Discurso no Senado Federal

PROTESTO CONTRA A DISCRIMINAÇÃO, PELA VARIG, DOS ESTADOS DA REGIÃO NORTE, EM PARTICULAR O ACRE, AO ELIMINAR O 'VOO SOCIAL' QUE ATENDIA EMERGENCIA MEDICAS.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • PROTESTO CONTRA A DISCRIMINAÇÃO, PELA VARIG, DOS ESTADOS DA REGIÃO NORTE, EM PARTICULAR O ACRE, AO ELIMINAR O 'VOO SOCIAL' QUE ATENDIA EMERGENCIA MEDICAS.
Aparteantes
Marina Silva, Moreira Mendes, Mozarildo Cavalcanti, Roberto Requião, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 21/09/1999 - Página 24715
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • DENUNCIA, DECISÃO, VIAÇÃO AEREA RIO GRANDENSE S/A (VARIG), RETIRADA, VOO, ATENDIMENTO, EMERGENCIA, ASSISTENCIA MEDICA, DISCRIMINAÇÃO, ESTADOS, REGIÃO NORTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO ACRE (AC), ALEGAÇÕES, REDUÇÃO, TAXA DE OCUPAÇÃO.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, faço hoje um desabafo, com o qual, acredito, se identificarão os mais de 500 mil habitantes do Acre. Trata-se da discriminação, que já se tornou crônica, por parte das empresas aéreas atuantes na região.  

No final do mês de janeiro deste ano, a Varig, detentora do monopólio do transporte aéreo comercial no Acre nos últimos anos, anunciou que retiraria seus vôos, mantendo apenas um vôo diário naquele Estado. Essa situação delicada trouxe enormes dificuldades de comunicação entre o Acre e os Estados do Centro-Sul do País, de maneira especial com Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, atrapalhando o fluxo normal de relações comerciais entre eles. Essa decisão unilateral da Varig foi tomada sob a alegação de diminuição da taxa de ocupação dos seus vôos.  

Nós, políticos do Estado do Acre, decidimos nos reunir com os dirigentes da Varig para discutirmos a gravidade do problema. O fato é que se o Estado precisar socorrer um doente grave, levando-o para uma unidade de saúde do Centro-Sul, não contará com o serviço da Varig, uma vez que a empresa só oferece um vôo diário. Solicitamos à Varig que, pelo menos, ofereça um vôo a mais. Não é possível que essa empresa se mostre insensível ao nosso apelo, uma vez que utilizou-se, por mais de 30 anos, daquele espaço aéreo em uma relação comercial que seguramente não trouxe prejuízo a ela.  

Esse vôo adicional garantiria um equilíbrio de comunicação e de integração nacional do Acre com os demais Estados do Brasil. Ao mesmo tempo, repito, em casos de socorro a um paciente em estado grave, que deveria deslocar-se a um centro de atendimento médico mais sofisticado e mais complexo, estaríamos garantindo uma proteção a esse cidadão.  

Lamentavelmente, a Varig não demonstrou qualquer sensibilidade, não entendeu que é uma empresa detentora de uma concessão pública e que é um vôo social aquele que faz entre Rio Branco e o Centro-Sul do País. A Varig simplesmente disse que não colocaria mais um vôo, garantindo apenas o retorno ao Estado do Acre no período de alta estação. Aguardamos o mês de julho, período de alta estação, e a Varig não colocou à disposição aeronaves a mais, deixando-nos numa dificuldade profunda.  

Para nossa surpresa, Sr. Presidente, o Estado de Rondônia dispõe de oito vôos diários com o Centro-Sul do País, enquanto o Estado do Acre tem apenas um vôo diário, inviabilizando, como já disse, uma série de interesses econômicos e sociais do Estado.  

O assunto foi abordado informalmente com o Presidente da Varig, que entendeu se tratar de um vôo social, em relação ao qual deveria haver um tratamento diferenciado.  

No mês de maio, enviei um ofício ao então Ministro da Aeronáutica, hoje Comandante da Aeronáutica, Walter Brãuer, que se comprometeu a dar-me uma resposta. Apenas nesta semana, o Sr. Comandante da Aeronáutica informou-me da impossibilidade de a Aeronáutica intervir em algo que diz respeito a interesses do DAC e das empresas comerciais. Portanto, era um assunto de interesse comercial.  

