Discurso no Senado Federal

ANALISE COMPARATIVA ENTRE O DESENVOLVIMENTO ECONOMICO DA COREIA DO SUL, TAIWAN E BRASIL.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • ANALISE COMPARATIVA ENTRE O DESENVOLVIMENTO ECONOMICO DA COREIA DO SUL, TAIWAN E BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 23/09/1999 - Página 24895
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCUSSÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, COMBATE, POBREZA, IMPORTANCIA, ESTUDO, ORIGEM, PROBLEMA.
  • COMPARAÇÃO, BRASIL, PROCESSO, DESENVOLVIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, COREIA DO SUL, TAIWAN, INDUSTRIALIZAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, REDUÇÃO, MISERIA, MOTIVO, REFORMA AGRARIA, ESTABILIDADE, MOEDA, AMPLIAÇÃO, EDUCAÇÃO, INFERIORIDADE, JUROS, TRIBUTAÇÃO, VALORIZAÇÃO, EMPRESA NACIONAL, INCENTIVO, EXPORTAÇÃO.
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, OBJETIVO, ERRADICAÇÃO, MISERIA.

O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lamento que questões menores, como essa da relatoria do PPA, estejam tomando o tempo e as atenções deste Senado, em detrimento de outras que são realmente importantes.  

Por mais que seja politicamente relevante, Sr. Presidente, essa questão e outras serão sempre pequenas diante da enormidade dos problemas deste País. Uma delas, imaginei que seria o tema predominante neste plenário, a partir da proposta do Senador Antonio Carlos Magalhães, é a questão da pobreza no Brasil.  

Verifico também que, das poucas vezes em que o tema é abordado, como agora está sendo na Comissão Especial criada, o foco é sempre na questão dos efeitos da pobreza. Buscam-se mecanismos para minimizar a exclusão social, o que é importante. Mas creio que a discussão também deve buscar as causas das desigualdades sociais no Brasil. É o que vou procurar fazer hoje, num esforço de síntese, dada a exigüidade do tempo de que disponho.  

Creio que nada melhor para se chegar a um diagnóstico completo sobre as razões pelas quais um País como o Brasil, com o seu grau de industrialização, com os recursos naturais que possui, com a renda per capita que tem, de mais de quatro mil dólares, por que este País está no qüinquagésimo lugar em índice de desenvolvimento humano? Por que este País tem uma massa de excluídos tão grande, mesmo se comparado com países - vejam bem, Srs. Senadores - do mesmo nível de renda per capita ? Por que isso aconteceu ao nosso País?  

Creio que para não ficar no "achismo", Sr. Presidente, para não dar uma opinião meramente pessoal, o mais útil é estabelecermos comparações com países emergentes como o nosso, para verificarmos por que nós erramos. Quais foram os erros praticados e se podem ser corrigidos.  

Sr. Presidente, há mais de cem anos, Karl Marx profetizou erradamente que a pobreza, a desigualdade social era inevitável nos países capitalistas, ou seja, nos países de economia de mercado. Ele dizia que o capitalismo era um grande gerador de riquezas, mas um inevitável produtor de desigualdades, pobreza e exclusão. É a famosa tese catastrofista, segundo a qual o capitalismo acabaria morrendo numa enorme crise universal. Era a visão de um homem da Europa do séc. XIX.  

Na primeira metade deste século, o economista americano de origem russa, Simon Kusnetz, a partir do estudo da experiência de três países - os Estados Unidos, a Inglaterra e o Japão -, verificou que, na verdade, a evolução desses países apresentara duas fases. A primeira, uma fase concentradora e empobrecedora, seguida de uma segunda, distribuidora de renda. À exceção dos economistas de formação marxista, que continuaram presos à tese de seu patrono ou de seu mestre, os economistas liberais, de modo geral, aceitaram a Teoria de Kusnetz, porque era calcada em experiências históricas.  

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, foi preciso ocorrer um fenômeno novo nesta segunda metade de século, para colocar por terra tanto a Teoria de Marx quanto a de Kusnetz, que foi a experiência dos Tigres Asiáticos. Esses países conseguiram realizar o prodígio - não gosto da palavra milagre - em 25 anos, se considerarmos, mais ou menos, o período de 1960 a 1985, de se industrializarem e se transformarem em países ricos, como são hoje, com uma notável distribuição de renda. Vou excluir Cingapura e Hong Kong, que são duas cidades-estados, de população pequena, duas plataformas de exportação.  

Vou comparar com a Coréia do Sul e Taiwan, porque são dois países com base territorial e com populações razoavelmente expressivas. A Coréia do Sul tem mais de 40 milhões de habitantes. Eram países miseráveis, Sr. Presidente. Em 1960, ambos estavam muito abaixo do Brasil, fossem quais fossem os indicadores econômicos e sociais. Em meados dos anos 80, essas duas pequenas nações asiáticas não apenas eram potências industriais, como apresentavam, e apresentam ainda hoje, distribuição de renda equivalente à dos países escandinavos. É curioso como nós, latino-americanos, só vemos os Tigres, Coréia do Sul e Taiwan, como dois países que se industrializaram rapidamente, esquecendo este dado impressionante: esses países industrializaram-se, cresceram à velocidade espantosa de 10% ao ano, simultaneamente fazendo distribuição de renda. São países que não têm, hoje, quase exclusão social. Seul é uma megalópole com 8 milhões de habitantes. Não se encontram favelas naquela cidade, nem populações de rua, sem teto, embaixo de marquises ou viadutos, Sr. Presidente.  

Por que esses países conseguiram esse milagre, se o ponto de partida era inferior ao do Brasil? Sr. Presidente, existem fatores peculiares, típicos daqueles países, como os fatores culturais e geográficos, que não podem ser estendidos a outros, mas existem fatores suscetíveis de generalização.  

