Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES AO CONTEUDO DO PLANO PLURIANUAL E DO ORÇAMENTO PARA O ANO 2000. DENUNCIAS AS SOBREGARGAS FISCAIS E FALTA DE INVESTIMENTO NA AREA SOCIAL. TRANSCRIÇÃO DO ARTIGO DO JORNALISTA JANIO DE FREITAS, PUBLICADO NO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, DE HOJE, INTITULADO 'AVANÇO MESMO'.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • CONSIDERAÇÕES AO CONTEUDO DO PLANO PLURIANUAL E DO ORÇAMENTO PARA O ANO 2000. DENUNCIAS AS SOBREGARGAS FISCAIS E FALTA DE INVESTIMENTO NA AREA SOCIAL. TRANSCRIÇÃO DO ARTIGO DO JORNALISTA JANIO DE FREITAS, PUBLICADO NO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, DE HOJE, INTITULADO 'AVANÇO MESMO'.
Publicação
Publicação no DSF de 02/09/1999 - Página 23054
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • COMENTARIO, APRESENTAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PLANO PLURIANUAL (PPA), ORÇAMENTO, CRITICA, DESCUMPRIMENTO, COMPROMISSO, GOVERNO, EXERCICIO FINANCEIRO ANTERIOR, INVESTIMENTO, SUPERIORIDADE, PAGAMENTO, JUROS.
  • CRITICA, POLITICA FISCAL, GOVERNO, AUMENTO, ALIQUOTA, IMPOSTOS, MANUTENÇÃO, FUNDO DE ESTABILIZAÇÃO FISCAL, PREJUIZO, MUNICIPIOS, ESTADOS, EMPRESA, PESSOA FISICA.
  • OPINIÃO, INEFICACIA, CRIAÇÃO, FUNDO ESPECIAL, COMBATE, POBREZA, DEFESA, INCENTIVO, CRESCIMENTO ECONOMICO, PEQUENA EMPRESA, REFORMA AGRARIA, AUTONOMIA, RELAÇÃO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI).
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, JANIO DE FREITAS, JORNALISTA, ASSUNTO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL.
  • ANUNCIO, PRONUNCIAMENTO, ORADOR, ASSUNTO, DESIGUALDADE REGIONAL, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTERIO, OBJETIVO, FALTA, ATUAÇÃO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Caro Senador Leomar Quintanilha, V. Exª é sempre um homem de boa-fé, um homem de muita esperança, pois crê que o Orçamento será cumprido.  

Sr. Presidente, Srs. Senadores, gostaria de tecer algumas considerações sobre o PPA e sobre o Orçamento para o ano 2000, e, em sessão seguinte, sobre a distribuição de recursos para as regiões. A Constituição Federal estabelece que o Congresso Nacional e o Poder Executivo devem trabalhar para diminuir as desigualdades regionais, o que evidentemente não vem sendo feito.  

Em primeiro lugar, gostaria de falar a respeito do PPA, apresentado ontem com grande festa e pompa pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. E chamo a atenção para o descumprimento de compromissos feitos pelo Presidente anteriormente.  

O PPA e o Orçamento estão se sustentando graças ao aumento de impostos efetivado em momentos de dificuldade, estabelecido durante um intervalo de cobrança da CPMF. Agora, ao apresentar o Plano Plurianual e o Orçamento para o ano 2000, o Governo prorroga esses impostos como se a CPMF já não houvesse aumentado de 0,20% para 0,38%.  

Comecemos com a Contribuição Social sobre o lucro líquido das empresas. Em função de ter de passar seis meses sem a CPMF, o Governo, para não ter quebra de caixa, aumentou a Contribuição Social sobre o lucro líquido das empresas de 8% para 12%. Esse imposto deveria durar até 31 de agosto. Agora, ao apresentar o Plano Plurianual e o Orçamento do ano 2000, o Governo mantém essa alíquota até o ano 2002. Ora, é evidente que empresário não paga imposto sem repassá-lo para o produto final, o que contribui para o aumento da inflação.  

Mas quero chamar a atenção especialmente para a falta de compromisso do Governo. Ele prometeu ao povo brasileiro que cobraria 4% a mais, enquanto não se reiniciava a cobrança da CPMF. Pois bem, a CPMF foi reiniciada com o valor praticamente dobrado e o Governo prorroga para final de dezembro do ano 2002 a cobrança da alíquota de 12% sobre a contribuição social sobre o lucro das empresas.  

