Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM O ENDIVIDAMENTO DOS ESTADOS E O AUMENTO DA DIVIDA PUBLICA.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA.:
  • PREOCUPAÇÃO COM O ENDIVIDAMENTO DOS ESTADOS E O AUMENTO DA DIVIDA PUBLICA.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 01/09/1999 - Página 22776
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, QUALIDADE, RELATOR, PROJETO, CONTRATAÇÃO, EMPRESTIMO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), NECESSIDADE, AVALIAÇÃO, PROCESSO, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, PREVENÇÃO, PRIVILEGIO, ESTADOS, DESCUMPRIMENTO, RESOLUÇÃO, SENADO, DESEQUILIBRIO, CONTAS, SETOR PUBLICO.
  • ANALISE, ACORDO, BRASIL, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), OBJETIVO, COMBATE, CRISE, ECONOMIA, EXIGENCIA, AJUSTE FISCAL, PREJUIZO, POPULAÇÃO.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, SUPERIORIDADE, DESPESA, COMPARAÇÃO, RECEITA, DESCUMPRIMENTO, ACORDO, AJUSTE FISCAL, CRIME DE RESPONSABILIDADE.
  • CRITICA, ATRASO, CAMARA DOS DEPUTADOS, TRAMITAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA.
  • CRITICA, POLITICA DE EMPREGO, GOVERNO, INVESTIMENTO, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA, INFERIORIDADE, CRIAÇÃO, EMPREGO, COMPARAÇÃO, AGROINDUSTRIA, AGRICULTURA.
  • NECESSIDADE, RESPONSABILIDADE, SENADO, CONTENÇÃO, AUMENTO, DIVIDA PUBLICA.
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, OFICIO, AUTORIA, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ASSUNTO, DIVIDA PUBLICA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), LEITURA, RESPOSTA, SENADO, SOLICITAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF).

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje pela manhã a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado aprovou requerimentos do Senador Eduardo Suplicy convidando o Governador de São Paulo, Mario Covas, e o Presidente do Banco Central, Armínio Fraga, para que estejam presentes à reunião em que votaremos a autorização para contratação de empréstimos para o Estado de São Paulo, com o objetivo de esclarecerem dúvidas.  

Quero alertar desta tribuna que esse empréstimo de 100 milhões para São Paulo está sendo tratado em dois projetos, um de 45 milhões e outro de 55 milhões, do qual sou Relator, de forma individualizada. Em meu entendimento, caracteriza-se uma temeridade, porque estamos analisando processos cujos julgamentos serão, sem dúvida alguma, sinalizadores para aquilo que ocorrerá neste Senado a partir de então.  

Não podemos considerar a análise desses dois processos como se estivéssemos apenas autorizando ou deixando de autorizar a contratação de 100 milhões em empréstimos por parte do Estado de São Paulo; como também não podemos analisar o pedido de rolagem de dívida do Rio de Janeiro como se estivéssemos analisando de forma particular, individual o problema do Estado, porque há uma determinação do Presidente desta Casa, o Senador Antonio Carlos Magalhães, de que o que se fizer para São Paulo deverá ser feito para todos os Estados do País. Em outras palavras, o Presidente diz o que está escrito na Constituição: o direito à isonomia. O tratamento que dermos a São Paulo e ao Rio de Janeiro teremos de dar a todos os 27 Estados da Federação. Isto é o mínimo que pode ser exigido do Senado Federal.  

Sr. Presidente, preocupo-me com a análise de novos pedidos de empréstimos feitos pelos governadores - e que este Casa até agora havia analisado sem levar em conta, com muito rigor, o que preceitua a Resolução nº 78 do Senado, que estabelece as regras para o endividamento dos Estados -, porque estamos tratando de um assunto explosivo: ao autorizar a contratação de empréstimos por Estados que não poderão pagá-los, ao autorizar a rolagem de dívidas sem obedecer regras básicas, estamos provocando o aumento da dívida pública e o desequilíbrio das contas públicas. Os Senadores que tomam essa atitude contrariam todos os discursos que fazem, desta tribuna e nos seus Estados, contra os juros altos e a criação de novos impostos. Ao votar a contratação de novos empréstimos por Estados que não têm capacidade de endividamento ou que não apresentam os limites propostos pela Resolução nº 78 contribuem, e muito, para o crescimento da taxa de juros e para o aumento da carga tributária em nosso País. Contribuem ainda para o desemprego, o grande desafio que todos temos de enfrentar.  

