Discurso no Senado Federal

REGISTRO DA VISITA DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO AO ESTADO DO ACRE. PREOCUPAÇÃO COM A QUESTÃO DA SEGURANÇA DA FRONTEIRA AMAZONICA. APOIO A TESE DA REDIVISÃO TERRITORIAL DO PAIS.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA NACIONAL. DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • REGISTRO DA VISITA DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO AO ESTADO DO ACRE. PREOCUPAÇÃO COM A QUESTÃO DA SEGURANÇA DA FRONTEIRA AMAZONICA. APOIO A TESE DA REDIVISÃO TERRITORIAL DO PAIS.
Aparteantes
Gilberto Mestrinho, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 24/08/1999 - Página 21930
Assunto
Outros > SEGURANÇA NACIONAL. DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESTADO DO ACRE (AC).
  • COBRANÇA, GOVERNO FEDERAL, ATENÇÃO, PRECARIEDADE, SEGURANÇA, FRONTEIRA, REGIÃO AMAZONICA.
  • LEITURA, DOCUMENTO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), RECEBIMENTO, ORADOR, RESPOSTA, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, COMPROVAÇÃO, INVASÃO ESTRANGEIRA, TERRAS INDIGENAS, REGIÃO AMAZONICA.
  • DEFESA, ESTUDO, DIVISÃO TERRITORIAL, PAIS, VIABILIDADE, EFICACIA, GOVERNO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), ESTADO DO PARA (PA), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), PROPOSIÇÃO, CRIAÇÃO, ESTADOS.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL-RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicio o meu pronunciamento pelo registro da visita que o Presidente Fernando Henrique Cardoso fez ao Estado do Acre, do nosso querido Senador Tião Viana, parabenizando-o por estar Sua Excelência mais vez na Amazônia. Sabemos que aquela região necessita, com certeza, de maior atenção do que aquela que vem sendo dispensada desde o início da gestão do Presidente Fernando Henrique Cardoso.  

Cometeria, no entanto, uma injustiça se não registrasse aqui também iniciativas importantes como, por exemplo, a conclusão do asfaltamento da BR-174, no meu Estado, os entendimentos e os acordos feitos com a Venezuela para a aquisição da energia da Hidrelétrica de Guri, objetivando abastecer o nosso Estado de Roraima. Porém, se essas iniciativas são e têm sido valiosas para o desenvolvimento do meu Estado e de toda a Amazônia, é importante que, neste momento, ao elogiarmos a iniciativa do Presidente, apelemos também para que ele dê maior atenção a este momento crítico em que toda a Nação se volta para a Amazônia, preocupando-se com a crise da Colômbia, que mostra a vulnerabilidade das nossas fronteiras, a extensão da nossa Amazônia, totalmente desamparada e desguarnecida.  

Quero ler, como testemunho do que estou afirmando, dois documentos que recebi da Funai, em resposta a requerimentos de informação por mim feitos, mostrando bem como efetivamente devemos preocupar-nos mais com a Amazônia.  

Li na imprensa que dois cidadãos russos tinham sido presos no Estado do Amazonas em atividades ilegais dentro de áreas indígenas. Indagando à Funai a respeito, recebi, assinada pelo Dr. Sidney Possuelo, a seguinte resposta:  

"... este Departamento tem a informar a V. Sª que, de fato, dois cidadãos de origem russa foram presos no interior da Terra Indígena VALE DO JAVARI, em operação conjunta desencadeada pela Frente de Contato Vale do Javari, Departamento de Polícia Federal e IBAMA".  

Em outro documento, também assinado pelo Dr. Sidney Possuelo, ele vai além:  

"Em uma ação conjunta Funai/DPF/IBAMA, foram presas duas pessoas no interior da Terra Indígena VALE DO JAVARI. Por tratar-se de estrangeiros, foram deportados do território brasileiro. Chamo a atenção de V. Sª para observar que, nos documentos encontrados em posse dos estrangeiros, observa-se que uma entidade religiosa internacional está promovendo a "adoção" de grupos indígenas isolados da América do Sul, para serem catequizados, inclusive divulgando que os índios isolados foram abandonados pela Funai".  

Ora, Srªs e Srs. Senadores, quando se fala que a Amazônia está há muito tempo sendo vasculhada por estrangeiros, muita gente do sul e do sudeste, do litoral do Brasil acha isso um exagero, para chamar a atenção sobre o problema. Mas documentos oficiais estão aí para provar que nós precisamos, efetivamente, mudar a postura em relação à Amazônia. Nós, Senadores, nós, Senado, que temos a responsabilidade de representar os Estados e representar a Federação, não podemos nos calar diante de fatos tão visíveis a toda hora sendo constatados.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT-AC) - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Mozarildo Cavalcanti?  

