Pronunciamento de Geraldo Cândido em 21/10/1999
Discurso no Senado Federal
REFLEXÃO SOBRE AS PROPOSTAS DO PARTIDO DOS TRABALHADORES PARA O COMBATE AO DESEMPREGO.
- Autor
- Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
- Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. DESEMPREGO.:
- REFLEXÃO SOBRE AS PROPOSTAS DO PARTIDO DOS TRABALHADORES PARA O COMBATE AO DESEMPREGO.
- Publicação
- Publicação no DSF de 22/10/1999 - Página 28169
- Assunto
- Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. DESEMPREGO.
- Indexação
-
- ANALISE, GRAVIDADE, CRISE, FALTA, ESTABILIDADE, ECONOMIA NACIONAL, AGRAVAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, AUMENTO, DESEMPREGO.
- CRITICA, MODELO ECONOMICO, PROVOCAÇÃO, AUMENTO, DESEMPREGO, ECONOMIA INFORMAL, MERCADO DE TRABALHO.
- DEFESA, PROPOSTA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), COMBATE, DESEMPREGO, ESPECIFICAÇÃO, REDUÇÃO, JORNADA DE TRABALHO, MANUTENÇÃO, SALARIO.
- INFORMAÇÃO, REALIZAÇÃO, DIA NACIONAL, PARALISAÇÃO, PROTESTO, DEFESA, EMPREGO, BRASIL.
O SR. GERALDO CÂNDIDO
(Bloco/PT - RJ) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, a realidade brasileira e da maioria dos países da América Latina evidencia, entre outras coisas, que:
1 - está em curso um processo que aprofunda a dependência dos países aos centros imperialistas, especialmente aos EUA;
2 - seja na pilhagem ao patrimônio público, seja na adoção da abertura comercial irrestrita, as burguesias dos países dependentes reafirmam o papel de sócios minoritários do grande capital internacional, na exploração adicional aos trabalhadores desses países;
3 - no marco das disputas entre os oligopólios do G-7, desenvolve-se nova rodada de concentração e centralização de capital, em que o aparelho produtivo dos países vive o meteórico processo de desnacionalização.
É nesse contexto que se enquadra o desastre em que as classes dominantes locais jogaram o Brasil e o nosso povo, em nome da "estabilidade".
São visíveis os sinais da estagnação do crescimento econômico, a despeito das abundantes "notícias positivas" produzidas pelo governo e difundidas pela mídia.
A economia brasileira já é a mais internacionalizada, dentre as dos países subdesenvolvidos.
Das 500 maiores empresas multinacionais do mundo, 400 estão presentes no Brasil. Com a sobrevalorização do câmbio, as privatizações, a abertura indiscriminada da economia etc, essa situação só se cristalizou.
A política posta em prática pela coligação conservadora no governo, aprofunda a desnacionalização da economia brasileira e deprecia violentamente a poupança erguida por diversas gerações de brasileiros.
Com isso deve prosseguir o cenário de crise e instabilidade econômica, apontando para o agravamento das contradições sociais, que pode ser exemplificado pela taxa de desemprego em nosso país.
Portanto, é fato: o desemprego é o grande problema do Brasil. Também não é nenhuma novidade para os brasileiros a disparidade da concentração de renda. Em tempos de estagnação econômica, as diferenças sociais crescem ainda mais, como agora. De acordo com o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), cerca de 78 milhões de brasileiros vivem com menos de R$ 149 (cento e quarenta e nove reais) mensais.
Entre os anos de 1990 a 1998, a concentração de renda aumentou. No início da década, os 50% mais pobres detinham 12,7% de toda a renda brasileira, enquanto os 20% mais ricos concentravam 62,8%.
É fácil concluir, pois, que o desemprego é a conseqüência maior da concentração de renda em nosso país. Pesquisa da Unicamp mostra que o Brasil já tem 5% de todo o desemprego mundial, o que equivale a 7 milhões de desempregados. Isso nos coloca em quarto lugar no mundo em número de desempregados, atrás de países como Índia, Indonésia e Rússia. O que é mais grave: caminhamos a passos largos para assumir a segunda posição na lista.
Desde que assumiu o governo, Fernando Henrique Cardoso engrossou a massa de desempregados, deixando os trabalhadores mais pobres. Os próprios dados oficiais não conseguem esconder essa realidade. Segundo levantamento do Ministério do Trabalho e Emprego, nos últimos cinco anos cerca de 1,5 milhão de pessoas perderam seus postos de trabalho. A maioria das vagas - 52% - foi fechada entre setembro de 1998 e fevereiro último.
