Discurso no Senado Federal

INDIGNAÇÃO COM A DESTINAÇÃO DOS EMPRESTIMOS OBTIDOS JUNTO AO BID E AO BIRD PARA INVESTIMENTOS NA REDE DE PROTEÇÃO SOCIAL, QUE FORAM BLOQUEADOS PARA COMPOSIÇÃO DAS RESERVAS CAMBIAIS DO GOVERNO. COMENTARIOS A PESQUISA REALIZADA PELO INSTITUTO VOX POPULI SOBRE O INDICE DE REJEIÇÃO DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DIVIDA EXTERNA.:
  • INDIGNAÇÃO COM A DESTINAÇÃO DOS EMPRESTIMOS OBTIDOS JUNTO AO BID E AO BIRD PARA INVESTIMENTOS NA REDE DE PROTEÇÃO SOCIAL, QUE FORAM BLOQUEADOS PARA COMPOSIÇÃO DAS RESERVAS CAMBIAIS DO GOVERNO. COMENTARIOS A PESQUISA REALIZADA PELO INSTITUTO VOX POPULI SOBRE O INDICE DE REJEIÇÃO DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.
Publicação
Publicação no DSF de 17/09/1999 - Página 24531
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. DIVIDA EXTERNA.
Indexação
  • DENUNCIA, GOVERNO, DESVIO, RECURSOS, EMPRESTIMO, BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID), BANCO INTERNACIONAL DE RECONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO (BIRD), OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, ALTERAÇÃO, DESTINAÇÃO, RESERVAS CAMBIAIS.
  • COMENTARIO, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, DESAPROVAÇÃO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APROVAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, MARCHA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), REIVINDICAÇÃO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SISTEMA, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS).
  • REGISTRO, INDICE, OPINIÃO PUBLICA, AVALIAÇÃO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, INDEPENDENCIA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI).
  • CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, CORTE, DISTRIBUIÇÃO, ALIMENTOS, EXCESSO, DEPENDENCIA, MERCADO FINANCEIRO, SUPERIORIDADE, LUCRO, BANCOS, EPOCA, CRISE.
  • GRAVIDADE, TOTAL, DIVIDA PUBLICA, BRASIL, IMPOSSIBILIDADE, PAGAMENTO, PERDA, CONFIANÇA, MERCADO INTERNACIONAL.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, na tarde de ontem, a Senadora Heloisa Helena, em seu pronunciamento nesta Casa, referiu-se à audiência pública realizada, na última terça-feira, pela Comissão de Assuntos Sociais, com a presença do Ministro Martus Tavares.  

A Senadora demonstrava aqui sua indignação com a forma pela qual o Governo faz propaganda enganosa perante a opinião pública, de vez que a mensagem, encaminhada pelo Palácio do Planalto a esta Casa para obtenção de empréstimos junto ao BID e ao BIRD, embora afirmasse que os recursos seriam destinados a investimentos na Rede de Proteção Social, na verdade, pela voz do Sr. Ministro, foi-nos dado conhecimento, na Comissão de Assuntos Sociais, de que os recursos seriam destinados à composição das reservas cambiais do Governo para que os agiotas internacionais mantivessem a credibilidade no Governo brasileiro. Isto é um absurdo; é uma afronta ao povo brasileiro, ao povo miserável deste País, que vive nesses grotões de miséria. O Governo contrai empréstimos para investimentos na Rede de Proteção Social e acaba utilizando esses recursos para o pagamento dos juros da dívida ou para fazer caixa, recompondo as reservas cambiais.  

Outra questão que eu gostaria de trazer a este Plenário, Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, é relativa à pesquisa do Instituto Vox Populi, encomendada pela Confederação Nacional dos Transportes – CNT, que, tendo ouvido 2.200 pessoas entre os dias 4 e 6 deste mês, revelou que, de cada 100 brasileiros, 65 reprovam o Governo FHC. Esse índice supera o percentual máximo de rejeição alcançado pelo ex-Presidente Fernando Collor, que foi de 57%.  

A pesquisa ainda apontou que a população considerou oportuna e justa a Marcha dos 100 Mil, que mobilizou milhares de pessoas, culminando com um abaixo-assinado com mais de um milhão e trezentas mil assinaturas, pedindo a instalação de uma CPI para apurar os indícios de irregularidades da privatização do Sistema Telebrás. O resultado de 59% de apoio à manifestação demonstra que o povo brasileiro quer o esclarecimento dos pontos obscuros do leilão. Mesmo após o arquivamento pelo Presidente da Câmara, Deputado Michel Temer, para nós, do Bloco de Oposição, a luta pela instalação da CPI não terminou.  

O dado que mais me chamou a atenção na pesquisa, e a ele eu gostaria de me ater, foi o recado dado por 44% dos entrevistados à Equipe Econômica do Governo, ao avaliar que o Governo deveria deixar de lado as exigências do Fundo Monetário Internacional e buscar alternativas de políticas econômicas. É bom lembrar que o Ministro Pedro Malan, na manhã do dia 26 de agosto último, quando foi realizada a Marcha dos 100 Mil, em entrevista à imprensa, disse que "não haveria mudança na política econômica." Essa afirmação foi reforçada esta semana com a posse, no Ministério do Desenvolvimento, do banqueiro e empreiteiro Alcides Tápias, durante muito tempo Vice-Presidente do Bradesco, o maior banco privado do País, e Presidente da Federação Brasileira de Bancos - Febraban. O novo Ministro presidia a Camargo Corrêa, uma das maiores empreiteiras do País.  

