Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA 'MARCHA DOS 100 MIL', COMO MANIFESTAÇÃO DE CIDADANIA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA 'MARCHA DOS 100 MIL', COMO MANIFESTAÇÃO DE CIDADANIA.
Aparteantes
Eduardo Siqueira Campos, Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 26/08/1999 - Página 22099
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, CHEGADA, MARCHA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), POSSIBILIDADE, MANIFESTAÇÃO, CIDADANIA, REIVINDICAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS.
  • CRITICA, PROPOSTA, PEDIDO, RENUNCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos na véspera da chegada a Brasília de um enorme contingente de brasileiros que aqui vêm para dar seu grito de protesto.  

É evidente que os debates travados nos últimos dias sobre as motivações dessa marcha e sobre as razões que levaram tantos brasileiros a se deslocarem dos mais diferentes recantos do País têm suscitado troca de farpas entre o Governo e a Oposição, entre os que vêem nessa manifestação razões de caráter social muito fortes e os que vêem na vinda desses milhares de brasileiros motivações antidemocráticas que poderiam extrapolar o exercício de suas prerrogativas políticas, para contestar o próprio processo eleitoral, o processo democrático.  

Devemos entender esse movimento como uma manifestação de cidadania. É muito difícil imaginar que tantas pessoas se desloquem - mesmo que se confirmem as previsões mais modestas - dos seus lares, a pé, em caminhões ou em ônibus, se não estiverem bastante motivadas para tal.  

Tenho a confiança e a esperança de que, com a ajuda dos organizadores e dos inspiradores dessa marcha, dos organismos do Governo encarregados da manutenção da ordem e das lideranças políticas, essa manifestação ocorra pacificamente, sem que nenhum incidente possa toldar a sua importância.  

Espero que o Brasil - Oposição e Governo - seja outro após essa manifestação. Não é possível que o Governo não seja sensível a essas vozes, a essas angústias, a esses anseios.  

O Presidente da República chegou a dizer que essa era uma marcha dos sem rumo. Talvez, haja mesmo uma parcela dos que não tenham rumo, mas deve ser também uma marcha dos excluídos, dos angustiados, dos que não têm esperança, dos que desejam, de alguma maneira, elevar sua voz para que ela possa chegar aos gabinetes dos altos Poderes da República.  

E é claro que essa manifestação será mais importante se ocorrer dentro dos marcos do respeito às instituições, ao poder constituído e à ordem, produzindo, realmente, seus efeitos. E para haver uma repercussão muito maior, a motivação central desse marcha, aquela que poderia galvanizar todos esses brasileiros, deveria ser menos mesquinha do que a de pedir a destituição do Presidente da República. Isso não me parece prudente, nem justo, nem razoável. Considero, sim, que a importância dessa marcha pode emanar das suas reivindicações.  

Eu até traçava um paralelo com uma outra grande marcha, maior até do que essa, que aconteceu nos Estados Unidos há alguns anos: a grande concentração liderada pelo partido de Martin Luther King, onde compareceram 250 mil pessoas, em Washington, nos Estados Unidos. Mas esses cidadãos não estavam reunidos por uma luta contra o Governo, contra o Presidente Kennedy, contra as instituições. Havia ali uma motivação nobre, humana, generosa: uma luta pela igualdade dos direitos civis dos negros, há tantos anos espezinhados, desconsiderados, maltratados, discriminados. Foi essa a grande motivação para tantas pessoas se reunirem em Washington, quando Martin Luther King fez o grande discurso I Have a Dream, que, afinal de contas, resultou na grande mobilização da sociedade americana para mudar uma situação injusta, mas, de certa maneira, institucionalizada, já que havia leis que amparavam a discriminação, que colocavam o negro numa situação de inferioridade. Não era, portanto, uma discriminação fruto de insensibilidade humana, social. Era mais do que isso, era uma discriminação garantida pela lei, institucionalizada durante anos no Direito americano. No entanto, foi a mobilização, a partir daqueles distúrbios, daquelas manifestações que ocorreram em várias cidades dos Estados Unidos, reprimidas com violência, que terminou por sensibilizar a sociedade americana - e não apenas o presidente, o governo ou o Congresso daquela nação, mas a sociedade americana -, no sentido de que instrumentos legais fossem produzidos a fim de pôr termo àquela odiosa discriminação.  

