Pronunciamento de Bernardo Cabral em 03/09/1999
Discurso durante a 113ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
CUMPRIMENTO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA PELA ALOCAÇÃO DE RECURSOS ORÇAMENTARIOS PARA REATIVAÇÃO DO PROGRAMA CALHA NORTE.
- Autor
- Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
- Nome completo: José Bernardo Cabral
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SOBERANIA NACIONAL.:
- CUMPRIMENTO AO PRESIDENTE DA REPUBLICA PELA ALOCAÇÃO DE RECURSOS ORÇAMENTARIOS PARA REATIVAÇÃO DO PROGRAMA CALHA NORTE.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/09/1999 - Página 23244
- Assunto
- Outros > SOBERANIA NACIONAL.
- Indexação
-
- CRITICA, PLANO PLURIANUAL (PPA), INVESTIMENTO, POLITICA SOCIAL, AUSENCIA, INCLUSÃO, PROGRAMA, PROTEÇÃO, FRONTEIRA, REGIÃO NORTE.
- CUMPRIMENTO, RESPOSTA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, VERBA, DESTINAÇÃO, REATIVAÇÃO, PROGRAMA, PROTEÇÃO, FRONTEIRA, REGIÃO NORTE, IMPORTANCIA, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL.
O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Por uma razão muito simples, Sr. Presidente: há alguns dias, eu alertava o Governo no sentido de que ele estava escondendo-se dos desafios do futuro atrás das cortinas de omissão do presente. E referia-me exatamente ao Programa Calha Norte. Dava conta da denúncia que chegara ao meu conhecimento de que um técnico burocrata sugerira ao Tesouro Nacional a extinção do Programa Calha Norte, que já sofrera neste ano, na rubrica orçamentária, dotação zero.
Os discursos foram tendo seqüência, toda a Bancada da Amazônia já se referiu ao Programa Calha Norte. No entanto, recentemente, há alguns dias, dois eminentes Senadores que não fazem parte de forma geográfica - não da forma legal, mas da forma geográfica - da Amazônia, ocuparam a tribuna e se ocuparam deste assunto Calha Norte. Refiro-me ao eminente Senador Carlos Patrocínio e ao próprio eminente Senador Pedro Simon, que, em discursos candentes, chamaram a atenção para um vazio que compõe aquele nosso território, uma vez que ambos estiveram in loco acompanhando o trabalho do chamado Calha Norte.
Ora, Sr. Presidente, esse Programa evidencia que as fronteiras do Brasil não podem ficar à mercê das outras Amazônias porque é um equívoco se pensar que só existe a Amazônia brasileira. Esquecem-se os entendidos de que temos as Amazônias peruana, colombiana, equatoriana, aquelas sobre a qual, ao longo de todo aquele vazio, se comenta o problema de guerrilha e de narcotráfico. Essa denúncia foi feita porque, no Programa Plurianual, se deixou de completar o Programa Calha Norte, e a denúncia acaba de obter êxito.
Nobre Senador Geraldo Melo, pedi a V. Exª que me concedesse a palavra pela ordem porque, no instante em que se faz a crítica, que é construtiva, deve-se também registrar o resultado obtido. Estou tomando conhecimento de que o Presidente da República mandou destinar verba orçamentária própria no sentido de que o Programa Calha Norte não só não sofresse a sua extinção como fosse reativado. Como hoje há uma reunião do Alto Comando aqui em Brasília, e, evidentemente, não será para discutir o sexo dos anjos, estou quase que convencido de que, nessa grande reunião, que tem a responsabilidade dessa matéria, um dos assuntos será o Programa Calha Norte.
Faço esse registro na presidência de V. Exª, que, sendo do Nordeste, conhece os sacrifícios pelos quais passamos, para que haja uma espécie de toque de clarim para essas duas Regiões - a de V. Exª e a minha - eu não diria infelizes, mas quase rejeitadas. Até parece, Sr. Presidente, que, no cartório da cidadania, nós, do Norte e do Nordeste, não temos registro de nascimento com o mesmo valor das Regiões Sul e Sudeste.
