Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO EMPRESARIO DA COMUNICAÇÃO DR. JOÃO SAAD, FUNDADOR E PRESIDENTE DA REDE BANDEIRANTES DE RADIO E TELEVISÃO.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO EMPRESARIO DA COMUNICAÇÃO DR. JOÃO SAAD, FUNDADOR E PRESIDENTE DA REDE BANDEIRANTES DE RADIO E TELEVISÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 12/10/1999 - Página 27238
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JOÃO SAAD, PRESIDENTE, EMISSORA, RADIO, TELEVISÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ELOGIO, ATUAÇÃO, INCENTIVO, COMUNICAÇÃO SOCIAL.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estranha coincidência quando me propus, nesta segunda-feira, a falar desta tribuna sobre a Amazônia. Eu, que sou do Rio Grande do Sul, considero a defesa da Amazônia a questão mais importante existente hoje no Brasil, como Nação.

Ouvi o pronunciamento de V. Exª e o do Senador Nabor Júnior, tratando exatamente dessa matéria. É claro que S. Exªs trataram desse assunto com muito mais profundidade e com muito mais conteúdo, por serem pessoas da terra, que conhecem, vivem e sentem aquilo.

Eu tive oportunidade de visitar o Projeto Calha Norte; fiz uma longa viagem de quatro dias, em um daqueles aviões do Exército Brasileiro em que se ficava sentado no corredor. Lá pelas tantas, pifou um motor, e todos rezaram para que, com o motor que havia sobrado, chegássemos ao destino. Tive oportunidade de andar por toda aquela região. Vi ali projetos que vieram com o Calha Norte. Em São Gabriel da Cachoeira, vi um batalhão do Exército construído com o objetivo de aprofundar o conhecimento da Amazônia, preparar a gente daquela região para o desenvolvimento e, com tranqüilidade, mas com grandeza, estabelecer uma meta de defesa das nossas fronteiras. Vi o Hospital da Marinha, mas que, na verdade, era um hospital de toda a região; diga-se de passagem, um hospital moderno, um bom hospital, que dava tranqüilidade àquela gente.

No Amazonas, fui convidado pelo então Comandante do Exército, da Região Norte, um General carioca que a mim emocionou. Durante dois dias assistimos a um curso que há na Amazônia para preparar as pessoas, os militares, os soldados para conviverem na selva, e preparando com um sentimento de defesa da Amazônia.

Estranhei, à época, Sr. Presidente, o tom daquele General, um carioca que estava há dois anos no comando do Exército da Amazônia. Era impressionante ver o amor que ele tinha por aquela região e a sua angústia pelo fato de o Brasil não se preocupar com a Amazônia. Contava ele que os americanos tinham uma escola semelhante àquela na fronteira do Brasil - se não me engano, na Guiana -, preparando gente americana, pessoas do Exército americano para conviver na selva amazônica. Em 1986!

Chamou-me a atenção, por onde andei, na Amazônia, o número não apenas de missionários, não apenas de religiosos, mas de técnicos, de cientistas, que, pagos por organizações internacionais, estavam estudando a Amazônia. Os mais variados assuntos e as mais variadas situações, e essas pessoas estavam lá, conhecendo a Amazônia.

Chamou-me a atenção a questão dos índios yanomamis. De certa forma, há uma querença no mundo inteiro no sentido de debatê-la. Claro que não vejo nos americanos nenhuma autoridade para querer olhar a floresta ou olhar como são tratados os indígenas nativos de um país, de uma nação, de uma terra. Eles foram os maiores exterminadores de que se tem conhecimento, exatamente na terra deles, dos índios deles. Mas é bonito ver, na Igreja, na humanidade, a preocupação com os índios yanomamis. É bonito ver, e tenho lido, tomado conhecimento de coisas que até então não conhecia: o que era o Brasil em 1500; as nações indígenas que habitavam esta terra; o desenvolvimento que muitas delas tinham no Brasil, no México, no Peru e em tantos outros lugares; o massacre que sofreram e as tremendas injustiças das quais foram partes.