Ao longo de todos esses movimentos, os Estados Unidos foram surpreendidos pelo assassinato do Presidente Kennedy. Assim, coube ao Presidente Lyndon Johnson conduzir, liderar as negociações políticas que culminaram com o ato dos direito civis. E, em 2 de julho de 1964, foi à televisão e afirmou o seguinte: "Aqueles que antes eram iguais perante Deus serão agora iguais nas seções eleitorais, nas salas de aula, nas fábricas e nos hotéis, nos restaurantes, cinemas e outros lugares que prestem serviço ao público".  

Tentando, de certa maneira, estabelecer um paralelo, ainda que reconhecendo as diferenças de época, de circunstância e até de motivação que presidiram a realização dessas grandes concentrações, espero que essa mobilização de tantos brasileiros seja um apelo à sensibilidade, seja um apelo enérgico e forte contra a pobreza, a exclusão social, a falta de saúde, o analfabetismo e a ignorância. Essa não é uma causa só do Presidente Fernando Henrique. Como Presidente da República, cabe a Sua Excelência liderar esse processo. Mas essa não é uma causa só do Presidente, repito, nem só do Congresso brasileiro, que criou uma comissão para estudar a questão da pobreza. Essa é uma causa da sociedade brasileira. Nós temos que dar uma dimensão muito maior a esse encontro de brasileiros que vai ocorrer na Esplanada dos Ministérios, no Planalto Central, onde o Presidente Juscelino um dia afirmou que Brasília seria o centro das grandes decisões nacionais.  

Mais do que nunca, a Nação é chamada a se erguer, a se levantar, com todas as suas forças, com a energia de todos os seus filhos, independentemente de partido político. Hoje, lá está o Presidente Fernando Henrique, que é do meu Partido, o PSDB; amanhã, lá estará outra pessoa, de outro partido, e poderemos ter uma marcha semelhante. O importante é que nós retiremos daí a experiência. Não podemos estar indiferentes a esse clamor, ainda que reconheçamos a limitação de meios que temos para enfrentar tantos problemas que se acumularam na sociedade brasileira ao longo da sua evolução. Mas, se tivermos ouvidos para ouvir, se tivermos olhos para ver e se tivermos coração para sentir, essa marcha já terá, por si mesmo, cumprido um grande destino: sacudir o País, levantar a Nação para que esta se reencontre e, sem embargo das diferentes posições políticas, possamos, cada um a seu modo, colocar pelo menos um tijolo na construção do grande edifício nacional da soberania do Brasil e da justiça social.  

O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PFL - TO) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Ouço o Senador Eduardo Siqueira Campos.  

