Discurso no Senado Federal

INDIGNAÇÃO PELO POSICIONAMENTO DO PRESIDENTE DA ELETROBRAS EM REUNIÃO NA COMISSÃO DE INFRA-ESTRUTURA, SOBRE A CISÃO DO SISTEMA TUCURUI.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO. POLITICA ENERGETICA.:
  • INDIGNAÇÃO PELO POSICIONAMENTO DO PRESIDENTE DA ELETROBRAS EM REUNIÃO NA COMISSÃO DE INFRA-ESTRUTURA, SOBRE A CISÃO DO SISTEMA TUCURUI.
Aparteantes
Ademir Andrade.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/1999 - Página 27125
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, INFRAESTRUTURA, PRESIDENCIA, EMILIA FERNANDES, SENADOR, PARTICIPAÇÃO, PRESIDENTE, CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S/A (ELETROBRAS), CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE), OCORRENCIA, MANIFESTAÇÃO, COMUNIDADE, REGIÃO AMAZONICA, APREENSÃO, POSSIBILIDADE, DECISÃO, GOVERNO FEDERAL, APOIO, CISÃO, PRIVATIZAÇÃO, USINA HIDROELETRICA, MUNICIPIO, TUCURUI (PA), ESTADO DO PARA (PA).
  • CRITICA, POSIÇÃO, FIRMINO SAMPAIO, PRESIDENTE, CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S/A (ELETROBRAS), AUDIENCIA PUBLICA, DESRESPEITO, POPULAÇÃO, ESTADO DO ACRE (AC), IMPOSIÇÃO, ACEITAÇÃO, EXTENSÃO, REDE DE TRANSMISSÃO, AQUISIÇÃO, ENERGIA ELETRICA, ESTADO DE RONDONIA (RO), NEGOCIAÇÃO, INICIATIVA PRIVADA.
  • MANIFESTAÇÃO, OPOSIÇÃO, VENDA, USINA HIDROELETRICA, MUNICIPIO, TUCURUI (PA), ESTADO DO PARA (PA), COMPROMETIMENTO, MODELO, UTILIZAÇÃO, SISTEMA ELETRICO, POPULAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero fazer um registro da audiência pública ocorrida na Comissão de Infra-Estrutura, sob a Presidência da Senadora Emilia Fernandes, envolvendo os Presidentes da Eletrobrás e da Eletronorte, e o representante da Federação Nacional dos Urbanitários, Dr. Mauro Martinelli.  

Foi um encontro de enorme importância para nós, da Região Amazônica, porque o ponto de pauta foi a cisão de Tucuruí e a possível privatização da Hidrelétrica de Tucuruí. Toda a comunidade amazônica presente manifestou enorme preocupação com a situação que se estava colocando, com uma possível decisão do Governo Federal de, ainda no mês de outubro, decidir favoravelmente pela cisão de Tucuruí.  

Foi um debate de ampla representatividade, porque contamos com a presença do Líder do PMDB, Senador Jader Barbalho; tivemos manifestação do Senador Amir Lando e de representantes de todos os Estados, até do Líder do Governo no Senado Federal, Senador José Roberto Arruda, que demonstrou grande preocupação com a decisão precipitada que se pudesse tomar envolvendo o assunto. Lamentavelmente, testemunhamos, durante todo o transcorrer do debate, uma atitude de ironia, um certo sarcasmo do Sr. Presidente da Eletrobrás em relação ao assunto. Reconhecendo a inviabilidade da idéia do lucro, na discussão de utilização de energia para a Amazônia brasileira, especialmente, para a Amazônia ocidental, o Dr. Firmino, Presidente da Eletrobrás, teve a ousadia de dizer que, em relação, por exemplo, à parte mais ocidental da Amazônia, como é o caso do Estado do Acre, havia a seguinte opção: querer ou não querer uma extensão da rede de transmissão de Rondônia, que vai contar com um gasoduto desenvolvido pela iniciativa privada, que vai ter uma base de produção da utilização do gás natural em Rondônia para todo o Estado e que teria uma extensão de rede elétrica para o Estado do Acre. Se o Estado do Acre não quisesse, muito bem, que ele trataria com a Sudene, que tem grande interesse na utilização de uma extensão de rede e comercialização da energia através desse modelo.  

Ora, Sr. Presidente, foi um ato de desrespeito absoluto com o povo do Acre, de desrespeito com a responsabilidade e com a envergadura que o Presidente de uma estatal tem, de tratar as questões sociais e públicas como de necessidade e não de brincadeira de interesse de custo e benefício. Ainda mais, chegou ao ponto de dizer que foi uma decisão tratada quando da venda da Eletroacre, no Governo anterior do Estado do Acre, em que o Estado teria uma receita de cerca de 80 milhões, produto da negociação havida, e que deveria fazer seus investimentos, se quisesse, no sentido de perfuração e busca de gás natural, ou procurar uma outra alternativa. Como se fôssemos apenas obrigados a ter uma única opção: aceitar ou não aceitar a extensão da rede elétrica para sermos a periferia da periferia, para consumirmos a energia elétrica comprada de Rondônia, por meio de uma negociação da iniciativa privada.  

