Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE AS DIVERGENCIAS ENTRE O PARTIDO DOS TRABALHADORES DO RIO DE JANEIRO E O GOVERNADOR ANTHONY GAROTINHO. (COMO LIDER)

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA.:
  • COMENTARIOS SOBRE AS DIVERGENCIAS ENTRE O PARTIDO DOS TRABALHADORES DO RIO DE JANEIRO E O GOVERNADOR ANTHONY GAROTINHO. (COMO LIDER)
Aparteantes
Heloísa Helena, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 28/10/1999 - Página 28656
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, RECONHECIMENTO, ANTHONY GAROTINHO, GOVERNADOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INJUSTIÇA, DECLARAÇÃO, CRITICA, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • DEFESA, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ALTERNATIVA, POLITICA, FAVORECIMENTO, GRUPO, PREJUIZO, INTERESSE PUBLICO.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pretendo ser breve, em função do adiantado da hora e da audiência que terei daqui a pouco com o Governo do Estado.  

Gostaria de tecer um breve comentário sobre o episódio que envolveu o Partido dos Trabalhadores, o meu Partido, e o Governador do Rio de Janeiro, o Sr. Anthony Garotinho.  

Quero, com muita tranqüilidade, tratar desse assunto. Compreendo que parte do problema ali instituído já foi superado pelo pedido de desculpas e o reconhecimento do Governador de que havia praticado uma injustiça com o Partido dos Trabalhadores. Injustiça essa que não justifica o PT e o reconhecimento do Governador de que havia cometido um erro, não pelas minhas palavras, pelas palavras do Lula, dos Deputados José Dirceu e José Genoino, de quem quer que seja, mas pelo sentido da vida política e da organização do PT.  

O PT surgiu exatamente como um partido alternativo ao que se tem constituído na política fisiológica do interesse imediato de determinados grupos, em detrimento dos interesses maiores da sociedade na utilização dos bens públicos e dos recursos públicos. A história do PT é uma história de resistência, de luta e, principalmente, da criatividade no enfrentamento das dificuldades políticas do nosso povo, a partir de novas práticas políticas.  

O que testifica em favor do PT não são palavras, mas atos. Quero referir-me exatamente a esses atos. Se o PT, do ponto de vista formal, fosse um partido interessado apenas em governos por cargos - e considero que o Governador fez um pedido de desculpas -, o nosso partido não teria saído da coligação que fez com o Governador Dante de Oliveira. O PT ajudou a eleger o Governo e estava nele. No entanto, no momento em que houve divergência não tergiversou, não teve dúvidas em sair do Governo, deixando todos os seus cargos, porque as alianças que fazemos não são em cima de interesses pontuais, que não estão envolvidos em um conjunto de idéias. Elas são, acima de tudo, programáticas.  

Se uma ou outra pessoa, um ou outro militante, de forma isolada, pode cometer erro - porque, em todas as organizações partidárias, existem erros de indivíduos -, isso, em nenhum momento, poderá ser atribuído ao Partido dos Trabalhadores. Assim como eu estaria sendo leviana se figuras ligadas ao PFL, com determinadas posturas, eu as quisesse generalizar que isso é o PFL. Eu não poderia generalizar que episódios altamente complicados, com pessoas de outros partidos, representam o partido e as figuras públicas daquele partido.  

Então, estou reivindicando com relação ao caso do Governador Dante de Oliveira. Um outro caso ainda que tenho para testificar em favor do PT é o episódio do Governo de Rondônia. O Governador Valdir Raupp também foi eleito numa aliança com o Partido dos Trabalhadores. No momento em que tivemos divergência, em função do episódio de Corumbiara, o PT não pensou, em nenhum momento, nos importantes cargos que ocupava, de influência no Governo, e saiu imediatamente do Governo.  

Aliás, o nosso problema, em alguns momentos, pode até ser a falta de apego aos cargos. O Governador Vitor Buaiz era Governador do PT, e uma parte do PT largou todos os cargos que tinha e deixou o Governador, inclusive, sem o apoio nos cargos que precisava.  

Não quero aqui defender essa história com palavras, porque o que justificam as pessoas e as instituições são os seus atos. Considero que houve um reconhecimento da injustiça. Somos um partido que faz alianças programáticas. É em cima de programas, de conteúdos políticos e de respostas sociais para os problemas da nossa sociedade que permanecemos ou não nos cargos que ocupamos.  

