Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM A UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS DE EMPRESTIMO APROVADO PELO SENADO FEDERAL DESTINADO A REDE DE PROTEÇÃO SOCIAL.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • PREOCUPAÇÃO COM A UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS DE EMPRESTIMO APROVADO PELO SENADO FEDERAL DESTINADO A REDE DE PROTEÇÃO SOCIAL.
Publicação
Publicação no DSF de 16/09/1999 - Página 24427
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • CRITICA, AUSENCIA, DESTINAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, ACORDO, BANCO MUNDIAL, FINANCIAMENTO, PROGRAMA, ERRADICAÇÃO, POBREZA, MUNICIPIOS, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, RAUL JUNGMANN, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO EXTRAORDINARIO DE POLITICA FUNDIARIA (MEPF), URGENCIA, LIBERAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, GARANTIA, APLICAÇÃO, EMPRESTIMO, BANCO MUNDIAL, FINANCIAMENTO, PROGRAMA, ERRADICAÇÃO, POBREZA, MUNICIPIOS, PAIS.

A SRª HELOISA HELENA (Bloco/PT - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, compartilho com a Casa a preocupação em relação à audiência que tivemos ontem com o Ministro do Orçamento, Martus Tavares, não sobre o marketing do PPA mas sobre o empréstimo para a propagandeada Rede de Proteção Social, nos moldes do que já havia sido anteriormente aprovado nesta Casa.  

É de conhecimento público, e de uma forma muito especial desta Casa, que, no início deste ano, foi aprovado um projeto com o Banco Mundial no valor de US$252 milhões também apresentado pelo Governo Federal como se fosse ser utilizado para a Rede de Proteção Social.  

Como já era esperado, o recurso não foi usado. Em resposta a requerimento nosso, no dia 15 de junho, o Sr. Amaury Bier, respondendo interinamente pelo Ministro da Fazenda, assegurou o que já sabíamos: que o dinheiro tinha sido desembolsado como previsto em uma única operação, em 10 de março de 1999, sendo utilizado em amortização da dívida externa, de forma a se obter a melhor relação custo/benefício. Não discutirei qual é a relação custo/benefício que alguma pessoa de bom-senso pode ver no pagamento da dívida externa.  

Depois disso, ocorreu nesta Casa o debate sobre esse projeto muito cantado em verso e prosa dos US$2,2 bilhões. Diferentemente do primeiro projeto, vários Parlamentares da Bancada do Governo insistiram em dizer para a opinião pública que esse projeto era uma solicitação de endividamento diferente da do outro. O outro estaria servindo para pagar a dívida externa, e esse, para a utilização da Rede de Proteção Social.  

Ontem o Ministro esteve conosco. A sua participação foi muito boa, porque S. Exª foi muito sincero. Apresentou para a Nação brasileira e para os Senadores presentes a constatação que já temos da síndrome de senzala mansa com que o Brasil sempre se apresenta perante o capital especulativo internacional. O Ministro disse, com a mais absoluta clareza, que esse montante de US$2,2 bilhões serviria para recuperar a credibilidade e as reservas cambiais - com as palavras do próprio Ministro. Todos nós sabemos o que isso significa: deixa-se dinheiro em caixa porque esses dólares não podem ser revertidos em reais para investimentos da Rede de Proteção Social; deixam-se os dólares em caixa para que possam ir rapidamente para o pagamento dos serviços da dívida externa ou para que possam continuar seduzindo a voracidade do capital especulativo internacional.  

O próprio Ministro assumiu isso, dizendo que a alternativa do Governo Federal para investir na Rede de Proteção Social era uma interessantíssima, para não dizer o contrário, contrapartida do Governo Federal, investindo nessa mesma Rede de Proteção Social R$2,2 bilhões.  

E aí o negócio fica mais assombroso, porque o Orçamento apresentado pelo próprio Governo Federal ao organismo financeiro internacional é o próprio Orçamento, só que com um anexo errado, que havia sido aquela primeira proposta de orçamento que veio para a Casa. Não colocaram o documento que o Congresso efetivamente aprovou. Dizem que irão reparar o equívoco.  