Sr. Presidente, vou me encontrar amanhã com o Ministro Pedro Malan, pois fui brindado com um convite para almoço depois de muito tempo tentando falar com S. Exª, e pretendo discutir este assunto.  

O Senado e a Câmara aprovaram medidas de ajuste fiscal que colocaram um peso enorme sobre os ombros da população, principalmente da população trabalhadora deste País. Sem dó nem piedade, este Congresso aprovou – precisava fazê-lo para evitar o caos no País – aumento de impostos e contribuição dos pensionistas e aposentados da Previdência pública, para tentar cobrir o déficit da Previdência. O Congresso Nacional aprovou medidas antipáticas que trouxeram sacrifícios à população.  

Tudo isso por conta de um acordo firmado com o FMI, cujas metas estabelecidas, segundo o Governo, estamos atingido. Entretanto, não há o cumprimento das metas por parte do Governo Federal – dados do próprio Governo da União e dos seus órgãos técnicos o demonstram. Não me preocupo com o FMI. O FMI não é um problema da população brasileira. Se não estamos cumprindo o prescrito pelo FMI, é problema do FMI.  

As metas foram fixadas para dar estabilidade à moeda e, sobretudo, para resolver o problema da economia brasileira, a fim de que ela atravessasse esses momentos de tormenta.  

Depois das eleições de 4 de outubro de 1998, o Governo iniciou conversas com o FMI, assinando, em 13 de novembro do mesmo ano, o acordo preliminar. O primeiro acordo tinha como premissa básica a manutenção da política cambial e de ajuste gradual, sendo que o dólar chegaria no máximo a R$1,32. Essa foi a premissa do acordo que não foi cumprida, porque hoje a cotação do dólar já supera R$1,90, muito acima até do patamar de R$1,75 estabelecido no segundo acordo, assinado em 8 de março. O terceiro acordo, de 2 de julho, objetivava adequar-se aos fatos gerados pela crise internacional. Em 12 de julho, o Brasil foi obrigado a promover a desvalorização cambial, comprometendo a primeira premissa assinada com o FMI de variar gradualmente a taxa cambial até R$1,32.  

Argumenta-se que a crise cambial empurrou o Brasil a tomar aquela decisão. Mas não podemos ignorar alguns índices que demonstram não estar sendo cumprido o que interessa não ao FMI, mas a nós, cidadãos brasileiros.  

Sr. Presidente, pelo acordo, a dívida pública não deveria superar 50% do PIB. No entanto, isso já está ocorrendo. Nesse ponto, volto ao início do meu pronunciamento. O Senado Federal não pode contribuir de forma inconseqüente para a contratação de empréstimos que promovem o crescimento da dívida pública, principalmente sabendo que os Estados beneficiados não têm capacidade de contratá-los, por não poderem pagá-los. Quem, no final, vai pagar essa conta é a sociedade brasileira.  

O resultado primário do Governo Federal é de 2,3% do PIB e o primário global, de 3,1% do PIB. Ora, se analisarmos as contas dos Estados, verificaremos que nenhum Estado da Federação está cumprindo o compromisso assinado no termo de ajuste com a União de promover o crescimento das receitas. O resultado primário não pode, portanto, ser positivo nos Estados e oferecer uma média de 3,1% somado ao resultado da União, porque os Estados estão aumentando não suas receitas, mas suas despesas.  

Daqui para o final do ano, concluímos que o Governo Federal não conseguirá seu resultado primário de 2,3% do PIB, assim como a média dos governos estaduais não atingirá 3,1%. Gasta-se neste País muito mais do que se arrecada, contrariando a lei de responsabilidade fiscal que tramita no Congresso Nacional e que precisa ser votada urgentemente. Para que se atinja um superávit de 3,1% do PIB, teríamos de promover um excedente de arrecadação em relação ao ano passado de R$24 bilhões, ou seja, três vezes mais do que a CPMF proporcionará.  