Ficamos numa situação de órfãos, sem saber a quem recorrer. Há uma discriminação clara dessas empresas, que têm os seus filés de comunicação aérea entre Rio de Janeiro, São Paulo e áreas de turismo. Mas a Região Amazônica já paga o preço do preconceito das autoridades maiores deste País, que dispensam a ela muito pouca atenção. E ainda mais: agora, tenho um parecer definitivo da Aeronáutica dizendo que não pode intervir. Não posso entender que uma empresa detentora de concessão pública, num vôo de interesse social como o que tínhamos, tenha uma resposta tão fria por parte do poder político deste País.  

Todos os políticos da Região Norte atravessam este Brasil, a Amazônia brasileira, lamentando a qualidade dos vôos, a qualidade da alimentação servida, as condições sanitárias das aeronaves, e ninguém faz nada. É uma situação em que há um cidadão da vigilância sanitária no aeroporto, mas é sempre uma permissão apenas de passagem de uma empresa aérea.  

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - V. Exª permite-me um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Pois não, Senador. Antes de conceder o aparte a V. Exª, gostaria de prestar a mais absoluta solidariedade a V. Exª pela agressão sofrida. Não entendo com que direito setores da imprensa brasileira fazem juízo de valor, muitas vezes precipitados e equivocados, sobre a honra de quem tem.  

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Talvez a pergunta, Senador, não fosse com que direito, mas por encomenda de quem.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Todos nós, que cultivamos a seriedade na vida, sofremos por esse tipo de atitude.  

O Sr. Roberto Requião (PMDB - PR) - Senador, V. Exª abordou essa questão da Varig e me dá a oportunidade de trazer à baila um assunto que me incomoda há muito tempo e que me envolve pessoalmente. Julgo-me vítima de um estelionato por parte da Varig. Como muitos Senadores, ocupo preferencialmente a Varig. Primeiro, porque a imagem da Varig é altamente positiva no País, empresa do Rio Grande do Sul, o que me faz escolhê-la sempre quando viajo. A primeira coisa que pergunto é se tem um avião da Varig. Em virtude disso e das constantes viagens ao meu Estado e a outros lugares do Brasil, fui agraciado pela Varig com aquele célebre cartão diamante, que dá algumas vantagens extras naquele programa de milhagem. Entretanto, no início deste ano, Senador, uma diretora do Programa Smiles da Varig ligou-me, dizendo o seguinte: "Senador, V. Exª reduziu o seu número de viagens pela Varig e se não fizer, até março, 10 viagens, iremos rebaixar o seu cartão diamante para cartão ouro". Expliquei a ela que tinha um número de milhas acumuladas muito grande e que não havia reduzido os meus vôos pela Varig; apenas estava usando os prêmios da milhagem que o cartão Smiles me oferece. E ela respondeu: "Mas esses vôos não são considerados". A Varig me colocou na seguinte situação: se eu quisesse manter o privilégio do cartão diamante, teria de abandonar os prêmios de milhagem que a própria Varig me havia concedido e voar com tarifa paga, ou seja, o prêmio era para não ser utilizado. Um dia desses, tive a oportunidade de conversar aqui no Senado com os Presidentes da Varig e da Rio Sul, duas companhias de uma mesma origem que operam no Brasil esse cartão Smiles. Eles me disseram: "É exatamente isso mesmo. O cartão de milhas serve para viabilizar viagens nas férias, podendo-se utilizá-lo como up grade para complementar a viagem de férias". Na verdade, isso não passa de um grande 171, de um estelionato: induzir alguém em erro para viabilizar vantagem própria ou para outrem. Julgo-me, até hoje, vítima de estelionato por parte da Varig. Para manter o cartão, eu não poderia usar o prêmio. É realmente uma proposta encantadora. Todavia, não existe mais regulamentação. Onde estão o Ministério da Aeronáutica, as autoridades e o Procon para intervir nesse processo? Essa degradação do famoso cartão Smiles não diz respeito apenas a mim, mas a todas as pessoas que, em determinado momento, resolveram utilizar a vantagem prometida pela preferência dada à companhia. Uma verdadeira picaretagem.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Sem dúvida nenhuma, Senador Roberto Requião, é uma situação delicada, envolvendo usuários de uma empresa da qual todo o Brasil tem boas lembranças e que não poderia se deparar com esse problema.  

