Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SOBRE A MOTIVAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA MANIFESTAÇÃO POPULAR EM CURSO NA ESPLANADA DOS MINISTERIOS.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • REFLEXÕES SOBRE A MOTIVAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA MANIFESTAÇÃO POPULAR EM CURSO NA ESPLANADA DOS MINISTERIOS.
Publicação
Publicação no DSF de 27/08/1999 - Página 22282
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), REGISTRO, ENTREGA, PRESIDENTE, CAMARA DOS DEPUTADOS, COLETA, ASSINATURA, REIVINDICAÇÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, PRIVATIZAÇÃO, SISTEMA, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS).
  • DEFESA, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, GOVERNO, ACUSAÇÃO, AMEAÇA, DEMOCRACIA, PEDIDO, IMPEACHMENT, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • IMPORTANCIA, DEMOCRACIA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, EXPECTATIVA, RESULTADO, ALTERAÇÃO, SITUAÇÃO, NECESSIDADE, RESPEITO, EXECUTIVO, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, meu caro Senador Romero Jucá, eu estava desde as nove horas da manhã, com muita alegria, participando da maior concentração popular que já assisti em toda a minha vida no Distrito Federal.  

Quando se falou em 100 mil, estabeleceu-se um limite, mas o que vimos das nove horas da manhã até agora é que ali estão muito mais do que 100 mil pessoas. Há uma quantidade enorme de trabalhadores, de lideranças, de parlamentares de todo o Brasil. Dos cantos mais distantes de nossa Pátria as pessoas fizeram enorme sacrifício para chegar até aqui, para participar desse momento da história política do nosso Brasil, que, tenho certeza absoluta, deverá sofrer mudanças radicais daqui para frente.  

O direito de fazer essa manifestação é indiscutível. A questão de ela ter rumo ou ser sem rumo, como citou o Presidente da República, é o fato que deve ser levado em consideração. Ao participarmos da passeata e ao penetrarmos no Congresso Nacional, entregamos ao Presidente da Câmara, Michel Temer, um abaixo-assinado com 1,3 milhão de assinaturas de eleitores brasileiros devidamente identificados. E o que pede esse abaixo-assinado de 1,3 milhão de assinaturas? Pede que o Congresso Nacional cumpra o seu dever de abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a privatização do Sistema Telebrás, em cuja venda o Governo brasileiro arrecadou R$22 bilhões, quando sabemos que, ao longo dos últimos três anos, o próprio Governo brasileiro investiu mais de R$20 bilhões no sistema de telecomunicações.  

Dizer que hoje há celular barato e linha de telefone barata e querer atribuir isso à privatização é um contra-senso, é uma inverdade. O que está barateando o custo da linha telefônica e do aparelho celular não é evidentemente a privatização, mas, sim, o avanço da tecnologia. Lembro-me que há seis ou sete anos, comprei um computador chamado 280 pelo preço de um Chevette - mais de US$2500! Hoje, compra-se um pentium moderno por US$1000. Isso se deve à privatização? Não, o computador já era fabricado por empresa privatizada. Isso se deve ao avanço tecnológico. Há dois anos, o celular mais sofisticado custava US$2000; hoje, compra-se por R$600.  

Nessa privatização ficou claro que houve tráfico de influência, que houve participação do Governo para que determinados grupos ganhassem. E, hoje, somos obrigados a escutar uma mensagem ridícula quando fazemos uma ligação e o telefone chamado está ocupado. A telefonista da Telemar diz, com uma voz metálica: "Esta ligação é gratuita. A Telemar agradece." Como se fôssemos obrigados a pagar por uma ligação que não se completa! Por todas essas coisas e muito mais é que o povo está nas ruas.  

O Presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, interpretou muito bem a presença de mais de 150 Parlamentares na reunião em que lhe foi entregue o abaixo-assinado. Ali não estavam apenas os Parlamentares do PT, PSB, PCdoB e PDT; mas também muitos Parlamentares do PMDB, entre os quais os Senadores Roberto Requião e Amir Lando. Havia Deputados Federais do PL, inclusive o Líder do PL na Câmara dos Deputados. Participaram da entrega Parlamentares de quase todos os Partidos, mesmo os pertencentes à base de sustentação do Governo, que já não estão suportando mais a falta de popularidade do Governo e a verdadeira ansiedade que tem o povo brasileiro de que o Senhor Fernando Henrique Cardoso possa ser substituído na Presidência da República do Brasil.  

Falam que a Oposição está querendo o impeachment, e que isso é antidemocrático, é golpismo. Os Partidos políticos de oposição sabem que o impeachment só pode ser determinado por meio de um processo no Congresso Nacional. É por isso que queremos a criação da CPI do Sistema Telebrás, porque não temos a menor dúvida de que chegaríamos à comprovação de que o Presidente não agiu com honestidade e com seriedade na privatização do sistema de telecomunicações. Daí, quem sabe, marcharíamos para o impeachment

Os jornalistas nos questionam: "O que a Oposição pretende? É o impeachment? É o afastamento, que significaria a renúncia, a qual cabe exclusivamente ao Presidente decidir ou não? É simplesmente a CPI?" Entendemos que, se fosse prevalecer a vontade do povo brasileiro, hoje, tenho certeza de que 70% pediria a renúncia imediata do Presidente Fernando Henrique Cardoso. O povo não suporta mais essa situação de falta de crescimento econômico, de dificuldade de ganhar dinheiro, de dificuldade de sobreviver, de violência, de caos institucionalizado. A violência é conseqüência da falta de oportunidade de emprego, de trabalho, de sobrevivência. Por isso, este ato é bonito e extremamente legítimo.  

