Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O ENDIVIDAMENTO DO SETOR RURAL BRASILEIRO.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • PREOCUPAÇÃO COM O ENDIVIDAMENTO DO SETOR RURAL BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 19/08/1999 - Página 20709
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • APOIO, REIVINDICAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, PRODUTOR RURAL, MARCHA, CAMINHÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), DEFESA, PROPOSTA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, ESPECIFICAÇÃO, DIALOGO, GOVERNO.
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AGRICULTURA, BRASIL, AUMENTO, CUSTO, PRODUÇÃO, REDUÇÃO, COTAÇÃO, SOJA, MERCADO INTERNACIONAL, EXTINÇÃO, ESTABELECIMENTO, PEQUENO PRODUTOR RURAL, INSUFICIENCIA, RECURSOS, PLANO, SAFRA, GOVERNO, FALTA, ACESSO, PRODUTOR, MOTIVO, INADIMPLENCIA.

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB-RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como um estalo entre os dedos, o assunto reservado para a semana na agenda política do País se concentrou, de súbito, no problema do endividamento do setor rural brasileiro. No entanto, mais do que uma causa justa, já não era sem tempo de o Governo Federal destinar sua atenção às demandas da produção agrícola. A mobilização que ora assalta Brasília, com tantos tratores e caminhões a invadir o eixo monumental, adquire significado de dimensões imprevisíveis. Mal ou bem, o "caminhonaço" dos produtores veio a provocar a presença urgente do Ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, à cena das negociações.  

Sejamos francos: temos que reconhecer a legitimidade das reivindicações. O endividamento estratosférico dos médios e pequenos produtores desde as últimas safras tornou-se ônus insuportável, inviabilizando planos de colheita farta nos próximos anos. A comunidade ruralista é muito clara em seus prognósticos de curto prazo: caso a indiferença governamental perdure, a primeira safra do ano 2000 ficará inteiramente comprometida.  

Isso se justifica, na medida em que se apontam estrangulamentos bem definidos na agricultura brasileira. Trata-se, em síntese, da dívida gigante dos produtores, que já alcança a escala, nada desprezível, dos 23 bilhões de Reais! Parece-me que seria descabido discutir, aqui e agora, o mérito, ou não, da política agrícola que tem sido adotada pelo Governo Fernando Henrique. A questão, na verdade, ultrapassa o julgamento da eficiência política para ceder lugar à urgente superação da precariedade vigente no campo. Isso implica, naturalmente, maior sensibilidade das autoridades governamentais no que tange a novas rodadas de negociação das dívidas.  

Retrospectivamente, não há como comparar a euforia verificada no ano passado, quando os plantadores de soja foram premiados com uma grande colheita e bons preços, com a melancolia gerada pela safra de 99, cuja avaliação de desempenho não autoriza otimismo algum. E, para azedar ainda mais o panorama, tampouco a soja deverá contar com uma alta cotação no mercado mundial.  

Na realidade, a expectativa de que a primeira safra do ano 2000 alcançasse a faixa dos 90 milhões de toneladas de grãos não mais encontra credibilidade alguma. Conscientes do quadro, os agricultores do Brasil manifestam enorme preocupação com as duras conseqüências que daí podem advir. Para completar, o custo de produção, ao longo desses anos, tem-se elevado de forma constante no País. De acordo com dados da CONAB, eles evoluíram de 419 reais, em 1995, para 451 reais, em 96; 485 reais, em 97, e 501 reais, em 98. De acordo com a mesma CONAB, para este ano, deverá estar em torno de 804 reais, o que representa uma evolução de quase 100% em apenas 4 anos.  

Segundo o presidente da Comissão de Crédito Rural da Confederação Nacional de Crédito Rural (CNA), Carlos Sperotto, "as dificuldades financeiras dos produtores não permitem o pagamento dessas dívidas, mesmo as que já foram securitizadas ou alongadas no Programa Especial de Saneamento de Ativos".  

