Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • COMEMORAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 07/10/1999 - Página 26884
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), BANCO INTERNACIONAL DE RECONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO (BIRD), RELATORIO, PROJETO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD), AUMENTO, MISERIA, FOME, BRASIL, MUNDO, INEFICACIA, ATUAÇÃO, ORGANISMO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, DADOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA (FAO), ORIGEM, FOME, INJUSTIÇA, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, REGISTRO, GRAVIDADE, DESIGUALDADE SOCIAL, BRASIL.
  • NECESSIDADE, AUMENTO, VERBA, PROGRAMA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DEFESA, PARTICIPAÇÃO, ENTIDADE, SOCIEDADE CIVIL, IGREJA, DISTRIBUIÇÃO, RECURSOS, OBJETIVO, REDUÇÃO, CORRUPÇÃO.

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, comemorar o Dia Mundial da Alimentação, nas circunstâncias atuais do Brasil e do Mundo até parece uma ironia: no caso do Brasil, porque, ao longo dos anos, o número de pessoas sem condições financeiras para usufruírem de uma alimentação adequada está aumentando; o mesmo ocorrendo em escala mundial.  

Em 1990, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, o número estimado de brasileiros com renda insuficiente para adquirir uma cesta básica era de 32 milhões. Nesse mesmo ano, o Banco Mundial – BIRD calculava em 24 milhões o montante de pessoas situadas abaixo da linha de pobreza. Hoje, segundo dados do IPEA, publicados no Correio Braziliense do dia 11 de setembro último, já se enquadram abaixo da linha de pobreza 37 por cento da nossa população, algo como 60 milhões de pessoas. A realidade desses números ou mostra uma tremenda imprecisão científica na coleta de dados ou é o indício claro de que piorou substancialmente a vida de milhões de compatriotas nossos, que moram especialmente no Nordeste, no Norte, no Centro-Oeste e na zona rural como um todo. De uma coisa todos podemos ter certeza: não é a exatidão dos números que é importante. O substancial é saber que a fome e a pobreza são uma triste realidade do nosso País.  

Em âmbito mundial, a batalha contra a fome e a pobreza está sendo perdida, de acordo com confissão de fracasso do Banco Mundial. Os índices estão aí para nos mostrar isso. Em 1996, os países do mundo, reunidos na Cúpula Mundial de Alimentação, prometeram, até o ano 2015, reduzir à metade o número de famintos do Planeta. Os dados coletados em 98, apesar de mostrarem uma leve redução em alguns países, retrataram, em termos globais, um quadro muito pior: nesse ano havia um contingente maior de 8 milhões de pessoas famintas.  

Esse quadro é assustador e preocupante, se avaliarmos adequadamente as palavras de Jacques Diouf, diretor da FAO, proferidas na Cúpula Mundial da Alimentação: "O orçamento da FAO (650 milhões de dólares) é menor do que o dinheiro gasto em seis dias por nove países desenvolvidos com comida para cachorros e gatos e menos do que 5% dos habitantes de um único país rico gastam por ano para cuidar da silhueta contra os problemas causados pelo excesso de alimentação".  

O que preocupa, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, é que existem famintos não por falta de alimentos. É o mesmo Jacques Diouf que afirma, com a autoridade que lhe confere o cargo de diretor da FAO, o organismo das Nações Unidas que cuida da Agricultura e da Alimentação: "Há alimentos para todos no planeta. Mas, para nossa vergonha, vivemos num mundo onde os alimentos apodrecem enquanto muita gente morre de fome".  

Esse mesmo paradoxo nós podemos verificar no Brasil. Enquanto grande parcela de nossa população passa fome, uma quantidade enorme de alimentos perece e apodrece em depósitos, mercados e feiras. À semelhança da indignação sentida por Castro Alves no poema Navio Negreiro, poderíamos dizer que também essa é uma situação "que clama aos céus e pede a Deus vingança".  

Se observarmos com atenção o quadro de renda per capita dos países do mundo, verificaremos que a situação do Brasil não é tão ruim. Estamos acima de 75 por cento da população mundial. O que ocorre é que aqui o rico é rico além da conta e o pobre é pobre abaixo dos limites. Como pode um País que tem a oitava economia do mundo, não ser capaz de resolver os seus problemas de distribuição de renda? É esse o desafio que enfrentamos.  

Aliás, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, esse não é um desafio somente do Brasil: o mundo pós-globalização também o enfrenta. O Relatório do Desenvolvimento Humano de 1999, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, o constata. Os 20 por cento de países mais ricos detêm 86 por cento do Produto Interno Bruto – PIB mundial, enquanto os 20 por cento mais pobres se arrumam com 1(um) por cento desse mesmo PIB. Isso ocorre por uma razão muito simples, reconhecida pelo próprio PNUD: "O debate atual é demasiado estreito, limitado às questões do crescimento econômico e da estabilidade financeira e negligenciando preocupações humanas mais vastas, tais como a persistência da pobreza mundial, o crescimento da desigualdade entre e dentro dos países, a exclusão das pessoas e países pobres e a persistência de abusos dos direitos humanos".  

Reconhecemos que a situação mundial é muito preocupante, mas antes de encontrar soluções para aqueles que moram além de nossas fronteiras, precisamos encontrá-las para os que aqui vivem, principalmente aqueles que sucumbem à seca do Nordeste, o maior e mais persistente problema de fome e pobreza que enfrentamos.  

Precisamos encontrar soluções. O Senador Antônio Carlos Magalhães, com a sua proposta de criar tributos para diminuir a pobreza e erradicar a indigência teve o mérito de tornar público o debate e fazer com as pessoas refletissem sobre ele com mais atenção e preocupação. O aumento das verbas aplicadas na área social precisa ocorrer. Entretanto, precisamos ter nossa preocupação voltada especialmente para a aplicação desses recursos. Todos nós sabemos que, se todas as verbas destinadas ao combate à seca tivessem sido efetivamente aplicadas nessa finalidade, o Nordeste já não estaria mais convivendo com esse problema. A experiência tem nos mostrado que a malversação tem sido uma constante quando esses recursos são utilizados tanto pelo Governo Federal, quanto pelos estaduais e municipais nesse combate. Por que não se mudar essa sistemática, repassando os recursos diretamente às entidades organizadas da população e às igrejas? Por que não chamar a população, através de associações, a participar da distribuição e aplicação desses recursos? Temos certeza de que a sua utilização seria muito mais justa equânime e abrangente e diminuiriam substancialmente as ocorrências de corrupção e de má aplicação do dinheiro público. Além disso, estar-se-ia dando um enorme impulso a essa população para que participasse mais ativamente da vida do País e para que se sentisse mais cidadã.  

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, apesar de nossa situação de pobreza e miséria ser preocupante, não podemos desanimar. O nosso País é rico e predestinado às alturas. Os seus recursos naturais e humanos são mais do que suficientes para resolver todos esses problemas. Um passo significativo foi dado pelo Congresso com a instalação da Comissão Mista para a Erradicação da Pobreza. O que esperamos é que daí resultem as melhores propostas e que Congresso, Governo e a sociedade as encampem e se comprometam a colocá-las em prática.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/10/1999 - Página 26884