Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A REDUÇÃO DAS TAXAS DE JUROS ANUNCIADA RECENTEMENTE PELO GOVERNO FEDERAL.

Autor
Luiz Estevão (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/DF)
Nome completo: Luiz Estevão de Oliveira Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A REDUÇÃO DAS TAXAS DE JUROS ANUNCIADA RECENTEMENTE PELO GOVERNO FEDERAL.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/1999 - Página 27842
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, NOTICIARIO, IMPRENSA, ESFORÇO, GOVERNO FEDERAL, TENTATIVA, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, FATOR, PARALISAÇÃO, ATIVIDADE ECONOMICA, OFERTA, EMPREGO, CRESCIMENTO, DESEMPREGO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, BANCOS, ABUSO, COBRANÇA, TAXAS, JUROS, PREJUIZO, PRODUÇÃO, PAIS.

O SR. LUIZ ESTEVÃO (PMDB - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores a imprensa de todo o País noticiou, com grande e merecido destaque, o esforço que o Governo Federal vem fazendo no sentido de procurar reduzir as taxas de juros, o grande fator de inibição da atividade econômica em nosso País no momento.  

Com efeito, se examinamos o trabalho do Presidente do Banco Central, Dr. Armínio Fraga, desde a sua posse até os dias de hoje, temos o dever de cumprimentá-lo por ter conseguido, nesse período de tempo, cumprir uma de suas promessas, quando da sabatina a que foi submetido neste Senado, a de reduzir, no menor prazo possível, a taxa básica de juros — naquele momento, da ordem de 49% ao ano — para patamares bem mais palatáveis para a economia brasileira.  

Promessa feita, e é preciso que se diga: promessa cumprida. Há alguns meses, o Brasil vem convivendo com uma taxa básica de juros da ordem de 19%, quase três vezes menor do que aquela praticada no mês de fevereiro, quando de sua posse. Sem dúvida, essa era uma das principais providências reclamadas pelos Parlamentares, pelos dirigentes empresariais, por todos aqueles que apostam no desenvolvimento do País como a grande ferramenta para nos tirar do impasse em que nos encontramos. Trata-se de um país em que muitos trabalham; em que outros gostariam de trabalhar, mas não podem, porque não têm emprego. Lamentavelmente, é um país que vem empobrecendo a cada ano.  

Se da parte do Banco Central e do Ministério da Fazenda a tarefa foi cumprida com a redução da taxa básica de juros de 49% para 19%, lamentavelmente, percebe-se que esse benefício não chegou ao seu destinatário. Ou seja, a redução da taxa de juros, por exemplo, para o financiamento da atividade produtiva, para capital de giro das empresas, para operações de curto prazo, para financiamento de aquisição de bens de consumo, praticamente permaneceu inalterada, como se ainda vigesse no País aquela taxa de juros praticada em fevereiro deste ano. Na semana passada, o Governo Federal fez mais um esforço no sentido de proporcionar essa indispensável alavanca ao desenvolvimento do País.  

Em matérias publicadas na imprensa de ontem, notadamente nas revistas Veja e Época, estão as justificativas apresentadas pelos bancos para que a baixa de juros na captação não seja transferida para o consumidor final. Da leitura dos números apresentados pelos bancos, por meio da imprensa, só resta uma alternativa: rir, e rir para não chorar, pois simplesmente se vê que, enquanto para o aplicador é paga, no depósito de longo prazo, uma taxa de remuneração de 1,6% ao mês, a taxa cobrada de pessoas físicas para o uso do cheque especial é de 8,9%, portanto, quase seis vezes maior, com lucro bruto entre a diferença de custo e de venda de cerca de 600%. Em qualquer ramo de atividade, essa margem de lucro bruto seria realmente uma distorção em relação ao resto do mundo. E o mesmo acontece com as taxas de juros do nosso País. Não é à toa que o Brasil hoje pratica a maior taxa de juros ao consumidor do mundo.  

