Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO NO SETOR DE SANEAMENTO BASICO.

Autor
Carlos Patrocínio (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SANITARIA.:
  • NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO NO SETOR DE SANEAMENTO BASICO.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/1999 - Página 30526
Assunto
Outros > POLITICA SANITARIA.
Indexação
  • GRAVIDADE, PROBLEMA, SANEAMENTO BASICO, BRASIL, PREJUIZO, SAUDE PUBLICA, NECESSIDADE, AUMENTO, INVESTIMENTO, SETOR.
  • APOIO, DESESTATIZAÇÃO, EMPRESA DE AGUA E ESGOTO, MOTIVO, INCAPACIDADE, ESTADO, INVESTIMENTO, SETOR, DEFESA, DEFINIÇÃO, MODELO, PRIVATIZAÇÃO, GARANTIA, INTERESSE PUBLICO.
  • COMENTARIO, ANUNCIO, EXECUTIVO, ENCAMINHAMENTO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, DESCENTRALIZAÇÃO, MUNICIPIOS, GESTÃO, SANEAMENTO.
  • ANALISE, VANTAGENS, CISÃO, EMPRESA DE AGUA E ESGOTO, ANTERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO.
  • ELOGIO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), FINANCIAMENTO, EMPRESA, INICIATIVA PRIVADA, CONCESSÃO, SERVIÇO, ABASTECIMENTO DE AGUA, COLETA, TRATAMENTO, ESGOTO.
  • APOIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, GERALDO MELO, SENADOR, PROPOSTA, MODELO, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA DE AGUA E ESGOTO.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr as e Srs. Senadores, o setor de saneamento básico não está entre aqueles que recebem uma maior atenção da mídia e da opinião pública no Brasil. No entanto, os problemas nele existentes são de grandes proporções, tornando urgente uma reformulação profunda, que venha a garantir o montante de investimentos imprescindíveis para que o saneamento básico passe a atender ao conjunto da nossa população.  

Quando se fala no estado calamitoso da saúde em nosso País, é comum não se frisar que as precárias condições de saneamento constituem um dos maiores responsáveis pelo mesmo. Há estimativas de que cada real investido em saneamento básico representa uma economia futura de R$3.00 em gastos com saúde.  

Vejamos alguns dados que atestam a insuficiência de nosso sistema de saneamento básico. Nove por cento dos domicílios urbanos não são atendidos pela rede de água, o que corresponde a algo em torno de 15 milhões de pessoas sem acesso ao abastecimento da água canalizada. Quanto ao esgoto, 51% dos domicílios urbanos não estão ligados à rede de esgoto. Noventa por cento do esgoto coletado, por sua vez, são lançados sem qualquer tratamento nos rios, no mar ou no solo.  

Estima-se em 45% o índice de perdas no faturamento das companhias que fornecem água, seja por falhas na medição, seja por desperdício físico. Quanto às conseqüências sobre a saúde, cerca de 65% das internações hospitalares de menores de 10 anos estão relacionadas às precárias condições de saneamento básico.  

O Brasil conta, portanto, com um sistema de saneamento básico ineficiente na utilização adequada dos recursos de que dispomos e ineficaz no cumprimento do objetivo de atender à totalidade da população. Como é fácil supor, esse atendimento, além de insuficiente, não se caracteriza por um perfil igualitário. Se 49% dos domicílios urbanos brasileiros estão conectados à rede de esgoto, esse índice cai para ínfimos 27% nos domicílios cuja renda é até dois salários mínimos.  

A disparidade regional não fica aquém da meramente econômica: se encontramos na Região Sudeste 5% das residências urbanas sem conexão à rede de água, na Região Norte, 31% – ou quase um terço – das residências urbanas estão nessa condição. No que se refere à coleta de esgotos, ela está ausente em 91% dos domicílios das cidades do Norte, enquanto no Nordeste esse índice é de 24%.  