Eu também defendo o respeito e que se dêem condições de vida e de defesa do que sobrou da sua raça às nações indígenas, principalmente aos índios yanomamis. Sou a favor de que se lhes dê uma localização de terras, para que possam desenvolver, mas que essa terra não fique na fronteira - yanomami do lado do Brasil e da Colômbia; do lado do Brasil e da Venezuela, nas três fronteiras -, para que não nasça a expectativa da criação de uma nação yanomami, com independência, e permita as intervenções de que se falam.

Já falei, ainda que rapidamente, das declarações americanas com relação à intervenção na Colômbia. São declarações abertas, francas, consultas feitas no sentido de que tropas americanas intervenham na Colômbia.

Li, Sr. Presidente, as declarações que V. Exª fez com relação ao ilustre militar, ex-chefe das forças militares da Colômbia. Ele tem razão, quando diz que o Brasil deve preocupar-se com a Colômbia. Ele tem razão, quando diz que o Brasil deve preocupar-se com a fronteira, com o combate ao narcotráfico e com o combate também ao contrabando de armas na região. Ele tem razão, quando diz que os políticos do Brasil, notadamente do Rio de Janeiro e de São Paulo, deveriam preocupar-se com aquela região, dando-lhe a merecida importância.

Penso que esta Casa, o Governo brasileiro e o Congresso Nacional deveriam olhar com muito mais profundidade aquela região. Nunca poderia imaginar, quando criança, olhando com orgulho o tamanho do Brasil no mapa, que um dia teria de assumir esta tribuna e chamar a atenção nossa, de nós, brasileiros, no sentido de nos preocuparmos com o tamanho territorial do Brasil.

Sempre aprendi que o Brasil era uma Nação pacífica, com as suas fronteiras delineadas, tranqüilas, não havendo, conseqüentemente, qualquer problema entre nós. Esses problemas não existem na limitação do tamanho da Amazônia brasileira, da Amazônia boliviana, da Amazônia venezuelana, da Amazônia colombiana ou da Amazônia guianense. Não há qualquer problema nesse sentido. Os países vizinhos e limítrofes, que têm a responsabilidade coletiva de olhar pela Amazônia, podem ter, provavelmente sim, os equívocos de não dar a atenção que deviam à região, mas não são nenhum deles responsáveis por questão de limites, por questão de fronteiras, por questão de vaidade de querer avançar ou não aceitar que os outros avancem.

É claro que o problema sério que está havendo hoje é da Colômbia em geral, e também o problema do narcotráfico de um modo especial. Que o narcotráfico é hoje uma das questões mais graves para a mocidade da humanidade inteira, é verdade. Que o narcotráfico é hoje uma questão que faz com que todos nós temamos com relação ao futuro dos nossos países, de nossos jovens, também é verdade. Que o narcotráfico é hoje um grande problema para a mocidade americana, talvez um dos problemas que, com toda a potência, com o todo o dinheiro, com toda a organização, eles estejam impotentes, não podendo conter seu avanço, também é verdade. Que ali, dramaticamente, naquela região, se instalou uma possibilidade de plantio e, mais que isso, de industrialização da droga, e que naquela região se cria uma possibilidade de o tráfico ser altamente facilitado, também é verdade. Que os americanos tenham preocupação, é compreensível, mas creio que nessa questão temos todos de nos dar as mãos. Não para intervir na Colômbia, mas sentar à mesa com a Colômbia e buscar a ajuda necessária.

Difícil a questão colombiana. Por iniciativa do Presidente Sarney, esteve na Comissão de Relações Exteriores o Vice-Presidente colombiano. Jovem, muito jovem, mas muito competente, muito responsável, fez uma análise muito fria, muita objetiva de seu país, em que sentimos que é grave a questão colombiana, que é difícil ver os próximos passos, que difícil é compreender qual será a saída.

