Pronunciamento de Geraldo Cândido em 06/10/1999
Discurso no Senado Federal
COMEMORAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO.
- Autor
- Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
- Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA SOCIAL.:
- COMEMORAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO.
- Publicação
- Publicação no DSF de 07/10/1999 - Página 26869
- Assunto
- Outros > POLITICA SOCIAL.
- Indexação
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- COMENTARIO, DADOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA (FAO), INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), CONCENTRAÇÃO DE RENDA.
- ANUNCIO, CHEGADA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), MARCHA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, DEFESA, BRASIL, DEMOCRACIA, TRABALHO, PROPOSTA, PROGRAMA, EMERGENCIA.
- ANEXAÇÃO, DOCUMENTO, PROPOSTA, ERRADICAÇÃO, POBREZA, BRASIL.
O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no Dia Mundial da Alimentação: é preciso dizer que “progresso é o povo feliz e a ordem é não passar fome”.
Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, os números são da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação - FAO: no mundo inteiro, a vida de oitocentos e quarenta milhões de pessoas, ou seja, mais de cinco vezes a população do Brasil, está comprometida pela fome e pela desnutrição. Desse total, duzentos milhões são de crianças abaixo dos cinco anos de idade.
A população mundial se aproxima dos seis bilhões de habitantes e os dados anteriores são estarrecedores, porque, ainda segundo estudo dos técnicos da FAO, o mundo produz o suficiente para matar a fome dessas seis bilhões de pessoas, e ainda gera um excedente de cerca de 30% de alimentos. Portanto, se grande parcela da humanidade passa fome, podemos creditar a situação a um sistema econômico, que não é o “fim da história”, como a bem pouco tempo apregoavam alguns, mas ouso reafirmar o que disse a revolucionária Rosa Luxemburgo: o capitalismo é o caminho para a barbárie.
No Brasil, a realidade não é menos dramática. O projeto neoliberal, levado a cabo pelo Governo FHC, com o desmonte das políticas públicas do Estado e a redução do investimento nas áreas sociais, tem agravado ainda mais as desigualdades, fazendo do Brasil o campeão de má distribuição de renda. Segundo dados do IBGE, os 50% mais pobres detêm 11,2% da renda do país, enquanto os 20% mais ricos, 63,9%. A causa da fome em nosso país é, sem dúvida, a péssima distribuição de renda.
Apesar de ser uma das dez maiores economias do mundo, o Brasil ocupa o lugar de número 79 no ranking de desenvolvimento humano da ONU, que leva em consideração a expectativa de vida, a qualidade da saúde e educação, entre outros indicadores.
No meu Estado, o Rio de Janeiro, recente estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o IPEA, apontou que dos treze milhões, quinhentos e dezoito mil, quatrocentos e trinta e três habitantes, 12,32% se encontram abaixo da linha de pobreza. Isto significa que, em um dos estados mais desenvolvidos da União, cerca de um milhão e seiscentas mil pessoas não têm dinheiro sequer para suprir as necessidades de alimentação.
A causa da fome em nosso país é originária da péssima distribuição de renda. Um problema que depende, não só da mudança do modelo econômico vigente, mas da elaboração de um novo projeto para este país. Uma proposta radicalmente popular e democrática, sintetizando os anseios da maioria do povo brasileiro, que não sonha “falar inglês e navegar na Internet”, mas quer emprego, salário decente, casa, comida, educação, saúde e segurança.
Para demonstrar que esse projeto é possível, mil cento e oitenta militantes dos mais diversos movimentos sociais, como o MST, movimento sindical, pequenos agricultores, donas de casa, estudantes, agentes de pastoral, jovens e adultos, homens e mulheres, partiram da cidade do Rio de Janeiro, no dia 26 de julho deste ano, em direção a Brasília, e, depois de quase três meses de caminhada e mil quatrocentos e oitenta quilômetros percorridos, chegam amanhã.
Esses bravos brasileiros, que podem ser representados na figura do baiano Luiz Beltrame, de 91 anos, o marchante mais idoso, querem chamar atenção da sociedade para a gravidade do momento histórico que nosso país está vivendo.
A Marcha Popular pelo Brasil, em defesa do Brasil, da democracia e do trabalho, debateu com a população de mais de 40 municípios a crise do País e suas causas, e apontou as saídas sob a ótica dos setores excluídos da população.
Sr. Presidente, como os próprios marchantes admitem no texto que serviu de base para os debates com a população, “certamente, as saídas não são fáceis, nem milagrosas. Mas há saídas. Temos um país com enormes potencialidades. Temos recursos naturais, uma imensa área agricultável, minérios, energia abundante, água, fábricas, conhecimento científico, tecnologia e gente jovem e trabalhadora. É preciso mudar os rumos de nossa economia e propor um programa de emergência, que una nosso povo e construa uma alternativa que garanta soberania para o nosso país, democracia verdadeira e soluções concretas para as necessidades do povo, especialmente, de trabalho para todos”.
Diante dessas constatações, um programa de emergência, contemplando diversos pontos, foi apresentado à sociedade, através da Marcha Popular pelo Brasil. Vamos a ele.
I - Medidas para recuperar recursos
1 - Impedir que a riqueza produzida aqui seja enviada para o exterior para financiar os países ricos. Por isso, é preciso interromper a remessa de capital, controlar o capital especulativo e suspender o pagamento da dívida externa, mediante auditoria.
2 - Reduzir as taxas de juros, e suspender o pagamento da dívida interna do governo.
3 - Eliminar todos os incentivos fiscais concedidos às grandes empresas, que promovem o desemprego e não geram desenvolvimento econômico, implantando impostos sobre as grandes fortunas e recolhimento de impostos sobre os bancos.
4 - Confisco dos 7,4 bilhões de reais ganhos pelos bancos com a especulação cambial.
II - Destino desses recursos
- Implementar um programa maciço de investimentos desses recursos, no apoio à pequena e média empresa: na construção de casas populares - faltam dez milhões de casas -; na reforma agrária; no apoio à produção agrícola familiar; na garantia de escolas e atendimento de saúde gratuitos e de boa qualidade para todos os brasileiros. Isso vai gerar milhões de empregos e criar um mercado interno de massas.
III- Medidas políticas
1 - Ruptura com o FMI e defesa da soberania nacional.
2 - Suspensão e revisão de todas as privatizações de empresas estratégicas.
3- Aumento do salário mínimo e das aposentadorias.
Alguns poderão dizer que é utopia. Para mim, com a organização consciente da maioria do povo brasileiro, poderemos transformar as idéias em realidade, como diz o poeta Ademar Bogo, militante do MST, em seu poema “Marchar e vencer”, dedicado à Marcha Popular pelo Brasil: “A dor, a fome, a miséria e a opressão não são eternas. Eternos são os sonhos, a beleza e a solidariedade. Por estarem ao longo do caminho de quem anda. Em busca da utopia nas asas da liberdade”.
É preciso dizer que eu, e outros milhares de brasileiros, senadores, deputados, prefeitos, vereadores, sindicalistas, aposentados, homens e mulheres, cidadãos simples, se somarão à chegada da marcha, no dia de amanhã, aqui em Brasília. Essa gente, Sr. Presidente, teima em acreditar num país mais justo e generoso, onde o lema de sua bandeira possa dizer que: “Progresso é o povo feliz e a Ordem é não passar fome”. Solicito, ainda, Senhor Presidente, seja dado como lido o documento elaborado em meu gabinete intitulado "Como acabar com a pobreza no Brasil".