Sr. Presidente, outra meta era o resultado da balança comercial e do balanço de pagamentos. Pelo primeiro acordo, a balança comercial deveria gerar um superávit de R$11 bilhões. Quando do ajuste feito no segundo acordo, percebendo-se que aquela meta não seria atingida, baixou-se para R$4 bilhões. O resultado do primeiro semestre foi de R$200 milhões negativos na balança comercial, contra a meta de R$11 bilhões no ano de superávit.  

Mesmo baixando para R$4 bilhões, Sr. Presidente, essa meta dificilmente será atingida, por termos um mercado externo deprimido, pelas circunstâncias externas e também pela política atual não estar direcionada para a geração de emprego e de renda. A não ser que as medidas anunciadas pelo Governo hoje possam mudar esse quadro, mas duvido que isso aconteça. E não me venham chamar de pessimista ou de catastrofista, porque baseio-me em números. Estou torcendo muito – vou dizer isso ao Ministro Malan – para que essa meta seja atingida, apesar das dificuldades.  

Sr. Presidente, outro objetivo era a modificação do sistema tributário. A proposta de reforma tributária arrasta-se na Câmara há quatro anos, e estamos aguardando que aquela Casa encaminhe o projeto aprovado para o Senado, para que possamos discuti-lo.  

O estabelecimento do IVA, Imposto sobre Valor Agregado, era outra meta, assim como a criação de taxas e impostos seletivos pelo Governo Federal, que também depende da reforma tributária. A utilização da CPMF como uma taxa mínima dedutível do Imposto de Renda não está ainda em discussão. Principalmente o IVA e a CPMF permanente encontrarão muita resistência para serem aprovados.  

A meta de crescimento econômico entre 3,5% e 4% do PIB, Sr. Presidente, é uma das nossas maiores incógnitas. Embora os discursos otimistas digam que vamos crescer ainda este ano ao nível de 2%, se não tivermos o resultado da balança comercial esperado, também ficará difícil atingirmos o crescimento do PIB. Portanto, Sr. Presidente, mais uma meta que está complicada em relação àquela que foi estabelecida.  

Quanto às novas receitas fiscais, estamos vendo que a CPMF não está compensando — embora a tenhamos aprovado com determinado atraso — a queda da arrecadação dos Estados, especialmente pelo decréscimo da atividade econômica em nosso País; pela incapacidade que o Estado brasileiro apresenta hoje de promover novos empreendimentos; e, principalmente, pelo equívoco que ele tem praticado, ao concentrar recursos dos seus organismos financeiros, como o BNDES e o Banco do Brasil, em poucos e grandes empreendimentos, financiando empresas multinacionais, alterando ou tentando alterar o perfil econômico de determinadas Unidades da Federação, que tem uma vocação que está sendo desrespeitada.  

De repente, parece que fabricar carro resolverá o problema de renda e de emprego em nosso País. No entanto, o próprio BNDES divulga o dado de que as montadoras de automóvel, quando instaladas e já produzindo, geram um emprego para cada US$1 milhão investidos, enquanto que os recursos investidos na agroindústria e na agricultura geram, respectivamente, um emprego para cada para cada US$89 mil ou para cada US$10 mil.  

Portanto, não está ocorrendo aquilo que chamamos de otimização dos recursos, que, embora escassos, poderiam estar sendo concentrados para a geração de emprego e renda, e não para a implantação de empresas que, além de não gerar empregos, tornam o nosso capital muito mais estrangeiro que nacional. Evidentemente, já na próxima geração, isso fará falta para o País.

