Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AO SERVIDOR PUBLICO BRASILEIRO, PELO TRANSCURSO DO SEU DIA.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL. HOMENAGEM. :
  • HOMENAGEM AO SERVIDOR PUBLICO BRASILEIRO, PELO TRANSCURSO DO SEU DIA.
Publicação
Publicação no DSF de 29/10/1999 - Página 28843
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • CRITICA, AUSENCIA, REAJUSTE, SALARIO, FUNCIONARIO PUBLICO, DISCORDANCIA, ORADOR, TENTATIVA, AUMENTO, ALIQUOTA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, SERVIDOR, PAIS.
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, FUNCIONARIO PUBLICO.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o tema que, hoje, me motiva a ocupar a tribuna da Casa se reveste da mais elevada e urgente importância. Trata-se, antes de tudo, de um dever do Senado corrigir uma equivocada e injusta imagem a que o servidor público brasileiro vem sendo, nos últimos anos, associado.  

No dia 28 de outubro, comemora-se o seu dia, que bem merece ser envolto numa cerimônia de retratação e reparação pública, por parte do Governo e da sociedade brasileira. Afinal de contas, se houve alguma classe de trabalhadores cuja reputação, recentemente, mais se difamou e se depreciou neste País, temos de identificar o funcionalismo nessa agônica posição.  

De corrupto contumaz a preguiçoso marajá, sua representação no imaginário nacional parece ter sido, indevidamente, contaminada por uma campanha de repugnante e covarde espezinhamento. Aliás, por causa dessa ingrata e leviana caricatura, a categoria tem, impiedosamente, pago um alto preço na escala dos sacrifícios sociais. Com salários congelados e sob ameaça constante de dispensa, o servidor se vê, cada vez mais, desmotivado, abandonado e encurralado.  

No total, o Brasil abriga quase 510 mil funcionários públicos federais, que representam uma força de trabalho bastante significativa na economia e na história do País. Não por acaso, o articulista político Elio Gaspari, que não é dado a defender causas sem comprovado valor de justiça, moralidade e coletividade, se debruçou longamente, na semana passada, sobre a grave situação em que se encontra o funcionalismo, intitulando sua coluna "O serviço público caiu numa armadilha".  

Evidentemente, a armadilha a que se refere Gaspari remete-se ao fato de que, aos contribuintes de agora, pouco se lhes importa o processo de detração, e mesmo enxovalhamento, a que se tem, insistentemente, submetido os trabalhadores do setor público. E, como contrapartida — analisa o articulista —, os servidores públicos, à população, devolvem a mesma indiferença na forma de um atendimento medíocre. Ora, o circuito suicida se fecha, sem que a Nação tome consciência de que não há a menor possibilidade de ganhadores nessa peleja.  

Para interromper tal viciosa circularidade, cabem à sociedade e aos poderes democraticamente investidos a iniciativa de recompor e revalorizar o papel do servidor público no contexto da moralização do Estado.  

Sr. Presidente, o contrário de nada adianta. A exploração do funcionalismo como bode expiatório de todos os males e desvios do setor público se prestou muito mais a camuflar as verdadeiras causas da ineficiência da máquina governamental. O eminente ex-Senador Josaphat Marinho, na sua coluna semanal no Correio Braziliense , também expressou sua preocupação com a categoria declarando: "Os servidores civis há anos que não recebem melhoria nenhuma do Poder Executivo. A situação de todos é de dificuldades manifestas."  

Indiscutivelmente, sem aumentos há 5 anos e submetidos a uma sucessão de confiscos, os servidores encarnaram o papel de sabotadores da justiça social brasileira. Nada mais simplista e, politicamente, cínico que atribuir-lhes o peso e o ônus histórico da má gerência da coisa pública. Ou seja, se o Estado não funciona bem, a explicação recai automaticamente na ineficiência, na malandragem e na má índole do servidor, naturalmente. E, o que é pior, a mídia tem seu dedo na veiculação e consolidação deste perverso estereótipo.  

Todavia, como se bem sabe, os males do Brasil são bem outros, entre eles: juros altos, sonegação de impostos e corrupção desbragada nos altos escalões. Nas palavras dos economistas, foram os juros em patamares estratosféricos que, para sustentar financiamento dos déficits em transações correntes, alimentaram continuamente a dívida pública mobiliária, e não os gastos excessivos do Governo, como querem os mal-informados ou mal-intencionados. Com efeito, a deterioração do equilíbrio entre receitas e despesas públicas se efetivou na medida em que os juros embutidos nos empréstimos contraídos pelo País adquiriram uma virulência espiral incontrolável.  

