Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS A REPORTAGEM DO JORNAL CORREIO BRAZILIENSE SOBRE A DEFICIENCIA DO IODO NO SAL E SUAS CONSEQUENCIAS A SAUDE.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • COMENTARIOS A REPORTAGEM DO JORNAL CORREIO BRAZILIENSE SOBRE A DEFICIENCIA DO IODO NO SAL E SUAS CONSEQUENCIAS A SAUDE.
Publicação
Publicação no DSF de 27/10/1999 - Página 28554
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, APREENSÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), AUTORIA, SOLANO NASCIMENTO, JORNALISTA, REFERENCIA, PERIGO, EFEITO, SAUDE, AUSENCIA, ADIÇÃO, IODO, CONSUMO, SAL, POPULAÇÃO, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ADOÇÃO, PROVIDENCIA, OBJETIVO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, FISCALIZAÇÃO, PROCESSO, ADIÇÃO, IODO, CONSUMO, SAL, POPULAÇÃO, PAIS.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, fui surpreendido, nesses últimos dias, por matéria de grande profundidade, conteúdo e forma jornalística do Correio Braziliense , que aborda a saúde, tema da maior importância para todo o País. Esta matéria foi escrita pelo jornalista Solano Nascimento, a quem aproveito a oportunidade para cumprimentar pelo trabalho de grande profundidade e muito zelo.  

O jornalista trata das conseqüências do não-adicionamento de iodo ao sal ingerido pela população brasileira, percebido por pesquisa feita entre 1994 e 1995, pelo Ministério da Saúde e pela Universidade de Campinas, que tem feito trabalhos neste campo.  

A Universidade de Campinas estudou 179 mil estudantes de 428 Municípios brasileiros e demonstrou que, desses, 59 mil estavam com deficiência comprovada de iodo em seus organismos.  

O sinal de alerta é muito claro, Sr. Presidente. A conseqüência da falta de iodo no organismo de crianças de até cinco anos são: presença de retardamento mental, sinais de sofrimento cerebral claro, baixo aproveitamento intelectual, além de conseqüências sérias ao organismo, no funcionamento do sistema orgânico. Nas pessoas de mais idade, surge o chamado bócio endêmico, nódulo tireoideano que, além do aspecto estético, provoca manifestações oculares e do aparelho cardiocirculatório.  

Essa situação é injustificável. Relata-nos a seqüência da matéria do Correio Braziliense que o Governo Figueiredo, de 1993 a 1994, apresentou um estudo sobre a irregularidade na distribuição do iodo para ser adicionado ao sal. Quando foi feita a pesquisa, era de 0,65%; no Governo Sarney, de 1985 a 1989, a pesquisa apresentada também mostrou uma irregularidade no fornecimento de iodo de 0,24%; nos Governo Collor e Itamar, de 1990 a 1994, uma distribuição irregular da ordem de 2,3% e no Governo Fernando Henrique Cardoso, de 1995 a 1998, uma irregularidade no adicionamento de iodo ao sal de 9,82%.  

Uma situação injustificável, provocando agravos sérios à saúde humana e que atinge principalmente os Estados mais periféricos do País, marcadamente o Amapá, o Acre e o Tocantins. Essa situação, penso, merece uma autocrítica por parte dos gestores responsáveis pela saúde do País, por se aproximar do injustificável. Tem suas razões de ser na famigerada política de encolhimento e enxugamento da máquina pública. Buscando-se reduzir o papel do Estado, houve a extinção, por exemplo, do Inan – Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição –, órgão público responsável pelo adicionamento do iodo ao sal, o que garantia a regularidade da proteção à saúde humana.  

Posteriormente, a Lei nº 9.005, editada em março de 1995, estabelecia que o Governo brasileiro, por meio do Ministério da Saúde, seria responsável pela regularização na distribuição do iodo para as indústrias de sal do Brasil. O iodo adicionado garantiria o não-agravamento do problema, acabaria com o bócio endêmico, uma doença que já deveria estar extinta no território brasileiro, e também evitaria danos ao sistema nervoso central das crianças até cinco anos.  

