Discurso no Senado Federal

REPUDIO A INTENÇÃO DE DESQUALIFICAR A MANIFESTAÇÃO REALIZADA ONTEM, NA ESPLANADA DOS MINISTERIOS, DE PROTESTO CONTRA O GOVERNO FEDERAL. REGISTRO DA HOMENAGEM DO PUBLICITARIO CARLITO MAIA AO CARTUNISTA HENRIQUE DE SOUZA FILHO - HENFIL, POR OCASIÃO DOS 20 ANOS DA ANISTIA NO BRASIL.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA. HOMENAGEM.:
  • REPUDIO A INTENÇÃO DE DESQUALIFICAR A MANIFESTAÇÃO REALIZADA ONTEM, NA ESPLANADA DOS MINISTERIOS, DE PROTESTO CONTRA O GOVERNO FEDERAL. REGISTRO DA HOMENAGEM DO PUBLICITARIO CARLITO MAIA AO CARTUNISTA HENRIQUE DE SOUZA FILHO - HENFIL, POR OCASIÃO DOS 20 ANOS DA ANISTIA NO BRASIL.
Aparteantes
Heloísa Helena, Lauro Campos, Luiz Otavio.
Publicação
Publicação no DSF de 28/08/1999 - Página 22355
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA. HOMENAGEM.
Indexação
  • REPUDIO, TENTATIVA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, CRITICA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, MARCHA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), PROTESTO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • LEITURA, CARTA, AUTORIA, CARLITO MAIA, PUBLICITARIO, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, LEI DE ANISTIA, HOMENAGEM, JORNALISTA, ESCRITOR, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não serve bem à Nação aquela pessoa que procura não ver o que realmente está acontecendo.  

O Presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães, desde as vésperas da marcha organizada pela Oposição em protesto contra o estado de coisas no País, um severo protesto contra o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, procurou minimizá-la e desqualificá-la, a tal ponto que a própria coordenação da marcha avaliou que seria melhor entregar o abaixo-assinado de mais de um milhão de assinaturas, solicitando a realização de Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar o processo de privatização das empresas do Sistema Telebrás, apenas ao Presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer.  

Não era essa a opinião dos Senadores do Bloco da Oposição, entretanto, na coordenação, avaliou-se que o Presidente Antonio Carlos Magalhães estava tentando diminuir, desqualificar a marcha pelas suas inúmeras declarações. Ontem, procurou enfatizar que a marcha não teria conseguido cumprir a meta, inclusive dizendo que havia apenas 30 mil pessoas. O que observo é que o Jornal do Senado publicou uma foto da manifestação, escolhendo um horário em que não era o momento de maior afluência. Tanto isso é verdade que as fotos hoje publicadas, por exemplo, na primeira página da Folha de S.Paulo , precisando o horário - imagem aérea feita às 14h -, mostram a concentração na Esplanada dos Ministérios em protesto contra o Governo Fernando Henrique Cardoso com a manchete: "75 mil protestam contra Fernando Henrique Cardoso".  

Quero lembrar que a Folha de S.Paulo, ao longo dos anos, tem sido um dos órgãos de imprensa que, com maior precisão, procura estimar o número de pessoas em concentrações. Já o Jornal do Brasil coloca que "A multidão, calculada em 40 mil pela PM e em 130 mil pessoas pela Oposição, ocupou a Esplanada dos Ministérios". Na verdade, a própria Polícia Militar estimou em cerca de 60 mil pessoas.  

Mas observo aqui o comentário de uma jornalista, Tereza Cruvinel, que procura ser imparcial:  

"O Brasil que veio  

Números à parte, foi uma grande manifestação. Mais do que os militantes, foram os sem-rumo, insatisfeitos e vindos de longe, que tomaram o gramado. Minimizá-la ou negar seu significado político seria o pior rumo para o Governo. Esta foi a primeira reação dos exaltados e teóricos do golpismo, mas não a do próprio Presidente, segundo um interlocutor no início da noite.  

FH não desclassificava o ato, mas discutia rumos que o Governo deve tomar agora. Outras vozes de sua equipe também revelam que o barulho da praça foi ouvido" - e aí expressa o que sentiu, e ouviu, e assistiu o Ministro da Justiça José Carlos Dias.  