O Sr. Eduardo Siqueira Campos (PFL - TO) - Senador Lúcio Alcântara, prazerosamente, ouço o relevante pronunciamento de V. Exª. Não é de causar estranheza ou surpresa a análise serena que V. Exª, um Senador importante do PSDB, faz neste momento. V. Exª traduz, com toda a tranqüilidade, a verdadeira concepção e percepção que todos temos que ter do fato que se anuncia para amanhã. A ninguém é dado o direito de desconhecer ou menosprezar esse movimento; a todos nós se impõe a responsabilidade de percebê-lo. Ainda que se tenha originado de alguns setores da sociedade brasileira, seguramente esse acontecimento pode fazer com que o nosso Presidente da República e autoridades como nós, representantes dos nossos Estados, estejamos mais relacionados e identificados com os anseios da população brasileira. Nesse sentido, eu gostaria de lembrar aqui uma frase que ouvi: " Tudo es verdad, tudo es mentira, depende del cristal pelo que se mira ." E é assim: os diversos setores, segmentos ou partidos, cada um traz o seu enfoque. O que particularmente identifico como equivocado nesse movimento é pedir a renúncia de um Presidente da República ainda com três anos e meio de mandato. Creio que isso atenta contra a nossa Constituição, contra o princípio democrático, é um desserviço ao País. Trata-se de um segmento minoritário, não se pode atribuir a qualquer partido; porém, reputo da maior importância, da maior responsabilidade esse movimento, que há de, no mínimo, prestar esse serviço à Nação. Espero que todos nós estejamos abertos a ouvir. Tenho sido, nesta Casa, um dos que pedem sempre, da tribuna, ao Presidente da República para nos articularmos, para que Sua Excelência ouça o Congresso Nacional. Se Sua Excelência estivesse ouvindo mais, quem sabe, Senador Lúcio Alcântara, este País já pudesse ter acordado antes e talvez a marcha nem fosse necessária. Parabéns a V. Exª pela serenidade, pela tranqüilidade, principalmente, de um homem lúcido que faz essa análise e traz a esperança de que amanhã seja um dia que realmente mudará a nossa história. Parabéns!  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Muito obrigado, Senador Siqueira Campos. V. Exª lembra bem: muitos vêem sob diferentes ângulos a presença de tantos brasileiros no dia de amanhã; uns, com apreensão; outros, preocupados com o desenrolar dos acontecimentos. Na verdade, é preciso que todos nós, na medida do possível, colaboremos para que esse seja um encontro de brasileiros que vêm aqui trazer suas apreensões, preocupações e angústias, assim como sua participação, depositando, como que no altar da Pátria - afinal de contas, a concepção monumental de Brasília até sugere isso -, as suas ansiedades e as suas esperanças, e que o Governo, liderado pelo Presidente Fernando Henrique, veja nisso um chamado, uma convocação para fortalecer aquilo que ontem o Senador Álvaro Dias dizia da tribuna desta Casa, num discurso muito bem-feito e oportuno, e talvez muitos não tenham percebido: o reencontro dos ideais socialdemocratas.  

Todos sabemos que não há vara de condão, não há mágica, não há artifício que possa mudar essa realidade de uma hora para outra. Mas seria muito bom se todos pudéssemos perceber uma vontade real, uma vontade em andamento, em marcha, de um processo efetivo de transformação o mais rápido possível dessa realidade. Entretanto, não será com desencontros, não será até atingindo a essência do processo democrático, que é o respeito às instituições, que é o respeito à vontade popular, que vamos chegar a isso.

 

Esses brasileiros anônimos, esses que estão vindo das mais diferentes partes do País, deslocando-se como podem, não viriam aqui, volto a dizer, se não fossem movidos por um sentimento muito forte, que, em determinados momentos, diz respeito até à sua própria sobrevivência em condições humanas, em condições compatíveis com os seres humanos. E não me venham dizer que são pessoas manipuladas, que são pessoas recrutadas. São esses argumentos que, a pretexto de desqualificar manifestações como essa, terminam por fortalecê-las. Não devemos enveredar nesse tipo de raciocínio que são raciocínios especiosos. O que temos realmente que fazer é colher lições disso tudo, de ambos os lados: nós, que somos do Partido do Governo; e os outros, que estão na Oposição, mas que são movidos também por sentimentos patrióticos, enquanto, evidentemente, se comportarem dentro de limites que a nossa democracia possa tolerar, até em um processo de amadurecimento, que deve ser permanente.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Lúcio Alcântara, V. Exª me permite um aparte?  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Cumprimento V. Exª, Senador Lúcio Alcântara, pela disposição de acolher e ouvir aqueles que resolveram participar da marcha das oposições amanhã de manhã, e pela sensibilidade de perceber que esse movimento poderá representar um despertar de toda a Nação. O Governo Fernando Henrique Cardoso está, há muito tempo, como que desacordado, como que desapercebido do senso de urgência para efetivamente combater a desigualdade, tão gritante no Brasil, para erradicar a pobreza, para realizar uma reforma agrária - muito mais rapidamente do que tem feito - e para admitir a apuração, por meio de qualquer tipo de procedimento - e nós solicitamos que o exame fosse feito por uma Comissão Parlamentar de Inquérito - para averiguar o que efetivamente aconteceu com a privatização do sistema Telebrás. Essas são algumas das questões que estarão presentes, amanhã, nas reflexões de todos os que aqui virão, além do sentimento de indignação com respeito à impunidade para com os responsáveis pelo massacre de Eldorado dos Carajás. Bem faz V. Exª ao lembrar a extraordinária Marcha de 28 de agosto de 1963, quando mais de 200 mil pessoas estiveram diante do monumento de Abraham Lincoln, ouvindo Martin Luther King pronunciar sua extraordinária oração "Eu tenho um sonho". Naquele dia, Martin Luther King, tal como V. Exª aqui expressa, conclamou a todos para que realizassem uma manifestação nos limites da legalidade, da paz e do respeito às pessoas. Vou citar, inclusive, uma frase dita por ele: "Precisamos sempre conduzir nossa luta no plano alto da dignidade e da disciplina. Não podemos deixar o nosso protesto criativo degenerar em violência física. Todas as vezes, e a cada vez, precisamos alcançar as alturas majestosas e confrontar a força física com a força d’alma". Mas ele alertou que "nós viemos a este lugar sagrado para recordar à América a intensa urgência do momento. Esse não é o tempo de nos darmos ao luxo de nos acalmar ou de tomarmos a droga tranqüilizadora do gradualismo". O que nós percebemos é que há, da parte dos que compõem as forças que hoje dominam o Governo Fernando Henrique, um sentimento de estar sempre postergando a realização das coisas que efetivamente contribuiriam para a criação de uma nação justa. É por essa razão, acredito, que há um sentimento tão forte daqueles que virão a Brasília amanhã.  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Senador Eduardo Suplicy, o drama dos governos, sobretudo dos governos que lidam com grandes limitações de meios, limitações materiais, é que eles não são julgados pelo que fazem ou pelo que conseguem fazer, mas são geralmente analisados pelo muito que está por ser feito.  

