Discurso no Senado Federal

PARTICIPAÇÃO DE S.EXA. NO SEMINARIO INTERNACIONAL SOBRE 'EDUCAÇÃO SUPERIOR E SUAS TENDENCIAS PARA SECULO XXI', ORGANIZADO PELA UNIVERSIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DO ESTADO E DA REGIÃO DO PANTANAL (UNIDERP), REALIZADO NOS DIAS 28 E 30 DE JULHO ULTIMO, EM CAMPO GRANDE/MS.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • PARTICIPAÇÃO DE S.EXA. NO SEMINARIO INTERNACIONAL SOBRE 'EDUCAÇÃO SUPERIOR E SUAS TENDENCIAS PARA SECULO XXI', ORGANIZADO PELA UNIVERSIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DO ESTADO E DA REGIÃO DO PANTANAL (UNIDERP), REALIZADO NOS DIAS 28 E 30 DE JULHO ULTIMO, EM CAMPO GRANDE/MS.
Publicação
Publicação no DSF de 26/08/1999 - Página 22158
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, SEMINARIO, ENSINO SUPERIOR, AMBITO INTERNACIONAL, MUNICIPIO, CAMPO GRANDE (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), ORGANIZAÇÃO, UNIVERSIDADE ESTADUAL, OBJETIVO, DISCUSSÃO, FUTURO, EDUCAÇÃO, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, PRONUNCIAMENTO, ORADOR, SEMINARIO, DEFESA, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, ENSINO SUPERIOR.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Sr Presidente, Srªs. Srs. Senadores, entre os dias 28 e 30 de julho último, em Campo Grande, durante o período do recesso parlamentar, tive a oportunidade de participar de um evento que, pela sua importância, merece ser destacado, aqui, nesta Casa. Trata-se do Seminário Internacional sobre Educação Superior e suas tendências para o Século XXI , organizado pela Universidade Para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal ( UNIDERP), sob a direção firme e lúcida do reitor Pedro Chaves Filho.  

Foi, essa, uma oportunidade de muito valor, em que se pôde discutir sobre o futuro da educação em nosso país com especialistas renomados, que trouxeram sua palavra de esclarecimento e estímulo não só para a comunidade de educadores e estudantes universitários de Mato Grosso do Sul, como para todos os que têm responsabilidade de decisão no Estado.  

Eventos como esse, Sr. Presidente, mostram o esforço da sociedade sul-mato-grossense para colocar-se em sintonia com os novos tempos, ajustar-se às exigências do momento e atender às necessidades do país. Iniciativas como essa, devem ser louvadas e receber todo o nosso apoio. Por isso, foi com muita satisfação que aceitei o convite do Reitor Pedro Chaves para participar do Seminário, onde discorri sobre o tema "A Educação Superior e o Homem Público no Século XXI".  

Face à importância do evento e à relevância do tema que me coube, peço a transcrição nos Anais desta Casa do texto anexo, que contém as idéias que, como homem interessado nos destinos da educação em nosso País, apresentei, naquela oportunidade, em meu pronunciamento. Muito obrigado.  

Palestra: "A EDUCAÇÃO SUPERIOR E O HOMEM PÚBLICO NO SÉCULO XXI" (Cumprimentos aos demais integrantes da Mesa)Senhoras e Senhores Participantes, Dirigentes, Professores e Estudantes.  

Minhas Senhoras e Meus Senhores:  

Participar de um evento como este, em que se pensa e se discute sobre educação, traz um duplo e talvez contraditório sentimento a todos nós, homens e mulheres responsáveis, que nos dispomos a agir e que nos comprometemos com a realização das mais dignas aspirações humanas. O primeiro reflete a satisfação, a alegria de saber que nos reunirmos com pessoas afins, que comungam entre si os elevados ideais de preparar caminhos para as gerações que se sucedem. O outro reflete a nossa ansiedade ante a imensidão do desafio que nos é proposto e que cada um de nós, no âmbito de nossas ações pessoais e coletivas, decidiu aceitar. Porque está na educação o cerne das grandes questões do momento. E está na educação que se conseguir conquistar o futuro mais ou menos feliz das nações, do nosso país, dos homens e mulheres que receberão como herança o fruto do nosso trabalho.  

