particulares e empresas. Será celebrada missa solene na Basílica de Nossa Senhora do Rosário, onde o menino Ary foi coroinha, levado pela avó, que sonhava vê-lo sacerdote. A programação contempla ainda as apresentações de algumas das mais expressivas manifestações artísticas da cidade: o Madrigal Ubaense, liderado pelo grande maestro Marum Alexander, também ubaense, o Coral do IBEU e as Bandas 22 de Maio e Sagrado Coração de Jesus.  

No encerramento da programação festiva, a forma mais adequada para se homenagear aquele que fez da música popular o mais perfeito instrumento de comunicação da alma brasileira com a comunidade universal: uma seresta, percorrendo as mais tradicionais ruas de Ubá.  

Encerro este pronunciamento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com a certeza de estar fazendo um registro histórico. Os 60 anos da primeira gravação de Aquarela do Brasil constituem data marcante no calendário cultural brasileiro. Seu autor, o imortal ubaense Ary Barroso, transpôs para a música popular os sentimentos que nos fazem humanos - cantando o amor e a esperança - e nos tornam mais brasileiros - cantando a exuberância de nossas riquezas naturais e nossa incansável busca de construção de uma vida digna.  

Quando Francisco Alves e a Orquestra do Maestro Radamés Gnatalli entraram em estúdio para gravar aquele disco de 78 rpm, registrado com o nº 11.768, davam início a uma história que não teria fim. Iniciava-se ali a trajetória de uma canção que, como raramente acontece no mundo, transcendeu a tudo e a todos, tornando-se mensageira de um povo a todos os povos.  

Essa, a genialidade de Ary.  

Essa, a imortalidade da "Aquarela".  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/1999 - Página 20706