V. Exª citou alguns aspectos de políticas públicas e censurou, como membro da Oposição que é, o Governo do Presidente Fernando Henrique. Mas, certamente, por honestidade intelectual, não poderia, por exemplo, deixar de reconhecer que, em relação à reforma agrária, em que pese o muito que há por ser feito, nunca se fez tanto como tem feito o Presidente Fernando Henrique. Muito menos seria justo atribuir-lhe, por exemplo, a responsabilidade pela impunidade dos policiais envolvidos na morte dos trabalhadores de Eldorado dos Carajás.  

É, portanto, justamente para fugir - e não digo isso em relação a V. Exª porque o tenho na mais alta conta - a uma simplificação que pode galvanizar em um primeiro momento, mas que é insuficiente para uma análise mais profunda dos fatos, que eu estou fazendo este pronunciamento, para que seja dada a essa grande manifestação que ocorrerá aqui amanhã um sentido superior, elevado, sem querer com isso indulgência para os eventuais enganos, equívocos, erros do Governo do Presidente Fernando Henrique, mas para que possamos nos mobilizar também, enquanto homens públicos e políticos, seja a que partido pertençamos, no sentido de aproveitarmos essa oportunidade.  

V. Exª leu trechos que são de grande sensibilidade, quando alude, por exemplo, à necessidade de mudanças radicais, evidentemente dentro da ordem, das instituições; e a esse sistema de pesos e contrapesos, que é útil para o próprio governante, que, muitas vezes, é prisioneiro de microssistemas e macrossistemas políticos, econômicos e até de natureza pessoal e afetiva, que, em certas ocasiões, não lhe permitem enxergar a conjuntura toda.  

Nesse sentido é que valorizo muito essa mobilização, porque ela tem esse condão de dar um sacolejo no País e nos convocar a todos para essa tarefa, cada um dentro da sua esfera de atuação.  

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Ouço V. Exª, nobre Senador Lauro Campos.  

