Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM AS CONSEQUENCIAS DO TABAGISMO PARA A SOCIEDADE.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TABAGISMO. SAUDE.:
  • PREOCUPAÇÃO COM AS CONSEQUENCIAS DO TABAGISMO PARA A SOCIEDADE.
Publicação
Publicação no DSF de 30/10/1999 - Página 28905
Assunto
Outros > TABAGISMO. SAUDE.
Indexação
  • ANALISE, ESTATISTICA, PREJUIZO, TABAGISMO, SOCIEDADE, ESPECIFICAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, ASSISTENCIA, SAUDE, SUPERIORIDADE, ARRECADAÇÃO, IMPOSTOS, INDUSTRIA, CIGARRO.
  • COMENTARIO, RELATORIO, PESQUISA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), PAIS ESTRANGEIRO, INGLATERRA, DADOS, PROBLEMA, CARDIOPATIA GRAVE, MULHER, USUARIO, FUMO, AUMENTO, RISCOS, DOENÇA GRAVE.
  • DEFESA, CONTROLE, PUBLICIDADE, FUMO, APOIO, SEMANA, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), COMBATE.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, um dos pressupostos básicos da democracia é o direito, que cada pessoa tem, de escolher os próprios caminhos; de fazer as opções individuais e usufruir seus benefícios ou arcar com suas conseqüências . Existem, todavia, situações em que o interesse social, o bem-estar coletivo, pairam acima do livre arbítrio.  

Nesse caso podemos enquadrar as drogas indexadas na legislação penal, bem como as outras que, mesmo legalmente admitidas, causam notórios e inegáveis danos à saúde dos consumidores. E, ao ocasionar esses problemas pessoais, geram gastos de grande monta, que acabam absorvidos e custeados pela sociedade como um todo, inclusive pelos que não participam dos hábitos viciados.  

Quero deixar bem claro que, ao abordar esse grave problema, não me animo de intuitos moralistas ou recriminatórios a opções de quem quer que seja. Vou-me servir, pura e simplesmente, de números, de estatísticas, de provas concretas a respeito do impacto que o consumo de derivados do tabaco acarreta à coletividade, particularmente às mulheres situadas na meia-idade.  

Valho-me de reportagem transmitida ontem pela Agência Reuters, cujo noticiário já é franqueado aos setores de imprensa do Senado Federal e brevemente estará disponível nos gabinetes dos Srs. Senadores: "Ataques cardíacos provocados pelo hábito de fumar matam todos os dias mais de cem mulheres com menos de 45 anos, na Inglaterra - e outras 300 jovens também sofrem ataques não-fatais, ligados ao fumo". O alarme abrange todos os artigos à base de tabaco, desde o cigarro comum até charutos e cigarrilhas.  

Esses números se referem exclusivamente a casos comprovados e acompanhados pelas equipes de pesquisadores, na Inglaterra. Mas não temos motivo algum para acreditar que no Brasil o resultado seria diferente, pois os casos e as circunstâncias que os cercam são idênticos em sua malignidade.  

Foram analisados os prontuários e outros registros médico-hospitalares de 448 mulheres, de 16 a 44 anos de idade, atingidas por acidentes cardiovasculares, ao longo de 24 meses - e confrontadas com os dados colhidos de outras, nas mesmas faixas etárias, que não sofreram esses problemas.  

Os resultados são assustadores. Em primeiro lugar, quanto mais a mulher fuma, maiores as chances de sofrer um ataque cardíaco: essa é a síntese do relatório . Os outros três registros, confrontando fumantes e não-fumantes, detalham as condições de cada grupo: a mulher que fuma até cinco cigarros por dia tem o dobro de probabilidades de um problema de coração; a que consome mais de um maço por dia está vinte e cinco vezes mais arriscada do que a não-fumante; e as que fumam mais de dois maços diários têm de saber que estão expostas a um risco de infarto setenta e cinco vezes maior que o da companheira imune ao seu vício.  

Mas não apenas o infarto ronda as fumantes. Outras doenças, mesmo sendo menos letais, são penosas e provocam sofrimentos duradouros ou até permanentes, segundo comprovou o Grupo de Pesquisa em Segurança de Drogas, da Inglaterra: hipertensão, taxas altas de colesterol e de diabetes são ocorrências comuns nas mulheres que têm o fumo como rotina de vida.  

O pior é que esses problemas se associam, somam-se como um débito mortal para as mulheres consumidoras de derivados de tabaco . Diz a pesquisa que "as fumantes que apresentavam outros fatores de risco estavam duplamente vulneráveis", ou seja, traziam um conjunto perverso de fatores mortais pairando sobre suas cabeças.  

É o maior mérito da pesquisa: destruir um mito que, certamente, já levou muitas mulheres à sepultura, o de que o fumo só é prejudicial para as idosas. Ao contrário, antes mesmo de entrar na fase da menopausa elas já se encontram concretamente inseridas numa faixa de morbidade.  

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ainda ecoam neste plenário as sábias palavras do ex-Senador Lourival Baptista, que nunca esmoreceu em sua campanha contra o fumo. Numa época em que os cigarros eram cercados de charme, de imagens glamourosas de divas enfumaçadas, de galãs que faziam das baforadas sua afirmação viril - naquele tempo, o grande médico, representante do Estado de Sergipe, já investia sua lança contra os males do tabaco.  