Antes de continuar o meu raciocínio, entretanto, peço permissão para esclarecer que falarei a esta assembléia não como um técnico em educação, que não o sou, mas usando a experiência que tenho como homem público, procurando trazer a debate reflexões íntimas e observações que venho desenvolvendo para nortear a minha própria conduta diante da atividade política que desenvolvo. Assim, me apresento, desejoso por cooperar e pronto a modificar conceitos, sempre que alguma ponderação me aponte novos rumos.  

O tema a mim proposto é instigante : A educação superior e o homem público no século XXI .  

Mas o que é educação superior? Estaríamos nos referindo simplesmente ao ensino de terceiro grau? Ou estaríamos incluindo um conceito mais amplo, usando a palavra superior no sentido de uma educação elevada, que contemple o homem integral, desenvolvendo-lhe a potencialidade e a criatividade, abrindo a sua mente e o seu coração para o equilíbrio das relações fraternas, de solidariedade, de compreensão de si mesmo e do próximo ?  

Porque é essa a educação, a meu ver que o homem precisa alcançar tendo em vista o século XXI. E se esses objetivos devem ser aprofundados e consolidados nas universidades, não podem estar ausentes em nenhuma etapa do desenvolvimento do ser humano, sob pena de efetivamente jamais se realizarem. Portanto, embora reconheça a fundamental e indispensável participação das universidades na formação dos recursos humanos, na construção do progresso do pensamento e do desenvolvimento das tecnologias, entendo que a educação superior transcende o âmbito de um estudo de terceiro grau

Apenas para situar o meu pensamento, lembro que a educação superior a que me refiro, segundo os mais importantes estudos de psicologia da atualidade, começa no ventre da mãe, estende-se com crucial importância nos dois primeiros anos de vida e sedimenta-se até os sete anos de idade. Aí a personalidade está formada e se poderá adorná-la com os recursos do conhecimento, do saber, da experiência. Ora, se já sabemos que até os sete anos de idade forma-se a personalidade do ser humano, que nesse limitado período de tempo sua estrutura psicológica se define, tornando-o mais ou menos apto para responder aos desafios que lhe serão propostos pela vida, somos levados a pensar que a educação superior não pode estar dissociada das questões referentes aos direitos humanos, à distribuição de renda e ao meio ambiente, sem falar no abrangente fenômeno da globalização.  

Aí a grande complexidade! A vida não se enquadra em compartimentos estanques e não se pode falar em educação sem se pensar no contexto em que ela se realiza. Vivemos num mundo globalizado, que faz repercutir em todos os países, na vida de todos os seres humanos acontecimentos antes restritos a pequenos universos. E a globalização, esse fenômeno que se apresentou como proposta de uma nova interpretação para a nossa civilização, fazendo suscitar sonhos de um futuro de amplos horizontes, além e acima das fronteiras nacionais, em um mundo mais justo, mais próspero, mais fraterno, tem-se mostrado cruel para os menos abastados .  

Países como o Brasil, em face da intensidade e variedade das exigências desse nova época, são desafiados a adaptarem-se à nova ordem, correndo contra o tempo, lutando com a falta de capital, obrigados - ante a ameaça de se verem condenados à segregação da comunidade mundial e à pobreza sem esperança - a ignorar as peculiaridades do seu povo. Diante dos fatos, fica evidente que a globalização não é apenas um fenômeno natural, conseqüência do progresso científico e tecnológico da humanidade, do qual ninguém é particularmente responsável e onde todos os agentes são passivos. Ao contrário, pode-se hoje reconhecer que a reboque desse processo natural e desejável, agentes ativos atuam na direção da sempre eficiente e requintada forma de dominação que deixa aos colonizados, agora chamados de globalizados, a impressão de que são eles, e não os seus algozes, os responsáveis pelos insucessos de seus países. As regras são ditadas pelo capital, e o capital, como pudemos observar nas recentes crises que abalaram o mercado financeiro internacional, não tem ideologia (a não ser a do lucro), nem pátria e está nas mãos de poucos. Os outros, os pobres, a maioria, precisam adaptar-se, modernizar-se, não importando o que lhes custe de suor, de lágrimas, de renúncia de valores culturais