Sinceramente, não posso imaginar como o Ministério da Saúde não faça uma investigação ampla dessa situação, não encontre os responsáveis por essa falha, não puna os responsáveis, e faça uma autocrítica perante a Nação brasileira.  

É uma ocorrência da maior gravidade a que eu observo, em que, dos municípios estudados, que seriam as áreas-alvo, com maior suscetibilidade à deficiência do iodo ao sal, encontramos quase 30% da população estudada com essa deficiência.  

Espero sinceramente que o Sr. Ministro da Saúde, que tem tido a preocupação de arrumar a casa, de organizar os setores de gestão do Ministério da Saúde, não deixe isso passar em branco, que adote as providências necessárias e que repare um erro injustificável na política de saúde.  

Talvez esse seja mais um instrumento, mais um indicador da saúde publica deste Pais que possa servir como orientação, como vetor para que o Ministério da Saúde pense que não é mais possível haver essa fragmentação: doenças endêmicas sob a responsabilidade de um órgão público, em um órgão do Ministério da Saúde; outras doenças endêmicas sob a responsabilidade de outro órgão daquele Ministério, perdendo-se assim o senso de prioridade, sem que haja um projeto nacional amplo e claro do setor das endemias, em que, com a deficiência do iodo, o bócio endêmico se configuraria perfeitamente com uma doença que mereceria uma atenção e um senso de oportunidade e prioridade por parte dos gestores da saúde.  

Espero que a assistência, no Ministério da Saúde, seja tratada como assistência, que endemias sejam tratadas como endemias; que uma ação efetiva, organizada e bem-estruturada se faça acompanhar a partir de agora, com esse exemplo servindo de grande lição. Espero que o Conselho Federal de Medicina também requeira esclarecimentos sobre o porquê dessas falhas.  

Estou elaborando um requerimento de informações à Agência de Vigilância Sanitária, que está sendo reestruturada no Ministério da Saúde, que tem a responsabilidade de evitar a ocorrência desses fatos, em função da transformação em agência nacional. Tenho um voto de otimismo de que esse erro não venha a se repetir. Acredito que medidas firmes e garantidas serão tomadas pelo Governo Federal, por meio do Ministério da Saúde, para sanar problemas como esse que, espero, não ocorram mais neste País. Não podemos entrar em um novo milênio ainda testemunhando a presença do bócio endêmico se proliferando e agravos à saúde mental em crianças até cinco anos.  

Todos nós brasileiros da área da saúde imaginávamos, na década de 50, quando se decidiu pela presença e adicionamento do iodo ao sal, alimento universalmente usado, que esse problema estaria sanado nas décadas seguintes. Lamentavelmente, uma matéria inédita do Correio Braziliense aponta em profundidade a gravidade do assunto e demonstra que o Governo brasileiro tem falhado sucessivamente. No ano de 1994, a falha foi grave. A matéria ainda aponta que se passou um período de treze meses em situação de ausência na distribuição do iodo adicionado ao sal.  

Sr. Presidente, não é possível aceitarmos isso. Deve haver uma responsabilidade clara. Na falha da autoridade pública, a autoridade privada é responsável e deve garantir o adicionamento do iodo para que situações como essa não ocorram. Das 54 empresas estudadas, 36 delas apresentavam irregularidade no adicionamento de iodo ao sal, o que demonstra o risco que corre a população brasileira.  

Acredito que esse episódio deve transformar-se num exemplo de austeridade, firmeza, autocrítica e senso de prioridade pela saúde pública, pelo controle das endemias e combate a elas. Que o que está sendo feito de bom hoje na Fundação Nacional de Saúde seja um exemplo para todo o Ministério da Saúde!  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/10/1999 - Página 28554