Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE ESTUDO PREVIO A EXECUÇÃO DO PROJETO DE TRANSPOSIÇÃO DE AGUAS DO RIO SÃO FRANCISCO.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • NECESSIDADE DE ESTUDO PREVIO A EXECUÇÃO DO PROJETO DE TRANSPOSIÇÃO DE AGUAS DO RIO SÃO FRANCISCO.
Publicação
Publicação no DSF de 23/09/1999 - Página 24939
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ANALISE, PROJETO, EXECUTIVO, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RIO SÃO FRANCISCO, DEFESA, ANTERIORIDADE, RECUPERAÇÃO, BACIA HIDROGRAFICA, AMPLIAÇÃO, ESTUDO, EFEITO, MEIO AMBIENTE.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, DEBATE, GOVERNO ESTADUAL, SOCIEDADE CIVIL, DESCUMPRIMENTO, EXIGENCIA, ESTUDO, IMPACTO AMBIENTAL.
  • REGISTRO, AÇÃO CIVIL PUBLICA, AUTORIA, PROCURADORIA DA REPUBLICA, ESTADO DA BAHIA (BA), DESCUMPRIMENTO, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), UNIÃO FEDERAL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, LEGISLAÇÃO, MEIO AMBIENTE, ENCAMINHAMENTO, PROJETO, TRANSPOSIÇÃO, AGUA, RIO SÃO FRANCISCO.
  • COMENTARIO, LEGISLAÇÃO, MEIO AMBIENTE, GESTÃO, RECURSOS HIDRICOS, ANALISE, DIVERSIDADE, UTILIZAÇÃO, RIO SÃO FRANCISCO, IMPORTANCIA, MANUTENÇÃO, EQUILIBRIO ECOLOGICO, APREENSÃO, PROBLEMA, TRANSPOSIÇÃO, AMBITO, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA, IRRIGAÇÃO, ESTADO DE SERGIPE (SE), ESTADO DE ALAGOAS (AL).
  • IMPORTANCIA, ESTUDO, ALTERNATIVA, COMBATE, SECA.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr as Senadoras e Srs. Senadores, o pronunciamento que faço nesta tarde refere-se a um projeto, em tramitação no Executivo, sobre a transposição do Rio São Francisco.  

O Rio São Francisco é o rio da unidade nacional. Podendo prestar solidariedade aos irmãos nossos do Nordeste, não podemos de maneira nenhuma deixar de dar nosso apoio à transposição do Rio São Francisco. Mas, antes da transposição, o Governo precisará ter o maior cuidado para a recuperação desse rio, porque, da forma como ele se encontra hoje, está totalmente impossibilitado de prestar esse serviço aos demais Estados do Nordeste. A transposição é apenas um projeto. Antes desse projeto, deve haver a recuperação da Bacia do São Francisco, que se encontra, em alguns trechos, em situação muito difícil. Essa obra é tão ou mais importante do que a própria transposição.  

A solução para o terrível drama da seca que atinge periodicamente o Nordeste do nosso País, além de parte do Estado de Minas Gerais, é uma causa que sensibiliza todos os brasileiros. Deve ser considerada uma das prioridades nacionais a implementação de ações estruturais para evitar o sofrimento da população atingida, possibilitando o desenvolvimento de atividades econômicas que resistam à adversidade climática.  

A preocupação mais que secular de combater as conseqüências da estiagem prolongada do semi-árido tem nos mostrado, entretanto, que as soluções a serem encaminhadas não são simples, envolvendo fatores econômicos e sociais, tecnológicos e culturais de grande complexidade.  

A vontade de resolver problema tão grave leva muitas vezes a uma simplificação do mesmo e, consequentemente, de sua simplificação fazendo-nos crer que uma única e espetacular medida poderia pôr fim ao drama vivido por tantos brasileiros, em sua maioria nordestinos e pobres.  