Qual a justificativa para uma diferença tão grande entre o custo de compra do dinheiro e o seu preço de venda? Conforme uma resposta publicada pela imprensa, segundo os bancos, de cada R$10,00 cobrados a mais de lucro bruto sobre a diferença de captação e de venda do dinheiro, R$2,00 seriam referentes a despesas administrativas. Ora, isso é uma piada, porque nunca vimos nenhum ramo de atividade em que a despesa administrativa pudesse corresponder a mais do que o custo de compra do insumo básico, que é a captação do dinheiro. Mais do que isso, é preciso que se diga que os bancos hoje cobram taxa por todos os serviços que prestam, inclusive pelo fornecimento de extratos, talões de cheque, cobrindo, portanto, grande parte dessa despesa administrativa, já com a venda que fazem dos serviços, sem os quais, aliás, é impossível, para qualquer correntista, movimentar uma conta bancária.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. LUIZ ESTEVÃO (PMDB - DF) - Ouço V. Exª, nobre Senador Romero Jucá.  

O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Meu caro Senador Luiz Estevão, V. Exª traz um tema que é extremamente grave e precisa ser debatido pela sociedade brasileira. Trata-se da vergonhosa taxa de juros que é cobrada em nosso País. O Governo tem feito um esforço no sentido de baixar medidas que, de certa forma, procurem descomprimir essa diferença entre a taxa de juros básica e os juros de mercado, mas, na verdade, tudo isso tem sido muito pouco, quando se compara — como V. Exª está fazendo nesta tarde — o resultado prático das medidas com a taxa de juros que o cidadão paga no fim da linha. Sem dúvida, os juros são escorchantes. Não há economia de mercado que possa sobreviver com a taxa de juros hoje praticada no Brasil. Não há atividade produtiva que possa remunerar qualquer empréstimo com taxa de juros de 200% ou 300%. Isso é uma insanidade. Apesar das medidas tomadas pelo Governo, como a redução de depósito compulsório, a diminuição da taxa de IOF e outras que visam, de certa forma, a facilitar e baratear a atuação dos bancos, não há reciprocidade do lado destes no tocante a uma visão social e econômica do País. Os bancos deveriam ser os grandes impulsores da atividade econômica. E, hoje, a taxa de juros é, na verdade, o inverso: o grande inibidor ou quebrador das atividades econômicas. Ela faz com que a falência e as contas de juros inviabilizem a produção nacional. Então, penso que o Governo — o Presidente disse isso muito claramente na semana passada — vai procurar um mecanismo para tornar claras à população a concorrência e a questão dos juros cobrados por diversos bancos. No entanto, temos que buscar caminhos duros. Não é possível que a produção brasileira fique sujeita à taxação de juros dos bancos da forma como está. Os mecanismos dos bancos oficiais e outros mecanismos têm que ser utilizados no sentido de gerar um padrão diferente, para puxar para trás esse ciclo vicioso que apenas leva a nossa economia — e, conseqüentemente, a condição de vida da população — a uma situação de extrema dificuldade. Não quero alongar-me neste aparte. Na verdade, a análise econômica de tudo isso não tem razão de ser. Na conjuntura internacional, analisando os juros internacionais e os brasileiros, como V. Exª bem disse, talvez o Brasil seja o país do mundo em que eles são mais altos. No entanto, não existe hoje uma economia equilibrada, com as taxas de juros que o País está pagando. Somente países que estão quebrando — como a Rússia — ou vivendo um momento de extrema dificuldade pagam uma taxa de juros como essa; não um país equilibrado, estabilizado, como em tese é o Brasil. Portanto, parabenizo V. Exª pelo tema que levanta. Sem dúvida, é preciso que a sociedade brasileira, a classe política e o Governo intervenham com rigor e dureza no sentido de baixar essas vergonhosas taxas de juros que hoje são cobradas no País.  

O SR. LUIZ ESTEVÃO (PMDB - DF) - Agradeço o oportuníssimo aparte do Senador Romero Jucá. S. Exª usou um termo muito apropriado e que os bancos, inclusive, costumam cobrar de seus clientes: a chamada reciprocidade. É o momento de cobrar, realmente, dos bancos não uma política de generosidade com a sociedade, mas uma política de realidade com a sociedade.  