"- Eu assisti a tudo. Foi uma grande manifestação, embora sem uma proposta unificadora. Passamos no teste democrático, mas devemos todos refletir, Governo e oposição" - dizia o Ministro da Justiça, José Carlos Dias. Ele conversou com FH duas vezes por telefone ao longo do ato."  

Gostaria de alertar aqueles que procuram desqualificar o ato e o sentido maior do clamor das oposições. É importante que se ouça esse clamor das ruas, pois não servirão bem à Nação aqueles que procurarem fechar os seus olhos e tapar os seus ouvidos à realidade que efetivamente acontece.  

Sr. Presidente, amanhã, dia 28 de agosto, completar-se-ão 20 anos da anistia. Uma das pessoas que mais batalhou, com força, criatividade, humor e inteligência, pela anistia e pela democracia neste País, para que os marginalizados e destituídos de direito à cidadania fossem ouvidos, foi Henfil.  

O publicitário Carlito Maia, outro extraordinário lutador pelas liberdades democrática em nosso País, escreveu um texto a propósito dos 20 anos da anistia, em homenagem a Henfil. Gostaria de abraçar essa homenagem, lendo-a da Tribuna do Senado:  

"Henfil, Meu Pai, Meu Filho, Meu Irmão...  

Se houve alguém que ralou sem refresco pela Anistia, foi ele. Se teve alguém que encheu o saco dos ditadores de plantão, foi ele. E não pensem que era assim, fácil como é hoje, não senhor. Era preciso ser muito macho pra fazer provocação naqueles tempos. Eram os tais Anos de Chumbo. Tão lembrados? Aqueles da ditadura braba, da tortura, do Doi-Codi, da censura, do AI-5! Mas ele não amarelava. Parecia até que quanto mais feia ficava a coisa, mais desacatado ficava aquele baixinho gente fina. Ele era o Henrique Souza Filho. Não era um Henrique qualquer. Era o Henfil.  

Humorista, chargista, humanista, escritor, cineasta e mineiro duro na queda, Henfil foi um dos grandes responsáveis pela Anistia. Quem é que pode ter se esquecido do Bode Orelana , do Zeferino, do Ubaldo, o Paranóico e da Graúna sempre desancando a ditadura em implacáveis cartuns no Estadão e no Globo? Isso sem falar nas "Cartas à Mãe", onde ele não dava folga, exigindo a anistia dos exilados políticos e martelando na volta do Betinho, na última página (que era a primeira que a gente lia), toda semana, na revista IstoÉ. Pois não foi à toa que "O Bêbado e a Equilibrista", música de Aldir Blanc e João Bosco, transformou-se em uma espécie de refrão nacional pela Anistia: "Meu Brasil, que sonha com a volta do irmão do Henfil, com tanta gente que partiu num rabo de foguete..."  

Henriquinho deu sangue pela democracia. Tadim... de tomar sangue contaminado - irresponsabilidade criminosa do governo - acabou que foi ele quem partiu num rabo de foguete... Mas acabou, também, que sua morte foi uma denúncia que resultou em uma grande discussão no Congresso Nacional sobre a política do sangue. Aliás, falando em democracia, sabiam que foi criação dele o lema "Diretas-Já"?  

Pois bem, gente, somos herdeiros do Henfil! Seu veneno da vida corre agora em nossas veias. Este país nos mata lentamente, eu sei, mas são tantas as injustiças - a miséria - a fome... que esmorecer, jamais! (Tá vendo alguma esperança? É você!)  

A Anistia foi uma grande vitória do meu amado amigo Henfa, e neste momento de comemoração, dedico a ele todas as minhas homenagens pelo seu notável exemplo de coragem e patriotismo, relembrando as palavras lindas que, certa vez, lhe dedicou um fã-poeta de Jundiaí:  

Se não houver frutos, valeu a beleza das flores.  

Se não houver flores, valeu a sombra das folhas.  

Se não houver folhas, valeu a intenção da semente.  

Valeu Henfil! Valeu meu pai, valeu meu filho, valeu meu irmão!"  

