Pronunciamento de Ademir Andrade em 03/09/1999
Discurso no Senado Federal
CONSIDERAÇÕES SOBRE O DISCURSO DO SENADOR PEDRO SIMON. TRANSCRIÇÃO DAS INFORMAÇÕES RECEBIDAS DO MINISTRO DA AERONAUTICA SOBRE O USO DE AERONAVES POR MINISTROS DE ESTADO. RELATO DA REUNIÃO COM OS MINISTROS DA POLITICA FUNDIARIA E DA CIENCIA E TECNOLOGIA VISANDO UMA SOLUÇÃO PARA ASSENTAMENTO NA FAZENDA VALE DO CRISTALINO, NO PARA.
- Autor
- Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
- Nome completo: Ademir Galvão Andrade
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
REFORMA AGRARIA.:
- CONSIDERAÇÕES SOBRE O DISCURSO DO SENADOR PEDRO SIMON. TRANSCRIÇÃO DAS INFORMAÇÕES RECEBIDAS DO MINISTRO DA AERONAUTICA SOBRE O USO DE AERONAVES POR MINISTROS DE ESTADO. RELATO DA REUNIÃO COM OS MINISTROS DA POLITICA FUNDIARIA E DA CIENCIA E TECNOLOGIA VISANDO UMA SOLUÇÃO PARA ASSENTAMENTO NA FAZENDA VALE DO CRISTALINO, NO PARA.
- Aparteantes
- Heloísa Helena.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/09/1999 - Página 23255
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. REFORMA AGRARIA.
- Indexação
-
- COMENTARIO, DIVERGENCIA, CLOVIS CARVALHO, PEDRO MALAN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), MINISTERIO DA FAZENDA (MF), RELAÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, ESTABILIDADE, ECONOMIA.
- REGISTRO, ANAIS DO SENADO, RESPOSTA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA AERONAUTICA (MAER), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, AUTORIA, ORADOR, ESCLARECIMENTOS, UTILIZAÇÃO, AERONAVE, FORÇA AEREA BRASILEIRA (FAB), LAZER, AUTORIDADE, GOVERNO FEDERAL.
- CRITICA, MINISTERIO DA AERONAUTICA (MAER), OMISSÃO, INFORMAÇÃO, PASSAGEIRO, AERONAVE, FORÇA AEREA BRASILEIRA (FAB), ACOMPANHAMENTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), VIAGEM, LAZER.
- CRITICA, SUPERIORIDADE, NUMERO, VOO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), AERONAVE, AERONAUTICA, TRECHO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), ABUSO DE PODER, NECESSIDADE, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA.
- REGISTRO, REUNIÃO, ORADOR, RAUL JUNGMANN, RONALDO SARDENBERG, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), ROBERTO FRANÇA, PRESIDENTE, INDUSTRIAS NUCLEARES DO BRASIL S/A (INB), AUTORIDADE, BUSCA, SOLUÇÃO, ASSENTAMENTO RURAL, PROPRIEDADE, DESAPROPRIAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), RISCOS, VIDA, AGRICULTOR, MOTIVO, PRESENÇA, URANIO.
- CRITICA, FALTA, ORGANIZAÇÃO, GOVERNO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), AGRADECIMENTO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), PROVIDENCIA, LEVANTAMENTO AEROFOTOGRAMETRICO, MINERAL, PROTEÇÃO, FAMILIA, OCUPAÇÃO, PROPRIEDADE RURAL.
O SR. ADEMIR ANDRADE
(Bloco/PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Tião Viana, Senadora Heloisa Helena, eu estava no gabinete a assistir o pronunciamento do Senador Pedro Simon. Penso que, em muitos aspectos, S. Exª tem razão, principalmente quando estranha a manifestação do Ministro Clóvis Carvalho no debate realizado ontem, em que, sem sombra de dúvidas, constrangeu o Ministro Pedro Malan, dizendo que vacilações no momento de se promover o desenvolvimento no Brasil chegariam a ser covardia.
Ora todos sabem que o Ministro Pedro Malan defende uma política de estabilização a qualquer custo. S. Exª acredita que a questão principal é a estabilização. Reter o desenvolvimento para manter essa estabilização é o seu posicionamento e a sua defesa intransigente. Aliás, o Ministro Pedro Malan deixou isso muito claro na reunião que realizou nesta semana com os integrantes da Comissão de Economia do Senado da República.