Nessas circunstâncias, é perfeitamente razoável a proposta dos agricultores inadimplentes, que pleiteiam nova negociação dos débitos rurais, para pagamento em prazo de 20 anos, com 4 anos de carência e juros fixos de 3% ao ano, sem correção. Em contrapartida, os produtores se comprometem a atingir a meta produtiva de 100 milhões de toneladas de grãos nos próximos 3 anos. Além disso, o setor promete a criação de 1 milhão e meio de empregos até 2003. Tal proposta não vaga no ar, mas já conta com o apoio da Frente Parlamentar da Agricultura, da Organização das Cooperativas Brasileiras, da Sociedade Rural Brasileira dos Criadores de Zebu, da Associação dos Municípios e da Comissão da Agricultura da Câmara.  

Em outras palavras, o momento é de resolver de vez os problemas de renda do produtor, sem reincidir em soluções habitualmente paliativas. Caso contrário, quem sai perdendo mesmo é o pequeno e médio produtor, cujo desaparecimento da estrutura rural brasileira é notada, visivelmente, no último censo agropecuário. Datado de 96, registra a desintegração de quase 1 milhão de estabelecimentos rurais entre 86 e 95, dos quais 96% possuíam áreas inferiores a 100 hectares.  

Sr. Presidente, a situação se agravou ainda mais no início de julho último, por ocasião do anúncio do Plano de Safra do Governo. Bem aquém do que se esperava, o volume de 13,1 bilhões de Reais destinado ao financiamento de custeio e investimento agropecuário para a safra 1999/2000 despertou, apenas, mais descontentamento no campo. A insuficiência dos recursos é patente para atender às demandas da realidade atual. Na verdade, setores da agricultura avaliam que o valor prometido chega a ser menor do que as cifras do ano anterior convertidas em dólar.  

Vale frisar que, por esses cálculos, o Governo está disponibilizando menos 12,16% em relação à safra que se encerra agora com a colheita do algodão. Pior ainda, o custo dos insumos agrícolas explodiu depois da liberação do câmbio em janeiro, afetando os negócios fechados com as multinacionais, com abruptas majorações de até 40%, em real. O preço de máquinas agrícolas, fertilizantes, sementes e defensivos estão todos cotados em dólar, o que caracteriza um grave fator de insegurança para o produtor nacional.  

Nesse contexto, ainda que os 13 bilhões oferecidos pelo Estado estivessem disponíveis, hoje, na paridade do dólar de 98, poucos produtores lograriam ter acesso aos mesmos bilhões, já que o estigma da inadimplência em créditos anteriores desautoriza o pleito por novas verbas. O sistema bancário não hesita em levar para a instância judicial devida os inadimplentes do campo, inviabilizando novos financiamentos.  

Além do mais, convém esclarecer que a calamidade no setor agrícola não foi desencadeada, propriamente falando, durante o atual Governo. Segundo o Deputado José Genoíno, a crise do produtor deita raízes no Plano Collor, em 1990, quando a dívida agrícola foi ajustada em 74,02% para um reajuste de preços dos produtos de apenas 33%. Aliás, se retrocedermos mais no tempo, detectaremos que a primeira faísca se deu, de fato, por ocasião da mudança do modelo de crédito rural, nos anos 80, com a extinção da Conta Movimento do Banco do Brasil, com o corte de financiamentos e com a reforma tarifária.  

Diante do exposto, estou convencido de que o Governo Federal, representado na pessoa do Ministro Pratini de Moraes, não agirá, de modo algum, na linha da intransigência política. A flexibilidade exigida nas negociações não encontrará resistência por parte do Estado, pois a ponderação no estudo das propostas e no diálogo está garantida na filosofia do Governo. Por isso, a proposta apresentada pelo Ministro, que contempla, entre outras coisas, o perdão da dívida para os pequenos produtores com perdas de safra por conta da seca, demonstra a iniciativa do Governo em desatar os nós mais apertados da questão.  

Concluindo, quero reiterar, aqui, meu apoio aos produtores rurais e penhorar meus esforços na superação de eventuais impasses que venham a surgir no diálogo entre ruralistas e o Governo. Desse modo, faço um veemente apelo a ambas as partes para que um acordo bilateralmente profícuo seja alcançado o mais breve possível. Afinal de contas, quem sai ganhando é a Nação brasileira.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/08/1999 - Página 20709