Em análises sobre os cinco anos do Plano Real, o Dieese apontou que a renda média do trabalhador brasileiro cresceu no primeiro ano, minguou em 98 e vem despencando este ano. Durante a vigência do Plano, o desemprego triplicou, crescendo em todas as regiões metropolitanas.
O desemprego é apresentado como uma fatalidade, sem maiores explicações. É, vagamente, vinculado à globalização e à suposta segunda ou terceira "revolução industrial", sem explicitar as reações de causa e efeito entre esses fenômenos.
Freqüentemente, se diz que o avanço tecnológico exige novas qualificações, que os trabalhadores não têm. O problema, então, não seria de desemprego, mas de baixa "empregabilidade" do trabalhador brasileiro. Assim, a culpa é jogada sobre os ombros dos próprios trabalhadores, e a solução seria que estes procurassem se requalificar profissionalmente, como se as pessoas fossem responsáveis pelo próprio desemprego.
É verdade que há necessidade de trabalhadores com novas qualificações e que qualificações anteriores ficaram superadas. Mas isto sempre existiu porque o capitalismo está sempre revolucionando as bases da produção. Porém, este fenômeno só consegue explicar parcialmente o desemprego, em alguns ramos de negócios que sofreram mudanças mais bruscas e acentuadas. Jamais explica o desemprego global de hoje.
Os próprios capitalistas não procuram resolvê-lo. Estão preocupados apenas com suas necessidades de mão-de-obra e com novas qualificações de que precisam. A criação de cursos de requalificação não faz mais que transferir para o conjunto da sociedade custos de formação que, de outra forma, teriam que ser absorvidos pelos próprios capitalistas interessados.
Para eles, a causa do desemprego seria o "alto custo da mão-de-obra" aqui no nosso país. Este seria causado, por sua vez, pela "excessiva regulamentação". A solução seria, então, tornar o emprego "mais fácil" – e mais barato – para o capitalista. Como se o Brasil não fosse, já, um dos países com os menores custos de trabalho do mundo. Como se não fosse o próprio alto nível de desemprego a causa do achatamento ainda maior dos salários. Trata-se de reduzir os já poucos direitos que os trabalhadores conquistaram em décadas de lutas. E ainda por cima dizem que isto é para o bem dos trabalhadores!
Senhor presidente, senhoras e senhores senadores, a realidade é bem outra. Com esse modelo econômico, estamos criando também o desemprego intelectual . A pessoa se forma e não trabalha na sua área. Consegue um emprego pior ou cai no mercado informal. As poucas vagas de qualidade são geradas em setores específicos, voltados às tecnologias de ponta. É a cultura de hiperqualificação.
Quando se fala de uma política para reduzir o desemprego , no que é que se pensa em primeiro lugar? Que o governo deve incentivar, estimular e subvencionar as empresas. Dito de outra forma: o governo deve dar dinheiro... aos capitalistas! Quase ninguém acha isso um absurdo. Quando o Governo do Estado do Rio Grande do Sul se recusou a dar dinheiro para que a Ford se instalasse no Estado, muita gente censurou, inclusive trabalhadores e sindicatos. No Rio de Janeiro, os esforços para minorar o desemprego se concentram na tentativa de reanimar a construção naval através de incentivos governamentais. Em São Paulo, luta-se para manter um acordo de redução de impostos com a indústria automobilística para evitar demissões.
No caso da Ford, o governo contrai empréstimos, doa terrenos, concede isenções de impostos para uma das mais ricas empresas do mundo. Vantagens essas que não são concedidas, nem de longe, às pequenas empresas de brasileiros. Para quê? Para instalação de uma fábrica moderna e automatizada que contratará um número muito pequeno de trabalhadores.
A indústria naval brasileira se desenvolveu à custa de gordas subvenções que favoreciam os grandes armadores. Entrou em colapso quando veio à luz o escândalo da Sunamam (Superintendência Nacional da Marinha Mercante), responsável pela concessão desses privilégios. Os grandes beneficiários do acordo com a indústria automobilística, que envolve redução de impostos para diminuir o preço final dos veículos, são o próprio setor automobilístico e os compradores de veículos novos. Nenhum desses beneficiários devem ser exatamente pobres.
Trata-se sempre de alterar a distribuição da riqueza produzida. O governo renuncia a uma parcela de sua parte, mas sempre em benefício dos empresários. Supostamente para favorecer os trabalhadores. Para "gerar empregos".