O Ministro Clóvis Carvalho deve ter uma força muito grande junto ao Presidente da República. Realmente, S. Exª foi seu secretário particular no Senado e ocupou o Gabinete Civil durante vários anos. Seria bom até que o nosso amigo Geraldo Mesquita, do Jornal do Senado , prestasse muita atenção ao fato que pretendo expor aqui.
Recentemente, o Ministro Clóvis Carvalho foi denunciado, quando, juntamente com sua esposa, todos os filhos, o namorado de uma das filhas e a namorada de um dos filhos, foi, num avião da FAB, para Fernando de Noronha, onde passou o Carnaval passeando e descansando às custas do Estado brasileiro, já que o vôo foi feito em uma aeronave da Aeronáutica e já que ficou hospedado no Hotel da Aeronáutica. E, segundo denúncias que recebemos na época, taifeiros - portanto, integrantes da Aeronáutica – prestaram-lhes todos os serviços de assessoria, hotelaria, etc.
Na ocasião, encaminhamos um pedido de informação ao Ministro da Aeronáutica e, recentemente, recebemos a justificativa do Ministério da Aeronáutica por ter cedido o avião para o Ministro Clóvis Carvalho.
Sr. Presidente, quero que a resposta do Ministro da Aeronáutica conste como parte integrante do meu discurso e seja impressa nos Anais do Senado, porque o que tenho para mostrar é realmente estarrecedor e vai entrar para a História.
O Ministro da Aeronáutica, evidentemente, não culpou o Ministro Clóvis Carvalho por ter usado a aeronave da Aeronáutica para passear em Fernando de Noronha. S. Exª disse que deve atender a determinadas pessoas que têm o poder de solicitar aviões para ficar à sua disposição e que o Ministro ressarciu os dias em que passou hospedado em Fernando de Noronha. Disse ainda que não sabe quem acompanhou o Ministro, porque, normalmente, quando o avião é solicitado, não são revelados ao Ministério da Aeronáutica os nomes dos passageiros, o que considero uma omissão, porque é dever de quem faz o transporte ter a relação de todas as pessoas que foram transportadas, até por uma questão de segurança. Acredito que isso está estabelecido nas normas do DAC. Nenhum avião pode sair de um lugar para outro sem que sejam registrados os nomes de todos os passageiros.
Portanto, penso que aqui há um negativa proposital no sentido de encobrir a utilização indevida de avião da Aeronáutica pelo Ministro Clóvis Carvalho, lamentavelmente assinada pelo Ministro da Aeronáutica, o Tenente Brigadeiro Walter Werner Bräuer, pessoa com quem, inclusive, tenho convivido e conversado. Eu o admiro pelo seu trabalho e pela sua dedicação. Penso que, por dever de ofício e por espírito de corpo com o Governo, ele procurou ser o mais ameno possível com relação à resposta sobre a utilização do vôo do Learjet da Aeronáutica pelo Ministro Clóvis Carvalho para passear em Fernando de Noronha.
O que é estarrecedor, Senadora Heloisa Helena, é que conseguimos nesse pedido de informação uma relação contendo todos os vôos do Ministro Clóvis Carvalho realizados nos quatro primeiros anos do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. E aí digo como o Senador Pedro Simon: "Olha, é de estarrecer!".
Desejo, Sr. Presidente, que seja publicada nos Anais do Senado esta relação. Aqui estão todos os vôos feitos pelo Ministro Clóvis Carvalho. Esse cidadão deve ter muita força junto ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, pois este não tomou nenhuma providência com relação à utilização indevida de avião da Aeronáutica pelo Ministro Clóvis Carvalho para passear com a família, genros e noras em Fernando de Noronha.
Não quero aqui entrar no mérito da discussão entre os Ministros Pedro Malan e Clóvis Carvalho no aspecto da política econômica do Brasil, nem sobre quem tem razão nessa questão. Agora, como pode um cidadão, em quatro anos de governo, usar aviões da Aeronáutica por quase 400 vezes? Pelo levantamento, Senadora Heloisa Helena, em 1995, o Ministro Clóvis Carvalho usou o avião da Aeronáutica por 78 vezes; em 1996, por 96 vezes; em 1997, por 98 vezes; e, em 1998, também por 98 vezes. Praticamente, o Ministro Clóvis Carvalho, a cada dois dias e meio, fez uma viagem no avião da Aeronáutica às custas do povo brasileiro. E V. Exªs podem reparar que, na maioria dos trechos, a aviação comercial tem dezenas de linhas diárias, de pontes aéreas permanentes, como Brasília/São Paulo e Brasília/Rio. E a maioria dos vôos foi feita justamente nesta área: Brasília/São Paulo e São Paulo/Brasília.