Aproveitei a oportunidade em que as grandes lideranças da Oposição estão no palanque falando àquela multidão, para vir à tribuna do Senado para manifestar também o meu pensamento. A sessão de hoje serviu para os governistas fazerem a defesa do Governo. Mas a história está nas mãos do povo. Não tenho dúvida de que as manifestações de hoje terão conseqüências muito importantes para o País. Haverá de provocar mudanças sérias e radicais. Não posso prever exatamente o que vai acontecer, mas não tenho dúvida de que haverá desdobramentos muito sérios no processo da política brasileira.  

E se o Congresso Nacional não se atentar também para esse sentimento da Nação brasileira - porque o Poder Executivo, ao que parece, não está dando importância para o sentimento do povo brasileiro -, se o Congresso Nacional não tomar as rédeas desse processo, muitas coisas sérias e graves poderão acontecer no Brasil.  

É por isso, Sr. Presidente, que venho à tribuna dizer que o povo brasileiro está de parabéns hoje; ao fazer esse sacrifício enorme de se deslocar até Brasília de ônibus, vindo dos lugares mais distantes deste Brasil, para fazer o Governo sentir que não está governando para a população, que ele está governando para os grandes grupos econômicos, sob o comando do Fundo Monetário Internacional e das nações mais desenvolvidas do mundo. E, se não houver mudanças, poderemos entrar num período de turbulência, porque o povo, hoje, conforme prometido pelas direções desses movimentos e pelos nossos Partidos, está ordeiro e pacífico, manifestando-se dentro do seu direito e da democracia. Contudo, se mudanças não houver, se o País não partir para o crescimento e atendimento imediato das necessidades do nosso povo no que se refere à moradia, reforma agrária, educação e, principalmente, saúde e segurança pública, não tenho dúvida de que os próximos movimentos não serão tão pacíficos como o que estamos a presenciar hoje em Brasília.  

Esse é um recado ao Senhor Presidente da República, ao próprio Presidente do Congresso Nacional, que disse, ontem, que a Marcha seria menor do que se imaginava. Espero que S. Exª compareça ao movimento, a fim de perceber a realidade e a força do povo, que se faz presente na capital do Brasil.  

Não é possível mais a continuidade de uma política que só favorece o sistema financeiro. Ainda ontem, assistimos à apresentadora do Jornal Nacional dizer que a dívida externa atinge a cifra de R$440 bilhões. Quando o Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu o Governo, o Brasil devia apenas R$60 bilhões. Como se pode explicar essa cifra, num período em que quase não houve inflação, em que Sua Excelência vendeu metade do patrimônio público brasileiro - eu diria mais da metade do patrimônio público brasileiro -, vendeu as siderúrgicas, vendeu as empresas mineradoras, vendeu o Sistema de Telecomunicações, vendeu grande parte do sistema elétrico. Onde o Presidente jogou esse dinheiro? Como se pode explicar que a dívida tenha aumentado de R$60 bilhões para R$ 440 bilhões?  

Pior ainda: mostrava a jornalista que as 100 maiores empresas brasileiras, ao longo desses últimos cinco anos do Governo Fernando Henrique Cardoso, caíram, desvalorizaram o seu capital em 60%. De R$360 bilhões estão valendo hoje R$123 bilhões. O contrário aconteceu, no mesmo período, nos Estados Unidos, que são os grandes exploradores dos países subdesenvolvidos do nosso Planeta. As 100 maiores empresas dos Estados Unidos triplicaram o seu valor real, o seu patrimônio, o seu capital. Ela citou inclusive o caso da Microsoft, que aumentou em três vezes - não me lembro o número exato -, nesse período, o seu capital e o seu patrimônio. Quer dizer, enquanto os Estados Unidos enriquecem as suas empresas, o Brasil empobrece e enfraquece as suas.  

É por isso que, hoje, não é apenas a Oposição que está nas ruas; não é apenas o PT; o meu Partido, o PSB; o PC do B; o PDT. Estão também o PL e as lideranças de vários outros partidos políticos. Lá está o Lula, lá está o Miguel Arraes, lá está o Leonel Brizola, o João Amazonas e tantas outras lideranças importantes da nossa Pátria.  

Não é à toa que essa gente está lá; está lá porque tem uma razão, porque o povo não agüenta mais essa situação. Tenho certeza de que estamos sendo extremamente úteis, importantes para o nosso País, quando organizamos uma manifestação dessa espécie. Não estamos sendo ruins ao Brasil, como afirmaram alguns. Estamos sendo extremamente importantes, porque estamos servindo os excluídos da nossa Pátria, estamos servindo aqueles que estão abandonados, passando necessidade; aqueles que se humilham em gabinete de parlamentares e que passam por todas as dificuldades para conseguir um emprego, seja ele qual for. É a essa gente que estamos ajudando.  

Com a nossa ação, com esse movimento e com a participação de todas as pessoas que estão aqui, temos a certeza de que vamos provocar as mudanças necessárias para a melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro.  

Portanto, estão de parabéns todos os brasileiros, todos os cidadãos que, com muito sacrifício, vieram a Brasília participar dessa maravilhosa manifestação.  

Encerro aqui as minhas palavras, Sr. Presidente, para ir, mais uma vez, para o meio daquele povo, participar desse movimento de alegria e de esperança, trazido por todos os cidadãos brasileiros.

 

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/08/1999 - Página 22282