 

Também quero alertar para o programa de privatização dos bancos estaduais, em São Paulo, Paraná, Bahia e outros Estados. Citarei o meu Estado como exemplo. A meta era a de que, até 30 de junho, fosse federalizado ou privatizado o Banco do Estado do Paraná. O dinheiro foi destinado, e o saneamento não foi feito. O Banco Central, passando por cima da Resolução do Senado, prorrogou o prazo para 30 de setembro, depois para 30 de novembro e, posteriormente, para 30 de março. Não há sequer a perspectiva de que este prazo seja cumprido. O dinheiro do saneamento também é público, é do Banco Central e poderia estar sendo utilizado de forma mais adequada, neste momento de crise em que o Brasil vive. No entanto, está saneando um banco que foi quebrado — não sei por que, ou sei por que, sim, mas não cabe falar agora, porque é uma história muito comprida e árida.  

Então, Sr. Presidente, citei metas que foram estabelecidas, mas não estão sendo cumpridas. A outra meta é em relação à taxa de juros, que deveria, até o final do ano, estar em torno de 18%. Parece que ela está perto disso, até porque o Governo é o maior pagador de taxa de juros, pois é o maior contratante de empréstimo, já que é obrigado a rolar as dívidas dos Estados e a contratar empréstimo. Para pagar serviços da dívida, o Brasil — este dado não é meu — já despendeu R$70 bilhões este ano.  

Sr. Presidente, estamos caminhando para uma encruzilhada. As metas podem desagradar ao FMI, mas muitas delas colocarão a economia e a sociedade brasileira em uma crise muito perversa. Será que o Senado e o Governo, juntos, não têm de tomar uma decisão? Não se trata de fazer acordos fora do Senado ou em reuniões informais. Essas decisões têm de ser tomadas, reunindo-se a Comissão de Assuntos Econômicos e chegando-se à conclusão de que não podemos mais autorizar empréstimos para Estados que não poderão pagar; não podemos mais autorizar a rolagem de dívidas para Estados que não estão cumprindo o disposto na Resolução nº 78 do Senado.  

Essa Resolução foi votada pelo Senado, exatamente para criar um anteparo, para estabelecer regras, a fim de que o Brasil não seja obrigado a assumir dívidas impagáveis; a fim de que a sociedade brasileira, amanhã, não seja condenada a pagá-las. Não estamos construindo um País em que os nossos filhos terão a perspectiva de viver em paz, com segurança, emprego, saúde e educação, enfim, com os direitos constitucionais observados, porque estamos tomando medidas que condenarão as futuras gerações a pagar dívida. Chegará o momento em que o Estado brasileiro só pagará dívidas. Isso não depende apenas do Ministro Pedro Malan, do Sr. Armínio Fraga ou do Presidente da República, mas dos Senadores, que têm de assumir uma posição, mesmo que contrariem Governadores, por mais poderosos que sejam. Sr. Presidente, estamos trabalhando para construir o futuro de um País, que se enterrará em dívidas, se continuarmos com os procedimentos que estão sendo adotados.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) - Ouço V. Exª, com prazer.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Cumprimento V. Exª pelo zelo que está demonstrando no que diz respeito à administração da dívida pública dos Municípios, dos Estados e da União. É importante que o Senado Federal assuma plenamente a responsabilidade de estar averiguando, ao autorizar as operações financeiras de cada uma das Unidades da Federação, se há a possibilidade de cumprirem aquilo que se propõem a fazer. V. Exª anunciou hoje que amanhã terá uma audiência com o Ministro Pedro Malan, depois de tê-la solicitado por um ano e meio. Acredito ser fundamental que V. Exª, com toda a sua sinceridade e assertividade, exponha ao Ministro Pedro Malan as suas dúvidas, inclusive no que diz respeito ao projeto do qual é Relator. Refiro-me às operações financeiras de US$50 milhões e US$45 milhões.  

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) - Cinqüenta e cinco e quarenta e cinco.  