A imprensa deveria fazer um levantamento - não me cabe fazê-lo agora - para mostrar ao público as mordomias do Governo Fernando Henrique Cardoso. É inadmissível, inaceitável, que, em um ano, um simples Ministro de Governo use por 98 vezes um avião das Forças Aéreas Brasileiras. Um cidadão que usa desse poder poderia estar voando em linhas de jatos normais, como nós Senadores e a maioria dos Ministros do próprio Governo o fazem. Creio que ele não toma um avião particular em hipótese alguma, porque viajar 98 vezes em um ano significa uma viagem a cada três dias.
Estou com a documentação. Repito: penso que a imprensa brasileira - revistas brasileiras como Veja, IstoÉ , Época e tantas outras - deveria divulgar isso, para ver se o Presidente Fernando Henrique Cardoso toma uma atitude com relação a esse verdadeiro abuso de poder, porque, no meu entendimento, isso é absolutamente inaceitável.
Só alguém que tem tanta força junto ao Presidente da República poderia confrontar-se com o Ministro mais forte do Governo, que é o Ministro Pedro Malan, em posições antagônicas e de uma maneira bastante deselegante. O Ministro Pedro Malan não foi diretamente chamado de covarde, mas, para a opinião pública, está claro que S. Exª defende a política de estabilização da moeda ainda que esta custe a redução do nosso desenvolvimento e que, enquanto isso, outros segmentos do Governo e do próprio PSDB, como o Governador Mário Covas e outros parlamentares do Governo, defendem o desenvolvimento ainda que não haja estabilidade da moeda. Essa pode não ter sido uma acusação direta, mas foi muito deselegante, porque, para a opinião pública de uma maneira geral, quer o fato tenha sido real ou não, o Ministro Clóvis Carvalho chamou o Ministro Pedro Malan de covarde na presença dele. Dessa forma, só alguém com tanto poder pode ter a ousadia do Ministro Clóvis Carvalho.
Espero que a imprensa brasileira dê a devida cobertura a esse abuso de poder e ao gasto indevido de dinheiro público e faça com que o Presidente da República se aperceba de que o povo não é idiota, de que o povo assistiu à notícia de que o Ministro Clóvis Carvalho foi para Fernando de Noronha em avião da Aeronáutica e de que o Presidente da República não fez absolutamente nada com relação a isso. Sua Excelência não deu satisfação alguma à opinião pública brasileira.
A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - V. Exª me permite um aparte, antes de entrar em outro tema?
O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) - Com muita alegria, concedo o aparte a V. Exª.
A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Ademir Andrade, quero saudar o corajoso pronunciamento de V. Exª e compartilhar das observações feitas. Toda essa confusão que, a todo momento, está ocorrendo dentro da imprensa é armada pelo Presidente da República para buscar oxigênio perante a sociedade, mudando uma ou outra personalidade da equipe econômica. Tenta-se iludir a opinião pública dizendo que agora vai haver alguma mudança. Essas posições são assumidas por algumas personalidades amigas do próprio Presidente da República, como bem disse o Senador Pedro Simon. Sabemos que, infelizmente, o Governo premia aqueles que cometem improbidade administrativa. Não é à toa que o Mendonça de Barros é Vice-Presidente do PSDB. Ele foi premiado pelo tráfico de influência, pela prevaricação, pelo peculato, por toda a rede de bandidagem que foi montada por ele e pelas personalidades políticas e familiares que estão em torno dele. Sabemos que o Governo Federal realmente estabelece premiações importantes para essas pessoas que cometem esse tipo de delito, de delinqüência. Dizem que o Clóvis Carvalho é um trator, mas um trator só funciona se houver um tratorista. Com certeza, o tratorista de tudo isso que está sendo montado é o Presidente da República, é o Governo Federal. Faz-se de conta que está havendo uma confusão dentro do Governo, e aí se muda uma ou outra personalidade da equipe econômica e se diz que nela agora entrarão os desenvolvimentistas. Eu até discutia a respeito disso com o brilhante Senador Lauro Campos, o nosso exemplo cotidiano, que nos inspira, todos os dias, uma belíssima juventude. Debatíamos sobre a própria História deste País que sempre foi montada com base nesse falso dilema entre monetaristas e desenvolvimentistas. Tudo isso está sendo montado pelo próprio Presidente da República, para fazer de conta que mudou alguma coisa e para preservar a política de subserviência e de subordinação ao capital especulativo internacional, ao Fundo Monetário Internacional, ao Conselho de Washington, abrindo mão de transformar este País, neste próximo século, na belíssima nação que o povo brasileiro merece e pode ter. Quero, portanto, saudar o pronunciamento corajoso de V. Exª.