Confesso a V. Exªs que é muito triste ter ouvido, como recentemente ouvi, de um funcionário da Varig – que pediu para não ser identificado – que a empresa estava pronta para colocar mais um vôo para o Estado do Acre caso a Transbrasil assim o fizesse, como era o seu propósito.  

Então, é um jogo de interesses que fere a ética. Acredito que a nossa Região, a Amazônica, não pode continuar sendo vítima desse tipo de situação.  

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL - RR) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Ouço V. Exª com prazer.  

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL - RR) - Senador Tião Viana, solidarizo-me com sua denúncia, até porque o caso do meu Estado é exatamente igual a esse. Somos vítima do monopólio da Varig, a única empresa que tem vôo para Roraima e somente num horário todos os dias. Como V. Exª falou, quando a Transbrasil ou a Vasp colocaram linhas para Boa Vista, imediatamente a Varig aumentou suas freqüências, melhorou os seus serviços e, com isso, fez com que aquelas duas companhias recuassem, tornando-se única e exclusivamente a dona da referida linha. É lamentável que isso ocorra e não haja uma forma de corrigir essa distorção, porque, mesmo com a interferência dos representantes do povo, sejam Deputados, sejam Senadores, a Varig reina acima de qualquer reclamação ou de qualquer reivindicação daquelas regiões.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço ao nobre Senador Mozarildo Cavalcanti e concedo um aparte ao nobre Senador Romero Jucá, que o está solicitando.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Caro Senador Tião Viana, V. Exª toca num assunto que tem sido permanentemente reiterado, quer através da tribuna, quer através de correspondências, principalmente pelos Parlamentares do Norte do País. Sem dúvida nenhuma, apesar de reclamações constantes, temos um serviço e um atendimento, no setor de transporte aéreo, que têm deixado muito a desejar. O Estado de Roraima tem apenas um vôo diário – vôo também operado, por coincidência, pela Varig –, que, de certa forma, não atende ou não preenche as necessidades do Estado e da Região – Estados de Rondônia, Acre. Temos ouvido permanentemente queixas também de Parlamentares e participado de abaixo-assinados que têm sido encaminhados às companhias aéreas e ao Ministério da Aeronáutica exatamente no intuito de buscar uma regulamentação e uma fiscalização que, efetivamente, façam com que haja uma melhoria dos serviços de transporte aéreo, notadamente aos usuários de nossa região. É bom lembrar que, hoje, uma passagem aérea para o meu Estado, Roraima, e para o Estado de V. Exª, o Acre, é muitas vezes mais cara do que a de um vôo internacional. Além de pagarmos caríssimo pelas tarifas aéreas internas em nosso País, ainda sofremos discriminação, inclusive com um serviço de qualidade duvidosa prestado por essa companhia. Portanto, quero somar a minha voz à de V. Exª, deixando aqui o meu protesto e, mais do que isso, a minha reivindicação no sentido de que o Ministério da Aeronáutica e, futuramente, a Agência que vai controlar os transportes no País exerçam um efetivo serviço de fiscalização a fim de coibir os abusos e defender o consumidor, que paga tão caro por esses serviços.

 

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço, nobre Senador Romero Jucá, o seu aparte.  

Concedo o aparte ao nobre Senador Moreira Mendes, que o está solicitando.  

O Sr. Moreira Mendes (PFL - RO) - Eminente Senador Tião Viana, quero me irmanar a seu protesto, principalmente no atinente à discriminação sofrida pelos Estados da Amazônia, não apenas de parte das companhias aéreas, mas de parte de vários outros segmentos que, de uma forma ou de outra, segregam os nossos Estados, relegando-nos a uma condição de segundo plano, de pouca importância no contexto nacional. Conheço a aflição do povo acreano, ainda que nós, de Rondônia, tenhamos superado essa fase, uma vez que o nosso Estado está bem servido por vôos nacionais. Entendo ser uma discriminação odiosa a que se faz com os Estados do Acre, Roraima e Amapá na área da aviação civil. V. Exª bem lembrou que se trata de uma concessão de serviço público, e os representantes das empresas têm de ter em mente que, de alguma forma, devem cumprir com sua obrigação no que se refere ao desenvolvimento dessas regiões. O mais grave disso é que, embora paguemos muito caro pelas passagens aéreas, desfrutamos de um serviço de má qualidade. V. Exª observou um ponto importantíssimo, qual seja, o da qualidade dos aviões que servem aos nossos Estados: na maioria das vezes, são aeronaves antigas, que não recebem a higienização adequada. Ainda hoje, observei essa circunstância vindo de Rondônia, oportunidade em que tive, como companheiros de viagem, muitos acreanos. Sei dessa aflição porque tenho ouvido, constantemente, as lamúrias das pessoas que vivem no Acre, em Roraima e no Amapá. Portanto, quero aqui, também, prestar minha solidariedade e dizer que concordo com tudo aquilo que V. Exª bem colocou.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço, Senador Moreira Mendes, e quero dizer que o mais importante é que haja sensibilidade por parte dos representantes dessas empresas aéreas. Acredito que o Comando Militar da Aeronáutica deva tomar uma posição mais dura, mais firme a respeito disso, uma vez que tem ascendência funcional sobre o DAC.  