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL-RR) - Pois não, nobre Senador Tião Viana.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT-AC) - Senador Mozarildo Cavalcanti, gostaria de cumprimentá-lo pelo seu pronunciamento. V. Exª está, mais uma vez, preocupado com os interesses da Amazônia e daquele povo sempre em situação de grande expectativa em relação às políticas públicas do Brasil. Atualmente, mais do que nunca, a Amazônia é uma região para a qual todos os olhos da inteligência brasileira devem estar voltados, pois, como V. Exª muito bem coloca, daqui a poucos anos ou mesmo meses, estaremos diante do risco iminente de aproximação da cobiça internacional. O caso da Colômbia nada mais é do que uma intervenção desnecessária no interesse de alguns países a fim de que se justifiquem outras intenções, outras cobiças junto à Amazônia brasileira. Ali se encontram os recursos naturais que falarão alto no próximo século: sua biodiversidade, sua capacidade genética que pode contribuir profundamente com o planeta e a água. Como todos os Senadores têm mencionado, aquela será a grande reserva de água doce do mundo. Mas gostaria de me prender especificamente à visita do Presidente da República ao Acre, que, como cita V. Exª, foi um gesto de atenção à Amazônia. Confesso que considerei a visita oportuna e feliz para o povo acreano. A instituição da Presidência da República chegou ao Acre após 18 anos. Antes parecia que ali era um lugar distante dos interesses do País. A Presidência da República chegou lá, acompanhada de vários Ministros de Estado: o Ministro do Meio Ambiente, o Ministro da Defesa, o Ministro dos Transportes, além do Comandante da Aeronáutica e o Ministro das Comunicações. Travou-se uma discussão sobre uma idéia que a equipe de Governo e setores políticos do Estado estavam tendo, e à qual me incorporo, qual seja, a de que a ida do Presidente da República estaria fechando um ciclo que surgiu no Acre 100 anos atrás. Como disse recentemente ao Presidente da República o Presidente da Fundação de Cultura: "estaria encerrando os ‘cem anos de solidão’ que o Acre estava vivendo". Um pouco antes do ano de 1900, o "ouro negro da Amazônia", ou seja, a economia da borracha afirmou o Brasil como um país de economia forte no mundo inteiro. E a cobiça internacional se fez presente na região com a entrada do Bolivian Syndicate, que foi a tomada daquela região do Brasil, uma tomada daquela região da Bolívia para grupos econômicos internacionais. Depois disso, houve a crise da borracha, a crise econômica progressiva, a crise social e a busca dos caminhos para o Estado, um Estado que, em cem anos, explorou apenas a seringueira e a castanheira, e precisava de uma mudança de rumo e de um novo modelo socioeconômico que marcasse a administração dos tempos atuais. E foi o que houve. Entrou um Governo em janeiro que disse não à corrupção; é zero hoje o índice de corrupção no Governo do Acre. Há um grupo que diz "não" à política do fisiologismo, à política de humilhar-se e abaixar-se para conseguir recursos ou de trocá-los por votos. É um grupo que apresenta projetos, defende a soberania do povo e acredita na personalidade socioeconômica e cultural daquele povo perante a Amazônia e perante o Brasil. Mudou-se a representatividade política; saiu a representatividade viciada. Ainda sobre a Presidência da República, posso lhe dizer com profundo respeito que a aprovação de aproximadamente R$144 milhões em projetos de infra-estrutura, saneamento básico, saúde, educação, comunicação, viabilização das artérias do Estado, que são as estradas, foi algo fantástico para o povo acreano. Temos o claro discernimento de que se afirmou uma grande possibilidade de mudança, surgiu o paradigma de uma nova realidade socioeconômica e política do Estado, porque o Governo é confiável e vai aplicar muito bem cada centavo. Então, a visita da Presidência da República fechou um ciclo e afirmou um novo momento. O povo acreano está feliz, porque há esperança de que o Governo, sendo confiável, vai aplicar cada centavo. Acredito que isso se chama agenda positiva. Espero sinceramente que outros Estados estejam vivendo o mesmo ciclo da política limpa e verdadeira e que possam fazer, como V. Exª coloca muito bem aqui, com que a Amazônia e o Brasil sejam vistos com outros olhos. Muito obrigado.  

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL-RR) - Senador Tião Viana, agradeço a V. Exª o seu aparte, que vem enriquecer meu pronunciamento. Aliás, é um depoimento. Como V. Exª diz, depois de 18 anos, um Presidente da República visita o Acre, um Estado mais a oeste do País, que brigou para ser Brasil. Essa é uma demonstração clara de quanto nossos governantes vinham negligenciando a Amazônia. Foram necessários 18 anos para um Presidente ir ao Acre, mas garanto que, pelo menos, 18 vezes por semestre Sua Excelência vai a São Paulo. No entanto, São Paulo não precisa de tanto cuidado assim, porque é um Estado industrializado e desenvolvido. Precisamos, Senador Tião Viana, cobrar mais apoio e atenção do Governo Federal, como bem disse V. Exª, não como um favor, mas como um dever que este tem para com aquela Região.  