Faz-se necessário aumentar, em grande proporção, os investimentos na infra-estrutura de saneamento bem como garantir maior eficiência ao sistema, minimizando os desperdícios. A opção pela concessão do serviço à iniciativa privada mostra-se a mais indicada, face aos vícios acumulados na gestão das empresas públicas, sobretudo considerando-se o esgotamento da capacidade do Estado em seus três níveis, de investir adequadamente no setor. De acordo com estudos do Banco Mundial, é necessário o investimento de R$42 bilhões nos próximos 15 anos para universalizar os serviços de água e esgoto no País. Como ressalta o articulista Cristiano Romero, do Jornal do Brasil , "para se ter uma idéia do que isso significa, entre 1970 e 1996 foram investidos apenas R$15 bilhões". Precisamos realizar, portanto, um grande esforço para viabilizar esses investimentos, esforço que será, certamente, amplamente recompensado, em termos de ganhos sociais.  

Há, no entanto, importantes questões a serem deslindadas de modo a possibilitar a privatização do setor no País – e, ainda, a definir o modelo de privatização que se mostra mais satisfatório para atender aos interesses públicos. Antes de tudo, temos a intrincada questão da titularidade dos serviços de saneamento básico: pertence ela aos Estados, aos Municípios ou a ambos? Como a Constituição não é explícita a esse respeito, cabe ao Congresso Nacional resolver o assunto, o que se vem tentando por meio de um projeto de lei que tramita nesta Casa, ao que me parece de autoria do eminente Senador José Serra, hoje Ministro da Saúde, projeto de lei que foi apensado a outros de natureza similar. O Poder Executivo, no entanto, pretende encaminhar um projeto de lei complementar, que deve dar uma direção algo distinta em relação ao estágio atual do projeto em tramitação: a tendência, ao que nos consta, é a de conceder aos Municípios a gestão do setor de saneamento, com participação dos Estados no caso de as companhias envolverem mais de um Município. O mais importante, ao nosso ver, é que a questão seja definida, de fato e de direito, de modo a possibilitar efetivamente o processo de concessão à iniciativa privada.  

Outra importante definição refere-se aos modelos pulverizado ou concentrado da privatização. Caso se opte pela concessão do serviço a grandes empresas, que correspondam, por exemplo, às atuais companhias estaduais, teremos uma forte concentração do setor, em todo o País, provavelmente nas mãos de algumas poucas e poderosas empresas multinacionais. Isso facilitaria, possivelmente, a viabilização de vultosos investimentos; mas traz, também, o risco de cartelização e de encarecimento dos serviços. Um modelo menos concentrado parece-nos mais indicado e perfeitamente viável do ponto de vista econômico. Nesta situação, encontramos vários dos países do Primeiro Mundo, como a França, com cerca de 15 mil empresas no setor, a Alemanha, com 6 mil, ou os Estados Unidos, com quase 60 mil empresas autônomas - o que não impede que algumas das empresas desses países sejam efetivamente muito grandes.  

Sr. Presidente, acreditamos que a concessão de serviços de saneamento básico às empresas privadas representa, de fato, a melhor e mais exeqüível opção para superarmos as dificuldades do setor. Congratulamo-nos, assim, com o BNDES pelos esforços despendidos e pelos resultados já obtidos com o início do processo de privatização das empresas de saneamento básico. O Banco vem participando do financiamento dos investimentos de várias das 32 operadoras privadas que obtiveram concessões municipais para explorar, por 30 anos, os serviços de distribuição de água e coleta e tratamento de esgoto. Do plano inicial de investimento de cinco companhias, o BNDES já financiou metade dos recursos previstos, os quais totalizam R$77.5 milhões. Está sendo analisada ainda a participação da ordem de 30% nos investimentos programados por outras seis operadoras.  

O que é importante é não apenas o montante de recursos emprestados às concessionárias privadas, mas a noção mesma de que o setor público deve estimular, acompanhar, fiscalizar e exigir o cumprimento de metas em serviço tão essencial à população. Nesse sentido, devemos saudar a proposta de criação de uma Agência Nacional das Águas, defendida pelo ex-Secretário de Desenvolvimento Urbano, Dr. Sérgio Cutolo, e também pelo eminente Ministro do Meio Ambiente, Deputado Sarney Filho, e que deve ser encaminhada ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo. Caberia a esta agência o papel de regulação de todo o sistema hídrico, abrangendo abastecimento, saneamento, irrigação e energia elétrica relacionada ao setor, ressaltando-se ainda a questão do impacto dessas várias atividades sobre o meio ambiente, de onde provém a água tão imprescindível.  