O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) - Agradeço, Senadora Heloisa Helena, o seu aparte.
O povo está percebendo tudo isso, tanto que há um sentimento muito grande de rejeição à permanência do Presidente Fernando Henrique e à sua forma de conduzir o processo político e econômico da nossa Nação. Mas me parece que Sua Excelência é que não está percebendo os graves erros que tem cometido.
Uma situação como essa, por exemplo, não justifica que um Presidente, que vive pedindo economia e aumentando imposto, permita que seja proporcionada uma mordomia tão grande a uma pessoa de sua absoluta confiança, de sua proximidade, como é o caso do Ministro Clóvis Carvalho.
Aproveito a oportunidade para tratar de um outro assunto, relativamente a dois Ministros desse Governo – pelos quais tenho uma admiração, acredito na competência deles e no firme propósito que têm de conduzir as questões com patriotismo, com vontade política – com os quais me reuni ontem. Consegui fazer com que o Ministro Raul Jungmann, da Política Fundiária, e o Ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, se reunissem ontem, a nosso pedido, juntamente com uma série de outras pessoas, para tratar de uma questão que, de certa forma, foi criada, eu não diria por culpa desses Ministros, mas pela ineficiência e incapacidade do Governo como um todo.
Ontem à noite, às 18h30 exatamente, fizemos uma reunião para uma discussão técnica em que estavam presentes os Ministros Raul Jungmann e Ronaldo Sardenberg; o Presidente da Indústria Nuclear do Brasil, Dr. Roberto Franca, que veio do Rio de Janeiro para participar dessa reunião; o Coordenador de Projetos, Embaixador Rui de Vasconcellos; o geólogo Gerobal Guimarães, Consultor Legislativo do Congresso Nacional; Anita Melo, representando o Deputado Federal Paulo Rocha – companheiro que também está tentando solucionar esse problema, mas teve que ir a Belém e não pôde comparecer; Dirceu Carlos da Silva, Secretário de Agricultura do Município de Santana do Araguaia; eu e alguns assessores como Alfredo Júnior, e assessores do Ministro, cujos nomes não gravei.
Sr. Presidente, fomos tratar de uma questão interessante, que mostra a desorganização do Governo: a Fazenda Vale do Cristalino, antiga fazenda da Volkswagen, que tomou conta de 140 mil hectares no Pará, há muitos anos, e onde foram feitas derrubadas astronômicas, que chamaram a atenção do mundo, para transformar em pasto e, depois, foi praticamente abandonada.
O Presidente Fernando Henrique e o próprio Ministro da Reforma Agrária, no ano passado, assinaram um decreto de desapropriação dessa fazenda. Hoje em dia, em toda propriedade na nossa região, se o proprietário vacilar, não estiver ali trabalhando e produzindo, os colonos entram. Quando o Governo assina um decreto de desapropriação, praticamente assina a ocupação, porque a demanda por terra é tão grande que, imediatamente, ela passa a ser ocupada.
Pois bem, foi o que aconteceu com a Vale do Cristalino. Há informações de que o próprio proprietário tinha interesse em que os trabalhadores ocupassem a terra, ou até estimulou a ocupação da terra para que ele pudesse ser desapropriado pelo INCRA. É possível que isso seja verdade.
A ocupação aconteceu, na verdade, depois da assinatura do decreto de desapropriação. Portanto, o INCRA não pode, em nenhuma hipótese, justificar que a ocupação foi premeditada, foi pensada e ajudada pelo próprio proprietário. Pode ter sido, mas não redime o INCRA do erro e o próprio Presidente da República de ter assinado o decreto de desapropriação da área e, depois, de ter abandonado a idéia.