Feito o registro, cumprimento quem teve a iniciativa e cumprimento o Presidente da República pela decisão, que, se efetivada, fará com que o Programa Calha Norte ressurja, saia como uma espécie de rejuvenescimento, com uma tônica maior para que a Amazônia continue sendo nossa.
Relembro o meu discurso de 30 anos atrás, Sr. Presidente, que virou lema do Projeto Rondon: “Em matéria de Amazônia, é melhor integrar para não ter de entregar.”
Obrigado, Sr. Presidente. Obrigado ao eminente Senador Pedro Simon.
O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Sr. Presidente, solicito a inscrição para uma comunicação inadiável.
O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Perfeitamente, Senador Tião Viana. Como interrompemos a lista de oradores para ouvir a palavra pela ordem do Senador Bernardo Cabral, V. Exª falará depois do próximo orador.
Por permuta com o Senador Casildo Maldaner, tem a palavra por vinte minutos o Senador Pedro Simon.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, todos nós, brasileiros, recebemos com muita emoção a proposta feita pelo Presidente da República sobre o seu novo plano de investimento.
Um trilhão de dólares, obras e mais obras. Avança Brasil! O Governo fez um esforço muito grande para demonstrar a sua vontade de crescer, de desenvolver, de fazer coisas concretas e positivas. Num momento em que há, de certa forma, um exagero de pessimismo, o Presidente Fernando Henrique reuniu a sua equipe, oxigenou a sua equipe e deu uma determinação: agora vamos fazer! Foi feliz e oportuna essa reunião, não que tenha sido marcada para responder, mas coincidiu com a Marcha dos 100 mil. Essa marcha aconteceu num momento, na minha opinião, histórico e de uma maneira pacífica, ordeira, democrática. Assim como também de uma maneira ordeira e democrática o Governo a assistiu, com as Forças Armadas garantindo a tranqüilidade sem nenhum ato de violência e demonstrando que, se “quando um não quer, dois não brigam”, quando dois não querem, não há problema nenhum. Foi uma aula de democracia o que aconteceu aqui.
A resposta foi dada lançando o Plano, e a Nação ficou a debatê-lo. A Oposição diz que parece um plano requentado pois, afinal de contas, há cinco anos, quando o Presidente da República se lançou candidato, com a imagem dos cinco dedos da mão, o que sobrou do Plano?
Esse era o debate que estava sendo travado. Mas o Governo, com firmeza, com convicção, com denodo, dizia: “O Plano é para valer.” São um trilhão de reais, obras e mais obras pelo Brasil inteiro; oito milhões de novos empregos, manchetes em todos os jornais, interrogação positiva em todos os locais.
O Presidente da República, com atraso, diz que reúne seu Governo para estabelecer - eu não me lembro o nome exato, parece que era Código de Ética - o código de ética do comando do Governo. Na minha opinião, uma coisa que não precisaria existir, pois as pessoas já deveriam ter ética. E, se é para ter, deveria haver desde o primeiro dia do Governo. Quatro anos e três meses depois, aparece o Código de Ética do Governo, cujo primeiro item é: “Ministro não pode criticar Ministro; deve haver um entendimento, deve haver um entrosamento entre os membros do Governo”. Na hora, sem analisar direito, achei até um certo exagero, afinal um Ministro pode criticar, não é um crime um Ministro discordar de outro publicamente, divergindo em alguns pontos. Isso faz parte da vida.
Atendi dez telefonemas desde às 5h45 de pessoas que estão querendo saber a minha opinião sobre quem tinha razão, o Clóvis ou o Malan. Ninguém se lembra mais do Plano, ninguém tocou em uma palavra sobre o Plano de Desenvolvimento. Desculpe-me, nobre Líder da Oposição, mas ninguém falou na Oposição. A Oposição perdeu todos os espaços. Era só Clóvis ou Malan. O Governo conseguiu ocupar todos os espaços, infelizmente de uma maneira cruel, de uma maneira incompreensível, de uma maneira injustificável. O debate é normal. O Sr. Malan defende uma política para conter a inflação, a estabilidade é fundamental. Temos que controlar para que não haja bolhas de desenvolvimento. Muita gente do PSDB, do PMDB e do PT acha que ele é exagerado nessa posição. Quer dizer que é necessário o desenvolvimento, o crescimento mesmo que se pague um preço, mas não pode haver recessão, desemprego só para garantir teses do Fundo Monetário: inflação zero, mas com recessão e desemprego?! O arrojo, as vezes é necessário. É outra tese.