Há muito tempo eu estudo a realidade desses países asiáticos, que saíram de moda devido à crise de 1997, criando-se a idéia de que tinham fracassado. Trata-se de um grande equívoco. Foi um sistema financeiro precário que lançou a economia desses países em crise, mas já se recuperam rapidamente. A Coréia do Sul vai crescer 5% este ano, e Taiwan 8%. Já retomaram a marcha.  

Sr. Presidente, pincei sete fatores que podem ser generalizados e que explicam, num estudo comparativo, por que esses países conseguiram esse feito prodigioso, e o Brasil não. Vou listá-los, rapidamente.  

Em primeiro lugar, reforma agrária. Taiwan e Coréia do Sul realizaram reformas agrárias com grande êxito, sem confisco, com indenização dos proprietários, e criaram naqueles dois países uma classe média rural como nós nem sonhamos. Não existe MST em Taiwan, nem na Coréia do Sul, porque a terra foi distribuída de uma forma extremamente inteligente. Infelizmente, não disponho de tempo para entrar em detalhes a respeito dessa realização de ambos os países. Eles evitaram, assim, que massas de excluídos, como no Brasil, afluíssem para as cidades, criando esse cinturão periférico de miséria que existe nas grandes cidades brasileiras, o que não é visto em nenhum dos dois - repito.  

Em segundo lugar, Sr. Presidente, estabilidade monetária. Naqueles 25 anos, o Brasil estava com a inflação mais alta, mais escandalosa, mais descabelada, mais maluca do mundo - uma inflação de 2, de 3, e, no fim, de 4 dígitos -, e todos esses países sempre tiveram inflação de nível europeu. Sempre foram muito rigorosos em termos de política monetária. A não ser alguns poucos e rápidos surtos, a média foi sempre de estabilidade. E nós todos sabemos quanto, no Brasil, a inflação contribuiu para a concentração de renda.  

Terceiro fator: universalização da educação. Em ambos, o Estado investiu forte e pesadamente na educação. Logo nos primeiros anos erradicaram o analfabetismo e, hoje, exibem números que nos fazem morrer de inveja, Sr. Presidente. A Coréia do Sul tem um percentual de Phd´s maior do que os Estados Unidos. Senador Geraldo Melo, 95% da população coreana, na faixa etária de 15 a 17 anos, estão cursando o segundo grau. Preciso dizer a V. Exªs qual foi o comportamento do Estado brasileiro, qual foi a política do Estado brasileiro em relação à educação? Todos sabemos quanto a falta de escolaridade contribui também para o processo de concentração de renda.  

Quarto fator, Sr. Presidente: ambos tiveram sempre juros baixos, mas positivos. Talvez nem na experiência de Taiwan, nem na da Coréia do Sul encontremos algum período em que os juros tenham sido estratosféricos como no Brasil, mas em nenhum momento também foram subsidiados; eles foram sempre, ao mesmo tempo, estimuladores dos investimentos, porque eram baixos, e incentivadores da poupança, porque eram sempre superiores à inflação. Por esse motivo, aqueles países têm também taxas de poupança muito superiores às nossas, pois ultrapassam 30% do PIB.  

Quinto fator: Baixa carga tributária. Todos eles têm sistema tributário que lhes impõe uma carga inferior a 20% do PIB, Sr. Presidente. A nossa, como sabemos, hoje já ultrapassa 30%. Todos nós sabemos que além de a nossa carga ser elevada para um país com o nosso nível de renda, temos um sistema tributário da pior qualidade, porque onera principalmente o setor produtivo e contribui também muito para a má distribuição de renda que apresentamos.  

Sexto fator: Valorização do capital nacional. Em nenhum desses países se verificou xenofobia, Sr. Presidente, eles não são hostis ao capital estrangeiro, nunca o proibiram. No entanto, neles o Estado privilegiou sempre o capital nacional e criou em ambos empresas de nível internacional, grandes multinacionais - na Coréia do Sul, há empresas como a Samsung, Daewoo, LG e Hyundai, que são empresas do nível, do porte das grandes empresas européias e americanas. E mesmo agora, mesmo depois da crise de 97, da crise financeira que os afetou, foi muito pequeno, Sr. Presidente, o índice de desnacionalização daquelas economias.  

Ao contrário, no Brasil, se verificou um processo de privatização que privilegiou o capital estrangeiro, financiado e subsidiado por um banco estatal como o BNDES. É pequena a participação de capital estrangeiro na Coréia do Sul e em Taiwan. O capital é predominantemente - e continua sendo - nacional.  

Finalmente, o sétimo fator: a extroversão econômica. Esses países privilegiaram, sempre, as exportações, sem escancarar suas portas para as importações. E assim se comportaram tanto nas trocas comerciais, como no fluxo financeiro.  

Sr. Presidente, infelizmente, eu não pude - repito -, por carência de tempo, ersmiuçar esses fatores que acabei de enumerar, mas creio que agora, quando se discute o problema da desigualdade social no Brasil, da concentração de renda, seria muito bom que nos voltássemos, com profundidade, para o estudo da experiência histórica de países como Taiwan e Coréia do Sul. Eles nos dão lições, Sr. Presidente, que devemos apreender para tentar fazer uma correção de rumos. Vamos adotar políticas compensatórias para evitar que as pessoas passem fome ou morram de fome, mas, Sr. Presidente, vamos, principalmente, procurar adotar medidas de fundo para que o Brasil mude radicalmente sua política econômica a partir da experiência de outros países. Que adapte aquilo que for adaptável para que identifiquemos e erradiquemos as causas da pobreza e não apenas combatamos os seus efeitos.

 

Era o que tinha a dizer.  

 

TenhT


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/09/1999 - Página 24895