Essa vontade simplificadora revela-se, em nosso entender, no encaminhamento que vem sendo dado à proposta das águas da Bacia do rio São Francisco. É certo e indiscutível que um projeto como esse, que altera de forma significativa as condições naturais de toda uma imensa bacia hidrográfica, deve, antes de mais nada, ser estudado profunda e exaustivamente em todas as suas faces e conseqüências, podendo então ser debatido com os diversos segmentos da sociedade por ele afetados.  

A simples vontade e os interesses particulares, sejam esses de natureza política ou econômica, não devem e não podem impedir que equacionemos essa problemática com a máxima clareza e seriedade que ela exige.  

Constatamos, entretanto, que o Governo Federal não apenas dá mostras de querer levar o projeto sem abrir o debate com os Governos Estaduais e com a sociedade em geral, como também se abstém de cumprir os procedimentos legalmente estabelecidos como condição para o início de qualquer ação nesse sentido. Referimo-nos especificamente à exigência de "estudo prévio de impacto ambiental" "para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, conforme se lê no art. 225, §1º, inciso IV, da Constituição Federal.  

Reporto-me ao zelo dos Procuradores da República, sediados no Estado da Bahia, em preservar os interesses públicos ameaçados pelo encaminhamento inconstitucional do Projeto de Transposição das Águas do rio São Francisco. Os Procuradores Danilo José Matos Cruz, José Manoel de Castro Júnior e Lúcia Maria de Andrade Ferraz impetraram, ainda em agosto de 1994, ação civil pública contra inobservância dos preceitos constitucionais e da legislação ordinária pela União Federal e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.  

Essa peça jurídica não apenas apresenta sólido embasamento na legislação ambiental pertinente, como aduz uma série de argumentos técnicos, sejam de ordem ecológica ou econômica, que permitem uma visão global sob o amplo espectro de questões trazidas à baila pelo Projeto de Transposição das Águas do rio São Francisco.  

O texto da ação civil pública em foco inicia-se pelo relato da iniciativa da Procuradoria da República do Estado da Bahia em proceder ao levantamento e monitoramento de impactos e degradações ambientais ocorridos ao longo do curso do rio São Francisco. Constataram-se, assim, diversas e graves ameaças à preservação do equilíbrio hidrológico e ecológico do "Velho Chico", relacionados à prática de pesca irregular, construção indevida de barragens, desmatamento de matas ciliares, poluição por efluentes líquidos e sólidos e assoreamento. A "Carta do rio São Francisco", relatando a intensa degradação ambiental, evidenciada desde a nascente até a foz, obteve repercussão quando foi divulgada em outubro de 1993, resultando em compromisso do então Ministro do Meio Ambiente e da Amazônia Legal em estabelecer um amplo programa de recuperação, a começar pela despoluição e recuperação das matas ciliares.  

Pouco após a ocorrência desses fatos, o antigo Ministério da Integração Regional divulgava o "Plano de Transposição das Águas da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco", o qual previa a construção de estações elevatórias, túneis e canais, de modo que as águas, elevadas em torno de 180 metros, fossem conduzidas a açudes e leitos de rios intermitentes, visando a beneficiar áreas dos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. O custo do projeto era estimado em US$2 bilhões. A captação das águas do São Francisco seria, em uma primeira etapa, equivalente a 50 m 3/s atingindo, quando da implantação total do projeto, a vazão de 280 m 3/s. Esta última vazão prevista equivale a aproximadamente a 12% da vazão total do rio São Francisco.  

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o arcabouço jurídico nacional incorporou diversos dispositivos que visam a garantir a defesa e a preservação do meio ambiente, em face das poderosas pressões dos interesses econômicos. Nossa Lei Magna é suficientemente explícita no art. 170, inciso VI, quando considera a defesa do meio ambiente como um dos princípios da ordem econômica. A preservação do meio ambiente, patrimônio de todo o povo e da Nação, é de fundamental importância para o bem-estar e plena realização das gerações presentes e futuras. O conceito de desenvolvimento sustentável deve pautar o conjunto das atividades econômicas estabelecidas no País, de modo a que essas não revertam em danos inestimáveis para a coletividade.  