Outro artifício que ele usou para substituir a perda da CPMF foi o aumento do Cofins - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social. Passou a alíquota de 2% para 3%, com o compromisso de acabar no retorno da CPMF. Agora vai tornar a alíquota permanente.  

O Imposto de Renda da Pessoa Física aumentou em 10% para as pessoas que ganham acima de R$1.800,00. Houve um aumento dessa alíquota no Pacote 51, quando da crise internacional. A alíquota passou para 27,5% do total da receita do contribuinte. Era provisória a alíquota, mas o Governo a tornará permanente, pois depende dessas receitas para cumprir o Orçamento para o ano 2.000 e o Plano Plurianual.  

Houve o compromisso do Presidente Fernando Henrique Cardoso, sob a pressão dos prefeitos e governadores de todos os Estados do Brasil, para acabar com o Fundo de Estabilização Fiscal - uma retirada de 20% de toda a receita vinculada na Constituição que Sua Excelência utilizava como bem quisesse e entendesse. Prometeu acabar, porque estava prejudicando enormemente os Municípios e os Estados brasileiros. Pois, o Governo pretende dar continuidade ao Fundo de Estabilização Fiscal , antes chamado de Fundo Social de Emergência. Aliás, descobriram que este foi utilizado para a realização de banquetes no Palácio do Planalto e, por isso, mudaram sua denominação para Fundo de Estabilização Fiscal. Quero alertar os prefeitos e governadores de nosso País, principalmente os da base de sustentação do Governo, para o fato de que Fernando Henrique Cardoso está projetando a manutenção do Fundo de Estabilização Fiscal com outro nome, com o objetivo de recolher 20% de toda a receita vinculada da Constituição, para que ele gaste ao seu livre arbítrio.  

O Congresso Nacional, ou algum segmento de iniciativa partidária ou bloco partidário, decide, por exemplo, por um fundo para atender às necessidade da pobreza. Eu particularmente acredito que não é esta a saída para resolver o problema dos pobres no Brasil. Não creio que a criação de um fundo mudará a nossa realidade. O que mudará a nossa realidade será o crescimento econômico, o prestígio ao pequeno e médio produtor, a reforma agrária, o investimento em moradia, enfim, o crescimento da economia, a obediência aos nossos próprios interesses e não aos interesses de organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional.  

Diz-se isso aqui no Congresso Nacional. Aliás, é dito pela base de sustentação do Governo. E o próprio Governo diz que é impossível, que a nossa carga tributária é a maior do mundo e que não pode haver mais impostos. Que contradição! Há uma proposta do Senador Antonio Carlos Magalhães e um estudo sendo elaborado por uma comissão mista do Congresso Nacional com o fim de apresentar uma proposta para diminuir a desigualdade social, para diminuir a pobreza, para, vamos dizer assim, socorrer os excluídos da sociedade. E o Governo chia e diz que o pacote é impossível, pois não se pode aumentar impostos. Mas quando faz o seu Plano Plurianual, quando elabora o Orçamento para o ano 2000, mantém todos os aumentos de impostos que havia prometido que seriam temporários pois ficariam somente durante o tempo de interrupção da CPMF - de janeiro a junho de 1999.  

Por aí, conclui-se que se trata de um Governo que não leva a sério o que fala e pensa que a sociedade não acompanha o que está acontecendo.  

O fato é grave: o Governo faz uma promessa, descumpre-a radicalmente; não dá qualquer satisfação à opinião pública; e se comporta como se ninguém fosse dizer absolutamente nada ou lembrar que ele assumiu o compromisso de que determinados impostos seriam temporários.  

O pior de tudo isso, Sr. Presidente, é que o Governo, ao elaborar o Orçamento do Ano 2000, estabeleceu que o salário mínimo só aumentará 5,6%. Ou seja, em 1999 deveremos atingir uma inflação de 15% ou 16% - se formos muito otimistas - ultrapassando a meta do Governo de em torno de 8%. Ainda assim, prevê o aumento do salário mínimo, para 1º de maio do ano 2000, em apenas 5,6%, o que elevaria o salário mínimo para pouco mais de R$143,00 por mês.  