O fato em si demonstra o grau de submissão do atual Governo ao sistema financeiro, justamente o único setor a lucrar com a crise. Os dois maiores bancos privados nacionais tiveram, no primeiro semestre deste ano, um lucro líquido superior a R$1 bilhão e 500 milhões. O Itaú, segundo colocado no ranking, lucrou R$1bilhão e 93 milhões; o Bradesco, R$460 milhões. Com ganhos tão expressivos, os bancos ofereceram míseros 4% de reajuste aos trabalhadores bancários. Também é bom lembrar que, durante o período do Plano Real, 250 mil empregos foram fechados no setor, segundo dados da Confederação Nacional dos Bancários.  

Submisso aos banqueiros nacionais, o Governo FHC é subserviente ao capital financeiro internacional. No último dia 9, uma Missão do FMI chegou ao Brasil para fazer a quarta avaliação do acordo do País com o Fundo. Apesar do sorriso do Ministro Pedro Malan e da economista chefe da missão, Teresa Ter-Minassian, a realidade não é tão agradável. O Brasil não "reconquistou a credibilidade dos credores internacionais", como quer demonstrar a Equipe Econômica do Governo.  

O artigo do jornalista Aloysio Biondi publicado na Revista Caros Amigos, deste mês, faz uma revelação bastante interessante:  

"Em agosto deste ano, quando o real já havia começado a despencar outra vez, um grande banco internacional, o ING Barings, divulgou relatório aconselhando seus clientes e investidores a venderem os títulos do Governo e de empresas brasileiras. Motivo: o risco do calote, já que a dívida do tesouro passa dos R$400 bilhões, e como os juros aqui dentro estavam na casa dos 22%, isso significa uma carga de juros de uns 90 a 100 bilhões de reais por ano. Ou, arredondando, 10 bilhões de reais por mês. Impossível pagar."  

A informação desmente totalmente a falácia da "reconquista da credibilidade internacional" alardeada pelo Governo e seus porta-vozes. O articulista ainda apresenta outro dado que reforça a sua análise: "no 1º semestre deste ano, os bancos internacionais emprestaram apenas US$3,5 bilhões a empresas brasileiras. Isto é, cinco vezes menos que os US$17,5 bilhões concedidos no mesmo período do ano passado".  

Portanto, Sr. Presidente, só posso crer que o sentido dessa Missão do FMI não é o de uma "visita de cortesia". Na terceira versão do acordo, datada de 5 de junho de 1999, ficavam explícitas as linhas mestras do PGP - Plano de Gestão de Pessoal -, e do PPA - Plano Plurianual -, rebatizado de "Avança Brasil", aliás, o nome do programa de Governo do então candidato Fernando Henrique Cardoso.  

Nesta quarta versão, pelo descrédito dos agiotas internacionais em relação ao Governo brasileiro, a imposição do FMI deve ser por uma aceleração nas privatizações do que restou do patrimônio nacional: exploração de petróleo, energia elétrica, águas e saneamento, além dos bancos públicos.  

Quando esta Casa debate a questão da erradicação da pobreza, ouso dizer que o melhor programa de combate à miséria é o rompimento com o FMI e a suspensão do pagamento da dívida externa.  

Essa dívida é imoral, ilegítima e já foi paga. Segundo dados do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, o Brasil pagou, no período de 1987 a 1989, entre juros e amortizações, US$216 bilhões. A dívida, em 1989, era de US$115 bilhões. Isso mesmo. O País pagou US$216 bilhões. Devia US$115 bilhões e continua devendo mais de US$220 bilhões. Só no Governo FHC, o Brasil remeteu ao exterior US$80 bilhões.  

A edição do Jornal Folha de S.Paulo, da última terça-feira, deu-nos um exemplo do quanto é nociva ao País uma política econômica que prioriza os grandes capitalistas e esquece o povo. Numa chamada de primeira página, com o título "Ajuste corta cesta de 8,6 milhões", o jornal informava sobre os cortes de verba no Prodea – Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos. Cerca de 8.600 milhões de pessoas estão, desde julho, sem receber a cesta básica. A população que deixou de ser atendida está localizada em 1.353 municípios acompanhados pelo Programa Comunidade Solidária.  

A reportagem dos jornalistas Rui Nogueira e Marta Salomon mostrou que, de um total autorizado pelo Tesouro Nacional de R$98,2 milhões, até esta semana, apenas R$46,2 milhões foram usados no Prodea, ou cerca de 47% do orçamento total. Um dado bastante interessante da matéria informa-nos que somente 21% do gasto diário com juros da dívida pública correspondem a todo o orçamento do Programa.  

Portanto, a dívida externa deve ser uma questão amplamente debatida pela sociedade brasileira, porque afeta diretamente o dia-a-dia da população. O nosso País tem duas opções na virada deste século: ser uma nação soberana, o pólo de construção da solidariedade dos povos da América Latina contra a espoliação e operação da dívida ilegítima, ou contentar-se em ser novamente uma colônia, não mais de Portugal, mas do FMI.  

Era o que eu tinha a dizer.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/09/1999 - Página 24531