A Colômbia, não por ação interna, mas por intervenção americana, já perdeu uma de suas zonas mais importantes, que é o Canal do Panamá. A vida inteira se esperou a ligação do Atlântico com o Pacífico na região. Quando ela saiu, os americanos - como é de sua tradição, não permitiram que a região ficasse sob o comando da Colômbia - criaram um país, o Panamá. Agora, estamos às vésperas de saber se devolverão o Canal à autonomia do Panamá; se as tropas se retirarão do Panamá, ou se eles lá permanecerão. Esse é um outro complicador.

Sr. Presidente, nós, brasileiros, devíamos tomar uma posição - e esta seria uma questão de honra; nos dirigirmos à Amazônia, possuirmos a Amazônia, estarmos presentes na Amazônia.

Quando se criou a Zona Franca de Manaus, todo o objetivo, todo o debate em torno da matéria era criar um pólo de desenvolvimento, um pólo industrial, um pólo de crescimento com indústrias progredindo, desenvolvendo, avançando de tal forma que haveria uma marcha para o Norte. Lá se vão tantos e tantos anos.

Há discussões e debates se a Zona Franca de Manaus deve continuar, alguns até querendo fechá-la. Existe uma interrogação com relação aos paulistas, uns odiando a Zona Franca porque faz concorrência desleal, porque não paga impostos, outros, paulistas que estão lá. Até agora não saiu o pólo industrial, mas um pólo de montagem de peças estrangeiras, mas na verdade, na verdade, foi uma tentativa, é uma tentativa.

Quando vejo, de modo especial, o Senador Bernardo Cabral debatendo e discutindo a questão da Amazônia ligada à questão industrial, à Zona Franca, fico a pensar o que pode ser feito para transformá-la efetivamente naquilo para o que ela nasceu.

Quando vejo Parlamentares do Norte defenderem que o projeto Calha Norte tem de sair da paralisação em que se encontra e que deve continuar, fico a pensar se é justo que ele tenha estacionado e que as verbas que se tem no próximo Orçamento, inclusive no Plurianual, para o Calha Norte, sejam praticamente zero - zero não é, mas é algo parecido com isso, porque praticamente não dá para fazer nada.

Para nós brasileiros, seria ridículo, senão grotesco, se a nossa passagem pela vida pública culminasse com algo desta natureza: estrangeiros entrando na Amazônia; o que, aliás, hoje não é irreal, não é um sonho. Repito: os americanos fazem a pergunta, e o Sr. Menem, no final de seu mandato, com a nostalgia já do poder e sonhando com a popularidade que não tem, antecipou-se oferecendo tropas argentinas para as Forças de Paz ocuparem a Amazônia da Colômbia.

Não sei, mas acredito que essa questão deveria ser prioritária. Cada um de nós, cada Estado, cada região devia dar a sua capacidade de ocupação na colaboração da Amazônia.

Quando estive em Roraima, emocionei-me ao encontrar uma leva de gaúchos, não aqueles que estão indo pelo Brasil para levar a agricultura, para explorar a terra, para desbravar o interior do nosso País, mas gaúchos da Universidade de Santa Maria, jovens estudantes, alguns já formados, doutores, médicos, engenheiros, que estavam participando do Projeto Rondon, num convênio entre a Universidade e o então território. Impressionante o trabalho que aquela gente fez! Impressionante trabalho de penetração pela Amazônia! Mais impressionante ainda é que aquelas pessoas de Santa Maria, Rio Grande do Sul, apaixonaram-se pela terra e lá ficaram! Deputados Estaduais, Federais, Prefeitos, Lideranças, médicos humanitários. Lá estão eles, como seus CTGs, símbolo do Rio Grande do Sul, nortistas apaixonados e defensores da região. Pena que aquela projeto - até hoje não entendo por que, e tenho vários estudos. Inclusive quando V. Exª era Presidente, Senador José Sarney, lembra-se de reuniões que se fez com o Alto Comando exatamente no sentido do Projeto Rondon? À época eu o defendia.

Durante muito tempo, metade do Exército brasileiro esteve na fronteira do Brasil com a Argentina; imaginava-se que era absolutamente fora de qualquer hipótese a não-realização futura de uma guerra entre o Brasil e a Argentina. Alegrete tem quatro quartéis do Exército; Santiago do Boqueirão tem quatro quartéis; São Borja tem três quartéis e Santa Maria, mais quatro, todos no Rio Grande do Sul. Quartéis que desenvolveram a região, que trabalharam para o desenvolvimento dessa.