É esse o Governo que quer festejar o Orçamento e o Plano Plurianual, um Governo que trata a sociedade brasileira como se fosse formada por pessoas que não têm a menor percepção da realidade e das intenções do Governo.  

Pior do que isso tudo, Sr. Presidente: se formos analisar aqui o cumprimento do Orçamento do ano de 1999. Nem falemos nas projeções feitas para o ano 2000. Projeções essas péssimas para os trabalhadores, para os aposentados e, principalmente, para os aposentados rurais, com o aumento absolutamente insignificante do salário mínimo.  

Passo à análise do que fez o Governo ao tentar cumprir o Orçamento estabelecido para o ano de 1999. Perceber-se-á claramente o desvio, a má-fé do Governo Fernando Henrique Cardoso. Tenho alguns levantamentos feitos pelas contas do Governo, por intermédio do Siafi, dos recursos previstos para o Orçamento de 99 e dos efetivamente executados até o dia 30 de junho, ou seja, durante todo o primeiro semestre do ano de 99. São estarrecedores os dados.  

Com investimentos - obras, estradas, ferrovias, pontes, redes de energia etc -, o Governo previu gastar em 99 R$8,73 bilhões. Executou, até agora, 8,45% do total previsto. O Governo está com superávit, atendendo às determinações do Fundo Monetário Internacional, porque está segurando todo o dinheiro do Orçamento, cumprindo absolutamente nada do que está estabelecido para a aplicação de recursos no Orçamento da União.  

Vamos aos dados: investimentos - dos R$8,73 bilhões previstos, gastou até o primeiro semestre, até 30 de junho, 8,45%; construção, ampliação, recuperação e abastecimento de água - de R$103,4 milhões, gastou 1,24%; infra-estrutura e saneamento - de R$198 milhões, foram gastos 1,22%; sistema de esgotamento sanitário - de R$66 milhões, gastou 1,29%; eletrificação rural, fundamental para o desenvolvimento do interior brasileiro, inclusive para evitar a migração dos nossos trabalhadores, que deixam as suas terras para morar nos grandes centros, porque não têm oportunidade de assistir a televisão, ouvir rádio, não têm acesso aos meios de comunicação - dos R$105,4 milhões destinados a esse fim, sabe quanto o Governo aplicou? Zero, nem um centavo! Defesa da criança e do adolescente - dos R$20 milhões previstos, sabe quanto o Governo aplicou até agora? Zero. Aquisição de veículos escolares - de R$13,1 milhões, o Governo aplicou zero. Infra-estrutura do Sistema Único de Saúde, ou seja, melhoria da infra-estrutura para que o Estado possa dar o atendimento à saúde - previsão de R$431 milhões e aplicação zero. Pronaf, a tão propalada agricultura familiar, que funciona em todos os países europeus, os chamados países de Primeiro Mundo, proporcionando alta produção agrícola - dos R$154 milhões previstos, aplicou-se até agora zero. Projeto de Reforma Agrária e Colonização - R$95 milhões, 0,05% aplicado; Programa de Desenvolvimento Urbano - R$266 milhões, zero de aplicação; melhoria das condições de habitação - R$182 milhões, zero de aplicação; erradicação da dengue - R$9,3 milhões, zero de aplicação, nem um centavo para a dengue no ano de 1999; controle da doença de Chagas, a que ataca o coração e é transmitida pelo barbeiro - R$36,4 milhões, sabem quanto aplicou? Zero.  

Agora vem o dado que deve chamar a atenção de todas as pessoas que nos estão escutando: enquanto que com aquilo que é essencial, aquilo que é fundamental para o nosso desenvolvimento, para o nosso crescimento, para a geração de emprego, para a saúde do nosso povo e para a educação do nosso povo, o Governo está segurando todos os recursos de tudo que está previsto no Orçamento; ele gastou mais em investimento e atingiu 8,45% nessa área. Agora, pasmem V. Exªs, previsão de pagamento de juros: no ano de 1999, o Governo brasileiro pagará R$50,1 bilhões de juros da sua dívida. No ano de 2000, no Orçamento apresentado ontem com toda pompa pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, vamos pagar R$62 bilhões de juros, enquanto o investimento total será de menos da metade desse valor. Mas, na aplicação do Orçamento de 1999, enquanto em todos os outros segmentos ele chegou ao máximo de cumprir 8,45% do que estava estabelecido no Orçamento de 1999, com relação ao pagamento dos juros daquelas pessoas que aplicam no sistema financeiro, dos banqueiros, que não produzem nada, que especulam, que não fazem parte do setor produtivo, o Governo brasileiro cumpriu até 30 de junho 56,94%, ou seja, ele superou, porque, até 30 de junho, era de se supor que ele tivesse pago 50% do serviço da dívida por meio dos juros. Mas não: ele pagou 56,94% até 30 de junho; ele pagou exatamente R$28 bilhões de juros, para enriquecer aqueles que são donos de bancos e que podem viver de aplicações no sistema financeiro.