Ante essa nova e inimaginada amplitude que o poder econômico alcança, impondo regras mesmo aos governos dos países mais ricos, as sociedades dos povos começam a buscar mecanismos próprios de defesa dos interesses da nacionalidade. Os mais ricos e fortes colocaram-se na dianteira, impondo medidas de proteção ao seu comércio, medidas essas que desprezam e inibem quando pretendidas pelos mais pobres. Mas esse estado de coisas não poderá perdurar . Essa mesma globalização que hoje mostra sua face mais cruel para os mais fracos apresentará também aos países mais ricos grandes dificuldades, uma vez que, como sabemos, estão entrelaçadas todas as vidas em nosso planeta. Assim, os países abastados, e mesmo os próprios controladores do capital, serão compelidos a rever suas posições, senão por solidariedade, por uma questão de sobrevivência . Fundamenta a minha convicção a própria história. O sonho da unificação da Europa, cultivado desde os romanos, tentado por Napoleão, realiza-se hoje, com a União Européia, não como um projeto de conquistas e dominação, mas como o único meio de garantir qualidade de vida para o continente. E num mundo globalizado essa exigência também se tornará mundial.  

Aqui não posso deixar de lembrar que a Organização das Nações Unidas, ONU, marcou o próximo dia 12 de outubro como o Dia dos 6 Bilhões, data em que se calcula nascerá em alguma parte do mundo a criança que fará contar a humanidade em 6 bilhões de criaturas. Em 1804 o nosso planeta contava com 1 bilhão de habitantes. Em 1927, alcançou-se os 2 bilhões. Passados 33 anos, em 1960, chegou-se a 3 bilhões de habitantes, mas, 14 anos depois, em 1974, já éramos 4 bilhões. Em 1987, treze anos após, contou-se em 5 bilhões a humanidade. Bastaram mais doze anos para chegarmos aos seis bilhões. Nesta última meia hora em que estamos reunidos 6.500 recém-nascidos lançaram seu apelo por um mundo melhor e a cada 24 horas a Terra recebe novos 375 mil habitantes. Mas o mais alarmante é que 90% dos nascimentos ocorrem nos países pobres e só se pode esperar a estabilização do crescimento populacional por volta do ano 2050, com um contingente estimado entre 9 e 12 bilhões de indivíduos. Esses são os números futuros com que devemos contar no nosso planeta globalizado . Números espantosos, que provam, pela rapidez com que progridem, que o futuro não é uma alegoria, um tempo que se possa esperar. O futuro, o século XXI, é o presente que se dessenrola ante o nosso olhar, que já estamos vivendo e que reivindica urgência nas ações, decisões acertadas, visão de mundo, solidariedade.  

Face a números tão espetaculares, agigantam-se as questões dos direitos humanos, da distribuição de renda e do meio ambiente.( E não podemos ignorar que essas pessoas que já compartilham conosco o ambiente terrestre e as muitas outras que estão chegando precisam ter garantidas não apenas a sua sobrevivência, mas as condições de uma vida digna.)

Breve, serão pelo menos 9 bilhões de pessoas que deverão encontrar meios nutricionais adequados, ambiente saudável, educação condizente com o grau de civilização que a humanidade já alcançou. Gente que precisará de moradia, de atendimento à saúde, de trabalho.  