Com muita tranqüilidade, sem nenhum medo de enfrentar esse debate publicamente, venho a esta tribuna para advogar a defesa do meu partido, que é um dos poucos reconhecidos nacionalmente como sendo um partido que funciona como partido. Aliás, quando ele assim funciona, quando discute com os Governadores a partir do seu conteúdo programático, ele é severamente criticado. É contraditório, porque as pessoas, a sociedade, os meios de comunicação exigem um conteúdo programático. Todavia, quando aparece um partido que assim se comporta, imediatamente vem todo um rolo compressor de críticas.  

Aliás, para o Partido dos Trabalhadores, a música daqueles cantores nordestinos, Os Três do Nordeste, pega muito bem: "Se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come." Não tem jeito. Se fazemos, somos criticados; se não fazemos, somos criticados.  

Tomemos como exemplo a figura mais radical que tenhamos no PT e essa figura é criticada por ser radical. Vamos pegar as que são mais amenas, no campo daquilo que alguns chamam até de a direita do PT, e aí a direita do PT também é criticada. Não tem jeito.  

Sr. Presidente, para que esse episódio seja tratado com a devida dimensão e com a história política, organizativa, de conteúdo político nas ações políticas, nas funções públicas em que ocupamos, quero aqui dizer que esse episódio está em parte superado. Em parte superado por um aspecto, nessa frase infeliz do Governador Anthony Garotinho. Na outra parte, no que se refere à decisão do Diretório, com todo respeito pelos fóruns de decisão do meu partido no Rio de Janeiro, espero que seja tratado adequadamente esse processo.  

As lideranças políticas do Rio de Janeiro, o Deputado Carlos Santana, o nosso Presidente José Dirceu, o nosso companheiro Lula e o próprio ex-Governador Leonel Brizola já estão discutindo à luz de algo que é muito maior, que são os rumos da sociedade brasileira, aquilo que queremos para o nosso País. E é para isso que, em alguns momentos, até poderemos abrir mão das nossas paixões individuais, dos nossos grupos políticos, pelo bem maior do nosso País.  

A outra parte está sendo resolvida. Nós, que ajudamos a eleger o Governador Anthony Garotinho, estamos para dizer ao povo brasileiro e ao povo do Rio de Janeiro que, como partido – eu pelo menos, individualmente, advogo essa tese –, sentimo-nos responsáveis pelo que está acontecendo no Rio de Janeiro, do ponto de vista de termos um Governo voltado para buscar respostas para a saúde, educação, segurança. E o PT faz parte desse projeto dentro de um leque dos partidos progressistas e de esquerda. Temos divergências, sim, de conteúdo programático, político em alguns aspectos, que devem estar postas de forma civilizada e até fraterna e devem ser colocadas na mesa para discussão.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senadora Marina, V. Exª me concede um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC) - Concedo o aparte à Senadora Heloisa Helena e, em seguida, ao Senador Ramez Tebet.  