Então, houve um desrespeito absoluto, em todo momento da audiência com a comunidade amazônica, do Sr. Presidente da Eletrobrás, que acredito não seja a representação efetiva, real e verdadeira dos interesses do Governo Federal. Demonstramo-lhe, com toda clareza, o que é viver na Amazônia e ser vítima de uma política de privatização que afeta a todos nós, porque na Amazônia não está a idéia do lucro imediato, porque lá não estão os grandes aglomerados urbanos, as grandes concentrações sociais. Por isso, dependemos nitidamente de uma situação, de um lucro que não se abate e não se apresenta dentro de uma realidade da Amazônia.  

Olhar para a Amazônia é ter uma visão especial. Nela há dispersão populacional, dificuldade na arrecadação imediata do lucro por empresas que queiram se apresentar naquela região e é preciso vê-la com os olhos que merece. A Amazônia pode ser o grande vetor de elevação da personalidade internacional do nosso País para o próximo milênio; pode-nos colocar em uma condição de primeiro mundo se for bem tratada, com senso de prioridade e de objetividade.  

Lamentavelmente, faltou amor ao Brasil, faltou uma visão estratégica ao Sr. Presidente da Eletrobrás, faltou compreensão e respeito para com o povo da Amazônia.  

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB - PA) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Concedo o aparte ao nobre Senador Ademir Andrade, que, faço questão de registrar, foi quem iniciou um grande debate regional e nacional na defesa e no respeito a Tucuruí e ao modelo energético justo que queremos desenvolver para a Região Amazônica.  

O Sr. Ademir Andrade (Bloco/PSB - PA) - Agradeço a V. Exª, Senador Tião Viana, e gostaria de dizer que, na verdade, os funcionários do Sistema Elétrico Brasileiro estão fazendo um grande trabalho nesse sentido, defendendo os interesses da nossa Pátria e, principalmente, da nossa região. A eles se devem, digamos assim, as informações técnicas e todos os dados que nos têm chegado e que nos têm permitido, inclusive, combater e fazer o Governo voltar atrás nas suas decisões. Creio que, já pela segunda vez, o Governo adia o processo de cisão da Eletronorte. Agora, quero chamar atenção para um aspecto interessante: por mais que se possa ter boa vontade com este Governo, por mais que se faça um esforço extraordinário para compreender o que o Governo faz, ele jamais teria como justificar as suas atitudes. Veja bem, estamos construindo a segunda etapa da Hidrelétrica de Tucuruí. Durante quase cinco anos ouvi falar na construção dessa segunda etapa, e essa segunda etapa tem um investimento de R$1,2 bilhão. Ora, durante muito tempo se tentou um acordo com a iniciativa privada para que ela assumisse a obra com recursos próprios; e as indústrias de eletrointensivos tinham todo o desejo, ou a vontade, de assumir a obra, porque elas seriam suas donas. As indústrias de eletrointensivos, na nossa região - a Albrás e a Alunorte, em Barcarena, no Pará, e a Alumar, no Maranhão -, sozinhas consomem 40% de toda a energia produzida pela Hidrelétrica de Tucuruí, a um preço subsidiado, vergonhoso. O Governo brasileiro está perdendo US$200 milhões/ano em subsídio a essas duas empresas, que já não são mais estatais, porque a Vale do Rio Doce, pelo menos, tinha parte da Albrás e da Alunorte, e já não tem mais. No entanto, o Governo fecha os olhos a esse tipo de coisa. Os subsídios estão aí até 2.004, quando pensamos que poderão acabar, e seria interessante que essas indústrias de eletrointensivos, até por interesse próprio, de ter energia própria a partir do ano 2.004, pudessem construir a segunda etapa da Hidrelétrica de Tucuruí. Pois bem, para nossa surpresa, depois de quatro anos de negociação, o Governo assume, com recursos próprios, do Tesouro, a construção da segunda etapa da Hidrelétrica de Tucuruí. Então, não consigo compreender a coerência desse Governo. Imagine bem V. Exª: se ele não foi capaz de conseguir, no Brasil, no mundo - porque, agora, essas empresas são multinacionais -, alguém que pudesse investir R$1,2 bilhão, o que equivale, hoje, a US$700 milhões, para fazer a segunda etapa, por que, então, ele quer vender a Hidrelétrica de Tucuruí e os demais sistemas elétricos da nossa Amazônia? Por quê? Onde está a razão disso? Como se justifica isso? É para atender à imposição do Fundo Monetário Internacional? É para atender à imposição dos países desenvolvidos do Primeiro Mundo? Vender a troco de banana a Hidrelétrica de Tucuruí, que custou aos cofres públicos brasileiros 6 bilhões de dólares para ser construída, fora os juros que se pagou ao longo de todos esses anos do empréstimo que se tomou para executar essa obra, para servir ao interesse de multinacionais, que são a Albrás/Alunorte, a Alumar e o próprio Projeto Carajás, que é eminentemente exportador de riqueza natural, que é o nosso ferro de Carajás! Como é que se pode admitir um negócio desses? Este Governo não tem coerência, não tem ética, não tem comportamento. É um Governo irresponsável, é um Governo que segue as ordens do Fundo Monetário Internacional. E o povo da Amazônia, os Parlamentares da Amazônia não podem aceitar essa indignidade que querem fazer com o sistema elétrico da nossa Região, que é o Norte do Brasil. Não podemos aceitar a privatização da Eletronorte, a privatização da Usina Hidrelétrica de Tucuruí e dos demais sistemas elétricos da nossa Região, a não ser que o Governo nos apresente uma razão lógica, porque - repito -, se ele não foi capaz de conseguir a iniciativa privada para fazer uma segunda etapa, como é que ele quer vender a etapa que já existe e já construída a segunda etapa com recursos próprios? No fundo, ele vai gastar 10 bilhões de dólares para vender por 1 bilhão de dólares. Ela custou, na época, 6 bilhões de dólares. Coloque juros, encargos, tudo que vem ao longo do tempo, e ultrapassará a 10 bilhões de dólares. Vai gastar mais 1 bilhão e 200 mil reais agora, e quer vender por 1 bilhão de dólares a Usina Hidrelétrica de Tucuruí? Então, que Governo é este? É um Governo sério? Não é. Portanto, não podemos aceitar esse tipo de tentativa do Ministro, a qualquer custo, de dividir a Eletronorte para privatizar e entregar a empresas multinacionais que querem tomar conta da energia da nossa Região. Muito obrigado.  