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Cinqüenta e cinco e quarenta e cinco milhões de dólares, respectivamente, para projetos do Governo do Estado de São Paulo para obras importantes do ponto de vista da Administração Pública do Estado. Obviamente, V. Exª está tendo o cuidado de examinar se não está sendo extrapolado o limite fixado pelo Senado Federal com relação aos Governos Estaduais. V. Exª salientou que o Banco Central, depois de um primeiro parecer de seu Presidente, encaminhou um ofício em que abre inteiramente ao Senado a perspectiva de aprovar ou não, reconhecendo que aquelas operações teriam sido anunciadas em um acordo prévio à Resolução nº 78, entre o Governo do Estado e a União. Por essa razão, avaliei importante, obtendo o apoio de V. Exª, que tanto o Governador Mário Covas, como o Governador Anthony Garotinho, no caso do Estado do Rio de Janeiro, venham à Comissão de Assuntos Econômicos, e também o Presidente do Banco Central, Dr. Armínio Fraga, para dirimir as dúvidas. Ressalto que, assim como V. Exª tem dúvidas a respeito do que ocorre com o Banco do Estado do Paraná, eu também as tenho quanto à observância pelo Governo do Estado de São Paulo e pelo Banco Central das resoluções e das leis relativas ao processo de federalização e privatização do Banespa, que ainda está por ocorrer. Enviei ofício ao Governador, em 22 de junho. S. Exª me escreveu no dia 1º de julho, mas a resposta só chegou esta semana. Como persistem algumas dúvidas, a vinda do Governador será oportuna, porque poderemos esclarecer muitos dos problemas. No que diz respeito ao agravamento do endividamento, Senador Osmar Dias, se levarmos em consideração o parâmetro receitas correntes, segundo o boletim do Banco Central, de 1995, 1996 a 1997, o Governo estava pagando de juros reais totais algo em torno de 7 a 9% de suas receitas correntes. Em 1998, essa proporção passou para 25%, e, este ano, os valores são maiores. Então, a preocupação de V. Exª é muito saudável, chama a atenção do Governo e da União para aonde vamos. Se o endividamento público, em relação ao Produto Interno Bruto, mesmo que tenha superado 50% em relação a outros países, inclusive desenvolvidos, não está numa proporção assim tão elevada; também é fato que, em relação ao Orçamento da União, o que estamos pagando de juros é extraordinário. E há um aspecto que precisa ser levado à consideração complementar: quem recebe juros? Não são os segmentos da população que estão nas camadas de maior renda e riqueza na sociedade? Não terá isso um efeito sobre o processo de concentração de renda e de riqueza no País? Outro aspecto que precisa ser discutido com o Ministro da Fazenda é quanto às suas responsabilidades e aos objetivos de maior eqüidade, ainda hoje expressos pelo Presidente no anúncio do plano Avança Brasil. Muito obrigado.  

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) - Senador Eduardo Suplicy, obrigado pelo aparte. V. Exª, especialista no assunto, sempre está preocupado com essa questão, pois sabe que as conseqüências de um empréstimo estadual não pago são drásticas, não só para o Governo, para o Estado, mas, depois, para a sociedade brasileira.  

O Ministro Pedro Malan argumentou que os empréstimos eram meritórios porque atenderiam a compromissos sociais do Estado de São Paulo. Mas não foi o Ministro Malan obrigado a cortar do Orçamento social do Governo recursos em função do comprometimento do Orçamento com o pagamento dos serviços da dívida? Não é o mesmo Ministro que promoveu cortes substanciais nas áreas de saúde, educação, enfim, áreas sociais? Será que esses cortes não causaram um dano maior do que se tivéssemos evitado o endividamento feito com o argumento de que auxiliariam os Estados a promoverem suas políticas sociais?  

Nessa troca, Sr. Presidente, a sociedade perde, porque paga duas vezes. Uma, pela inconseqüência daqueles que contratam empréstimos irresponsavelmente, e que, não podendo pagar, pagam multas, taxas de permanência.  

Não me canso de repetir que dei parecer contrário aos empréstimos que o meu Estado estava solicitando ao Senado Federal. Conforme disse, o Paraná não está utilizando os empréstimos, paga multa e taxa de permanência, e o dinheiro está parado. A população do Estado foi beneficiada? Não. A população do Estado foi sacrificada, penalizada e condenada a pagar, agora, a taxa de permanência, e, amanhã, a dívida será debitada na conta de nossos filhos. Não estamos construindo um Estado, um País, em que nossos filhos possam viver com segurança, mas estamos condenando-os a pagar dívidas. Essa é a herança das futuras gerações.  