Aproveito o ensejo para falar da oportunidade do estudo de uma nova divisão territorial do País. A Amazônia, com Estados imensos como o Amazonas, o Pará e o próprio Mato Grosso, não pode responder ao dinamismo da era moderna, à atual filosofia de administração. A prova disso é que os exemplos que tivemos de uma nova divisão, nos Estados do Acre, Rondônia e Amapá, responderam positivamente à experiência.  

Ao finalizar meu pronunciamento, gostaria de retornar à tese de uma nova divisão política do País, principalmente dos três maiores Estados que são, pela ordem, o Amazonas, o Pará e o Mato Grosso.  

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB-AM) - V. Exª me concede um aparte, nobre Senador?  

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL-RR) - Ouço, com prazer, o Senador Gilberto Mestrinho.  

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB-AM) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª aborda um tema importante para o País: uma nova divisão territorial. Efetivamente, há no País Estados imensos com dificuldades de administração, vazios demográficos e econômicos, aumentando a disparidade regional já existente. Só discordo de V. Exª quanto à criação de Estados. Penso que a melhor medida seria termos no Brasil uma redivisão criando territórios federais, com estatuto novo de território, uma administração própria, programas a serem executados, ou áreas, principalmente nas fronteiras, especiais de administração para que a presença brasileira se faça mais efetiva e seja um instrumento de crescimento e desenvolvimento dessas regiões. Imagine o Amazonas, com um milhão e meio de quilômetros quadrados, quer dizer, 150 milhões de hectares, duas vezes e meia a França, o maior país da Europa Ocidental; o Pará, um milhão e pouco mais de 300 mil quilômetros quadrados, e assim vai. Veja as dificuldades e as diversidades que há dentro dos próprios Estados e o incipiente desenvolvimento desta região dentro da Amazônia. Daí a idéia de V. Exª é muito boa, apenas que, em vez de Estados que seriam, sob certos aspectos, talvez inviáveis inicialmente por questões econômico-financeiras, não teriam num primeiro momento renda suficiente para se manterem como Estados, nem a própria estrutura administrativo-cultural para se transformarem em Estados. A situação do interior desses grandes Estados é um pouco diferente da do Acre, que foi uma conquista; de Rondônia, que tinha uma estrutura e se liga muito mais facilmente ao Centro-Oeste; de Roraima, que já era secular, mas teve dificuldades iniciais. A idéia do território é muito boa, como muito boa foi - e V. Exª abordou muito bem - a visita do Presidência da República ao Acre. O Acre distante, o mais ocidental rincão do País, dividido por dois vales, recebe a visita do Presidente da República, que leva benefícios efetivos para lá, sem olhar a cor partidária, sem olhar se o Governador é da situação ou da oposição. No Acre, Sua Excelência viu acreanos, brasileiros e - sou testemunha - um Governo sério que trabalha, que realiza, que constrói e que está modificando a própria estrutura econômico-social do Estado. Por isso, parabéns a V. Exª pelo pronunciamento que está fazendo.

 

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Agradeço a V. Exª pelo aparte. Minha proposta de redivisão propõe efetivamente a criação de novos Estados. V. Exª já foi Deputado Federal pelo meu Estado, o então Território Federal de Roraima, sabe bem do que está falando. Eu, por ter nascido lá e por ter sido criado no regime de território federal, talvez seja um pouco avesso à tese da criação de território federal. Mas V. Exª disse muito bem: com o estatuto moderno, com uma legislação mais democrática, talvez seja esse o caminho. Não sou radical quanto a essa posição. O que defendo, sim, é que Estados, como disse V. Exª, como o Amazonas, o Pará e o Mato Grosso, com a dimensão que têm, são ingovernáveis e não propiciam o desenvolvimento, e o que é pior: no caso do Amazonas, justamente a região mais fronteiriça, quer dizer, a região de toda a faixa de fronteira, é a menos desenvolvida, porque a capital Manaus está muito mais ao Norte, muito mais a Leste, próxima do Estado de Roraima, do que das fronteiras imensas com a Colômbia, Bolívia etc.  

Entendo que o importante é fazermos caminhar, tirar da gaveta esse estudo da redivisão territorial, seja pela criação de territórios federais, seja pela criação de novos Estados. Embora tenhamos exemplos diferentes, no caso do Tocantins e do Mato Grosso do Sul, criando-se diretamente o Estado, o desenvolvimento veio mais rápido pela via própria: as instituições democráticas propiciam esse desenvolvimento rápido.  

Esse não foi o caso de Roraima e do Amapá, que passaram 44 anos como território federal, porque não havia interesse dos Ministérios que administravam esses territórios em trabalhar efetivamente no sentido de desenvolvê-los e transformá-los em Estados, porque essa era uma forma de manter um poder sobre uma região sem precisar passar pelo voto do povo.  

Assim, penso que o caminho do novo modelo de território federal possa realmente ser encampado e estarei ao lado dessa tese. V. Exª, que conhece muito bem essa região, tendo sido por três vezes Governador do Estado do Amazonas, poderia juntamente conosco engrossar essa tese momentânea e mais do que atual da divisão territorial do nosso Pais.  

Muito obrigado.  

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/08/1999 - Página 21930