Quer dizer, não é à toa que os bancos tiveram lucros recordes no primeiro semestre deste ano, no Brasil. Aliás, esses foram construídos à mercê da crise econômica pela qual passou o nosso País. Mas o que eles fazem hoje, simplesmente a longo prazo, é inviabilizar completamente a sobrevivência da empresa brasileira. Porque, por outro lado - e o Senador Romero Jucá abordou o tema com muita pertinência -, as empresas multinacionais têm disponibilidade de oferta de recursos lá fora, no mercado internacional, a juros extremamente reduzidos, o que faz com o empresário brasileiro perca, por mais esta razão, as condições de competitividade e desenvolvimento que precisava ter.  

Portanto, o que está acontecendo no Brasil é a morte da livre iniciativa, em função das diferenças de possibilidade de captação de recursos com que são tratadas hoje as empresas brasileiras e as empresas multinacionais instaladas no nosso País.  

Mas essa conta mágica dos bancos tem ainda alguns números realmente de impossível compreensão: de cada R$10,00 cobrados de spread, dizem os bancos que gastam R$1,90, que é o custo da inadimplência, e R$4,00, que seria o custo da inadimplência no caso das empresas das pessoas jurídicas.  

Ora, todos nós sabemos que o mal devedor é provisionado; quando não paga essa despesa, ela é provisionada contra a contribuição para o Imposto de Renda. Portanto, aquele que não paga tem o seu débito lançado em uma conta-prejuízo e esse valor é abatido no Imposto de Renda. O que vemos aqui é um lucro em duplicidade, em que os bancos cobram do tomador o custo daqueles que não vão pagar os seus empréstimos, e, do outro lado, voltam a cobrar essa mesma conta do Governo, abatendo isso do Imposto de Renda a pagar sobre os seus lucros. Por conseguinte, o tomador do empréstimo paga uma vez e a sociedade brasileira paga de novo, já que não recebe o Imposto de Renda decorrente em função do abatimento dessas operações.  

Por outro lado, admitem aqui que têm como lucro 31% do spread, no caso das operações de pessoa física, e 1,8%, no caso das operações de pessoa jurídica. Ora, da mesma forma, no menor caso, o lucro representa mais que o custo da matéria-prima, que é o dinheiro comprado a R$1,60. No segundo caso, representa duas vezes o custo do dinheiro que foi adquirido do investidor no mercado de aplicações.  

Hoje temos, simplesmente, uma conta que não resiste à análise de nenhuma criança que tenha feito pelo menos um curso de aritmética durante o seu primário. Porque é impossível que alguém compre um produto a R$1,60, venda a R$10,00 e alegue simplesmente que não pode reduzir a sua margem de ganho, porque, de outra forma, teria prejuízo. É lamentável, porque a Brasil sofre e paga um preço enorme por isso: a redução da nossa atividade econômica, o endividamento da nossa sociedade, a diminuição da atividade de emprego, com crescimento, portanto, do desemprego no nosso Pais.

 

O Governo Federal, alertado pelas preocupações da sociedade e pelas lideranças políticas, tomou as medidas que teria de tomar reduzindo o Imposto sobre Operações Financeiras - como foi bem lembrado pelo Senador Romero Jucá -, reduzindo o recolhimento compulsório sobre os depósitos e sobre as operações. Mas parece que, do lado dos bancos, tudo que se faz é simplesmente aumentar a conta nas costas do tomador de empréstimo.  

Dessa maneira, penso que já passou da hora de exigir dos bancos a reciprocidade de tratar o tomador de empréstimo com o mínimo de respeito. Está na hora, isto sim, de serem tomadas medidas duras a fim de que a sociedade brasileira pare de pagar um preço tão alto pelo lucro de tão poucos.  

Muito obrigado.  

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR LUIZ ESTEVÃO EM SEU PRONUNCIAMENTO:  

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/1999 - Página 27842