Esse debate é normal. Conheço duas unanimidade no Governo Fernando Henrique: uma que o Presidente é um homem sério. Pode-se divergir do Presidente, pode-se até questionar o processo de privatizações, mas nunca ouvi alguém dizer que tenha alguma coisa a ver com o Presidente. Ele é um homem de bem. A outra unanimidade é que ninguém gosta do tal Dr. Clóvis. Havia uma unanimidade no sentido de que ele estava no lugar errado e que o Presidente Fernando Henrique não deveria tê-lo colocado na Chefia da Casa Civil.
Lembro-me que, outro dia, conversando com um jesuíta muito importante, disse-lhe que estava lendo a vida dos santos populares e tinha visto a diferença entre a vida do Santo com quem mais me identifico, São Francisco de Assis, e a vida de Santo Ignácio de Loyola. São Francisco de Assis procurava a humildade, procurava ser o servo mais humilde de Deus e se perdia no sentido de ajudar o seu semelhante, amando o sol, a lua, a natureza, os animais. Santo Ignácio de Loyola, primeiro, colocou em sua cabeça que seria santo. Nunca tinha visto isto: “Eu, Ignácio de Loyola, serei Santo!” E preparou uma Ordem para assumir o comando. Os jesuítas se imiscuíam, andavam por todos os lados e perguntavam quem tinham o poder - os reis. E os jesuítas eram os confessores do rei. Quando o rei ia se confessar, era um jesuíta que estava lá. Quando os homens das forças militares iam se confessar, era um jesuíta que estava lá. O próprio príncipe, quando ia se confessar, era um jesuíta que estava lá. E, assim, a Ordem cresceu, fazendo grandes Santos, grandes cientistas, pessoas que tiveram uma presença extraordinária. Todos dizem que os jesuítas têm qualidades fantásticas, mas têm defeitos muito sérios. Isso me dizia o jesuíta: “Temos qualidades imensas, mas temos muitos defeitos.”
Agora, esse Dr. Clóvis, que foi jesuíta, só não colocou a batina, ficou com todos os defeitos e não levou nenhuma das qualidades dos jesuítas.
Saiu o Sr. Clóvis, o povo aplaudiu, mas, como é amigo do Presidente, este lhe deu o cargo de Ministro do Planejamento. Ocorre que ele é o amigo do Presidente, é o homem que está há quatro anos e meio ao lado do Presidente, cercando-o. Não havia ninguém que pudesse chegar ao Presidente da República se não fosse por intermédio do Dr. Clóvis.
Quando o Senhor Fernando Henrique convidou o Richa ou o Scalco para ocupar o Ministério do Relacionamento Político, eles não aceitaram porque tinham que ser subordinados ao Dr. Clóvis. Então, disseram: “Não posso aceitar. Como é que eu vou fazer coordenação política se não tenho ligação direta com o Presidente da República? Vou fazer ligação com o Sr. Clóvis?”
Esse homem saiu dali pela exigência de todos e chegou ao Ministério do Planejamento. Ele é o homem da intimidade do Presidente. A convenção do PSDB deveria ser um grande momento para o Partido do Presidente, em que fossem debatidas teses internas. Sabemos que o PSDB tem essa tese interna. E há pessoas do PSDB - para quem bato palmas - que defendem a tese de que o desenvolvimento e a prosperidade são necessários e que o Sr. Malan é um pouco exagerado. No entanto, entre esse fato e o de o Sr. Clóvis usar a linguagem que usou com relação ao Malan, há uma diferença muito grande. Alguém que ficou quatro anos e seis meses ao lado do Senhor Presidente da República, inclusive participando de toda a campanha eleitoral; a quem nunca se viu defender qualquer idéia nesse sentido; a quem nunca se viu tomar posição, colaborar, ajudar, estimular o Presidente nesse sentido, de repente, porque ele considera uma tese simpática, porque o PSDB, na sua maioria, está pensando dessa forma, assim como a Oposição e a sociedade, ele vem com quatro pedras. Usa uma linguagem, sinceramente, incompreensível, dando a entender inclusive que a cautela, nessa altura, não tem outro nome a não ser covardia. Ele chamou o Sr. Malan, de corpo presente, de covarde. Infringiu o código de ética de Fernando Henrique!