A Srª Heloisa Helena (Bloco/PT - AL) - Senadora Marina Silva, quero saudar o pronunciamento de V. Exª. De fato, nem vou entrar na complexidade do caso do Rio de Janeiro, apesar da indignação que, com certeza, ficamos, não apenas nós do PT, mas milhares de pessoas do País que reconhecem a existência do Partido dos Trabalhadores, qualificando o debate com a sociedade. Quero falar sobre uma dinâmica que já é muito conhecida por nós, do PT. O nosso partido é sempre muito procurado em momentos eleitorais. É uma danação! o PT é como se fosse o logotipo do sucesso, é a senha da moralidade, é a possibilidade da corajosa militância desbravando caminhos sem remuneração. Tudo que é mérito do PT, antes e durante o processo eleitoral, passa a ser defeito quando ele é chamado para administrar conjuntamente. Aí, a postura de coragem, de independência, de fiscalização, de firmeza ideológica, tudo passa a ser criticado. Acredito que esses casos que têm acontecido ultimamente fazem com que reflitamos muito, não em função dos "petólogos" de plantão, até porque não podemos ter a pretensão de agradar a todos. Primeiro, porque não somos os donos da verdade; segundo porque nem Jesus Cristo agradou a todo o mundo, imagine se vamos ser nós. Se começarmos a agradar a todos, deve haver alguma coisa errada, porque a própria pluralidade de interesses da sociedade brasileira nos faz querer fazer uma opção política. Agradar a todos? Claro que não vamos agradar mesmo. Nem mesmo Jesus Cristo agradou todos. Entre os que gritavam "crucifiquem, crucifiquem", estavam muitos dos que o bajulavam nas caminhadas pelas ruas de Jerusalém. Este é um momento de reflexão do Partido do Trabalhadores: de reflexão sobre as nossas alianças nacionais; de reflexão sobre a firmeza ideológica que temos de ter, do medo que não devemos ter de determinadas críticas. Como V. Exª diz, se fazemos, somos criticados; se não fazemos, somos criticados também. Portanto, é de fundamental importância que continuemos qualificando o debate com a sociedade, tendo firmeza, clareza e independência de defender um projeto alternativo de desenvolvimento econômico e de políticas sociais para este País. É isso que o povo brasileiro espera. Aliás, milhares de pessoas pelo mundo vêem no partido dos trabalhadores uma grande alternativa, uma sinalização de luz no fim do túnel, uma oxigenação das forças vivas das sociedade que permita construir um modelo de desenvolvimento econômico diferente. Saúdo o pronunciamento de V. Exª.  

O Sr. Ramez Tebet (PSDB - MS) - V. Exª me permite um aparte?  

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senadora Heloísa Helena e incorporo-o ao meu pronunciamento. Concedo o aparte ao Senador Ramez Tebet.  

O Sr. Ramez Tebet (PSDB - MS) - O meu aparte é para saudar a sua figura, sinceramente. Cheguei aqui junto com V. Exª. Sei da sua vida, sei de onde vem, sei das dificuldades por que passou pessoalmente, sei onde forjou suas convicções políticas - num Estado pequeno, difícil, agreste - lutando com dificuldade. Eis que V. Exª chega ao Senado da República. Que bom acontecimento! Mostra que todos têm oportunidade na vida, mesmo num País de tantas injustiças sociais e desigualdades como este nosso Brasil. Sabe o que a presença hoje de V. Exª na tribuna sugere? Que só há um jeito de um Partido não ser criticado: se não chegar ao poder; se se mantiver estilingue. Se chega ao poder por si ou em coligação, sem dúvida nenhuma, Senadora Marina Silva - e isso é da fragilidade humana. Ah, se os homens não fossem falíveis! - as pessoas resvalam nos mesmos erros de outros Partidos políticos. Assim tem sido com o PT. Imagino eu que, na medida em que cresce, agiganta-se, chega ao poder, o PT começa a mostrar suas incoerências e deficiências. Antes ele não ocupava cargo. Tudo é fisiologismo. Mas quando ele ocupa cargo, é fisiologismo? Por que é fisiologismo no dos outros e não no nosso? Dizer que o PT não está em disputa de cargos no Rio de Janeiro é negar a realidade. Nem V. Exª, Senadora Marina Silva, pode negar isso. Tanto é verdade que há ameaça de deixar cargos. Uma corrente quer deixar cargos; outra não quer. É evidente que o PT tem suas contradições. O Partido é uma coisa; os homens que o compõem têm lá suas deficiências. Até há pouco, eu nunca tinha ouvido dizer, por exemplo, que o PT estava ajeitando delegados visando à conquista de um determinado propósito ou oferecendo cargos para vencer uma convenção. Eu nunca tinha ouvido falar nisso! Ouvi-o agora, porque o PT está chegando ao poder. Isso não desmerece o Partido - veja bem. - mas desmerece quem pratica esses atos! Então, V. Exª tem toda a razão. O PT é um Partido normalmente de pessoas íntegras, honestas, mas há, também, aquelas que "pisam na bola" ou são acusadas de fazê-lo quando chegam ao poder. E temos de encarar isto na mais absoluta normalidade: o Partido ou as Leis do País punindo quem quer que seja que "pise na bola" ou que resvale em atos atentatórios. Os atos atentatórios à disciplina partidária são problema de cada Partido. Todavia, os atos atentatórios à administração pública são problema das autoridades. Vejo que, quando V. Exª fala, acredita numa causa e é, conseqüentemente, credora do nosso maior respeito. Permita-me essas observações, fruto da análise de quem tem vivido um pouco a política brasileira, mas que tem o mesmo ideal de V. Exª e de todos de contribuir para este País. Muito obrigado.

