Discurso no Senado Federal

DEFESA DO PROJETO DE CAPACITAÇÃO E GERAÇÃO E RENDA, ELABORADO PELA COMUNIDADE SOLIDARIA EM PARCERIA COM A SUDENE E A UNESCO, COMO SOLUÇÃO PARA O PROBLEMA DA SECA NO NORDESTE.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • DEFESA DO PROJETO DE CAPACITAÇÃO E GERAÇÃO E RENDA, ELABORADO PELA COMUNIDADE SOLIDARIA EM PARCERIA COM A SUDENE E A UNESCO, COMO SOLUÇÃO PARA O PROBLEMA DA SECA NO NORDESTE.
Publicação
Publicação no DSF de 24/09/1999 - Página 25116
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • DEFESA, PROJETO, ELABORAÇÃO, PROGRAMA COMUNIDADE SOLIDARIA, PARCERIA, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), ALTERNATIVA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, SECA, REGIÃO NORDESTE, GARANTIA, SUBSISTENCIA, POPULAÇÃO.
  • RECONHECIMENTO, EMPENHO, RUTH CARDOSO, PRESIDENTE, CONSELHO, PROGRAMA COMUNIDADE SOLIDARIA, IMPLANTAÇÃO, PROJETO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, de nada adianta o desespero da irracionalidade. A seca que aflige o sertão nordestino consiste num problema nacional, para cuja superação o Brasil precisa, necessariamente, de apelar para as políticas emergenciais do Governo. Nessa lógica, o Projeto de Capacitação e Geração de Renda se afigurou, no decorrer de 98, como a solução, de curto prazo, mais correta para debelar as mazelas da seca nordestina. Elaborado pelo Conselho da Comunidade Solidária em parceria com a Sudene e a Unesco, teve como objetivo a apresentação de formas alternativas para geração de sustento às famílias atingidas pela estiagem, por meio de recursos do próprio semi-árido.  

Instalado em 1998, a execução do Projeto foi programada para durar 7 meses. Para tanto, contou com a participação decisiva de diversas ONGs, às quais coube a implementação concreta das diretrizes nas áreas atingidas pela seca. Sob a inspiração de uma perspectiva econômico-social que resgata a compatibilidade da seca com a fomentação de práticas produtivas tradicionais, o projeto proporcionou nova forma de trabalho a cerca de 12 mil e 500 pessoas. Com custo estimado em pouco mais de 2 milhões de Reais, abrangeu dezenas de municípios, dentre os quais se destacam Juazeiro e Sobradinho na Bahia, Exú e Bodocó em Pernambuco, Itapagé e Trairi no Ceará, União e Campo Maior no Piauí, e Lagoa Seca e Cacimba na Paraíba.  

O propósito geral do Projeto de Capacitação girou em torno da idéia de que é possível encarar o fenômeno da seca como ambiente propício para o desenvolvimento de determinadas atividades. Isso é, em vez de explicarmos a estiagem do Nordeste como fatalidade da natureza contra a sobrevivência do homem, devemos, sim, compreendê-la como ecossistema especial, dotado de uma inospitalidade apenas aparentemente incontrolável. No lugar da costumeira paralisia, do imobilismo conformista e da passiva resignação, propõe-se uma visão realista menos cética, mais pragmática, que reconheça a região da seca como ambiente de inexplorado potencial produtivo.  

Espelhando-se nas radicais transformações ambientais promovidas nas regiões desérticas do Oriente Médio, o agreste brasileiro pode perfeitamente acolher diretrizes econômicas que incentivem o aproveitamento do solo, mediante investimento em tecnologias de irrigação. Maximizando a utilização dos parcos recursos naturais disponíveis, o projeto visou revertê-los em frutos que, extensivamente, garantam a vida e a fixação dos flagelados na região. Nesse sentido, o compromisso do projeto alçou vôos sociais para além das metas previstas no Programa Federal de Combate aos Efeitos da Seca. Pois, em vez de ações meramente emergenciais, destinou-se o projeto a fins de melhoria permanente, valorizando os costumes, a cultura e as tradições locais.  