Estão dizendo, agora, que esse projeto – que vai servir simplesmente para se ter dólares em caixa para o capital especulativo internacional e para o pagamento dos juros da dívida externa – possibilitará que o Governo cumpra o Orçamento. Ora, é crime de responsabilidade não cumprir a Lei Orçamentária, e agora somos surpreendidos com a afirmação de que o Orçamento, encaminhado pelo Governo Federal, somente será cumprido se esta Casa aprovar os R$2,2 bilhões para se ter dólares a fim de pagar a dívida externa.  

E o que é mais grave é a forma, a propaganda enganosa que é montada com esse tipo de empréstimo perante a opinião pública. Qualquer pessoa, com um mínimo de capacidade para lidar com números, vê claramente a irresponsabilidade do Governo Federal no trato do Orçamento público, das finanças públicas e na construção do superávit primário.  

A Rede de Proteção Social não é uma invenção do Governo Federal nem de qualquer socialista; é, isto sim, assumida pelas entidades financeiras internacionais – Banco Mundial, FMI e demais entidades, vistas por alguns como filantrópicas, quando sabemos o que elas efetivamente significam. Essas mesmas instituições entendem que, nos procedimentos de ajuste fiscal, nos programas de ajuste fiscal, aumenta a miserabilidade, aumenta o empobrecimento da população, com vistas à construção do chamado superávit primário.  

O Governo Federal, até este momento, na área de investimentos e na área de políticas sociais, alocou menos de 9%. Repito: menos de 9%, até este mês, foram aplicados na área de políticas sociais e na área de investimentos. E, agora, vêm nos dizer que, para cumprirem o Orçamento, para investirem na Rede de Proteção Social, vão precisar dessa "oitava maravilha do mundo", ou seja, desse empréstimo, que significa, efetivamente, R$30 mil ao mês para cada município brasileiro combater a pobreza.  

Nem vou falar, Sr. Presidente, das matérias que estão circulando, nem vou falar sobre a miserabilidade de todos os Estados. Aproveito o momento, para dizer que o Governo Federal não tem investido em reforma agrária, não tem investido em política agrícola, só agora tendo liberado 1% dos recursos do Pronaf, tão cantado como a alternativa para diminuir a miséria no campo, a miséria dos trabalhadores rurais.  

No meu Estado, Senador Lauro Campos, existem milhares de pessoas, nas portas dos supermercados, dizendo que vão saqueá-los porque estão com fome. É claro que nenhum saqueador dos cofres públicos vai poder falar mal dos saques viabilizados pelos famintos, e nós esperamos que os saques não aconteçam; e alguém saquear um bodegueiro, um pequeno comerciante, uma padaria, efetivamente significa muito pouco.  

Aproveito a oportunidade para fazer um apelo ao Ministro da Reforma Agrária, ao Presidente do INCRA, à Conab, no sentido de que, ao menos, liberem as migalhas que acabam sendo algo fundamental para garantir a sobrevivência biológica das pessoas. E também as cestas básicas dos assentados, dos acampados, dos miseráveis de Alagoas.  

Em relação ao projeto, à propaganda enganosa, à panacéia que vai resolver todos os males da pobreza, ainda bem que o Ministro, ontem, veio aqui e , com muita clareza, atestou a síndrome de senzala que o Brasil tem e que o Governo Federal assume – e de senzala mansa, porque, se ainda fossem os escravos Zumbi e Dandara da república dos Palmares, a gente ficaria feliz. Mas a síndrome da senzala mansa do Governo Federal efetivamente ficou bem clara ontem com a participação do Ministro.  

Portanto, espero que os ouvidos que estejam escutando este debate possam aprimorar essa discussão, para que, quando essa matéria estiver aqui na Casa, possamos fazer o debate desse "maravilhoso" empréstimo que vai significar, efetivamente, R$30 mil para cada município no combate à pobreza do País.  

É só, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/09/1999 - Página 24427