 

É isso, Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, que não entendemos como uma atitude correta da parte do Governo. Não há como justificar esse tipo de comportamento. É por isso talvez que o Presidente esteja tão impopular, esteja tão repudiado, reprovado pelo povo brasileiro, chegando a índices de rejeição que ultrapassam 60%. Creio que Sua Excelência nunca esteve numa situação tão difícil junto ao nosso povo. E, lamentavelmente, tudo o que faz conduz a que o povo brasileiro passe a ter mais desconfiança, a viver mais assustado e preocupado com o seu futuro. Não dá para acreditar, diante dos dados que temos, que citei um por um, que o Governo Fernando Henrique Cardoso vá cumprir as metas estabelecidas, seja no Orçamento do ano 2000, seja no Plano Plurianual, ainda que isso pudesse ser feito às custas da manutenção ou do aumento de impostos sobre o povo brasileiro, como ficou comprovado também na análise que apresentei.  

De forma que queremos chamar a atenção para essas questões e nos dirigir aos quase seis mil Prefeitos deste País, aos 27 Governadores - não apenas aos seis da Oposição - que vivem de pires na mão, passando toda espécie de dificuldade, aos Vereadores do nosso País, às organizações da sociedade civil, para estarem atentos à análise daquilo que está sendo proposto, não engolindo de maneira fácil o que a mídia nos empurra. Façam uma análise crítica do que está sendo proposto, fazendo contrapropostas, condenando, chamando a atenção, como fizemos na grande marcha dos cem mil, recentemente, em Brasília.  

Desejo, Sr. Presidente, que seja incluído nos Anais do Senado da República, como parte integrante do meu pronunciamento, o artigo do jornalista Janio de Freitas, da Folha de S.Paulo , publicado hoje, quarta-feira, 1º de setembro, com o título Avança mesmo . Ele faz uma análise real daquilo em que realmente o Governo Fernando Henrique está avançando em nosso País.  

Sr. Presidente, pretendo continuar minha manifestação numa próxima sessão, não apenas tratando dos erros cometidos pelo Governo na proteção escandalosa dos interesses do sistema financeiro, na falta de coerência nos seus compromissos de não aumentar impostos, na dificuldade que tem encontrado na aplicação real daquilo que está previsto no Orçamento e que realmente se destina a mudar a vida do povo brasileiro; tratarei da desigualdade regional que se apresenta nesse contexto, mas que provoca ainda mais distorções e demonstra a má condução da política do Governo no nosso País.  

Quero apresentar a este Plenário a diferença dos investimentos proporcionados às regiões mais desenvolvidas em detrimento das regiões menos desenvolvidas, num ataque frontal ao que determina a Constituição brasileira.  

Estou preparando praticamente quinze pedidos de informação, dirigidos a todos os Ministros do Governo que fazem investimentos na nossa Nação, para que nos dêem satisfação do percentual de investimento de cada Ministério em cada região do nosso País. Haveremos de demonstrar que as regiões mais pobres, mais atrasadas - o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste - são as que mais sofrem, de certa forma, perseguição, indiferença ou incompreensão por parte do Governo Federal.  

Chamo a atenção de todos aqueles que têm o dever de ajudar este País a caminhar no rumo certo, no rumo do desenvolvimento, no rumo da redução das desigualdades, sejam sociais ou regionais, a fim de atentarem para detalhes como os que exponho aqui, sobre o Plano apresentado ontem, tanto do Orçamento do ano 2000 quanto do Plano Plurianual.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/09/1999 - Página 23054