Nossos olhos e os nossos corações não podem se endurecer e se acostumar com as cenas de fome coletiva que já assistimos em algumas partes do mundo. Nem com a devastação provocada por epidemias como a Aids e o Ebola. A solução não pode estar na morte de nossos irmãos menos favorecidos, como já vem acontecendo em certas regiões da África e em alguns países da Ásia, em que a expectativa de vida chega a ser 24 anos menor do que nos países mais ricos. Contra essa idéia, que começa a se insinuar como fato inevitável, temos de nos rebelar. E agir. O contrário será admitir a barbárie.  

É verdade que não podemos esperar que as vicissitudes atinjam os mais ricos para que esses sejam obrigados a mudar de atitude e venham cooperar. A hora da cooperação chegará, tenho certeza, e as tecnologias que estão sendo desenvolvidas justamente pelos que detêm o poder econômico serão instrumentos importantíssimos para a superação das dificuldades dos mais pobres. Porque haverá um momento de conscientização - mesmo para esse capital sem face que hoje nos apunhala - para o fato de que o lucro cessará, caso a miséria e a fome se alastrem em ondas de revolta popular.  

Nesse contexto, e apesar das dificuldades que o Brasil enfrenta, o nosso país ainda goza de condições privilegiadas que pode utilizar não apenas para resolver os seus problemas como para se tornar num importante cooperador mundial. Temos terras férteis, campos adequados à pecuária, climas variados, pouco sujeitos a grandes calamidades e propício ao cultivo das mais diversas culturas. O Brasil pode, sim, tornar-se num celeiro para um mundo superpopuloso. E mais que isso, o Brasil pode se tornar, ( não apenas num celeiro de grãos que nutrem o corpo, mas ) num foco generoso de idéias de solidariedade e de igualdade que cultivamos nas nossas relações sociais como parte do espírito da nossa nacionalidade!  

Para isso, o que é necessário? Precisa-se de planejamento objetivo e firme vontade política. Os recursos são poucos? São sim, mas existem, e precisam ser canalizados para as obras de infra-estrutura e para aquelas que possam garantir o bem estar social . É preciso que se invista prioritariamente na agricultura, na prevenção da saúde e na educação, aí incluindo a educação para os direitos humanos e para a preservação do meio ambiente. Investimentos oportunos, feitos com discernimento e no interesse coletivo, são essenciais para o crescimento econômico do país e para que o Brasil possa desempenhar o papel que lhe compete no concerto das nações, deixando de ser uma esperança para tornar-se na realidade desejada.  

Esse o papel que cabe desempenhar o homem público neste momento tão grave em que vivemos.  

Porque não o fazemos? O fato é que a constrangedora e permanente pressão globalizante a que estamos submetidos tem nos tirado, muitas vezes, a serenidade para a análise dos fatos, e as decisões, urgentes demais, seguem muitas vezes uma estreita e imediatista visão econômica. É isso que precisamos mudar. Há que se pensar não no custo de uma obra, mas no que representará de prejuízo para o futuro, caso não seja realizada. O conceito de distribuição de renda também deve ser modificado e não pode ser mais medido ou desejado apenas como a moeda que chega às mãos de cada um. Deve incluir a idéia de igualdade para a obtenção dos bens essenciais, de habitação digna, de escolas adequadas, de saúde protegida, em um meio ambiente saudável. Esse tem que ser o esforço do governo, a diretriz de todos nós que almejamos uma educação superior para todos os brasileiros. Esse tem que ser o esforço a ser desenvolvido para que todos as crianças brasileiras encontrem condições mínimas para o bom desenvolvimento da sua personalidade.  

Partindo dessas questões cruciais, não consigo imaginar, como esses desafios possam ser enfrentados com sabedoria, perspicácia e senso prático, sem que a educação esteja desempenhando um papel nuclear.  

Afinal, se ao homem público cabe propor e executar medidas no sentido de responder a essas questões cruciais, à educação – mais do que a qualquer outro setor da atividade social – é conferida a responsabilidade de, pela produção e disseminação do saber, preparar as pessoas para a participação cidadã e a construção de uma nova ordem social.  