Como bem afirmou o ex-Superintendente da Sudene, Sérgio Moreira, "as saídas definitivas para os problemas da seca nordestina passam necessariamente por educação, capacitação e cidadania". Portanto, é dentro dessa perspectiva que o projeto pretendeu resgatar práticas coletivamente tradicionais de trabalho no agreste nordestino. De fato, durante a gestão do projeto, que se desenvolveu por 7 meses, implementaram-se ações no âmbito dos recursos hídricos, do beneficiamento e comercialização de produtos agropecuários, das barragens subterrâneas, do manejo da caatinga, do associativismo, da produção de remédios caseiros e do agroflorestamento. Como resultado, podemos contabilizar a construção de 500 cisternas de placas para fins de treinamento no processo de capacitação.  

A primeira-dama do País, Ruth Cardoso, que é presidente do Conselho da Comunidade Solidária, declarou recentemente que o raio de atuação do projeto não se limitou à esfera do especificamente econômico, mas se estendeu ao domínio da cultura artesanal. Desse modo, atendeu-se ao propósito de resgatar a cultural local, bem como o de revigorar a identidade dos municípios recorrentemente atingidos pela seca. Naturalmente, o resgate da produção artesanal local se reverteu, no curto prazo, em fonte significativa de renda para as famílias dos flagelados.  

Aliás, não se pode deixar de reconhecer o empenho com que a doutora Ruth Cardoso se entregou à causa do Projeto de Capacitação. Graças à sua arguta sensibilidade em relação aos problemas sociais, o perfil antropológico da empreitada se viu garantido, sem que se dourassem as pílulas do conteúdo com contornos de romantismo irresponsável. Pelo contrário, o caráter educacional contido no Projeto justifica qualificá-lo como inovador, arrojado, culturalmente democrático e socialmente justo. Mais do que isso, se há algum aspecto antropológico que mereça ser efetivamente realçado, julgo que este deva ser reservado ao basilar princípio de que os males da seca somente serão exterminados quando, no mínimo, se restituir aos flagelados a consciência da superação dos problemas por meio do próprio trabalho, do revigoramento da tradição, da iniciativa coletiva e da criatividade. Em síntese, tratou-se de reacender e recuperar a auto-estima da população atingida.  

Nesse espírito, o Projeto se caracterizou pelo revigoramento das atividades que, pela própria escassez de recursos e dificuldades inerentes à seca, perderam-se no tempo. No meio dessas, destacam-se a produção de cerâmica no Vale do Jequitinhonha em Minas, o artesanato na Bahia, a conservação do patrimônio cultural e ambiental no Ceará, a confecção das rendas em Alagoas, bem como o canto de trabalho e trajes do trabalhador rural sertanejo em Pernambuco. Para acompanhar a execução do Projeto nos diversos municípios, contou-se com uma equipe de consultores especializados, reunindo profissionais de reconhecida qualificação nas áreas de antropologia, história, sociologia, arquitetura e assistência social.  

Por sua vez, às organizações não-governamentais atribuiu-se o papel de gerência e coordenação das ações nas cidades. O CETRA, do Ceará, o CEPAC, do Piauí, ADAC e MOC, da Bahia, o AMA, no Rio Grande do Norte, e CENTRO SABIÁ e CAATINGA, de Pernambuco, consumaram intervenção notável no Projeto, proporcionando referências para constituição de condições mínimas de sustentabilidade às famílias rurais, contra as adversidades ambientais, as desigualdades econômicas e as injustiças sociais. Isso tudo se dá sem levar em consideração a intervenção das ONGs no processo de despertar a consciência da população do semi-árido nordestino sobre o execrável domínio exercido, secularmente, pelas oligarquias que se sustentam na pobreza e na miséria do povo.  

Para concluir — Senhor Presidente —, temos que reconhecer que, embora o fenômeno da seca ainda vá afligir inexoravelmente nosso País por tempos à frente, o Governo do Presidente FHC não se tem furtado a promover políticas sociais e econômicas que, paulatinamente, se proponham a debelar a tragédia da estiagem prolongada no agreste brasileiro. Nessa trilha, o Projeto de Capacitação e Geração de Renda, formulado pela Comunidade Solidária em parceria com a Sudene e a Unesco, se enquadra perfeitamente na dinâmica impressa pelo Governo, no sentido de buscar soluções velozes, eficazes e socialmente mais justas para toda a pobre população do agreste.  

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/09/1999 - Página 25116