Discurso no Senado Federal

RECEBIMENTO DE NOTIFICAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL REFERENTE A INTERPELAÇÃO DO GOVERNADOR DE SÃO PAULO, SR. MARIO COVAS. (COMO LIDER)

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO ESTADUAL.:
  • RECEBIMENTO DE NOTIFICAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL REFERENTE A INTERPELAÇÃO DO GOVERNADOR DE SÃO PAULO, SR. MARIO COVAS. (COMO LIDER)
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/1999 - Página 24343
Assunto
Outros > ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • ANUNCIO, RECEBIMENTO, NOTIFICAÇÃO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), AUTORIZAÇÃO, RESPOSTA, INTERPELAÇÃO, MARIO COVAS, GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), GESTÃO, ORADOR, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ).
  • CRITICA, MARIO COVAS, GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUSENCIA, INTERESSE, SOLUÇÃO, PROBLEMA, CRESCIMENTO, VIOLENCIA, DESEMPREGO, IMPUNIDADE, REESTRUTURAÇÃO, PRIORIDADE, PAIS.
  • REMESSA, CARTA, AUTORIA, ORADOR, DESTINAÇÃO, MARIO COVAS, GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RESPOSTA, ACUSAÇÃO.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Como líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, agradeço a oportunidade de fazer esta importante comunicação ao Plenário.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje tive a honra de, finalmente, receber a notificação do Supremo Tribunal Federal para responder a uma interpelação do Sr. Mário Covas. Honra, porque nem todos têm o privilégio de serem interpelados por um trânsfuga da ética e da moralidade.  

O Governador explicitou divergências políticas durante a minha gestão no Ministério da Justiça, todas elas, sem exceção, geradas de interesses inconfessáveis que cobririam de lama a até então imaculada biografia do vetusto Governador paulista.  

O Sr. Covas parece não ter o que fazer em seu Estado: é o mais violento do País e, na sua gestão, conseguiu o impensável de superar outros Estados em violência e impunidade. Dói na alma, Sr. Presidente, humilha o País observar o abandono de São Paulo.  

São Paulo tem a maior média de fuga de presídios; vergonhosas cenas de tortura, mortes e rebeliões em unidades da FEBEM; pedágios estratosféricos; acaba de perder uma montadora e, conseqüentemente, empregos; vem presenciando um esvaziamento industrial; e o pior, Sr. Presidente: apenas 1,7% dos homicídios ocorridos em São Paulo são esclarecidos, ou seja, sua administração está afundando o maior Estado do País, e, por tudo isso, ele teve de enfrentar o desconforto de dividir estrondosa vaia, no 7 de Setembro, com o Prefeito Celso Pitta.  

Mas os ouvidos do Sr. Covas são estranhamente seletivos. Ele prefere dar atenção a fofocas e, covarde e por vezes anonimamente, propagar intrigas. Com tantos problemas para administrar, só o vejo alimentando fofocas no noticiário e tentando, como é de seu feitio, transferir responsabilidades. Um dia é comigo, outro é com o Presidente do Senado, outro com o Presidente da Câmara, quando a futrica não é dentro de seu próprio ninho.  

O Governador fica o dia inteiro tramando como fazer seu sucessor e como obter um passaporte de candidato viável à Presidência da República. A avidez desmedida o leva a querer governar o País antes do tempo e dos votos. O Sr. Covas fica tentando governar o próprio futuro, transforma esperança em desolação, e os milhões de moradores de São Paulo ficam à margem, na orfandade, no abandono.  

Esse senhor, que agora me interpela judicialmente, é o mesmo que, insistentemente, pediu-me no ano passado para gravar pronunciamentos a seu favor durante o horário eleitoral, na tentativa oportunista de vampirizar a visibilidade que adquiri no Ministério da Justiça. São as chamadas aproximações de conveniência, nas quais ele - reconheço - é um especialista.  

A coerência é verbalizada por muitos e praticada por poucos. Lembro-me de que um dia o Sr. Covas era socialdemocrata, fundou o PSDB, que agora ensaia abandonar. Tempos depois, já possuído pelo incontrolável desejo de chegar à Presidência a qualquer custo, pregou, aqui mesmo desta tribuna do Senado Federal, um tal "choque do capitalismo". Só hoje, depois de conhecer melhor seus interesses, é que comecei a entender realmente o que é o tal "choque do capitalismo". O caráter de uma pessoa pode variar proporcionalmente à dimensão de suas ambições. E as do Governador paulista não são nada modestas.  

Elas estão encarnadas na nomeação que ele, Mário Covas, fez para o Ministério da Justiça. As poucas providências foram no sentido de estadualizar as duas maiores licitações em curso naquela Pasta: o projeto de construção de presídios, no valor de meio bilhão, em que São Paulo tem 30%, e a inspeção técnica veicular, de um e meio bilhão anual, em que São Paulo já detém 47% do mercado.  

De resto, o Ministro entronizado por Covas inverteu toda a agenda do Ministério e do Governo: abandonou o programa de proteção a testemunhas, para o qual eu já havia assegurado os recursos necessários, e por isso o Juiz Leopoldino Marques e outros não tinham proteção policial; largou o projeto de proibição da venda de armas, aplaudido pela sociedade; claudica na implantação das chamadas penas alternativas; deixou órfãos os consumidores; pretende enterrar o Código de Trânsito, que hoje é sinônimo de cidadania; e retirou, Sr. Presidente - pasmem, em meio a tanta violência, a tanta impunidade, a tanta incerteza -, o Projeto de Reforma do Código Penal, que já estava no Palácio do Planalto para ser remetido ao Congresso Nacional. Fica na contramão das prioridades nacionais, pregando pelo País o casamento de homossexuais e a descriminação da maconha.  

Mas, Srªs e Srs. Senadores, esqueçamos as drogas pesadas e voltemos rapidamente às mais leves: a interpelação, que é ridicularizada no próprio despacho do Ministro do Supremo Tribunal Federal, que faculta ao interpelado responder se quiser. Quero responder e aproveito a oportunidade para dizer que reitero tudo o que disse na correspondência. A carta, cujo teor o Governador quer conhecer, pertence ao Presidente da República. Cabe a Sua Excelência decidir se a divulga ou não. De minha parte, sinceramente, autorizo o Presidente da República a entregar a carta ao Sr. Mário Covas.  

Ontem mesmo o Governador Covas recebeu uma pomposa homenagem dos donos de supermercados. Mereceu. Faz sentido. Ele é vaiado pelas donas de casa e aplaudido pelos donos de supermercados. Afinal, Sr. Presidente, na briga para que os mercados colocassem os preços nos produtos e parassem de lesar o consumidor, que invariavelmente se deparavam com um preço na gôndola e outro no produto, eu sei de qual lado ficou o Governador de São Paulo.  

Eu, que não tenho o hábito de esquecer a moralidade em gavetas, nem a prática de enviar intermediários para negociar propostas indecorosas, nem pego o telefone para acertar acordos inconfessáveis publicamente, daria um conselho ao Governador paulista: já que ele demonstra tanto gosto por inspeções, que se submeta a uma inspeção ética regularmente. Ela fará muito bem, Sr. Presidente, à saúde de São Paulo, à saúde do Brasil e à saúde da sua biografia angelical.  

Muito obrigado.  

Era uma comunicação que não poderia deixar de fazer à Casa.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/1999 - Página 24343