O problema que se seguiu à desapropriação foi que a Indústria Nuclear Brasileira disse que lá existe urânio que aflora à terra e que, portanto, pode trazer risco à vida das pessoas ali assentadas. E que, em função disso, o processo de criação de assentamento e de desapropriação seria definitivamente paralisado.
Não queremos saber se vão ser desapropriadas as Fazendas Cristalino, Manah, Caps, ou qualquer outra. O que queremos, o que nos interessa resolver é o problema criado pelo Governo. Uma fazenda de 140 mil hectares é uma grande fazenda, com infra-estrutura imensa, como a de uma pequena cidade, com escolas e televisão. Quando acontece um processo desse, no momento em que o povo vive desempregado, sem oportunidade de vida, de trabalho, sem nenhuma condição de atender a necessidade de sua família, as pessoas percebem a oportunidade de ter um pedaço de terra para morar, produzir e trabalhar e correm para ela. Trabalhadores de toda a região sul do Pará, Rio Maria, Redenção, Pau D’Arco, Santana do Araguaia - Município este onde está a fazenda -, Santa Maria das Barreiras, Cumaru do Norte, para lá se encaminharam.
A notícia se espalhou. Há pouco tempo, inclusive, foi publicada em uma revista - não sei se IstoÉ ou Veja -, citando o nome de um cidadão que seria filiado ao PSB. Isso é uma absoluta inverdade. Eu não sei quem é esse cidadão e ele nunca foi filiado ao meu Partido. Fiz questão de investigar. Seria o caso de o Governo Federal solicitar à Polícia Federal que encontre esse cidadão, interrogue-o, porque ele andou espalhando em uns seis Municípios da Região que o povo poderia se deslocar para a Fazenda Vale do Cristalino. E o povo, vendo a oportunidade, efetivamente, se deslocou para lá.
Estão lá, hoje, 800 famílias de trabalhadores e, a cada dia, chegam mais. Os trabalhadores já estão fazendo as suas roças, as suas derrubadas, já estão se preparando para queimar suas roças. Lá não há alimentos para esses trabalhadores. Os Prefeitos, que já são pobres e que não têm dinheiro para nada, estão se sacrificando para que as pessoas não morram por falta de assistência à saúde. Eles estão sustentando aquelas pessoas naquela região.
E o mais interessante de tudo isso é que agora a INB diz que não se pode fazer essa desapropriação porque tem urânio na área.
Solicitei, então, ao Ministro Raul Jungmann, que muito delicadamente nos atendeu, e ao Ministro Sardenberg que nos reuníssemos para tratar da questão. Nessa reunião, o Dr. Roberto Franca, Presidente da INB, Indústria Nuclear do Brasil, disse que realmente havia risco, porque é um minério de urânio muito rico, aflora à terra e, se pessoas construíssem casas com esse tipo de material, poderiam aspirar um determinado gás nocivo à saúde. Não é uma questão de radiação em si. É algo muito menos grave do que uma radiação, mas de qualquer forma poderia trazer risco à vida das pessoas.
Argumentei, então, que considerava interessante que estivessem trazendo esse problema porque, ao lado da Fazenda Vale do Cristalino, havia sido colocado um assentamento denominado Pau Brasil, que eu e o Diretor de Assuntos Fundiários do INCRA, o Dr. Pimenta, tivemos o prazer de inaugurar. Os trabalhadores lá assentados deram o nome de Dr. Pimenta ao assentamento em homenagem a ele. Foi inaugurada uma placa com o nome do Dr. Pimenta e de uma série de pessoas que trabalharam efetivamente para que aquele assentamento se concretizasse. Foi um agradecimento. Eu, inclusive, fui uma dessas pessoas a quem os colonos agradeceram pelo assentamento, encostado à Fazenda Vale do Cristalino, exatamente sobre a área mais perigosa. Por quê? A existência de urânio está prevista em apenas 3% da área total daquela fazenda.
Quero mostrar que há desorganização, incompreensão e negligência com relação ao acompanhamento do processo pelo Governo, que vem tratando essa questão do urânio desde 1974. Era uma área ampla, que foi sendo reduzida até que se tornou bem pequena.