Vimos que a Constituição consagrou a exigência do estudo prévio do impacto ambiental. Tal disposição já constava da Lei nº 6.803, de 1980, sendo explicitada como "instrumento da política nacional do meio ambiente" pela Lei nº 6.938, de 31/8/81. Segundo as palavras da Ação Civil comentada, "a imprescindibilidade de efetivar tal estudo anteriormente, como ato preparatório do projeto, tem como propósito prevenir que uma obra ou atividade, que se justifique sob o prisma econômico ou de interesses imediatos de seu proponente, traga posteriormente conseqüências negativas ao meio ambiente."  

A Resolução nº 1 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, de 23 de janeiro de 1986, estabelece o Estudo de Impacto Ambiental - EIA, materializado no Relatório de Impacto dobre o Meio Ambiente - RIMA, como condição para o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, sendo necessária a aprovação por órgão estadual competente ou pelo IBAMA, quando presente o interesse federal. Em seu art. 2º, a mesma Resolução relaciona as atividades tipicamente modificadoras do meio ambiente, fazendo constar no inciso VII, entre outras obras hidráulicas, a "transposição de bacias". Resta, assim, límpido e cristalino que a exigência do EIA e do RIMA aplica-se como condição prévia necessária para a execução do Projeto de Transposição das Águas da Bacia do São Francisco. Como se trata de um conjunto de obras públicas, torna-se altamente recomendável que as providências para a realização do citado estudo antecedam e condicionem qualquer outro dispêndio de recursos em atividade relacionada ao projeto.  

Noção de fundamental e crescente importância, Srªs e Srs. Senadores, é a necessidade de preservação dos recursos hídricos no mundo contemporâneo, tanto em sua quantidade como em sua qualidade. Já a Carta Européia da Água, em maio de 1968, advertia que "os recursos hídricos não são inesgotáveis". Outro dos artigos dessa Carta frisava a necessidade de uma compreensão global dos sistemas fluviais, preconizando que "a gestão dos recursos hídricos deve inserir-se no âmbito da bacia hidrográfica natural e não no das fronteiras administrativas e políticas." De fato, as águas de um rio costumam proporcionar mais de um tipo de utilização por diversos grupos humanos, além de sua imensa relevância para a manutenção do equilíbrio dos ecossistemas adjacentes ou próximos. O equilíbrio do próprio ecossistema fluvial de uma bacia hidrográfica depende do que ocorre em todos os cursos d’água que o compõem, bem como em suas margens e, de um modo geral, em toda a área abrangida pela bacia. Portanto, apenas uma gestão global ou sistêmica, regulando e compatibilizando os vários usos dos recursos hídricos e das terras, pode garantir o equilíbrio de uma bacia hidrográfica, preservando, juntamente, a capacidade de seu aproveitamento diversificado pela sociedade.  

O São Francisco é um exemplo típico de rio de múltiplos usos. Entre os principais deles, foram arrolados pelo Comitê Executivo de Estudos Integrados da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco - Ceeivasf: o abastecimento doméstico, o abastecimento industrial, a geração de energia elétrica, a irrigação, a diluição de despejos domésticos e industriais, a dessedentação de animais, a pesca, a navegação e a preservação da vida selvagem. Devemos mencionar ainda que o Velho Chico constitui um poderoso fator de identidade cultural para vastas regiões do Brasil, atravessando as fronteiras entre os Estados, aproximando e irmanando as suas populações. A maior parte do curso do rio corta justamente áreas incluídas no Polígono das Secas.