Volto a dizer que considerei exagerado o fato de um Ministro não poder criticar o outro. Isso é um absurdo. Pode. Mas um Ministro chamar o outro de covarde?! Isso não é criticar; é ofender, humilhar.
Se o Malan é covarde, como o Fernando Henrique tem no seu Governo um covarde? Ou o Sr. Clóvis é um irresponsável? Se é assim, como o Senhor Fernando Henrique mantém no seu Governo um irresponsável?
O Sr. Antonio Carlos Magalhães, que pode ter todas as qualidades e todos os defeitos, não há dúvida, possui muita competência para responder. Perguntado sobre o que pensava a esse respeito, respondeu: “Isso vocês têm que perguntar ao outro Presidente”. Pensaram que era o Presidente da Câmara, mas o outro era o Presidente da República. É ele quem tem que responder.
Sr. Presidente, não quero fazer prognóstico. Eu dizia, na sexta-feira, que o Presidente da República, com a Marcha dos 100 Mil e com o seu plano de governo, tem uma página em branco na sua frente. Ele vai escrever o que serão os próximos anos, o que será o seu Governo, o futuro do País e o seu papel na história do Brasil.
O Presidente da República é um homem de bem. Mas, nesse momento, ou ele toma uma atitude, ou acabou. Amanhã, haverá crítica ao Serra; depois de amanhã, o Serra vai criticar não sei quem. Essa linguagem não vai mais parar. Dizer que não se pode criticar outro Ministro, que é proibido, considero um exagero. Mas chamar de covarde não é criticar. Se ele tivesse usado uma linguagem elegante, por exemplo: “olha, acredito, com toda sinceridade, que o Brasil tem que ousar mais; o Brasil tem que buscar mais o desenvolvimento. Está certo que a estabilidade financeira e econômica são importantes. É um dado positivo. Mas não podemos cumprir regras do Fundo Monetário; não podemos deixar de constatar que há recessão, que há desemprego, que há fome. Temos que ousar”. É uma linguagem. Mas o que ele fez tem outro nome: chama-se covardia!
O Presidente telefonou para o Sr. Clóvis. Perdoe-me, Presidente Fernando Henrique, não está em jogo o seu relacionamento, a sua amizade com o Clóvis. O Clóvis é seu amigo. Trabalhava no seu gabinete de Senador, trabalhava no seu gabinete de Ministro e foi para a chefia da Casa Civil. Não é isso o que está em jogo. O Presidente disse ao telefone: “Fiquei muito bravo com o Clóvis. O Clóvis não podia fazer isso comigo”. Que barbaridade! Não é isso que está em jogo. Está em jogo a sua autoridade. Ou o Presidente da República tem autoridade ou não tem. Não pode, de repente, em meio a um plano como esse, em um momento como esse, cair no ridículo por causa de um tal de Clóvis. Não pode! O Governo ou toma uma posição, ou cai no ridículo junto com o Sr. Clóvis. Ele que tome uma posição.
Eu demitiria o Sr. Clóvis e aproveitaria a oportunidade, já que ele deu a chance, de escolher um nome da confiança nacional, um nome que quisesse o desenvolvimento, se for o caso. Um homem que tivesse credibilidade, que tivesse a confiança e que satisfizesse a Nação. Seria uma grande oportunidade. Quer demitir os dois? Que o faça!
