Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A REFORMA POLITICA. CONSULTA ENCAMINHADA AO SUPERIOR TRIBUNAL ELEITORAL SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DA 'BOCA-DE-URNA' COMO CAPTAÇÃO DE SUFRAGIO.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A REFORMA POLITICA. CONSULTA ENCAMINHADA AO SUPERIOR TRIBUNAL ELEITORAL SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DA 'BOCA-DE-URNA' COMO CAPTAÇÃO DE SUFRAGIO.
Publicação
Publicação no DSF de 15/10/1999 - Página 27629
Assunto
Outros > ELEIÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, ATRASO, CONGRESSO NACIONAL, DISCUSSÃO, REFORMA POLITICA, REGISTRO, APROVAÇÃO, LEI FEDERAL, PROIBIÇÃO, CAPTAÇÃO, VOTO, EXPECTATIVA, REDUÇÃO, ABUSO, PODER ECONOMICO, ELEIÇÕES.
  • LEITURA, CONSULTA, AUTORIA, ORADOR, DESTINAÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), ESCLARECIMENTOS, DUVIDA, CONTRATAÇÃO, TRABALHO, PROPAGANDA ELEITORAL, DIA, ELEIÇÃO, REGISTRO, OCORRENCIA, ELEIÇÃO ESTADUAL, ESTADO DE SERGIPE (SE).

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lamentavelmente o Congresso Nacional, por motivos que não nos cabe neste momento relatar, não fez a reforma política que havia sido proposta pela Comissão Especial que funcionou no Senado Federal desde os idos de 1996.  

O andamento desta reforma chegou até a Comissão de Justiça, alguns projetos foram apresentados, mas tudo que havia sido previsto em termos de reforma política, fidelidade partidária, voto proporcional ou não, financiamento público de campanha, eleições para a Presidência da República, admitindo ou não a reeleição para presidente, governadores e prefeitos, todos esses temas foram colocados de lado. E esperamos que nas próximas eleições do ano de 2002 tenhamos um quadro mais positivo com relação à melhoria da qualificação política dos Partidos Políticos e também uma eleição mais transparente, porque as eleições que temos enfrentado até o presente momento têm desencadeado um processo de fraude e de total falta de credibilidade do eleitorado.  

Apenas uma norma foi aprovada para as eleições do ano 2000 - as eleições municipais -, a que se refere a um projeto de natureza popular, que colheu mais de um milhão de assinaturas, que teve o apoio da Igreja e também a aprovação unânime do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. É a Lei nº 9.840, de 28 de setembro de 1999, que alterou a Lei nº 9.504/97, que veda a captação de sufrágio ou a compra de votos - logicamente a compra de votos sempre foi proibida e vista como crime eleitoral.  

Entretanto, as eleições passam e nenhuma providência é tomada contra essa vergonhosa e inadmissível compra de votos que destoa o resultado da eleição em favor de uma democracia mais transparente e participativa, em que todos os cidadãos tenham o direito de receber o voto e não haja tanta influência do poder econômico, como tem existido ao longo da história do Brasil, notadamente nas últimas eleições, como ficou provado nos diversos pronunciamentos feitos no Senado Federal e na Câmara dos Deputados, denunciando desmandos de executivos que usaram a máquina do Governo, recursos sem monta, no sentido de garantirem a qualquer custo suas eleições, dando um prejuízo enorme a este País, com gastos exorbitantes, enquanto obras de infra-estrutura deixaram de ser realizadas em função de um interesse muito menor: colocar temporariamente - numa democracia, ninguém fica no Poder eternamente - determinados políticos que se empenharam em gastar dinheiro público para garantir sua própria eleição.  

Em função dessa nossa preocupação, demos entrada hoje perante o Egrégio Tribunal Superior Eleitoral a uma consulta que diz respeito a um movimento efetivado em todo o Brasil durante o dia da eleição, que é a contratação de bocas de urnas. Pessoas contratadas previamente por candidatos se apresentam nas praças, nas ruas, vestindo camisas e bonés com números de candidatos, levando bandeiras, e no dia da eleição, em que o eleitor deveria sair de casa para as urnas, com o objetivo único e exclusivo de votar, o eleitor fica impressionado com aquela movimentação, nas ruas, de pessoas enfeitadas com o nome de candidatos ricos. São as chamadas bocas de urna.  

A nossa consulta feita ao Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, Sr. Presidente, é a seguinte:  

"A arregimentação, no dia de eleição, de "BOCAS DE URNA", ou seja, de pessoas que, mediante pagamento, usam camisas, bonés, bottons, bandeiras e outros itens que identificam sua preferência eleitoral, comprometendo o seu voto e colocando o seu trabalho a serviço de candidatos, de forma aparentemente gratuita, para inclusive induzir o eleitorado a também votar naquele determinado candidato, caracteriza "CAPTAÇÃO DE SUFRÁGIO", e sujeita, portanto, ditos candidatos pela efetivação de tal prática, bem como as "BOCAS DE URNA", às penalidades previstas na Lei nº 9.840, de 28 de setembro de 1999?  

 

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS  

 

O art. 1º da Lei nº 9.840, de 28 de setembro de 1999, acrescentou o art. 41-A à Lei nº 9.504/97, vedando a "CAPTAÇÃO DE SUFRÁGIO" e definindo-a da seguinte forma:  

"Art. 41- Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990."  

Prescreve, por outro lado, o Código Eleitoral brasileiro, em seu art. 248, que " ninguém poderá impedir a propaganda eleitoral, nem utilizar, alterar ou perturbar os meios lícitos nela empregados ." 