 

A falta de planejamento, de gerenciamento e de fiscalização - ou, dito de outro modo, o desinteresse dos Poderes Públicos pelas formas de utilização das águas e das terras da Bacia do São Francisco - vêm acarretando significativo processo de degradação do equilíbrio ecológico. Um dos problemas mais sérios é o de assoreamento dos rios, o qual resulta, basicamente, do uso indiscriminado dos solos e da devastação da cobertura vegetal. Devemos citar como algumas das principais atividades que causam o assoreamento o desmatamento das margens, a intensificação das atividades agrícolas, a dragagem para extração de minerais e a mineração de ferro. Como resultado, o São Francisco tem tido sua calha principal alargada e tornada rasa, em uma profundidade que varia entre 1,50m e 40cm. A pesca de subsistência vem-se deparando com a baixa vertiginosa da quantidade de peixes, especialmente após os trechos barrados. Os períodos de seca fazem-se acompanhar de níveis de vazão cada vez mais baixos. A geração de energia pela Companhia Hidroelétrica do São Francisco - Chesf, que retira do curso do rio São Francisco mais de 90% da energia elétrica consumida no Nordeste, representa, por fim, mais uma das importantes atividades que dependem da preservação do volume das águas e do equilíbrio hídrico da bacia como um todo.  

É necessário, portanto, compatibilizar todos esses diversos usos da Bacia do São Francisco, tendo como metas a manutenção do equilíbrio ecológico e o benefício da sociedade, as quais podem ser reunidas no conceito do desenvolvimento sustentável. Enfatizemos a necessidade de uma intervenção dos Poderes Públicos, mormente do Governo Federal, para que se preservem o rio São Francisco e seus afluentes. Nesse sentido, cabe registrar as palavras de um especialista no assunto, o engenheiro agrônomo e ex-Presidente da Ceeivasf José Theodomiro de Araújo.  

Voltemos à questão específica e altamente relevante da transposição das águas, mas antes firmemos o seguinte ponto de vista: é inaceitável que se promova qualquer ação concreta visando à transposição de águas da Bacia do São Francisco sem que se realize previamente a recuperação da saúde dos seus rios - especialmente, é claro, a do "rio da integração nacional". O próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso endossou esse entendimento ao assinar, em maio de 1995, juntamente com 12 Governadores, o documento intitulado "Compromisso pela Vida do São Francisco". Parece-nos entretanto que, passado todo esse tempo, poucos resultados foram efetivamente obtidos no sentido almejado.  

No que se refere à imperiosa elaboração do estudo de impacto ambiental, é preciso ressaltar a conveniência de fazê-lo de forma centralizada, considerando global e sistematicamente as diversas conseqüências possíveis do regime hídrico, do equilíbrio ecológico e da multiplicidade de usos da água do rio São Francisco. Acreditamos que nossa ênfase sobre a necessidade de gerenciar e equacionar os usos de uma bacia hidrográfica como um todo tenha deixado claro o acerto de tal opção.  

Não é sem justa motivação que a Lei nº 7.804, de 18 de julho de 1989, alterando o art. 10 da Lei nº 6.938, atribui a competência do licenciamento para a construção e funcionamento de estabelecimentos e atividades "capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental" ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama, no caso de atividades e obras de âmbito nacional ou regional.  

O fracionamento do licenciamento quanto ao projeto de transposição das águas do São Francisco pelos Estados interessados – como consta que já teria ocorrido com pelo menos um dos Estados – não é, portanto, justificável. É bom frisarmos, ainda, que o encaminhamento dessa problemática não deve ser tratado como uma disputa entre umas e outras Unidades da Federação, mas pautado por um exame imparcial e aprofundado dos seus vários aspectos e conseqüências, nas dimensões econômica, social e ambiental.  

O desvio de águas de uma bacia para outra é um tipo de intervenção humana que se pode considerar de alto impacto ambiental, uma vez que as águas não retornam ao curso de onde foram captadas, de modo diverso de outras utilizações dos rios, como a pesca e a navegação. Há exemplos de transposições bem-sucedidas de cursos de água, como o do rio Colorado, nos Estados Unidos; mas também há casos em que os prejuízos humanos e ambientais superam os benefícios, como o do rio Kissimmee, também nos Estados Unidos, cuja volta ao leito natural vem sendo proposta.  