À época, perguntei: por que alguns desses quartéis que já cumpriram sua missão não são transferidos para a Amazônia? Por que não se criar na Amazônia um quartel ferroviário ou um quartel rodoviário? Quartéis que tenham exatamente a missão de não serem apenas forças armadas de segurança, mas que realizem obras muito importantes e fundamentais para o desenvolvimento.

Penso que essas últimas declarações dos americanos aos jornais, deixam claro que, para interferir na América, não precisam da ONU, basta a Organização dos Estados Americanos. Como aconteceu na Iugoslávia, onde não se precisou da ONU, mas bastou uma determinação dolorosa da OTAN, nos festejos de seu cinqüentenário. Pela primeira vez, a OTAN determina a invasão em um país soberano. Perdoe-me, Senador José Sarney, mas não poderia deixar de citar isto, pela casualidade de sua presença, quando de seu pronunciamento emocionante em que dizia que “as nações não se fazem sem poetas.” V. Exª é um poeta, um escritor, um político e um intelectual. V. Exª foi Presidente deste País - e quero fazer-lhe justiça nesse sentido -, porquanto o Projeto Calha Norte teve a visão de V. Exª e avançou muito em seu governo. Creio que V. Exª poderia, com a autoridade que tem, coordenar, orientar, somar e estabelecer um grande debate de que o País precisa. Entre nós, os brasileiros, os peruanos, os venezuelanos, enfim, nós, os países amazonenses, que temos a Floresta Amazônica sob nossa responsabilidade. Deveríamos fazer um grande movimento, um debate com as forças internacionais, que dizem que há dinheiro à vontade para defender a floresta, no sentido de discutir, se a Floresta Amazônica é a grande reserva de oxigênio do mundo inteiro, temos a obrigação de preservá-la. O moderno conceito de meio ambiente é tão intenso hoje que, a não ser de forma criminosa, não se decidirá sobre o pouco que resta das florestas do mundo, como se fez com a floresta atlântica no Brasil, nos Estados Unidos e em tantos países, ou com as reservas naturais da Terra que foram queimadas, começando pela Europa, séculos atrás.

           Poderíamos criar um grande plano nacional -- ou até internacional -- de preservação da Amazônia, dos seus rios e das suas florestas, de possibilidade da exploração da Amazônia da melhor maneira, mantendo-a, não se esquecendo de que os grandes projetos que a reduziram foram internacionais, foram propostas de grandes empresários, de grandes grupos internacionais que lá quiseram se fixar e que, se não foram adiante nas propostas, foram adiante na destruição da floresta.

           Penso, e falo com profundo sentimento de brasilidade, que o maior problema do Brasil é a Amazônia. Claro que temos o problema social, com 30 milhões de brasileiros que praticamente vivem à margem da miséria. Temos gente morrendo de fome. Os problemas sociais do Brasil são inevitáveis e devem necessariamente ser colocados com prioridade absoluta. Como dizia o Betinho: se a pessoa está morrendo de fome não vamos discutir se devemos dar a cesta alimentar, se ela deve ou não ser dada, se é caridade ou não; se se está morrendo de fome, o que deve se fazer é evitar que isso aconteça, para, depois, se tomar a segunda providência. Mas, afora isso, creio que a grande, mas a grande proposta que a Nação tem que fazer é em relação à Amazônia; é olhar para a Amazônia.

           Sinto nas declarações que V. Exª citou do John Major e do próprio François Mitterrand, sinto nas afirmativas de muitas pessoas do mundo que, para eles, a Amazônia é uma questão de tempo. É grande demais para o Brasil olhar, é importante demais para ter uma soberania absoluta, grande demais para pertencer apenas a um povo. Nós temos que fazer a nossa parte no sentido daquilo que podemos realizar para desenvolver e preservar a Amazônia, mas, basicamente, para garantir a nossa soberania naquela região.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/10/1999 - Página 27238