Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • COMEMORAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 07/10/1999 - Página 26860
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, HISTORIA, FUNDAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA (FAO), COMBATE, FOME, MUNDO, DEFESA, DIREITOS HUMANOS, ACESSO, ALIMENTAÇÃO.
  • APREENSÃO, REDUÇÃO, AREA, CULTIVO, BRASIL, CRITICA, CONCORRENCIA DESLEAL, SUBSIDIOS, PRODUTO IMPORTADO, EXCESSO, TRIBUTAÇÃO, ALIMENTOS, PAIS, DEFESA, ISENÇÃO FISCAL, PRODUTO, CESTA DE ALIMENTOS BASICOS.
  • REPUDIO, EXISTENCIA, FOME, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, SECA, REGIÃO NORDESTE, DEFESA, POLITICA AGRICOLA, MELHORIA, ALIMENTAÇÃO, BRASILEIROS.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no dia 16 de outubro de 1945, há 54 anos, portanto, foi fundada, na cidade de Quebec, no Canadá, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura - FAO. Como todo sistema de organização ligado à Organização das Nações Unidas - ONU, a FAO foi criada após o trauma da Segunda Guerra Mundial, conflito durante o qual populações inteiras tiveram seu acesso à comida intencionalmente restringido. Sua criação, como a da própria ONU, resultava da disposição da humanidade de impedir novos surtos de barbárie por parte de Estados e governantes enlouquecidos.  

A preocupação dos fundadores da FAO, no entanto, não estava restrita às vítimas de bloqueios alimentares causados por conflitos políticos e militares. As vítimas de catástrofes naturais, como inundações, terremotos e outras situações de emergência, também foram lembradas, bem como as populações residentes em áreas de fome endêmica, ou seja, de gente em situação permanente de penúria, seja ela econômica ou nutricional, especialmente nas regiões e países mais pobres do Planeta.  

Os objetivos definidos para a FAO, quando de sua fundação, foram os seguintes: elevação do nível de nutrição e de vida da população mundial; melhoria da produção e da comercialização de produtos alimentícios; favorecimento do desenvolvimento rural, tudo visando ao objetivo último de eliminar a fome do mundo.  

Com efeito, não é possível de maneira nenhuma discordar de Jacques Diouf, Diretor-Geral da FAO, quando ele diz ser o direito à alimentação o mais importante de todos os direitos humanos, pois constitui a condição fundamental para a preservação da vida com um mínimo de qualidade e saúde.  

Infelizmente, Sr. Presidente, Srs. Senadores, apesar de todos os esforços ao longo desse quase meio século, a fome continua a infligir grandes sofrimentos à humanidade. Somente nos países em desenvolvimento existem cerca de 800 milhões de pessoas sofrendo de má nutrição crônica, entre as quais 192 milhões são crianças menores de cinco anos de idade. Em conseqüência, várias centenas de milhões de jovens apresentam problemas de atraso no crescimento, cegueira, surdez, deficiência física ou mental, bócio e outras doenças resultantes de avitaminoses ou da falta de nutrientes básicos em sua dieta. Segundo a FAO, há oitenta e nove países cujas populações são vítimas de escassez de alimentos, sendo quarenta e quatro deles na África; dezenove, na Ásia; quatro, no Oriente próximo; doze, entre as nações resultantes de fragmentação da União Soviética e, na nossa América Latina, nove. E, pasmem V. Exªs, para nossa extrema vergonha inclui-se entre esses nove o Brasil.  

A vergonha se nos afigura ainda maior quando constatamos que vem ocorrendo uma redução da área plantada com alimentos no País, e isso ocorre, como bem disse o Senador Osmar Dias, principalmente pela pressão exercida sobre os produtores pela concorrência com o alimento importado. Embora tenhamos crescido na área de grãos, nem toda área de alimentos tem tido o mesmo crescimento, e isso fragiliza o nosso País. O que antes se chamava pelo título pomposo de âncora verde, hoje não tem o mesmo significado. Qualquer problema internacional que reduza a oferta dos alimentos no mercado mundial significará uma crise imediata no suprimento de nossas feiras e supermercados, pois temos, hoje, uma grande quantidade de alimentos importados.  

Uma outra questão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sempre levantada aqui, no Congresso Nacional, pelos Parlamentares, principalmente por aqueles que procuram se debruçar com mais afinco sobre o problema de alimentação no Brasil, é o da tributação de alimentos em geral, principalmente da cesta básica. Já falamos aqui, por várias vezes: países ricos e desenvolvidos, como os Estados Unidos, França e Reino Unido, isentam inteiramente dos impostos equivalentes ao nosso ICMS os alimentos incluídos nas listas de consumo popular permanente. É absurdo que, com tantos pobres e miseráveis sofrendo na pele e no estômago as conseqüências do desemprego e da estagnação econômica, continuemos a tributar os alimentos integrantes da cesta básica.  