No caso da transposição das águas do São Francisco, a questão ambiental deve ser ponto básico no equacionamento de custos e benefícios. Na avaliação de alguns pareceres técnicos, há o risco de que a diminuição da vazão total do rio possa acarretar modificação na relação das águas do Baixo São Francisco com o oceano, ensejando a penetração da "cunha salina", o que causaria, por sua vez, alterações relevantes para a sobrevivência da ictiofauna, assim como a perda de qualidade da água para o abastecimento humano e para a irrigação. Importantes projetos de irrigação nas várzeas de Sergipe e Alagoas e no platô de Neópolis, em Sergipe, seriam assim prejudicados.  

O impacto sobre as demais utilizações econômicas das águas do São Francisco deve ser cuidadosamente delineado. A Chesf, em nota técnica, avalia que "a efetiva retirada de 50 m 3 na sua primeira etapa corresponderá a uma redução de cerca de 1 milhão 250 mil megawatts/hora (MWh) anuais, ou seja, cerca de US$32 milhões. Na etapa final (260 m 3/s), a energia garantida não gerada atingiria 6 milhões e 400 mil/MWh anuais, equivalente à paralisação de uma usina do porte de Sobradinho". Se somarmos a isso a energia necessária para elevar as águas em vazão contínua de 280 m 3/s, que ficaria pouco abaixo da energia elétrica que se deixaria de gerar, teremos um quadro em que o equilíbrio do balanço energético do Nordeste fica significativamente alterado.  

Alguns estudos indicam que o potencial de solos irrigáveis no Vale do São Francisco, caso aproveitado em sua integralidade, demandaria recursos hídricos superiores aos disponíveis na Bacia. Outras projeções, por sua vez, prevêem que cada hectare irrigado fora da Bacia do São Francisco impede a irrigação de 2,5 hectares próximos às suas margens, por um custo mínimo.  

Todos esses fatores devem ser cuidadosamente sopesados e avaliados de modo a conduzir à decisão mais acertada. Não podemos nos esquecer, de modo algum, da necessidade de profundas mudanças estruturais no Semi-Árido do Nordeste, possibilitando o convívio adequado e humanamente digno com o fenômeno periódico das secas. Caso se efetue a transposição das águas, não há dúvida de que será necessário, para assegurar o sucesso dos projetos de irrigação que em grande parte a justificam, um conjunto de medidas atinentes às questões fundiárias, de políticas de crédito, de assistência técnica e de comercialização. Por outro lado, cabe ter em mente, como alertado pelo Corpo Técnico da 4ª Câmara do Conselho Superior do Ministério Público, que "todas as alternativas tecnológicas e de localização do projeto devem ser confrontadas com a hipótese de não execução do projeto". Isso implica que diversas soluções alternativas de combate à seca, incorporando os avanços nas tecnologias apropriadas ao clima semi-árido, devem ser efetivamente consideradas.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a situação evidenciada e questionada pela Ação Civil Pública de iniciativa do Ministério Público Federal da Bahia, decorridos cinco anos, permanece praticamente a mesma. Não foi tornado público qualquer estudo de impacto ambiental. Questões de alta relevância relativas às conseqüências de projeto de tal magnitude não vêm sendo expostas e debatidas com transparência, como exige o espírito democrático. Sensível, aparentemente, às objeções, críticas e indagações levantadas a propósito da implementação do projeto, o Governo Federal terá que reformulá-lo. Fala-se, agora, que a vazão a ser transposta não atingiria os 280 metros cúbicos por segundo inicialmente previstos, mas ficaria em torno de 50 a 100 metros cúbicos por segundo. Não é o caso, entretanto, de entendermos a discussão sobre a conveniência do projeto como uma barganha, em que se oferecem metros cúbicos de água para lá e para cá.  

São necessários estudos sérios e um debate aprofundado, que conduzam, sem demagogia, às decisões mais corretas face às necessidades de atender nossa população e garantir a preservação ambiental do inestimável patrimônio representado pela bacia do Rio São Francisco.  

Obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/09/1999 - Página 24939