Discurso no Senado Federal

REFLEXÃO SOBRE A MANIFESTAÇÃO NACIONAL DENOMINADA 'O GRITO DOS EXCLUIDOS'.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • REFLEXÃO SOBRE A MANIFESTAÇÃO NACIONAL DENOMINADA 'O GRITO DOS EXCLUIDOS'.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/1999 - Página 24068
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, AMBITO NACIONAL, PARTICIPAÇÃO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), DEMONSTRAÇÃO, SOLIDARIEDADE, BUSCA, JUSTIÇA SOCIAL.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, PAIS, PREDOMINANCIA, DESEMPREGO, MISERIA, AUMENTO, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE.
  • COMENTARIO, POSSIBILIDADE, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, PAGAMENTO, DIVIDA EXTERNA.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu não poderia deixar de registrar, até porque não tive a oportunidade de fazê-lo ontem, a belíssima manifestação que ocorreu em todo o Brasil, chamada O Grito dos Excluídos. Foi um momento muito importante. Com certeza, as duas palavras de ordem - tanto as do ano passado, "Aqui é o Meu País", como as deste ano, "Um Filho Teu não Foge à Luta" - demonstram a grande capacidade de reação da maioria do povo brasileiro, articulado por forças vivas da sociedade, como a CNBB e o Movimento Evangélico Progressista.  

Enfim, esse foi um grito não de guerra, mas de amor, de solidariedade, de fraternidade, de busca pela justiça social. Acima de tudo, o que vimos - que certamente pôs medo, muito medo, à elite política e econômica, desde a Marcha dos 100 mil - foi uma voz sufocada do povo se levantando do chão, brotando feito flor do chão árido, em todas as cidades deste Brasil.  

Tratou-se de um conjunto de atividades em mais de mil cidades, convergindo para uma grande mobilização nacional. Sua realização foi construída coletivamente. As parcerias aconteceram da forma mais ampla, plural e respeitosa possível com todas as forças vivas da sociedade, num esforço que ocorreu desde a elaboração e preparação até a realização do Grito dos Excluídos, num belíssimo mutirão nacional.  

O Grito dos Excluídos ocorre num momento de descontentamento da população, de dor, de sofrimento, de angústia, devido à situação de desemprego, miséria, corrupção e impunidade.  

Diante da realidade de fome, desemprego e exclusão, existem muitas alternativas que estão sendo construídas coletivamente. Há lutas populares por todo este País: a Marcha dos 100 mil pelo Brasil, dizendo não à política de Fernando Henrique Cardoso, dizendo não à subserviência e à covardia diante do capital especulativo internacional, com a presença de centenas de movimentos de todo o nosso País; a Marcha Popular pelo Brasil; a Marcha pela Educação pública gratuita, democrática e de qualidade; a Marcha do Movimento dos Sem-Terra. Todas essas marchas contam com a participação de vários setores da sociedade.  

O Grito dos Excluídos apontou para uma unificação das lutas, com parcerias permanentes na construção do novo pensar e agir em sintonia com as iniciativas locais, vislumbrando sempre um projeto nacional para o Brasil onde existam, de fato, justiça e igualdade.  

A Coordenação Nacional do Grito dos Excluídos lançou também algo que é belíssimo e de fundamental importância para que possamos fazer deste País uma verdadeira Nação: o plebiscito, que se inicia agora, contra o pagamento da dívida externa e o plebiscito que busca unificar as lutas de todos os povos excluídos do mundo com o Grito dos Excluídos mundial.  

É mais democrática uma sociedade que consulta os seus cidadãos sobre os caminhos a seguir, pelo menos nas questões mais importantes e que mexem diretamente com a vida dos povos e das populações. Estamos numa sociedade pouco democrática. A maioria das decisões está sendo tomada diretamente pelo Governo, e sua aprovação pelo Congresso Nacional, em muitos momentos, é marcada pela troca de favores, pelo fisiologismo, pelo clientelismo. E os interesses legítimos da sociedade são deixados à margem dessas negociações. Em muitos momentos, estamos longe da democracia.  

É por isso que temos a obrigação de usar a nossa voz, a nossa responsabilidade de cidadãos, para fazermos com que a democracia avance em nosso País. É por isso que, com certeza, faremos o plebiscito popular sobre a dívida externa já no próximo ano, com a participação de todos os povos excluídos do mundo todo. Cabe a nós, como cidadãos soberanos, a responsabilidade histórica de convocar esse plebiscito e de convocar todos os cidadãos, inclusive os governantes, os políticos eleitos para cargos legislativos e os juízes, todos os que estão comprometidos com a construção de uma Nação justa, igualitária, fraterna e solidária, para que ajudem a escolher os caminhos mais corretos para se enfrentar o endividamento do Brasil.  

Essa decisão é fruto de uma longa caminhada. Está ligada à 3ª Semana Social Brasileira e, de um modo muito especial, ao Tribunal da Dívida Externa. O julgamento da dívida, feito por milhares de entidades não apenas do Brasil e da América Latina, mas também de diversos países explorados do mundo, confirmou em nós, que temos ao menos bom senso, independentemente das nossas convicções ideológicas, a certeza de que, além de ser matematicamente impagável, ela é imoral, injusta e ilegal. Os custos sociais do nosso endividamento são inaceitáveis, e é por isso que as dívidas externa e interna estão por trás do atraso das nossas políticas sociais, aumentando o peso da exclusão que leva ao desespero, ao suicídio, à marginalidade e à morte de milhões de brasileiros.  

São inaceitáveis, pela mesma razão, as decisões políticas dos últimos Governos federais e, em especial, do Governo atual. Elas absolutizam a economia, colocam o País nas mãos do capital financeiro internacional. Com dívidas feitas para renegociar as dívidas já existentes e para manter crédito junto aos credores, o País tornou-se refém dos juros mais altos do planeta. Isso comprometeu as riquezas, a inteligência e a soberania da Nação.  

O próprio povo é objeto de troca dessa dívida. O desemprego crescente nos é imposto como estratégia para facilitar exportações que deveriam financiar nosso endividamento. Na realidade, ficamos sem empregos, sem exportações, sem coisa alguma para oferecer como aval, sem crédito.  

Resta-nos aceitar esse enforcamento comandado doentiamente pelos detentores do poder político do Brasil e pelos grandes especuladores internacionais? Não! Várias mobilizações populares e sociais não aceitam essa imposição como se fosse um simples destino e apresentam propostas diferentes para o nosso País.  

Exatamente por isso estamos todos convocados. Estão convocados os que não se dobram, os que não se curvam e os que não se ajoelham covardemente para trabalhar em favor da organização do nosso plebiscito, cuja preparação se inicia a partir desta semana. Que possamos viver o lema do nosso Grito dos Excluídos, aquilo que está expresso no Hino Nacional. Alguns sabem sua letra, mas não a cumprem e não defendem o seu País, a construção de uma Nação.  

Portanto, parabéns a todos que foram à praça pública no dia do Grito dos Excluídos, a todos que, nas mais diversas atividades, conseguem dizer: "Um filho teu não foge à luta" e "Aqui é o meu País, aqui é o nosso País". Parabéns a todos que participaram desse belíssimo momento nacional juntamente com a Igreja Católica, o Movimento Evangélico Progressista, o MST, a CUT e a Contag, enfim, com todas as forças vivas da sociedade que querem fazer deste País uma verdadeira Nação e não um anexo do Fundo Monetário Internacional.  

 

cum þ


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/1999 - Página 24068