É muito doído para um profissional de saúde, que vive naquela região, ter um doente, vítima de um traumatismo craniano grave, sabendo que medidas há que podem salvar aquela vida se o doente chegar a tempo num centro de referência, de retaguarda de atenção médica de alta complexidade, embora sabendo também que, infelizmente, há obstrução por parte de algum interesse econômico, que há ganância pelo lucro, e esses falam mais alto.  

Portanto, essas empresas não têm dado ouvidos às reclamações que os representantes federais do Acre têm feito, a exemplo da Senadora Marina Silva, a quem concedo um aparte neste momento.  

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Sou solidária ao pronunciamento de V. Exª. Nossa Bancada tem feito todo um esforço no sentido de tentar revitalizar as linhas aéreas que anteriormente tínhamos. Hoje, estamos praticamente sem opções de saída do Acre e o que nos resta, muitas vezes, é fazermos um vôo extenuante por Manaus, com sérios prejuízos para as pessoas que necessitam ir ao Estado do Acre, seja em função de suas ações públicas, seja, enfim, pelo direito que os cidadãos brasileiros têm de ir e vir, o qual, no caso do Acre, está bastante limitado. Do ponto de vista constitucional, estamos sendo privados do direito fundamental de ir e vir, notadamente em função da posição insensível das empresas. Aliás, parece ironia: toda vez que chegamos ao final do vôo, eles agradecem a preferência por termos voado Varig. Mas, no caso do Acre, não existe outra possibilidade: é essa ou é essa, e, o que é pior, em apenas um vôo diário, com sérios prejuízos para as pessoas que, muitas vezes, precisam se ausentar da cidade para tratamentos de emergência. Quem não pode pagar uma UTI no ar fica impossibilitado de qualquer outro tipo de socorro. Além do mais, há a questão, levantada por V. Exª, de ser uma concessão pública. Em sendo uma concessão de serviço pública, a empresa não pode operar tendo em vista apenas os lucros, de vez que os serviços de que é concessionária têm uma utilidade pública, fazem parte de uma série de obrigações a que, independentemente da lucratividade, temos que dar uma resposta. Porventura as pessoas devem ficar sem água ou luz em função do lucro das empresas? Assim, é muito bom verificarmos o que está acontecendo nesse particular para podermos pensar o que poderá ocorrer, daqui para a frente, com outras empresas que, em função do lucro, poderão alegar a ausência de serviços prestados para a comunidade, em setores essenciais, como é o caso desse. Parabenizo V. Exª pela iniciativa do pronunciamento e fico feliz em saber que outros Srs. Senadores, como no caso de Rondônia e de Roraima, estão solidários ao nosso isolamento. Esperamos, tanto por parte das empresas quanto das autoridades responsáveis por essas concessões, que nos seja dada uma resposta.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço, Senadora Marina Silva.  

Sr. Presidente, espero sinceramente que haja uma reflexão de ordem ética, que haja sensibilidade e responsabilidade das empresas aéreas. Há cerca de dois anos, a empresa TAM anunciava seu interesse em incluir um vôo a mais no Estado do Acre. E a Varig colocou um vôo adicional para competir e inviabilizar a entrada da TAM. Agora, a Transbrasil anuncia que poderá fazer um vôo a mais para o Estado do Acre e a Varig já ameaça colocar um vôo a mais para competir e inviabilizar a oportunidade de acesso do povo acreano. Assim, penso que está posta uma situação ética. Espero sinceramente que o Poder Público Federal, por meio de seus órgãos competentes, não seja insensível e não prefira dizer que não pode fazer nada diante da situação.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/09/1999 - Página 24715