Tudo o que ouvíamos de Lourival Baptista se confirma a cada dia, por meio dos estudos científicos e das pesquisas médicas: a Organização Mundial de Saúde, repartição da ONU, instalou um relógio em Genebra que mostra, de minuto em minuto, o número de pessoas que morrem devido às doenças provocadas pelo tabaco. E, com base nas informações colhidas nos países filiados, registrou a ocorrência de 2.479 óbitos em menos de dez minutos!  

Notem V. Exªs que estava falando apenas das pesquisas realizadas na Inglaterra; valho-me, agora, de estatísticas mundiais, respaldadas pelas agências da Organização das Nações Unidas. E encontro números ainda mais assombrosos: o tabaco é responsável por 3 milhões e 500 mil ocorrências fatais por ano , em todo o mundo, o que lhe dá o impressionante índice de 7% de todas as mortes anuais. A participação do Brasil, nesse total, é de 80 mil pessoas por ano.  

Um dos grandes argumentos, repetidos pelos defensores do uso indiscriminado de produtos à base de tabaco, está nos impostos por eles gerados, inclusive no Brasil, onde o IPI encontra na indústria fumageira e na de seus derivados uma grande fonte de arrecadação fiscal. Entretanto, nada é mais fácil do que comprovar a falsidade dessa premissa!  

O ganho de caixa decorrente dos impostos sobre o fumo é muito inferior aos gastos hospitalares e previdenciários dele decorrentes. Qualquer pessoa que consultar um cardiologista, um pneumologista, um diretor de hospital, um técnico de saúde pública encontrará números impressionantes sobre aquelas despesas, atiradas à conta de toda a sociedade.  

O fumo desmente até mesmo o velho aforismo de que "nunca é tarde para corrigir os rumos de nossa vida". Isso porque o câncer de pulmão e as outras doenças provocadas pelo vício, quando instalados no organismo, marcam de sofrimentos, de dores e de despesas o resto dos dias de suas vítimas. O único remédio, no caso, é prevenir. Ou, ao menos, antecipar-se ao agravamento daqueles males.  

Retorno ao relatório do Grupo de Pesquisa em Segurança de Drogas, da Inglaterra: "Quem pára de fumar antes dos 35 anos de idade pode reduzir dramaticamente suas chances de sofrer algum mal induzido pelo fumo".  

O ideal seria não começar , mas quem já ingressou nos corredores do vício de fumar deve abandoná-lo o mais cedo possível, se tem amor à própria vida.  

Afirmo, novamente, minha postura respeitosa quanto ao direito que cada um possui de escolher seus próprios caminhos e hábitos. Mas, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o consumo de derivados de tabaco deve ser examinado à luz de valores maiores, por suas implicações na estrutura social globalizada, quando queima recursos da coletividade em hospitais e tratamentos caríssimos - dinheiro que seria melhor empregado na luta contra a fome, na educação e na cultura.  

Sou contra a adoção pura e simples de medidas meramente proibitivas, neste caso. Até hoje, ecoam as tragédias decorrentes da "Lei Seca" norte-americana, que inflou as estruturas do crime organizado, transformado a Máfia em um imbatível poder paralelo.  

Ao mesmo tempo, afirmo que algo deve ser feito para impedir a liberdade absoluta vivida pelos diversos tipos de produtos ligados ao fumo . Aquela mensagem lida após as propagandas de cigarro, alusiva aos males que ele provoca, não tem qualquer resultado concreto como inibidor do vício. Por mais soturna e cavernosa que seja a voz do locutor, não conseguirá encobrir a imagem de charme e de bem-estar gerada pelo publicitários, que associam o vício à potência sexual, à felicidade, à aventura, à liberdade.  

A realidade é bem mais cruel.  

E concluo justamente com esse apelo ao bom senso e aos compromissos que temos com a formação das estruturas da Pátria; ao respeito devido a nossos filhos e às gerações ainda não contaminadas: um dos momentos mais impressionantes de toda a minha vida foi quando ouvi o relato de um médico legista sobre os pulmões de fumantes que encontrou em milhares de necrópsias. O quadro é dantesco, aterrorizador, e se não o reproduzo agora é em respeito à sensibilidade dos meus nobres Pares.  

Mas estou certo de que cada Senador vai parar um minuto e imaginar o quadro que me foi transmitido por aquele profissional quando, acostumado a lidar com a morte e a pesquisar seus aspectos, transmitiu-me a certeza de que o fumo é uma arma cruel, ardilosa, impiedosa e devastadora. E que existe uma irresponsabilidade cometida por todos nós, a de não protestarmos com veemência contra a desenfreada divulgação mentirosa de seus piores aspectos, vendidos à juventude e a toda a sociedade embrulhados nos brilhos do engodo, da malícia e da mais covarde empulhação.  

É o grito de alarme que lanço no Senado, nesta sexta-feira, integrando seu Plenário à semana que a ONU dedicou , em todo o mundo, a desmascarar e condenar o fumo , uma das drogas mais insidiosas e malditas de nossos dias.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/1999 - Página 28905