O Sr. Lauro Campos ( Bloco/PT - DF) - Nobre Senador Lúcio Alcântara, não há dúvida de que existe uma linha divisória muito demarcada entre as palavras que V. Exª acaba de proferir, palavras essas que poderiam até servir como uma espécie de conselho cautelar para aqueles que empreenderão a marcha que chegará aqui amanhã, e a fala de outros diante desta tentativa de colocar as pernas e a consciência em movimento para defesa de direitos que, nós todos sabemos, têm sido tão postergados, marginalizados. Essa marcha deveria ser encarada como aquela que aconteceu em 1997, uma marcha limpa. Eu estive lá, vi pessoas de sandálias, roupas modestíssimas, mas completamente assépticas, misturando-se com as sandálias dos padres, dos pastores que ali estavam também. Algo de uma beleza e de uma grandeza que só aqueles que estão perto, participando da visão deles, é que conseguem realmente perceber. O que foi que aconteceu em Brasília? Quantos temores! Quanto mais se distancia do povo o soberano, o ditador, mais temor, mais medo ele tem desse povo. Isso eu pude observar ao longo de quarenta anos de vida em Brasília. O que observamos é que, de novo, o medo vem. Afirma-se que a caminhada é golpe. Caminhar não é golpe. Caminhar, andar, passear não é golpe. E esperamos que esse cooper cívico, esse cooper da consciência venha trazer aquilo que falta a Brasília, uma cidade morta, uma cidade de difícil preenchimento das artérias, das vias, das avenidas. Creio que, em um governo tão concentrador de poder, como o é infelizmente o Governo FHC, aquele que concentra os poderes, que concentra as benesses, que concentra o poder da comunicação, o poder da fala, o poder das mudanças das leis, também deve concentrar o ônus de ser emblematicamente considerado como o responsável por todas essas mazelas. De modo que, nesse breve aparte - pretendo, se puder, voltar a esse assunto, que considero muito importante -,quero reconhecer a diferença entre o pronunciamento de V. EXª, o nível de sua consciência e o daqueles que queriam obstaculizar esse processo e considerá-lo como algo subversivo, revolucionário; um golpe nas instituições. Nada disso. Veremos de novo que o MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, sairá de Brasília, na data marcada, sem deixar um papel no chão; deixará apenas a marca de sua assepsia, de sua limpeza e dos propósitos de fazer avançar a cidadania, que move cada passo desse batalhão de desarmados. Muito obrigado.  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - O Senador Lauro Campos disse que a reforma urbana, empreendida em Paris, pelo Barão Haussmann, que resultou na construção daqueles grandes bulevares, o deixa abaixo do Rio de Janeiro - Pereira Passos, Rodrigues Alves, que deu origem à Avenida Rio Branco. Havia uma inspiração política naquelas reformas, que era a extinção das vielas, dos cortiços, onde o povo se entrincheirava para se rebelar contra o poder constituído.  

A genialidade de Juscelino nos deu Brasília e essa magnífica Esplanada, que tem sido palco de grandes manifestações - concordemos ou não com elas, manifestações pacíficas, como só se viu, por exemplo, à época da campanha pelas eleições diretas. V. Exª há de se recordar muito bem do Vale do Anhangabaú; da Avenida Rio Branco; da Avenida Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, e de tantas outras manifestações que aconteceram pelo Brasil inteiro.  

Quero chamar a atenção para o risco que podemos correr de centralizar todos os problemas do País na figura do Presidente da República, por maior que seja o conjunto de responsabilidades e poderes que V. Exª diz, com toda razão, que Sua Excelência enfeixa em suas mãos.  

Essa é uma marcha, é uma mobilização que tem que encontrar uma motivação muito mais elevada, muito menos imediatista do que isso para sacudir a própria consciência nacional do País, para remover esses graves problemas com os quais nos deparamos no dia-a-dia e que afligem milhões de brasileiros por todo este País.  

Sr. Presidente, estou sob a ditadura do tempo, que V. Exª é obrigado a cumprir.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Infelizmente está, Senador.  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE)- E dos microfones. Existem vários microfones elevados, o que manifesta o desejo de os Senadores apartearem. Portanto, entre o Regimento e a minha vontade de ouvir os apartes, obedecerei ao Regimento, se essa for a determinação última de V. Exª.

 

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Não é determinação da Mesa; é determinação do próprio Regimento, ao qual a Mesa também se curva e agradece a compreensão de V. Exª.  

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Muito obrigado, Sr. Presidente.  

Então, peço desculpas aos demais Senadores por não poder ouvi-los. Certamente trariam contribuições extremamente úteis para que, refletindo sobre o que vai ocorrer amanhã, possamos aproveitar o evento como uma manifestação de energia do povo brasileiro, de mobilização nacional, a fim de que, juntos, ajudemos a construir o grande destino que o País merece.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - A Mesa agradece a V. Exª.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/08/1999 - Página 22099