 

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Com todo respeito, divirjo de V. Exª num aspecto. O fato de um Partido crescer e ter em seus quadros pessoas que cometem erros ocorre. A diferença é que, no PT, Senador Ramez Tebet, não tratamos isso como algo normal. Se porventura alguém tiver realmente colocado algum cargo em favor da convenção, pode ter certeza de que, em sendo submetido à Comissão de Ética do Partido dos Trabalhadores, sairá do Partido.  

Um outro aspecto do qual divirjo é o de tratar como normal. Se tratássemos como normais alguns episódios que ocorrem, não teríamos expulsado deputados, prefeitos, personalidades que muitos gostariam de ter em seus quadros. Exatamente porque compreendemos que o conteúdo programático dos partidos devem ser respeitados é que não tratamos esses episódios como normais, mesmo estando no poder. E aí V. Exª tem razão: quando o Partido chega ao poder, abrem-se muitos flancos. Eu, por exemplo, tenho sido vítima de uma crítica que poderia ser um mérito. Sabe o que os adversários dizem a meu respeito? "Essa Marina não ajuda nem os parentes; não ajuda nem a família."  

Vários dizem isso. Sabe por quê? Porque meu pai é um ex-seringueiro, minhas irmãs ou são agricultoras ou são empregadas domésticas. O que tem um trabalho melhor é o meu irmão, que é motorista de uma auto-escola. As pessoas acham que, porque sou Senadora, porque o Governo do Estado é do meu Partido, eu deveria arranjar um DAS para o meu pai, para o meu irmão, para a minhas irmãs, mesmo sendo quase todos semi-analfabetos. Essa coerência, que, para mim, é normal, a qual eu advogo, custa-me muito caro. Custou-me, nas últimas eleições. Um cidadão quis gravar do meu pai — que trabalhava dignamente numa cigarraria na rodoviária, vendendo cigarros, porque é um trabalho digno e é isso que ele sabe fazer — um depoimento dizendo que eu o havia abandonado e que por isso vendia cigarros. Eu ajudo como posso todos os meus familiares às minhas próprias expensas, não às expensas do Poder Público. Graças a Deus, meu pai, como bom cearense, homem digno, entende a minha postura. Foi com ele, em segundo lugar, que aprendi meus princípios morais; em primeiro lugar, foi com Deus, porque faço dos meus referenciais para a política referenciais cristãos. Meu pai, com todo o respeito, escorraçou o cidadão da sua cigarraria, mostrando-lhe que fazia aquele trabalho com muito mais alegria do que se fosse colocado num cargo de DAS, em que não saberia nem o que fazer.  

Realmente, "se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come". O que não fazemos é tratar como normal esse tipo de prática. Com certeza, quem está sendo acusado de tentar fazer esse tipo de negócio irá se submeter a uma investigação, sim, irá para a Comissão de Ética do Partido e poderá ser tranqüilamente expulso. Se eu cometer um erro, posso ser expulsa - não importando o simbolismo da Senadora Marina ou da Senadora Heloisa Helena. Nós não podemos viver da honestidade do passado. Honestidade não conta no passado; conta o presente. A cada dia temos que ser a mesma coisa.  

Portanto, acredito que esse episódio nos ensina que não se pode generalizar, em hipótese alguma, um episódio isolado. A história do PT pode dizer como ele se comporta em relação a cargos. Isso é muito tranqüilo para mim.  

E também nos ensina a importância do debate, nos devidos termos, sobre a aliança que fizemos para ganhar o Governo do Rio de Janeiro. A Senadora Benedita é a Vice-Governadora. E há dentro do Governo pessoas que têm cargos importantes, sim. E o que está sendo debatido hoje — eu digo com muita tranqüilidade — até tem a ver com a nossa concepção. Algumas pessoas acham que deveria haver uma interlocução não direta com aqueles que ocupam cargos dentro do Partido, dentro do Governo, mas com as instâncias do Partido. Essa é uma questão que talvez para os outros Partidos seja difícil entender. As pessoas dizem: "Quero conversar é com a Marina Silva, com o Cristovam Buarque, com a Heloisa Helena". Não, há alguns pontos que quem decide é o Partido, por meio das suas instâncias. Essas pessoas estão questionando isso.  