O ex-Secretário Sérgio Cutolo, reunindo-se recentemente com técnicos do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do Banco Mundial, em Washington, explicou-lhes a intenção do Governo brasileiro de não mais investir nas regiões onde o saneamento mostra-se economicamente viável para a iniciativa privada.  

Espero que o ex-Secretário Sérgio Cutolo, ao sair do Governo, tenha repassado essas suas tratativas com órgãos internacionais, no que diz respeito à privatização do sistema de saneamento básico em nosso País.  

Isso implica, também, que os governos devem aumentar a alocação de recursos nas regiões que, por características peculiares, ainda não apresentam tal viabilidade  

Hoje, fiquei satisfeito, Sr. Presidente, quando vi o pronunciamento do eminente Vice-Presidente desta Casa, Senador Geraldo Melo, embora não tenha participado do mesmo, que propôs um sistema de privatização das empresas de saneamento, mas não vendendo o patrimônio, não vendendo o ativo dessas empresas, apenas abrindo o capital, para que outras empresas nacionais ou multinacionais possam injetar capital nessas empresas, a fim de que haja investimento. Esse é um modelo que gostaria de aplaudir neste exato momento, já que não pude participar do brilhante pronunciamento do eminente Senador Geraldo Melo.  

A concessão dos serviços de saneamento básico para a iniciativa privada, que começa a se implementar, não corresponde a uma questão de princípio - o que é fundamental, é sabermos buscar, sem dogmatismos, as opções técnicas e econômicas que se mostram mais adequadas para atender aos interesses públicos.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Carlos Patrocínio, V. Exª me permite um aparte?  

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) - Concedo o aparte a V. Exª.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Quero cumprimentar V. Exª por tão importante tema trazido a debate na tarde de hoje. V. Exª analisa muito seriamente a problemática do saneamento básico e da distribuição de água no Brasil, declinando inclusive os percentuais no País inteiro de quantos milhões de brasileiros estão ainda sem condições de receber água e saneamento -, uma problemática ainda muito distante de se solucionar. V. Exª é um homem dedicado a essa área, e o Brasil inteiro acompanha V. Exª com muita atenção. Já o Senador Geraldo Melo debateu a tese de como encontrar caminhos. V. Exª parece que adere a essa proposta também. Confesso que vejo, com simpatia, o fato de essas empresas estaduais, ou mesmo municipais, não se desfazerem, muitas vezes alocarem aqui e acolá, mas abrirem e terem condições de criar recursos, no sentido de que capitais nacionais e internacionais venham a participar disso para poder, com mais condições, atender a essa demanda tão grande do saneamento básico. Precisamos enfrentar esse problema de uma maneira ou outra. Precisamos abrir isso, mas com fiscalização, com cuidado, com diligência, para que não haja exploração. E com cuidado também, a fim de que não haja concentração, que localidades que não sejam rentáveis num primeiro momento, do ponto de vista financeiro, também sejam atendidas. Ressalvadas todas as questões, penso que devemos debater o assunto mais vezes e com muita seriedade. Gostaria, mais uma vez, de cumprimentar V. Exª por nos ter trazido tão relevante tema. Acredito que o Brasil inteiro acompanhou V. Exª.

 

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PFL - TO) - Agradeço a participação de V. Exª, eminente Senador Casildo Maldaner. De fato, trata-se de uma questão ligada à saúde, que é o saneamento básico. Fiquei satisfeito quando o eminente Senador Geraldo Melo apresentou uma proposta inteligente sobre o processo de privatização das empresas, que ainda não se sabe se são dos Estados ou dos Municípios. Um projeto de lei haverá de dirimir o mais rápido possível o assunto. O importante é que sabemos do déficit existente no País. Conforme já tive a oportunidade de observar em meu pronunciamento, faltam cerca de R$45 bilhões para serem investidos em saneamento, possibilitando que toda a população brasileira tenha acesso às benesses da água tratada e do esgotamento sanitário. Devemos abrir esses serviços à iniciativa privada.  

Gostaria de ressaltar neste momento, aproveitando o aparte de V. Exª, que acreditamos que o modelo de privatização que vem sendo imprimido no Brasil não está absolutamente correto. Temos que pulverizar as ações das empresas, até para que o povo brasileiro possa delas participar e, sobretudo, as empresas nacionais, sem qualquer xenofobia.  

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.  

Muito obrigado.  

 

Z


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/1999 - Página 30526