Por essa razão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, propus uma emenda à Constituição para aperfeiçoar uma proposta do Senador José Ignácio Ferreira sobre reforma tributária.  

Srªs e Srs. Senadores, insisto em dizer que a existência da fome em nosso País é nada menos que uma vergonha para nós, porque demonstra a nossa incompetência como povo em resolver os nossos problemas mais básicos, apesar da prodigalidade da nossa natureza. Agora, no Nordeste, Sr. Presidente, estamos sofrendo muito. Há três anos, no meu Estado, no de V. Exª e em outros Estados não tem chovido regularmente. Já falei, desta tribuna, por várias vezes, da vergonha de ser brasileiro quando se visitam aquelas regiões e se constata que até mesmo a cesta básica determinada pelo Governo não tem chegado com regularidade.  

Temos, em nosso País, o fornecimento de três milhões de cestas básicas. Isso alimenta, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cerca de quinze milhões de pessoas e, pasmem V. Exªs, custa apenas 250 milhões à República. Em um Orçamento grandioso como o que temos, 250 milhões não causam escarcéu. No entanto, esse dinheiro, neste ano, está faltando e deveremos ter mais quinze milhões de pessoas que não terão o recebimento regular dessa cesta básica.  

Há poucos dias, eu disse ao Presidente da República que isso era inadmissível, principalmente porque não vai atingir somente os que são pobres, mas os que são realmente miseráveis e que, neste momento, estão carecendo de ajuda, como é o caso dos nordestinos, que estão enfrentando essa seca bárbara. Mesmo num Estado como Rio de Janeiro, milhares e milhares de pessoas necessitam dessa cesta básica.  

Os documentários mostram, Sr. Presidente, que, nas áreas de fome endêmicas, na África e na Ásia, existem quase sempre regiões desérticas ou inóspitas, onde a agricultura exigiria recursos, sejam financeiros, sejam técnicos, para melhoria dessa agricultura. Não é o caso do Brasil, onde, excluído esse fenômeno da seca, há áreas e áreas que poderão ser de grande sucesso para a economia. Lembro-me que há poucos anos, e não sou tão velho assim, dizia-se que o cerrado não produziria coisa alguma e, hoje, há o milagre na área de grãos.  

É preciso, portanto, Sr. Presidente, que se faça uma política ampla de estímulo à produção de alimentos no País. Aliás, não entendo por que não temos o Ministério da Alimentação. Não temos o Ministério das Escolas, temos o da Educação; não temos o Ministério dos Hospitais, temos o da Saúde, mas ao se falar de alimentação, o Ministério é o da Agricultura, quando essa é apenas uma parte, embora importante, não resta dúvida. Deveríamos ter, sim, o Ministério da Alimentação; justificaria ainda mais o fornecimento de cestas básicas àquelas famílias que não podem ter garantido o seu alimento porque lhes falta emprego ou porque não tiveram a possibilidade de se qualificar e não têm uma forma mais garantida de conseguir alimento para os seus filhos.  

Essa é uma idéia que já me ocorreu em algumas ocasiões e eu até discutia isso com alguns dos próceres da nossa República, dizendo-lhes que não podemos, de maneira alguma, deixar de garantir a alimentação a todos os brasileiros.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil, com as suas terras disponíveis e o seu clima, é, potencialmente, um celeiro do mundo. Falta apenas a vontade política para fazê-lo cumprir o seu destino de grandeza, o destino desse povo que, hoje, passa fome neste País, embora a nossa terra seja tão generosa.  

Neste aniversário da FAO, data em que se comemora o "Dia Internacional da Alimentação", desejo manifestar a minha preocupação com todos os que passam fome no mundo, pois entendo que pode ser evitada, desde que os governantes ou todos nos incomodemos com essa questão.  

Portanto, quero deixar claro para os meus Pares e para todos os cidadãos brasileiros que penso que somente preocupação não basta: é preciso agir; para agir, é preciso começar por alguma parte, e nada melhor para isso que começarmos na nossa própria Pátria. Por isso, no exercício de nosso papel como legisladores deste País imenso e promissor, temos que pôr um fim ao estado de fome em que, lamentavelmente, se encontra parte considerável do nosso povo.  

Quem sabe, se tivermos, realmente, uma revolução produtiva em nosso País, se não potencializaríamos a nossa capacidade de ajudar com alimentos, com soluções técnicas ou políticas, outros povos deste mundo, que hoje também estão sendo atingidos pelo fenômeno da fome.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/10/1999 - Página 26860