Agora, em relação à importância da aliança que fizemos, ela não deve ser circunscrita apenas ao Rio de Janeiro, é um processo político de construção de uma proposta política para o País. Penso que o Governador Leonel Brizola, o Lula, todos os quadros dirigentes da Oposição neste País têm a devida clareza.  

Foi graças a essa compreensão que hoje estamos tendo algumas vitórias na América Latina. Posso citar o caso a que acabamos de assistir na Argentina. Quem ganhou as eleições foi uma coalizão de um bloco de oposição, numa mistura de dissidentes conservadores com um bloco progressista, socialista, que derrotou o candidato do Presidente Menem. O Sr. De la Rúa ganhou as eleições com uma significativa votação.  

O que importa é o que aconteceu com aqueles países que aplicaram a receita do FMI em todos os sentidos, como é o caso da Argentina, que entrega para o sucessor um país com a economia arrasada, completamente dependente, em que aumentaram os números de desemprego, de pessoas que já não têm oportunidades de acesso a universidades, um país que era o exemplo do que deveriam ser os demais em relação a essas crises que estava vivendo. Esse resultado foi graças à compreensão de que é possível se unir em torno de interesses que sejam maiores para o bem da democracia. Quanto ao conteúdo programático do Sr. De la Rúa, só a história poderá dizer se realmente as propostas que ele defende são exatamente aquilo de que a Argentina está precisando.  

O que aconteceu ali foi um basta a essa política entreguista. Isso ensina a todos nós do Brasil que também aqui é fundamental termos a compreensão de que vencer os empecilhos da política que está posta e dos grupos conservadores que estão no poder dependerá da união dos setores progressistas e dos setores que hoje têm uma proposta diferente para os rumos da economia e para a questão da política social, enfim, em todos os sentidos da vida do nosso País.  

Gostaria de fazer esse registro, Sr. Presidente, Senadora Heloisa Helena, porque, de certa forma, trato com muito respeito o Governador Anthony Garotinho. No entanto, o Partido dos Trabalhadores também precisa e deve ser respeitado como Partido. Jamais poderão ser feitas generalizações a partir da ação de militantes, até porque, quando os seus militantes mais ilustres procedem da melhor forma possível, as pessoas não correm para creditar ao PT aquelas ações.  

Chico Mendes foi um dos militantes do Partido dos Trabalhadores mais ilustres que tivemos, conhecido no mundo todo. Ele é mesmo maior do que o PT, pois extrapolou as fronteiras partidárias. Entretanto, ninguém fazia questão de dizer que Chico Mendes, que só após a sua morte ficou famoso, era um filiado do PT lá de Xapuri. Pelo contrário; esse fato as pessoas escondem.  

Agora, se porventura a sua biografia o desabonasse e, por conseqüência, pudesse desabonar também o PT, certamente, as pessoas diriam que ele não era um filiado, mas o próprio PT.  

Já estou acostumada com isso e, tranqüilamente, nesta tarde, reporto-me ao fato, compreendendo que em parte está superado pelo reconhecimento do próprio Governador de que sua frase foi por demais infeliz. E tanto o Lula quanto o Governador Leonel Brizola posicionaram-se com a devida maturidade que o processo exige. Afinal de contas, elegemos o Governador do Rio de Janeiro e queremos que ele acerte em todos os aspectos da sua administração – na segurança, na saúde e na educação.  

Trata-se de um Estado que, para todos nós, é emblemático. Amamos o Rio de Janeiro, mas preocupamo-nos com o seu destino em razão dos problemas gravíssimos que enfrenta, principalmente na área social. O exemplo da Argentina, capaz de construir uma coalizão para derrotar a política neoliberal que o Sr. Menem aplicava à receita, também deve servir-nos de exemplo de como fazer para derrotarmos aqueles que pensam que o mercado é o instrumento a ser deificado como resposta aos problemas do nosso País e do mundo.  

Era o que tinha a dizer. Muito obrigada.  

 

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/10/1999 - Página 28656