O ensino de terceiro grau deve, portanto, ser chamado a contribuir na formação de um novo homem, que entenda, sim, a cidadania como meio de realização pessoal, mas que o integre eticamente a uma comunidade universal de homens livres, conhecedores dos deveres e dos direitos que harmonizam a vida social.  

Não se pode esquecer que é tarefa do ensino de terceiro grau formar os milhares de docentes que, em cada recanto do País, multiplicarão nas salas de aula de todos os níveis de ensino as orientações que bem houverem recebido, influindo diretamente na formação daqueles que, num futuro próximo, haverão de responder pelas decisões nacionais. Só a análise desse aspecto basta para nos fazer compreender a magnitude da missão do ensino de terceiro grau.  

Assim os educadores precisam estar sintonizados com esse tempo absolutamente novo em que vivemos e que exige tratamento também inovador no âmbito em que atuam, para que se possam formar crianças, adolescentes e jovens na perspectiva da cidadania. É preciso vincular a ação educativa a uma realidade que não cessa de mudar, ao mundo globalizado, abrindo espaço à criatividade, que hoje, certamente, representa patrimônio de valor e requisito indispensável para a inserção do jovem no mercado de trabalho, para a superação das dificuldades do país e sua integração no contexto das nações progressistas.  

Trabalhar, concreta e inteligentemente, os problemas da vida cotidiana; desenvolver a capacidade de refletir sobre os fatos; entender os mecanismos impulsionadores das técnicas e da tecnologia colocadas à nossa disposição; voltar-se para uma cultura essencialmente humanística, como meio para a construção de uma sociedade mais fraterna, mais solidária e menos individualista: eis, com segurança, alguns dos aspectos que haverão de balizar o trabalho da educação que os novos tempos estão a requerer.  

Numa sociedade politicamente organizada e assentada em bases democráticas, a feitura das leis e o estabelecimento das normas que regerão a condução do Estado e a vida dos cidadãos não podem estar apartados da realidade, muito menos ser produzidos à revelia da vontade da maioria.  

Tem que haver, necessariamente, correspondência entre o que se pede aos educadores e aquilo que o Poder Público oferece, especialmente no que se refere às normas legais que produz.  

Aos educadores cabe organizarem-se para reivindicar do Poder Público os meios que julguem pertinentes à maior eficácia do ensino de terceiro grau e à sua adequação aos novos tempos. Cabe preocuparem-se com a utilização intensa dos espaços e recursos humanos disponíveis, de modo a abrirem-se novas vagas para o grande contingente de estudantes que aspiram uma oportunidade de crescimento intelectual e profissional. Apesar do potencial humano que representam os mais de cento e sessenta milhões de habitantes que compõem o nosso País, pouco mais de 12% dos nossos jovens entre 18 e 24 anos alcançam a graduação. Essa proporção adquire dimensão inqualificável quando se comparam nossos números com os de nossos vizinhos latino-americanos. Na Argentina e no Chile esse índice quase que quadruplica: são 40% de jovens matriculados e na Bolívia, país evidentemente com dificuldades bem maiores do que as nossas, mais de 20% de seus jovens cursam o ensino superior.  

Não é possível, pois, que muitas das universidades federais e estaduais - que muito especialmente devem ter sempre a norteá-las o interesse dos cidadãos brasileiros - continuem a sub utilizar o período noturno, justamente o que pode atender aos jovens sem recursos financeiros, aqueles que precisam trabalhar para sustentar-se, que merecem, pela sobrecarga de esforços que realizam, uma oportunidade de igualdade, pelo menos relativa, ante os mais afortunados.  

A democratização do acesso ao ensino de terceiro grau é fundamental para que se atinja, no País, patamares mais elevados de distribuição de renda.  

O Poder Público tem de estar atento a isso e não pode, pelo menos ainda, eximir-se de manter essas instituições, de fazê-las crescer, de sustentar a pesquisa científica. É preciso, por outro lado, que o meio acadêmico se mobilize para esse objetivo, que além de pressionar o Poder Público na obtenção de mais verbas, busque patrocinadores na iniciativa privada, oferecendo serviços de interesse da sociedade, colocando-se verdadeiramente integrado às necessidades de desenvolvimento do Brasil.  