A imprensa está dizendo - e não acredito, pela intimidade que tem o Clóvis com o Presidente - que o Presidente é que está estimulando o Clóvis a fazer isso. Não aceito, não admito uma acusação dessa natureza contra a dignidade do Presidente. Não me passa pela cabeça que o Presidente faça esse tipo de fritura, que seria a mais imoral que se pudesse imaginar. Lançar o seu ministro às feras? Ninguém está sustentando o Sr. Malan. Quem o está sustentando no Ministério é o Presidente Fernando Henrique. Quer mantê-lo? Mantenha-o. Quer demiti-lo? Demita-o.
Não acredito. O que está na imprensa sobre ser o Presidente quem o está estimulando, que o Clóvis está falando em nome do Presidente, não acredito. Mas quer demitir o Malan? Demita-o . Quer demitir os dois? Demita-os. Quer dizer que o Sr. Clóvis está certo e que o Malan é covarde? Quer demitir o Malan e colocar o Clóvis na Fazenda? Pode até fazer isso. E eu voltaria a esta tribuna e diria: “Quero pedir desculpas, porque, na verdade, o Sr. Clóvis falou em nome do Presidente”.
O Presidente pensa que o Malan é covarde. É um direito seu. Ele deve saber mais do que eu e deve escolher um outro Ministro. O que não pode, Sr. Presidente, é isso ficar sem resposta.
Quando a imprensa procurar hoje o Fernando Henrique, Presidente da República, inclusive a mando do Sr. Antonio Carlos, o Presidente dirá: “Não, eu telefonei para ele. Ah, fiquei muito magoado com o Clóvis. Ele não podia ter feito isso”. Vamos parar um pouquinho! Trata-se de Presidente e Ministro. Houve um desafio público. O Sr. Clóvis desmoralizou o código de ética que o Governo implantou. Desmoralizou-o. Por quê? Eu diria: não cumpriu, violentou o código. Se ele tivesse criticado o Malan, se ele tivesse divergido publicamente de S. Exª, eu diria: “Mas por que não vão falar com o Presidente? Por que divergiram publicamente”? Não foi o que ele fez. Ele o agrediu, chamou-o de covarde.
A essa altura, ou há ou não há covardia. Não é a Oposição, não é o Pedro Simon, não é a imprensa. Ninguém colocou a questão nesses termos. A imprensa, a Oposição, o PSDB estavam colocando em termos de duas teses, respeitando o Malan, que estava agarrado na estabilidade. Ele dizia: “Temos que ter muito cuidado, porque, de repente, por causa das pesquisas, que deixam o Presidente mal, queremos aparecer demagogicamente, seja lá o que for. E, de repente, estoura tudo”.
O Sr. Clóvis embarcou agora para ganhar aplauso na reunião do PSDB. Foi bancar o bacana e chamou o outro de covarde!
O Presidente da República tem que responder. Ele não sai incógnito desse problema. Aquela história que se diz que o Presidente fica naquela de aguardar, de olhar e de não fazer, esse é o momento definitivo para reverter os fatos. Ou ele toma uma decisão - quem manda é o Presidente -, ou não toma. E, na próxima crise, quando a imprensa procurar o Antonio Carlos Magalhães, não sei a quem o Antonio Carlos Magalhães mandará consultar. Provavelmente não será o outro Presidente.
O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - V. Exª me permite um aparte?
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Com o maior prazer.