Sr. Presidente, devo deixar registrado, nos Anais do Senado Federal, o ofício do Presidente do Banco Central, se este merece análise de um relator de processo de endividamento de um Estado, para que amanhã ou depois não digam que o relator da matéria relativa a São Paulo estava com má vontade.  

Tenho aqui dois ofícios, um de 8 de julho de 1999, assinado pelo Presidente do Banco Central, Armínio Fraga; outro, de 25 de agosto de 1999, assinado pelo Presidente do Banco Central, Armínio Fraga:  

O primeiro ofício, referente aos empréstimos solicitados por São Paulo junto ao BIRD, de US$ 55 milhões e US$ 45 milhões, ou seja, dois processos, US$ 100 milhões, diz o seguinte:  

(...)"evidenciou que as operações pretendidas não se enquadram no disposto no art. 45-A da Resolução nº 78/98, introduzido pela Resolução nº 93, de 5.12.98, por não se destinarem a programas de reforma do Estado. Na análise dos pleitos constatou-se a extrapolação dos limites fixados nos incisos II e III do art. 6º e o não atendimento aos incisos III e VII do art. 13º da Resolução nº 78/98.  

2. Assim, considerando os termos do art. 22, combinado com o art. 27 da referida Resolução, o Estado não poderá realizar as operações pleiteadas.  

3. Por oportuno, informamos que o Excelentíssimo Senhor Governador daquele Estado está sendo comunicado da impossibilidade de as operações serem realizadas."  

Assinado Armínio Fraga Neto, Presidente do Banco Central.  

Parabéns ao Presidente do Banco Central, que analisou a Resolução nº 78 e fez o que era para ser feito. Não cumpre a resolução e devolve para o Estado.

 

Só que muita coisa aconteceu depois do dia 8 de julho até o dia 25 de agosto, porque, no dia 25 de agosto, o Sr. Presidente do Banco Central encaminhou o seguinte ofício referente àqueles empréstimos.  

Vou começar já no item 2, para ganhar tempo, Sr. Presidente:  

"A manifestação anterior deste Banco Central observou rigorosamente os parâmetros e ditames da Resolução nº 78/98 do Senado".  

Ou seja, ele se refere àquele ofício em que ele se baseou na resolução, mas é esta a regra que deve ser seguida: a resolução.  

"3. Isto nada obstante, o Governo do Estado de São Paulo solicitou-nos o reexame da matéria, com os seguintes argumentos:  

Que as operações já estavam no ajuste fiscal;  

Que a resolução vigente à época não era a de nº 78 mas a 69;  

Que as operações já teriam sido implicitamente aprovadas pelo Senado Federal por intermédio da Resolução nº118, não cabendo, portanto, novo exame de mérito à luz dos parâmetros da Resolução nº 78/98.  

O Sr. Armínio Fraga citou três argumentos do Estado de São Paulo e concluiu - vejam como um relator pode interpretar o que está escrito no § 4º:  

"Considerando ser fato o que se contém no item "a" - pode não ser considerado fato - " acima, e, ademais, a possibilidade lógica de tratamento da matéria na forma do item "c" - há possibilidade lógica, Sr. Presidente, não quer dizer que é lógico - "entendo haver mérito na argumentação do Governador do Estado de São Paulo e, dessa forma, permito-me reencaminhar o assunto à deliberação desse Senado Federal, a quem compete, em última instância, a interpretação de suas próprias resoluções.  