Hoje, numa situação de desemprego altíssimo como a que vivemos, os trabalhadores e seus sindicatos topam quase tudo para garantir o trabalho. Mas por que é que nunca se pensa em medidas que transfiram riqueza diretamente para os trabalhadores? E, pior ainda, quando se fala de alguma medida desse tipo, porque ela é imediatamente descartada como absurda? Porque é que ela realmente parece absurda para a grande maioria, inclusive dos trabalhadores?
Transferir bilhões para a Ford não é absurdo. Perdoar 18 bilhões de dívidas, como quer a bancada ruralista aqui no Congresso Nacional, não é absurdo. Mas aumentar o salário mínimo, ah, isto é um absurdo!
Outro fenômeno assustador é a informalização do mercado de trabalho . Estatísticas da Unicamp revelam que os trabalhadores informais representam hoje a metade do mercado brasileiro. São 25, 2 milhões de pessoas, ou 48,4% do total. Estão distribuídos no mercado informa tradicional (20,4 milhões) e no setor subcontratador – conceito desenvolvido para abrigar empresas que se dedicam à terceirização, prestação de serviços para o grande setor econômico (indústria, serviço público), que também têm alarmantes índices de precariedade. São 4,8 milhões de trabalhadores nesta categoria. O pico do crescimento da informalidade aconteceu entre os anos de 1990 e 1995.
Entre 1990 e 1997 foram despejados no mercado 7,4 milhões de trabalhadores nas atividades sem qualquer proteção legal. Para se ter uma idéia, é mais do que o saldo de geração de postos de trabalho do setor não agrícola da economia no período entre 1989 e 1996 (6,58 milhões de vagas).Este ano, até agosto, o país já perdeu 38.644 postos de trabalho com carteira assinada. (Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, do Ministério do Trabalho).
O número de empregados informais saltou de 14,9 milhões para 20,4 milhões entre 1990 e 1997 e o de subcontratados, de três milhões para 4,8 milhões.
O setor emprega hoje a metade do que empregava no início da década. O Brasil exportou empregos para os países-sede das multinacionais instaladas aqui, à medida que empresas passaram a fabricar cada uma das partes de um bem em continentes diferentes, aproveitando-se das diferenças entre os pisos salariais, carga tributária, isenções fiscais, entre outros fatores.
Não há trabalho para todos porque se trabalha demais. Assim, só há, hoje, uma solução real para o desemprego: é a redução da jornada de trabalho. Mas isto não é o suficiente. A experiência tem mostrado que é muito generalizado o uso das "horas extras" como forma de burlar a lei e prolongar a jornada real de trabalho. É preciso limitar severamente as horas extras . Temos 13,8 milhões de postos de trabalho ocupados indevidamente. Se o número de empregados, 25 milhões, que fazem horas extras, caísse drasticamente, haveria ainda mais 2,4 milhões de vagas.
Portanto, aumento de salários e redução da jornada de trabalho são as medidas mais importantes. Ainda mais: contribuem para a reanimação da economia. Isto torna essas medidas as mais importantes para combater o desemprego no Brasil.
O PT tem uma série de propostas de combate ao desemprego, dentro do modelo político atual, dentre as quais destacamos:
Redução da jornada de trabalho, sem diminuição dos salários.
Limitação das horas-extras.
Regulamentação do artigo 7º, inciso I, da Constituição, sobre dispensa imotivada.
Implantação, imediata e ampla, da reforma agrária.
Ampliação das parcelas do seguro-desemprego para 12 meses (atualmente é de 3 a 5 meses).
Por todos os aspectos levantados, devo destacar que não é suficiente ter boas propostas para reduzir a taxa de desemprego no Brasil. É necessário lutar para vê-las implementadas. Nesse sentido, está marcado para 10 de novembro o Dia Nacional de Paralisação e Protesto em Defesa do Emprego e do Brasil. A paralisação, que foi definida pelo Fórum Nacional de Luta por Terra, Trabalho, Cidadania e Soberania, terá como eixos principais a luta por emprego, salário, previdência, reforma agrária, pelo não pagamento das dívidas interna e externa e por direitos sociais. Espero que essa atividade conte com a participação de todos trabalhadores e da sociedade civil organizada, como também da grande massa de desempregados do nosso país. Com isso, poderemos dar os primeiros passos para derrotar a política neoliberal imposta ao Brasil pelo Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente. Obrigado.
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