Discurso no Senado Federal

DEFESA DE PROJETO DE LEI QUE ESTABELECE NORMA PARA DEFINIÇÃO PELO GOVERNO FEDERAL DE LINHA OFICIAL DE POBREZA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • DEFESA DE PROJETO DE LEI QUE ESTABELECE NORMA PARA DEFINIÇÃO PELO GOVERNO FEDERAL DE LINHA OFICIAL DE POBREZA.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/1999 - Página 24360
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, CONFLITO, FUNDAÇÃO ESTADUAL DO BEM ESTAR DO MENOR (FEBEM), AUMENTO, VIOLENCIA, DEMONSTRAÇÃO, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO SOCIAL, BRASIL.
  • DEFESA, PROJETO DE LEI, ESTABELECIMENTO, NORMAS, DEFINIÇÃO, POBREZA, CONSCIENTIZAÇÃO, SOCIEDADE, CONGRESSO NACIONAL, GOVERNO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, PROGRESSO, ERRADICAÇÃO, SITUAÇÃO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Carlos Patrocínio, nesses últimos sábado e domingo, nova rebelião aconteceu na Febem da Imigrantes, na zona sudeste de São Paulo. Essa foi a maior da história da instituição.  

De acordo com a Presidência da Febem, 644 menores fugiram. Até ontem, 317 haviam sido recapturados e 327 continuavam foragidos. O número de fugitivos representa 45% do total de 1.430 internos do complexo antes da rebelião. Até então, a maior fuga havia ocorrido em novembro de 1997, com 494 fugitivos da Febem da Imigrantes.  

Sr. Presidente, estive na unidade da Febem, juntamente com o Professor Paulo Sérgio Pinheiro, do Núcleo de Estudos de Violência da USP; o Padre Júlio Lancellotti; o médico João Baptista Breda, ex-Deputado Estadual, e inúmeros outros membros da Comissão Teotônio Vilela. Estive também com os Deputados Paulo Teixeira e Renato, da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de São Paulo, além de Jamil Murad.  

Sr. Presidente, ficamos extremamente preocupados com a situação da Febem. Há cerca de dois meses, tínhamos estado na unidade da Febem do Tatuapé, onde vimos a dificuldade que o Governo do Estado de São Paulo, os responsáveis pela Febem têm tido diante da superlotação, que tem caracterizado o número de internos em cada uma das unidades da Febem e, em especial, nessa unidade.  

Conversamos com os menores que estavam lá, na tarde de domingo, com os monitores, com os funcionários, com os diretores e também com o próprio Presidente da Febem, no caso o Sr. Guido Antonio Andrade, que orientou os diretores e os chefes de Unidade por telefone, preferindo não estar lá, de corpo presente, para averiguar a gravidade daquela situação.  

Ora, Sr. Presidente, no diálogo que mantive com cerca de 100 menores, que se sentaram no chão depois de o Padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Menor, ter rezado um Padre Nosso com eles, acalmado-os diante daquela angústia, daquela preocupação, cada um deles pôde, com relativa calma, explicar o que havia acontecido. Muitos deles se queixaram de maus tratos, de inúmeras vezes terem os monitores batido neles com madeiras, com cotoveladas e com os mais diversos tipos de instrumentos. O que pudemos notar nos rostos e na aparência daqueles jovens é que todos eles eram oriundos de famílias extremamente carentes. Pudemos confirmar isso no diálogo com suas mães e pais, angustiados na porta daquela unidade da Febem da Imigrantes.  

Certamente, Sr. Presidente, o agravamento da violência, que faz com que tantos adolescentes acabem seguindo o caminho da criminalidade, cometendo delitos, assim como, ainda na semana passada, jovens de 15, 16, 17 anos desceram dos morros do Rio de Janeiro para fazer arrastões nas ruas e nas praias de Copacabana e de Ipanema, levando tudo aquilo que podiam encontrar pela frente, aos gritos, em danças, em correria, tudo isso denota o agravamento da situação social no Brasil.  

Não é à toa que, ainda ontem, o próprio Ministro-Chefe da Casa Militar, General Alberto Cardoso, registrou que a desigualdade social e a inadequação do aparelho policial às exigências da sociedade são apontadas como as principais responsáveis pela crise na segurança pública. Então, se o próprio Ministro-Chefe da Casa Militar constata que a desigualdade social constitui um dos principais fatores para o aumento da violência, por que será que o Governo Fernando Henrique Cardoso tem sido tão lento em promover as medidas que possam transformar o Brasil, transformar esse quadro de desigualdade que nos desonra?  

Ainda hoje, a Folha de S.Paulo informa que cerca de 8,6 milhões de pessoas estão sem receber cestas básicas desde julho, devido aos cortes promovidos no Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos, em função dos ajustes que as autoridades econômicas estão fazendo.  

Ora, Sr. Presidente, se o Governo está cortando as cestas básicas, seria próprio que estivesse colocando em seu lugar outros instrumentos de política econômica de maior racionalidade, como a garantia de uma renda mínima para todos os cidadãos que, porventura, não alcancem aquele patamar suficiente a suprir suas necessidades vitais.  

Ainda ontem, no seminário promovido pelo BNDES sobre como erradicar a pobreza e promover maior igualdade e justiça social, tive oportunidade de colocar a importância de termos, no Brasil, a definição de uma linha oficial de pobreza, e de o Governo Federal, que, com o auxílio do IPEA e do IBGE, iria definir qual seria essa linha oficial de pobreza, ao mesmo tempo, transmitir à Nação, por intermédio de mensagens, pelo menos uma vez ao ano, qual o número de famílias e de pessoas que estão abaixo dessa linha oficial de pobreza e quais os instrumentos e metas para a progressiva erradicação da pobreza.  

Projeto nesse sentido, está tramitando na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, tendo recebido parecer, muito bem elaborado, do Senador Ramez Tebet. O Senador Bello Parga, por sua vez, pedindo vista do projeto, ao devolvê-lo à apreciação da Comissão, ofereceu parecer opinando pela sua inconstitucionalidade.  

Eu gostaria de registrar aqui que aguardo, com muita tensão, qual será a disposição do Governo, a orientação do Palácio do Planalto, com respeito a esse projeto, que não cria despesas; apenas estabelece uma norma para que o Governo defina essa linha oficial de pobreza.  

Qual é a utilidade dessa proposição? Tornar muito mais conscientes a sociedade brasileira, o Congresso Nacional, o Governo e os meios de comunicação a respeito de quais são os avanços realizados na direção de erradicarmos a pobreza.  

Não vejo qualquer sentido de inconstitucionalidade no referido projeto; ao contrário. Teríamos, aí; tipicamente um instrumento para facilitar o exame daquilo que é um objetivo fundamental do Brasil, conforme assinalado no art. 3º, inciso III, da Constituição, que registra "constituir objetivo fundamental da República Federativa do Brasil erradicar a pobreza e a marginalização e diminuir as desigualdades sociais e regionais".  

Assim, Sr. Presidente, eu gostaria de alertar os Líderes da base governamental – do PFL, do PSDB, do PMDB, do PTB e do PPB –, indagando de S. Exªs qual será a atitude que irão tomar.  

Ressalto que o Prêmio Nobel de Economia, James Tobin, recém-citado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, em suas obras, tem mostrado o quão importante foi, em diversos países, o estabelecimento de uma linha oficial de pobreza, para que toda a sociedade pudesse acompanhar melhor quais os progressos alcançados na erradicação da pobreza.  

Muito obrigado.  

 

áre


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/1999 - Página 24360