Na esteira dos excessos, a estabilidade do servidor, que era brandida como responsável pela improdutividade e ineficiência no serviço público, foi precipitadamente quebrada, sem que se atentasse para os eventuais conflitos políticos na definição dos parâmetros da demissão. Os gastos do Erário com sua folha de pagamentos, há muito foi comprovado, não comprometem abusivamente as contas públicas, a não ser em casos específicos, pontuados e bem localizados de administrações municipais e estaduais da Federação.  

Quanto à corrupção nas esferas mais altas do Poder, o Governo prometeu a instalação, no curto prazo, do Conselho de Ética, que deverá elaborar um código de conduta para a elite da burocracia federal. No entanto, até o presente momento, pouco, ou nada, de concretamente visível tem-se afigurado na direção da implementação do projeto do Conselho.  

Como se não bastasse, fica cada vez mais evidente que a elevação da alíquota de contribuição do servidor para a Previdência, apesar da sentença do STF, é questão de tempo. Por mais consistente e justa que seja, não há como negar que isso ganhe contornos semânticos de mais uma imposição de derrota ao funcionalismo.  

Mesmo assim, ainda que desestimulado, o servidor não deixa de acreditar na recuperação de seu prestígio, na relevância de seu trabalho. Nesse contexto, vale lembrar que a reedição do Programa de Demissão Voluntária (PDV), em setembro último, atraiu um conjunto pouco expressivo de servidores, cuja explicação pode estar alojada na falta de expectativa de trabalho no universo privado. Embora plausível, tal argumento não explica tudo, pois, no fundo, aposta-se na retomada de um horizonte mais alvissareiro dentro do setor público.  

Não obstante, por conta do baixo índice de adesões, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão já anunciou que vai adotar, a partir de dezembro, o sistema de transferência interestadual de servidores colocados em disponibilidade pelos órgãos. No Rio de Janeiro, por exemplo, que reúne maior contingente de servidores federais — cerca de 103 mil —, mais da metade deste total, segundo cálculos do Ministério, deverá ser colocada em disponibilidade. Isso implica, naturalmente, o agravamento de um ambiente já de alta insegurança e nervosismo dentro das repartições públicas.  

Contrastando com esse quadro, se, por um lado, o Governo estabelece medidas para economizar e enxugar pessoal, de outro, acena para a realização de concurso público em 2000, com o propósito de preencher quadros dentro das agências reguladoras. As 4 agências reguladoras do Governo ainda não dispõem de quadro próprio, para cuja formação se cogita criar lei que regulamente o tratamento de funcionários tanto de telecomunicações e petróleo, como de energia elétrica e vigilância.  

Na mesma linha, o limite de gastos com pessoal, que hoje segue os previstos 60% da receita líquida corrente nas 3 esferas da União (a denominada Lei Camata), tem demonstrado o compromisso do Estado brasileiro em privilegiar a função de atendimento às necessidades sociais. Pois, se o Estado gasta excessivamente com pessoal, compromete os recursos necessários para atender tais demandas. Disso ninguém discorda, muito menos os servidores públicos. Mas, como contrapartida, deve haver, por parte do Governo, maior sensibilidade com as condições de trabalho e maior respeito à auto-estima do funcionalismo.  

Reitero este apelo porque, na semana passada, representantes da Internacional dos Serviços Públicos (ISP), que opera como uma organização sindical mundial, apresentaram um dossiê à Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados, no qual denunciam 30 casos de violações de direitos trabalhistas em todo o País. As infrações variam desde perseguições políticas até demissões de dirigentes sindicais. Nessas democraticamente precárias e ameaçadoras condições, como esperar da categoria uma reação, ou mesmo uma mobilização, menos acanhada, menos intimidada?  

Ora, basta de tanta humilhação. É hora, sim, de reconhecer que houve um exagero desproporcional na acusação, na condenação e na penalidade arbitrariamente imposta aos servidores. Em que pese a procedência com que se propunha uma reforma no setor público, nada justifica a ira com que a sociedade brasileira se indispôs contra o serviço público. Temos que trabalhar na direção da reconciliação dessas duas esferas, de modo a resgatar a confiança e o prestígio de que, até pouco tempo atrás, sempre gozou o funcionalismo junto à coletividade.  

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 

 ù ; 3


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/10/1999 - Página 28843