Sr. Presidente, esse ofício do Presidente do Banco Central foi uma grande decepção. Pela primeira vez vi um ofício de um Presidente do Banco Central conclusivo, taxativo. Não demorou um mês, um pouco mais, de 8 de julho a 25 de agosto, para que o Presidente do Banco Central escrevesse um ofício em que nada conclui, em que lava as mãos e joga a bola para o Senado. Atendendo a quem? Não sei. Esse ofício deveria e vai ficar, Sr. Presidente, registrado nos Anais deste Senado como a grande piada do dia, porque é uma piada. Por isso concordei com o Senador Suplicy quanto ao requerimento de S. Exª, encaminhado ao Presidente do Banco Central, Armínio Fraga, convidando-o a dar explicações a respeito do que está escrito aqui. Não consigo entender, para relatar o processo, o que o Presidente do Banco Central está dizendo no mencionado ofício. Considerar como lógico ou como possibilidade lógica e não afirmar nada não é uma atitude condizente com uma autoridade que é Presidente do Banco Central e responsável pela política monetária do País. Do contrário, poderia haver o risco de o Presidente do Banco Central um dia, ao acordar, pensar assim: considerando o fato de poder haver uma nova crise na Ásia e a possibilidade lógica de uma crise na Argentina, vou desvalorizar o real. Qual a segurança que temos se um assunto dessa gravidade é tratado dessa forma?  

Penso que isso deve ser motivo de reflexão, de debate do Senado Federal. Já levei o assunto à Comissão de Assuntos Econômicos, não sei se a Comissão vai querer discuti-lo, mas eu vou querer debater com o Presidente do Banco Central o fato de um ofício deste teor ser encaminhado ao Presidente do Senado Federal, que, por sua vez, agindo com extrema responsabilidade, encaminhou um outro oficio ao Ministro Malan que, acredito, define bem a situação de endividamento ou de novos endividamentos e que deve ser daqui para frente o nosso critério.  

Diz o Presidente Antonio Carlos Magalhães:  

"Senhor Ministro,  

Solicito a V. Exª sejam prestadas a esta Presidência informações referentes a operações de crédito externo que ficaram configuradas nos contratos celebrados entre a União e os Governos dos Estados no âmbito do Programa de Apoio à Reestruturação e Ajuste Fiscal dos Estados.  

Caso essas operações tenham constado explicitamente do referido Programa, solicitamos a V. Exª informar também o seu valor total e o cronograma financeiro previsto".  

O Senador Antonio Carlos Magalhães está solicitando ao Ministro que esclarece que operações faziam parte do acordo, para não que não ocorra o que tem acontecido: O Governador de São Paulo diz que está no acordo; eu não encontro. S. Exª diz para que se procure nos arquivos do Senado; procuro e nada encontro. Ninguém me envia um documento dizendo onde está. Quanto à Resolução nº 118, nela não consta nenhum acordo ou empréstimo no acordo do Estado de São Paulo com a União.  

Não posso evidentemente relatar com base em uma conversa, em um acordo oral que tenha havido entre o Governador de São Paulo e o Ministro Pedro Malan. Por isso, quero ver essa relação que o Presidente do Senado está solicitando, para depois relatar o pedido de empréstimo de São Paulo.  

Devemos também, Sr. Presidente, adotar uma regra única para todos os Estados e que essa regra olhe para o futuro do País. Vamos, sim, promover o ajuste fiscal, mas com a responsabilidade de assumirmos aqui o que a Constituição nos delega como responsabilidade de um Senador da República: não permitir a quebradeira dos Estados e a irresponsabilidade.  

Não estou acusando o Governador de São Paulo, longe disso, porque não estamos tratando especificamente do pedido de empréstimo de S. Exª, mas estou colocando o crescimento da dívida pública como responsável pelo crescimento da taxa de juros e do desemprego em nosso País, principalmente do crescimento da dívida de Estados que não poderão pagá-la.  

Essa é uma posição que o Senado deve à sociedade brasileira, e que vou continuar cobrando, mesmo que seja repetitivo, cansativo e até chato, porque é melhor ser chato e cumprir a responsabilidade.  

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - Senador Osmar Dias, V. Exª solicita a transcrição nos Anais dos dois ofícios oriundos do Presidente do Banco Central?  

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) - Exatamente, Sr. Presidente.  

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - V. Exª será atendido.  

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR OSMAR DIAS EM SEU PRONUNCIAMENTO:  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/09/1999 - Página 22776