Na reunião, chegamos ao entendimento final. Já foi contratada uma empresa, responsável pelo levantamento aéreo via satélite, para identificar os minérios. Nesse levantamento, que demandará 120 dias aproximadamente para sua conclusão, é usado um sensor que define cada minério e o local em que se encontra. Os dois Ministros disseram que, para a análise da área, são necessários mais dois meses e outros dois meses para que o Governo determine que áreas não podem ser ocupadas pelas pessoas. Essas áreas, segundo informações, são muitos pequenas e, portanto, não influenciarão no processo de assentamento das demais pessoas.
A reunião terminaria nesse ponto, mas, coloquei que o levantamento deveria ser feito, definindo-se a área com urânio e a que representaria risco para os trabalhadores - alguns deles já estão assentados pelo próprio INCRA sobre a área de risco.
Quero saber o que será feito nesses quatro meses e o que acontecerá com as 800 famílias que lá estão e com as que chegam a cada dia a essa área. São essas questões que tenho que resolver como Senador da região.
Estiveram em Belém, nessa semana, os presidentes dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais de todos os municípios citados por mim aqui e várias lideranças dos trabalhadores. Não os levei a reunião, porque era uma reunião técnica, acompanhada apenas o Secretário de Agricultura do Município de Santana do Araguaia.
O Ministro Raul Jungmann demonstrou uma enorme preocupação. S. Exª disse não admitir que um trabalhador brasileiro corresse risco de vida; referiu-se, inclusive, às repercussões internacionais que tal fato poderia provocar. O Ministro preocupava-se com o que poderia acontecer se assentasse um sem-terra numa região com urânio, que poderia lhe trazer risco de vida. S. Exª mostrou-se muito sensibilizado e resolveu, de imediato, chamar o Governo do Estado do Pará, a Secretaria de Saúde do Estado do Pará, o Ministério da Saúde e colocar a sua equipe do INCRA para organizar a retirada das pessoas dos locais de maior risco, acomodá-las em acampamentos, dar-lhes cestas básicas enquanto se buscava um lugar seguro, em que elas pudessem ficar.
No meu entendimento, a reunião foi extremamente positiva, e agradeço aos Ministros Raul Jungmann e Ronaldo Sardemberger pela atenção e a compreensão da gravidade da situação não só em relação à questão urânio, mas também em relação ao conflito social na região. Espero que as ações sejam rápidas, porque a questão do levantamento está definida, devendo ocorrer em quatro meses. Mas o mais grave é a situação das famílias que lá estão, passando fome, necessidades, desordenadas, desorganizadas.
Quero registrar também que o Dr. Roberto Franca entendeu que os trabalhadores seriam assentados na área de capim.
O SR. PRESIDENTE (Lauro Campos. Fazendo soar a campainha) - Lembro ao nobre Senador que o seu tempo já ultrapassou em mais de dez minutos ao previsto pelo Regimento.
O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA) - Encerrarei em um minuto.
Só estou abusando, Sr. Presidente, por contar com a condescendência de V. Exª e também porque sou o último orador.
Os Ministros compreenderam a gravidade da situação e vão trabalhar para, de imediato, atender às necessidades daquele povo. Isso é tudo o que queremos. O problema da desapropriação, a forma como ela está sendo feita, se interessa ao dono da terra, se interessa ao Governo, não são esses os méritos que analisamos. O que estamos discutindo é o problema criado pelo próprio Governo, em virtude de dois erros cometidos, e que deve agir para resolvê-los.
São esses os motivos pelos quais faço esse registro aqui, expondo o que ocorreu naquela reunião. Espero ter sido absolutamente fiel aos fatos e que o Governador do Estado do Pará, o Secretário de Saúde daquele Estado, o Ministro da Saúde tomem conhecimento imediatamente do que estou colocando aqui.
O Ministro da Reforma Agrária afirmou que, em uma questão dessa, não há que se pensar em falta de dinheiro; ela é tão grave que temos que passar por cima disso e resolvê-la de qualquer maneira. Espero que isso aconteça.
Registro, repito, a minha satisfação em ver que as autoridades estão atentas ao problema. S. Ex as irão, evidentemente, resolvê-lo com a maior brevidade possível.
Solicito a V. Exª, mais uma vez, que seja registrado nos Anais desta Casa a resposta do Ministro da Aeronáutica ao meu pedido de informações.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Lauro Campos) - V. Exª será atendido na forma do Regimento Interno.
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