O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Senador Pedro Simon, sem nenhuma dúvida, o fio condutor filosófico do seu discurso é a autoridade. Quando V. Exª aborda esse tema o faz com várias credenciais. A primeira, a de quem exerceu a chefia do Poder Executivo. Tendo sido Governador, V. Exª deve ter passado por esse drama de Secretários que têm ciúme uns dos outros, que demonstram poder mais do que os outros. V. Exª também foi Ministro de Estado. Não vejo a presença de V. Exª na tribuna senão como uma crítica construtiva, fazendo uma análise - eu não diria corajosa, porque isso é intrínseco em V. Exª - de quem quer contribuir para o momento difícil da vida do Presidente da República. Conto a V. Exª uma passagem que conheço de um Governador do Nordeste. Moço, assumiu o Governo e convidou um dos talentosos homens do Nordeste para ser o seu Secretário. E era um super-secretário: brilhante, poderoso, forte. Lá pelas tantas, disseram ao Governador que tomasse cuidado porque ele era um trator, que é o que se costuma dizer quando um ministro ou um super-secretário é forte. Esse jovem Governador respondeu que o secretário era um trator, que o trator pode funcionar bem, mas só se tiver um tratorista melhor. E esse tratorista - sou obrigado a revelar o nome porque, senão, parecerá que estou criando essa história -, é o nosso Presidente Geraldo Melo, quando Governador do Rio Grande do Norte. S. Exª mostrou autoridade com o super-secretário. Quando V. Exª menciona a palavra covarde, lembro-me de Victor Hugo, dizendo textualmente que “os covardes se assemelham à luz das velas, iluminam mal porque tremem”. Veja que essa sua dissertação política, com o efeito de contribuição, na manhã de hoje, só merece aplauso do Senado. Tenho ouvido os discursos de V. Exª, ouço-os com a alegria de sempre. E vejo que há vários discursos V. Exª declara que o Presidente da República precisa falar com determinadas pessoas, e V. Exª as enumera; e sempre que as enumera, eu, aqui da minha bancada, acrescento o nome de V. Exª. Sua Excelência o Presidente da República precisa conversar mais com quem tem independência para falar. Aplaudo a forma como V. Exª abordou o assunto, que não é a forma caricata, mas a construtiva, como, aliás, é um traço característico dos discursos de V. Exª
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Eu agradeço profundamente emocionado a V. Exª pelo aparte. Emocionado, porque V. Exª, com a sua competência e com a sua seriedade, dá ao meu pronunciamento a conotação que eu gostaria de dar. É exatamente esta que V. Exª está dizendo aqui. E acrescento: quando faço crítica, não estou fazendo aí nenhuma crítica ao Presidente Fernando Henrique Cardoso. Eu estou criticando o Dr. Clóvis Carvalho. Poderei voltar a esta tribuna, no futuro, para criticar o Presidente, conforme a decisão que Sua Excelência tomar. Mas, neste momento, eu não posso acusar o Presidente de nada, apenas me solidarizo com o Presidente pela agressão grotesca feita pelo Sr. Clóvis Carvalho. O Sr. Clóvis Carvalho, ex-Chefe da Casa Civil, foi para o Ministério do Planejamento sem nenhuma história, não tinha um parlamentar, Sr. Presidente, do seu partido, o PSDB - para não dizer de outro partido - que indicasse o nome dele. É o caso da amizade
Eu não sei o que vai ser da minha vida, Sr. Presidente. Mas eu já fui Governador. E, naquela época, no meu Governo, não houve ninguém que ocupasse qualquer cargo que fosse meu amigo. Ninguém. Surpreendi muita gente, escolhendo dentro do MDB pessoas honradas, dignas, mas pessoas que tinham certas mágoas com relação a mim, e que eram competentes. E o pessoal não entendeu: “Mas e o Fulano que é íntimo, que é amigo dele? E o Beltrano, que é íntimo, não vai? E ele escolhe o Beltrano?
Governo não é para ser casa de amigos; é casa dos mais competentes. O Sr. Clóvis está ali somente porque é amigo! E não é um amigo de quem todo mundo gostava, de quem se dissesse: “Não, é um amigo, mas é um cara bom.” Não. É um amigo, que era amigo, de quem todo mundo dizia: “Mas que cara! Como é que esse cara está lá?” Daqui, dou minha solidariedade ao Presidente. Ele foi traído, ele não merecia o que recebeu por parte do Sr. Clóvis Carvalho.
Eu não considero o Sr. Malan uma pessoa covarde; considero o Sr. Malan um homem de bem. Olhem, eu meço as palavras. Quando tenho que agredir, agrido, mas meço as palavras. Ele é um homem de bem. Posso discordar da condução da economia, da privatização - creio que foi equivocada a forma de se fazer as privatizações. Porém, não posso pensar que o Sr. Malan seja covarde. Não me parece que ele seja covarde. Ele é um homem de bem. Porém, agora, cabe ao Presidente falar sobre esse assunto.
Marina?!