Carlito Maia"  

Um beijão para o Carlito.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Ouço V. Exª com muita honra.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Nobre Senador Eduardo Suplicy, todos nesta Casa e aqueles que estão tendo a oportunidade de nos ver neste momento, com certeza, sentem-se motivados e cheios de esperança diante do pronunciamento de V. Exª. Fiquei muito feliz com o dia de ontem, apesar do lastimável acidente de ônibus ocorrido com alguns companheiros de Alagoas, que, agora, passam bem. Nesta manhã, em que a emoção de V. Exª nos contagia, estive no Hospital de Base visitando os acidentados. Um dos senhores que vinham no ônibus, o Sr. Cícero, perdeu todo o globo ocular. E ele me dizia que um paciente que estava ao lado dele, disse-lhe: "Está vendo, se o senhor estivesse em casa, nada disso teria acontecido". O Sr. Cícero me disse, chorando: "Olha, Heloisa, eu perguntei a ele: "O senhor é o quê?" Ele me respondeu: "Eu estou desempregado". Então, eu falei: "Olhe, pois eu estava lá defendendo o senhor. E mesmo tendo acontecido essa tragédia comigo, vou achar que eu estava cumprindo meu papel, pois você não podia estar lá, porque estava aqui internado". Isso é que nos motiva, principalmente depois de um dia belíssimo como o de ontem, apesar da arrogância e da truculência do Presidente da República, dessa elite fracassada, cínica e demagógica que previa o grande fracasso da manifestação e muito violência. Quando essa elite fracassada, demagógica, insensível e incompetente viu, estarrecida, o belíssimo dia de ontem, disse aos jornais que a marcha não cumpriu seus objetivos. O Presidente da Casa afirmou na imprensa que o abaixo-assinado que nós entregamos era uma grande falsificação e que havia apenas 30 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios. A única coisa de que eu gostaria - porque sei que não adianta convencer nosso Presidente, porque essa elite fracassada, incompetente e cínica ninguém convence mesmo - é que todo o povo brasileiro tivesse tido a oportunidade de ver através dos meus olhos, de ver o que vi ontem: aquela manifestação belíssima e pacífica de mulheres e homens de bem e de paz, que estavam mostrando sua coragem, sua esperança. E quando alguém diz que o abaixo-assinado foi falsificado, lembra-me uma coisa, Senador Jefferson Peres: a minha mãe - analfabeta e pobre - sempre me ensinou que temos, primeiro, de acreditar. Mas existe um mecanismo na Psiquiatria, que é o mecanismo de projeção, segundo o qual o indivíduo sempre pensa que o outro vai fazer o que ele é capaz de fazer. Então, geralmente, quem pega um documento e afirma logo que é falsificado é porque ele é um falsário. Como dizem as velhas teorias da Psiquiatria, você sempre vê no outro aquilo que certamente você é. Portanto, as mulheres e homens de bem e de paz que participaram da marcha estão de parabéns, assim como aqueles que estavam espiritualmente presentes, impedidos de vir, por se encontrarem em seus Municípios, na rua, sem emprego, no serviço público, no setor privado. A manifestação de ontem representava a dor, a angústia, a humilhação, o sofrimento de milhões de brasileiros, vítimas dessa elite fracassada, cínica, demagógica, incompetente, insensível, que não faz nada pelo nosso País. Portanto, além do belíssimo pronunciamento de V. Exª hoje, pela manhã, manifesto que fiquei muito triste, arrasada, pelo o que aconteceu com o Sr. Cícero. Conheço-o, sei que se trata de uma liderança comunitária, que mora num bairro pobre, mas é uma pessoa cheia de coragem e de esperança. Essa é mais uma lição de vida. Também considero uma lição de vida o fato de uma criança de rua ter-me pedido para falar com esse insensível, demagógico e incompetente Presidente da República para que desse comida às crianças do Sertão, que estavam morrendo de fome; é também uma lição de vida o fato de que o Sr. Cícero está hoje em cima de uma maca, pós-cirurgiado, mas com tanta determinação. Também são lições de vida o Henfil, o Carlito e milhares de pessoas espalhadas pelo nosso País. Meu abraço grande a V. Exª que, sem dúvida nenhuma, é estímulo e exemplo a milhares de pessoas deste País.