Assim, a proteção aqui visada pelo legislador ordinário baseia-se num dos postulados básicos de nossa ordem constitucional, que vem a ser a liberdade de expressão.  

No entanto, para que tal liberdade de expressão seja praticada de forma cristalina e limpa, em consonância com os princípios éticos que devem reger o processo político, pensamos necessária uma disciplina, emanada da lei, no sentido de coibir qualquer abuso, sempre nocivo ao exercício da democracia. Esse abuso, infelizmente, tem-se verificado a cada pleito, mediante o uso de um artifício que na prática representa um grande instrumento para compra de votos em massa: a chamada boca de urna.  

A boca de urna é a artimanha mais utilizada pelos candidatos, principalmente os de maior poder aquisitivo, para disfarçar a efetiva e vergonhosa compra de votos, sob a capa de propaganda "voluntária" de eleitores em favor de candidatos a cargos eletivos. Para participar de uma arregimentação de boca de urna, basta que o candidato ou o partido político ofereça ao eleitor um kit contendo camisetas, bonés etc, para identificação do "trabalho", e posterior recebimento em dinheiro, sob promessa de voto certo no candidato.  

Além do mais, a presença massiva, no dia da eleição, de milhares de bocas de urna dá a impressão aos eleitores incautos de que o candidato que tem tantos "militantes" do seu lado, para veicularem o seu nome, já é um candidato antecipadamente vitorioso.  

Tal fato influencia ou induz o eleitor a se convencer do "prestígio" desse candidato, muitas vezes ancorado única e exclusivamente no seu poderio econômico, mediante o qual arregimenta pessoas sob promessa de retribuição, podendo distribuir milhares e milhares de camisas, bonés e tudo o mais que possa contribuir para a sua vitória, em detrimento dos que não têm posses para a realização de tais movimentos, no dia da realização do pleito.  

Ora, conforme prescreve a Lei nº 9.840, de 28 de setembro de 1999, recentemente editada, que alterou a Lei nº 9.504, de 30/09/97, nos termos do seu art. 41-A, "constitui captação de sufrágio, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive".  

Por tais razões, dada a relevância da matéria e as conseqüências que lhe são ínsitas, é de todo conveniente o pronunciamento dessa Egrégia Corte, para que a tal respeito não paire qualquer dúvida.  

Termos em que  

P.E. deferimento.  

Brasília, 13 de outubro de 1999.  

Senador Antonio Carlos Valadares"  

Sr. Presidente, com esta consulta, queremos que o Tribunal Superior Eleitoral deslinde de uma vez por todas essa dúvida que, por incrível que pareça, ainda persiste no meio político, qual seja, a contratação, no dia da eleição, de bocas de urna para que essas pessoas, previamente contratadas, vestidas com camisas portando número e nome de candidatos, possam fazer a propaganda do candidato que os contratou de forma livre, como tem ocorrido em todo o Brasil há várias eleições.  

É inconcebível, Sr. Presidente, que esse movimento da contratação ou da arregimentação de bocas de urna continue sendo utilizado; esse movimento é um aliciamento de eleitores, a verdade é essa.  

No Estado de Sergipe, que represento, um Deputado Estadual, no dia da eleição passada, a de 1998, contratou mais de 12 mil bocas de urna, que receberam um kit com camisa, boné, onde estavam escritos o nome e o número do candidato e foram para as ruas, para as praças da cidade. Passada a eleição e contados os votos, o Deputado Estadual que não esperava se eleger, de forma nenhuma, apareceu entre os mais votados na cidade de Aracaju. Elegeu-se Deputado Estadual; contratou os bocas de urna e o pagamento prometido não foi feito. Soubemos, dessa maneira, que aqueles bocas de urna eram pagos porque se consideravam lesados. E eles foram aos órgãos de comunicação, aos jornais, à televisão e à própria residência do candidato a Deputado Estadual, para exigir o pagamento que, segundo esses bocas de urna, era devido a eles. Além disso, num dos bairros da cidade de Aracaju, o comitê desse candidato foi depredado pelos bocas de urna. O candidato disse que realmente contratou os bocas de urna, mas que não pagaria de maneira nenhuma, porque a legislação eleitoral não permitia esse pagamento.  

Ora, Sr. Presidente, esse é apenas um dentre centenas de fatos ocorridos em todo o Brasil, durante as eleições de 1998.  

Agora, estamos prestes a realizar um pleito importante, onde mais de 5.500 Municípios brasileiros estarão fazendo eleições para a escolha de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores. Naturalmente que muitos desses candidatos estão pensando ser possível a contratação de boca de urna. Penso que, logicamente, não é possível da forma como ocorre nas eleições. Daí, a consulta que faço ao Tribunal Superior Eleitoral para que defina, de uma vez por todas, se os candidatos poderão utilizar-se desse processo ardiloso no sentido de comprar, no dia das eleições, eleitores travestidos de bocas de urna, garantindo as suas eleições. Espero que o Tribunal Superior Eleitoral resolva definitivamente este assunto que vem envergonhando a nacionalidade.

 

Com a aprovação da Lei nº 9.840, de 28 de setembro de 1999, que recebeu o apoio de mais de um milhão de eleitores em todo o País, temos a certeza de que o TSE terá o embasamento legal de que precisava para proibir, em definitivo, a arregimentação de bocas de urna nas eleições do ano 2000 e dos anos subseqüentes.  

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/10/1999 - Página 27629