A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Permite-me, V. EXª, um aparte?
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Perdoe-me a intimidade. Concedo o aparte à ilustre Líder, Senadora Marina.
A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - V. Exª é um amigo, e os amigos se referem com intimidade. Senador Pedro Simon, parabenizo V. Exª pela oportunidade do pronunciamento que traz nesta manhã de sexta-feira. Com certeza, não teria muito a acrescentar às observações de V. Exª, até porque V. Exª, como um homem de experiência na política, consegue adentrar a geografia do Governo com muito mais competência que eu. Porém, quero apenas ressaltar o fato de que, muitas vezes, vejo o Governo e o próprio Presidente utilizarem-se dos meios de comunicação para fazer críticas a sindicalistas, a pessoas que em momentos difíceis - porque estão perdendo emprego ou estão com problemas salariais, decorrentes de cortes na área social - fazem discursos, às vezes, apimentados. E, por mais apimentados que possam ser os discursos dos sindicalistas, talvez não tenham condições de concorrer com o que está sendo relatado agora por V. Exª e que está vindo à tona nos meios de comunicação. Aliás, isso não é novidade, porque já ocorreu por ocasião de uma divergência entre o Ministro José Serra e o nosso colega, aqui do Senado, Waldeck Ornellas, quando houve uma troca de “gentilezas” - V. Exª lembra disso - bastante forte. Naquele momento, com certeza, já estava sendo exposto ao País uma certa fragilidade no trato. Não concordo com a idéia...
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Foi por causa daquele fato que saiu o Código de Ética. Agora, isso aconteceu depois do Código. Naquele momento, não havia o Código de Ética.
A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Exato! O Código de Ética veio em socorro daquele comportamento político dos dois Ministros e de um outro comportamento político dos Ministros: o de pegar carona nos aviões da FAB para Fernando de Noronha.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - O primeiro foi o Clóvis.
A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Exato!
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Quem iniciou foi o Clóvis. Ali, eu já o teria demitido.
A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Agora, volta ao centro da cena. Mas comparar o que esta sendo hoje a briga dos dois Ministros, um chamando o outro de covarde, aos pronunciamentos fortes - e sei que são fortes politicamente, mas respeitosos no seu conteúdo - da minha querida e aguerrida Senadora Heloísa Helena, são como que observações de uma lady em relação ao Governo, porque ele assume a dianteira ao fazer as críticas apimentadas no mal sentido, porque no bom sentido é aquele sentido combativo do movimento social. Nos níveis em que ocorrem, talvez somente o Governo, por conhecer as suas entranhas e por seus membros se conhecerem entre si, é que teria essa capacidade de fazê-las. Causa-me espécie, realmente, observar que, preocupado em ter frases de efeito para responder a sindicalistas e em dar respostas a algumas Lideranças da Oposição, dentro do próprio Governo ocorra esse tipo de comportamento. A meu ver essa atitude demonstrar que, quando há propostas e projetos políticos sem conteúdo e quando os governistas querem continuar no poder a qualquer custo, só lhes resta um caminho, que é o de verbalizar determinadas posições, nem sempre construtivas para o nosso País.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço a V. Exª pelo honroso aparte. Quero, com base no aparte de V. Exª, continuar a minha exposição, nobre Líder.
Sr. Presidente, quando alguém da Oposição diz que temos que cuidar do desenvolvimento, produzir, prosperar, crescer; que este País está parado, que temos que fazer mais escolas, dar comida para ao povo e não sei mais o que, o que responde o Presidente Fernando Henrique, como respondeu ao Boris Casoy há pouco tempo: “Isso é demagogia! Se nós não temos condições, se nós não temos um orçamento equilibrado, se nós não temos condições de progredir e crescer, ir para o povo e dizer que tem que distribuir a riqueza, tem que dar dinheiro. Isso é demagogia!” É o que o Presidente Fernando Henrique diz dos Líderes da Oposição. Demagogia foi o que o Sr. Clóvis Carvalho fez na reunião do PSDB, na cara do Ministro da Fazenda. Ou não foi?