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço ao nobre Senador Ademir Andrade, que fala com propriedade sobre o assunto. Senador Ademir Andrade, lembro-me de que, no decorrer do debate, em nenhum momento os Srs. Presidentes da Eletrobrás ou da Eletronorte souberam responde-me a razão que justificasse a idéia da venda de Tucuruí. Não há razão! Se não for pela cartilha fracassada e já contestada na sua origem do neoliberalismo, não há qualquer outra razão. E ainda mais: o reconhecimento de que no máximo ela poderá ser vendida por um bilhão de dólares e, seguramente, com um financiamento para a iniciativa privada que a compraria por intermédio do BNDES. Esta é uma situação injustificável, absurda, inclusive tendo em vista o sacrifício de milhões de seres vegetais, animais e até humano na construção da Hidrelétrica de Tucuruí. No entanto, agora, temos essa decisão, à revelia, de venda, comprometendo todo o modelo energético e a sua utilização para a população da Região Amazônica.

 

Lamento profundamente que essa tese tenha chegado onde chegou. Acredito que, hoje, com a possibilidade de se transformar, submetida em uma decisão política, ela não vai passar, o Governo Federal usará do bom senso, reconhecerá que o drama das privatizações para a Região Amazônica é especial, porque lá não está presente a idéia do lucro, e na hora em que a empresa privada chega na Amazônia, um funcionário, que pertencia a uma estatal, é tratado de maneira selvagem e sem precedentes na Região. Aliás, sou testemunha de como são tratados os funcionários das telecomunicações que atuam na nossa Região. É uma humilhação, uma imposição de recuperação de perdas sem tamanho, sabendo-se que ali não é uma Região onde o lucro prevaleça, porque há dispersão populacional, há diminuição do fator econômico de circulação na região, e aquela população não é capaz de alimentar a iniciativa privada nos moldes do egoísmo e da ganância do Centro-Sul do País.  

Srª Presidente, acredito profundamente que o Governo Federal vai rever essa situação, já que esta é uma decisão das Lideranças nacionais e da Região Amazônica, contrária à do Governo.  

Espero, sinceramente, seja revisto também que o atual Presidente da Eletrobrás não está à altura do cargo que ocupa, porque se o estivesse não estaria ofendendo o povo da Região Norte com os seus pronunciamentos, não estaria esquecendo que o salário dele é fruto da arrecadação do Imposto de Renda, do IPI, do Cofins, de todo o povo brasileiro, onde se inclui o povo do Norte e, conseqüentemente, o povo acreano também.  

Muito obrigado.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/1999 - Página 27125