Nessa perspectiva, defendo maior autonomia para as universidades – sem confundi-la com uma despropositada soberania –de modo que essas instituições tenham, por exemplo, a possibilidade de decidir sobre o momento de se criar um curso, de extingui-lo ou de transformá-lo . 

No que diz respeito às universidades particulares, observa-se que cada vez mais essas instituições fortalecem os seus cursos noturnos. Nada há de errado nisso. Também essas escolas têm prestado um grande serviço à nação. Também elas submetem-se à avaliação feita pelo Ministério da Educação e estão procurando corrigir eventuais falhas e adequar-se às exigências de uma boa educação. Mas, infelizmente, é a elas que são obrigados a recorrer justamente os jovens mais pobres, os que não conseguiram, por uma ou outra razão, ingressar nas faculdades federais. O Poder Público, então, tem que agir em duas frentes: além de fazer otimizar os cursos noturnos nas universidades federais e estaduais precisa definir um programa plausível de bolsas de estudo para atender os estudantes carentes das faculdades particulares. Porque, do jeito que está o crédito educativo, os estudantes, junto com o diploma pelo qual tanto lutaram, recebem a notificação de cobrança e o certificado de inadimplência.

 

 

Para tudo isso é preciso coragem. Talvez essa coragem também diga respeito ao debate que nós, acadêmicos e homens públicos, necessariamente haveremos de ter a respeito do próprio conceito de universidade, em que as funções clássicas de ensino, pesquisa e extensão possam ser redimensionadas. Enfim, o campo é vasto, as necessidades múltiplas e curto o tempo para a tomada de decisão . 

Afinal o futuro é o presente. O futuro é o agora, dado a rapidez com que os avanços tecnológicos e a ciência se desenrolam, fazendo com que o hoje já seja ontem, e o amanhã, o hoje. Ter consciência disso é o primeiro passo para enfrentar e superar o problema hoje posto . 

Senhoras e senhores. Por fim, lanço um apelo: não se pode deixar de aproveitar a força idealista dos jovens. É preciso que as universidades, canalizem essas energias, valorizando o momento propício que vivem os que alcançam suas portas. É preciso que as universidades instiguem os seus alunos para o bem, levando à discussão esses temas que dizem respeito às suas vidas e ao futuro da humanidade. É preciso que as universidades não deixem seus jovens entregues apenas aos seus interesses particulares, que abram-lhes o raciocínio para as questões fundamentais do nosso tempo , não importando se cursam Medicina, Engenharia ou Informática. É preciso que se lhes desenvolva o senso crítico para avaliarem as proposições que chegam a todo instante e que, muitas vezes, embora revestidas de aparentes inovações, não contemplam as verdadeiras necessidades do progresso. Mas é preciso, também, prepará-los para aceitarem as mudanças necessárias ou inevitáveis. É preciso conscientizá-los sobre a importância da preservação do meio ambiente. Mas é preciso, além de tudo, procurar desenvolver-lhes o espírito ético, o sentido de responsabilidade social que deve ser a marca do homem público do século XXI.  

Os desafios estão postos. A cada um de nós, do meio acadêmico, da vida pública ou de qualquer outro ramo de atividade, cabe posicionar-se. Particularmente, penso estar consciente e agindo.  

A realização deste encontro é, ele mesmo, sinal das inquietações e preocupações que nos movem e nos aproximam.  

Não há como eximir-se. As responsabilidades precisam ser partilhadas, até mesmo como forma de serem encontrados os caminhos que nos levarão ao próximo milênio em condições melhores do que as que hoje temos.  

Esse, o propósito que nos trouxe até aqui.  

Esse, o compromisso que nos une, políticos e acadêmicos, de construção de um mundo melhor. Para todos.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/08/1999 - Página 22158