Quero ser muito sincero, Sr. Presidente. Que bom se eu estiver completamente errado. Saiu uma nota do Presidente da República que diz o seguinte:
1 - Quero dizer que o Sr. Clóvis Carvalho está certo;
2 - Quero dizer que o Pedro Malan -- Sua Excelência não usaria o termo ‘covarde’ -- tem precaução demais;
3 - Reconheço que a estabilidade já está garantida;
4 - Tem razão o Clóvis Carvalho. Vamos entrar em um plano de desenvolvimento para valer.
Que bom. Viva! Volto a esta tribuna para dizer: “- Dr. Clóvis Carvalho, V. Exª me desculpe. Dr. Pedro Malan, passe bem.” Mas alguma coisa Sua Excelência tem que dizer.
Como disse a nobre Senadora Marina Silva, quando é alguém da oposição que fala, é demagogo. Dizem: “- Olha aí, estão falando! É muito fácil fazer propostas, unir-se à Marcha dos Cem Mil e dizer que vão fazer isso e aquilo! É demagogia. Não dá para fazer se o Governo não der condições.” Pois o que o Sr. Clóvis Carvalho fez foi demagogia. O que S. Exª fez na reunião do PSDB foi demagogia. Se não foi demagogia, se o que S. Exª disse está certo, viva o Clóvis Carvalho! E esse Pedro Malan deve ir para o inferno, porque está atrapalhando a nossa vida.
Quanto ao que V. Exª disse, nobre Líder Marina Silva, sobre a nobre Senadora Heloísa Helena, quero dizer que S. Exª pode não ser uma lady na maneira de se vestir, pode não usar traje de gala, mas, mesmo usando calça jeans, S. Exª é uma lady no espírito, nas idéias e em sua brilhante batalha em defesa da sociedade brasileira.
Eu não estou criticando o Presidente. Ora, quando eu era Governador, meus companheiros de Partido e de Governo às vezes não entendiam se eu chamava um deputado do PT ou um deputado radical para conversarmos. Quando fui Governador do Estado do Rio Grande do Sul houve uma união histórica entre a esquerda radical e a direita radical -- PT, PDT, PDS e PFL -- contra o Pedro Simon. Uniram-se contra o tal de Pedro Simon, que deveria ser uma desgraça! Às vezes, eu chamava o adversário mais radical, fechava a porta e perguntava-lhe: “- O que é que você está dizendo?” E ele respondia: “- Olha, Governador, é isso, mais isso, mais isso.” E eu perguntava: “- Tu tens prova disso?” E ele respondia: “- Investigue aqui, aqui e aqui.” E eu ia investigar. Demiti gente por causa de pronunciamento de líder da oposição na tribuna da Assembléia Legislativa. E eu agradecia quem havia feito a denúncia.
Então, nesta hora, o Presidente da República tem de dar uma resposta. Se o Clóvis está certo, se o Malan está errado, Sua Excelência que o diga! Primeiro, Sua Excelência vai agradar o seu Partido. Se o Presidente Fernando Henrique demitir o Malan e disser que o Clóvis está certo, e que vai adotar uma política de desenvolvimento, os primeiros que vão vibrar e gritar viva são os componentes do PSDB. Mas Sua Excelência que o faça.
O que não pode acontecer é o que está aí, é a ironia do Sr. Antonio Carlos: “- Olha, a isso eu não posso responder. Vá falar com o outro Presidente”. E Sua Excelência não fazer nada.
A página em branco continua na frente do Presidente. Rezo a Deus, do fundo do meu coração, para que Sua Excelência tenha a felicidade de tomar uma decisão, que pode magoar, que pode atingir pessoas - e por isso Sua Excelência é um presidente reeleito -, porém ele não pode perder a autoridade no seu governo.
O Presidente lançou um plano revolucionário na quarta-feira: um trilhão de reais, oito milhões de novos empregos. Há interrogações sobre esse plano, para o sucesso do qual tem que haver muita autoridade, muito poder, muita energia. Se, no primeiro dia após o plano, o Clóvis chama o Malan de covarde, sinceramente, não sei como vai terminar.
Muito obrigado, Srª Presidente.