 

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - O exemplo do Sr. Cícero constitui-se uma notável lição, quando afirmou ao seu companheiro que estava presente para dizer ao Governo que não se pode admitir o fato de que tantas pessoas estão sem a oportunidade de trabalho, tantos que querem dedicar-se e prover o suficiente aos seus, a si próprio, além de contribuir para a riqueza da Nação.  

Senadora Heloisa Helena, temos daqui a instantes um encontro com o Ministro da Fazenda. Por volta do mês de março, S. Exª e o Presidente do Banco Central, Armínio Fraga, compareceram à Comissão de Assuntos Econômicos, após um périplo pelas capitais financeiras internacionais. Naquela ocasião, eu até lhe disse que seria importante se algumas vezes ele pudesse dialogar com os que têm sido atingidos, marginalizados, destituídos de seus direitos, inclusive do trabalho, em função da política econômica pela qual é o principal responsável, além do Presidente da República. E ele respondeu que estaria disposto a realizar um diálogo com trabalhadores desempregados, se isso fosse organizado. A Senadora Heloisa Helena então propôs-se a realizar algo assim em Alagoas. E, há três semanas, por ocasião de audiência com o Governador de Alagoas, o Ministro relembrou o assunto à Senadora. Eis que então ligamos para informar-lhe que iríamos combinar esse encontro. Esse é o propósito da audiência. A Senadora Heloisa Helena poderá - eu vou viajar - relatar ainda hoje aqui qual será o resultado dessa audiência.  

O Sr. Luiz Otávio (PPB - PA) - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª me permite um aparte?  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com muita honra, Senador Luiz Otávio.  

O Sr. Luiz Otávio (PPB - PA) - Senador Eduardo Suplicy, realmente estranhei a notícia de um jornal de hoje sobre a reunião que V. Exª e a Senadora Heloisa Helena terão com o Ministro Pedro Malan. Entendo que fazer oposição faz parte do processo democrático. Todos temos que defender a nossa bandeira, até com entusiasmo, com força de união, a fim de demonstrar às bases aquilo a que cada um de nós se propõe. Mas, na verdade, estranho quando, principalmente nesta oportunidade, exatamente neste momento, V. Exª fala sobre o entusiasmo, a boa vontade e o interesse do Governo em recebê-los para discutirem uma política e uma forma de atender às reivindicações de V. Exªs. Ouvi, entretanto, a Senadora Heloisa Helena agredir pessoalmente o Presidente da República, inclusive usando palavras de baixo nível. Se a marcha, a proposta, a idéia e até mesmo essa reunião é para a melhoria da condição do povo brasileiro, não vamos conseguir nada com essas ofensas e ataques pessoais. Deveríamos refletir sobre o momento de ontem, que foi muito importante, e, daqui para diante, passar para um melhor nível de entendimento e de relacionamento, porque aí eu diria - e faço até um desafio ao Ministro da Fazenda, Sr. Pedro Malan, - que fica esquisito para um Ministro estar recebendo e tentando resolver problemas de partidos e de pessoas que agridem a pessoa do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Acho esse procedimento estranho.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Nobre Senador Luiz Otávio, o sentimento expresso pela nobre Senadora Heloisa Helena é o mesmo daquelas pessoas que ela viu e com quem conversou, como o desempregado com quem ela conversou hoje, como o Sr. Cícero, que, embora tendo perdido o globo ocular, veio à manifestação de ontem expressar um sentimento muito forte. Eu tenho certeza de que o Ministro da Fazenda vai receber-me e a ela também com todo o respeito, compreendendo esse sentimento de angústia pela presente realidade no Brasil.  

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT - DF) - Permite-me um aparte, nobre Senador?  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Lauro Campos.  

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - A Mesa solicita ao Senador Eduardo Suplicy e aos seus aparteantes que sejam breves, porque o tempo do orador já está esgotado.  

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PT - DF) - Nobre Senador Eduardo Suplicy, congratulo-me com V. Exª pelo pronunciamento emocionado que faz hoje. Lembro que este seria o momento oportuno para compararmos aquilo que foi previsto como um day after , como um dia que se segue à calamidade, um dia após o tremor e o abalo que a proximidade de talvez cem mil pessoas empobrecidas, desempregadas, desesperadas que vieram trazer a Brasília, para alegria da cidade e para que seu conteúdo humano e político pudesse ser abastecido e reforçado, aquele ato de civismo, de educação e de vontade séria de mudanças. Eu gostaria de ficar neste tema: como o Governo esperou os acontecimentos? Como é que um Governo afastado do povo teme sua proximidade? Nos 40 anos em que moro em Brasília, vi ditadores que tremiam; cercados pelos militares, tremiam de medo. Eu mesmo participava, estava aqui; dezenas de vezes, quando tive espaço, estava aqui presente. E, numa dessas vezes em que aqui pedíamos mais democracia, mais espaço, quando nos retirávamos tranqüilamente, vinte e oito cascavéis, vinte e oito tanques de guerra, e mais de cem cães amestrados nos atropelaram ali em frente ao Palácio dito da Justiça. Recordo-me que, nessa ocasião, dois alunos estavam perto de mim - um, o Sérgio Cutolo, e o outro era sua esposa, colega de turma -; um deles, escorregou e caiu. Veio um cachorro daqueles e passou a não mais do que dois centímetros de distância de seu rosto. Presenciei coisas como essas, violências que não partiram dos manifestantes, mas sim do medo, que é um mau conselheiro. Aqueles que se afastam do povo, aqueles que usam o povo e que tentam comprar-lhe a consciência nas eleições, aqueles que usam de subterfúgios realmente acabam se encastelando, se distanciando e deixando de ouvir a voz rouca das ruas. E o que acontece agora? Disseram, por exemplo, que aquele ato não era espontâneo, mas político - como se um ato espontâneo da população não fosse a manifestação da alma política do povo que eles quiseram anestesiar. São declarações absurdas, ininteligíveis quase. Percebemos que agora os jornais noticiam que o Ministro Malan será substituído - li essa notícia no jornal de hoje. Vão pedir a cabeça do Malan porque obviamente a preferência agora será, de novo, pelo menos como ameaça ou como promessa renovada, o social. Só faço votos de que não troquem o malão por uma malinha e continue tudo na mesma.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Suplicy, eu gostaria ainda de...  

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Senadora, o tempo do orador já está ultrapassado em cinco minutos.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Sr. Presidente, fui citada no aparte do Senador Luiz Otávio e gostaria de responder. Solicito a V. Exª que garanta o meu aparte ou que me inscreva para falar no tempo que regimentalmente me é permitido.  

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Concedo a inscrição de V. Exª para explicação pessoal, logo após o término do discurso do Senador Eduardo Suplicy.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Muito obrigada, Sr. Presidente.  

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Eu pediria ao Senador que concluísse o seu pronunciamento.  

O SR. LUIZ OTÁVIO (PPB - PA) - Pela ordem, Sr. Presidente.  

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Tem a palavra V. Exª.  

O SR. LUIZ OTÁVIO (PPB - PA) - Se eu for citado, também desejarei fazer explicações pessoais, conforme V. Exª decidiu em favor da Senadora Heloisa Helena.  

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Se a Senadora citar o nome de V. Exª, a Mesa concederá também a V. Exª o tempo para explicação pessoal.  

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - O Senador Lauro Campos expressou de maneira melhor do que eu poderia fazer a advertência àqueles que são insensíveis aos clamores do povo, ao movimento da alma de cada um.  

Ontem, pudemos ver dezenas de milhares de pessoas, um número próximo daquele que os organizadores da Marcha estavam prevendo. De qualquer maneira foi, ao longo de muitos anos, segundo a própria imprensa, a maior manifestação aqui realizada de natureza política desde o impeachment de Collor e a manifestação dos sem-terra, realizada em 17 de abril de 1997, quando 30 mil pessoas participaram. E as estimativas são de pelo menos o dobro de pessoas, aliás como a própria PM anunciou, 60 mil; ou como a Folha de S. Paulo divulgou, 75 mil. Foi uma manifestação extraordinária e que mal estarão servindo a Nação aqueles que se mostrarem insensíveis ao clamor do povo.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/08/1999 - Página 22355