Discurso no Senado Federal

REGISTRO DA PARTICIPAÇÃO DE S.EXA. EM AUDIENCIAS COM MINISTRO DE ESTADO SOBRE A PRIVATIZAÇÃO DA ELETRONORTE.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO. BANCOS.:
  • REGISTRO DA PARTICIPAÇÃO DE S.EXA. EM AUDIENCIAS COM MINISTRO DE ESTADO SOBRE A PRIVATIZAÇÃO DA ELETRONORTE.
Publicação
Publicação no DSF de 12/11/1999 - Página 30663
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO. BANCOS.
Indexação
  • COMENTARIO, APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ACIONISTA MINORITARIO, POSTERIORIDADE, VENDA, BANCO PARTICULAR, ESTADO DO PARANA (PR), TRANSFERENCIA, CONTROLE, BANCO ESTRANGEIRO.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, AUDIENCIA, ALOYSIO NUNES FERREIRA, SECRETARIO, CHEFE, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, REFERENCIA, DISCUSSÃO, PREJUIZO, BENEFICIO, POSSIBILIDADE, PRIVATIZAÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE), REGIÃO NORTE.
  • CRITICA, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, SISTEMA, TELECOMUNICAÇÕES BRASILEIRAS S/A (TELEBRAS), APREENSÃO, POSSIBILIDADE, TRANSFERENCIA, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE), CONTROLE, INICIATIVA PRIVADA, AUSENCIA, GARANTIA, CONTINUAÇÃO, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, REGIÃO NORTE.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, REAVALIAÇÃO, PRETENSÃO, PRIVATIZAÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DO NORTE DO BRASIL S/A (ELETRONORTE).

O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero fazer referência a duas importantes audiências que tive, enquanto Parlamentar do Pará, juntamente com outros Parlamentares do nosso Estado e da Região Amazônica, com dois Ministros de Estado – o Sr. Aloysio Nunes e o Sr. Raul Jungmann.  

Antes, porém, quero me dizer estarrecido com as denúncias feitas aqui pelo Senador Álvaro Dias a respeito da venda do Banco Bamerindus ao HSBC, um grupo inglês. Entendo que um assunto de tamanha gravidade deveria constar da agenda de trabalhos da CPI do Sistema Financeiro, que, apesar de continuar trabalhando nesta Casa, lamentavelmente, não sei por que razão, deixou de ter a cobertura da imprensa nacional ou deixou, até mesmo, de se interessar por fatos dessa gravidade.  

Hoje, a CPI que realmente repercute é a que investiga os traficantes, o narcotráfico, a violência. Essa Comissão Parlamentar de Inquérito está tendo um resultado fantástico com o seu trabalho graças à sua própria ação e também à ação da imprensa nacional.  

Volto, contudo, aos temas que desejo abordar nesta tarde. O primeiro deles diz respeito à forma insensível ou até teimosa, radical, com que os homens do Governo tratam questões de relevante importância.  

Ontem, fomos ao Palácio do Planalto, na companhia o Sr Aloysio Nunes, conversar sobre a questão da cisão ou mesmo da privatização da Eletronorte. Conosco estavam ainda vários Srs. Senadores, cerca de 15 Deputados Federais e representantes da Eletrobrás: funcionários da Eletrobrás e da Eletronorte – os urbanitários de todo este País. Essa reunião foi acompanhada também, é bom lembrar, pelo Presidente da Comissão da Amazônia, na Câmara dos Deputados, e pela Deputada Vanessa Grazziotin, do Estado do Amazonas, que preside uma comissão especificamente constituída para tratar da questão da privatização da Eletronorte.  

Fomos levar ao Ministro o nosso ponto de vista, que engloba o de todos os Parlamentares da região, de todos os Partidos políticos - PFL, PPB, PMDB - e nós, evidentemente, da Oposição, que sempre tivemos uma postura contrária a esse processo de privatização. No início da discussão, é impressionante como o Governo gosta de ser intransigente e às vezes até irracional. É uma espécie de teimosia e convencimento de que está certo. O Ministro Aloysio Nunes iniciou logo a resposta a algumas das nossas indagações, dizendo que não gostaria de discutir a privatização, porque o Governo foi eleito para privatizar, o povo quer a privatização e, portanto, ele não vai mudar o seu ponto de vista com relação à privatização.  

Em determinados momentos da reunião, houve um certo acirramento, o Ministro chegou a enumerar as vantagens da privatização do Sistema Telebrás lá na Região Norte do País. Evidentemente, o Ministro não tem conhecimento de causa – nem de causa da privatização do Sistema da Eletronorte, nem de causa da privatização do Sistema da Telebrás. Nós o contestamos no mesmo instante, assinalando que, com relação à venda do sistema telefônico do Norte do País, S. Ex.ª deveria se deslocar ao interior do Pará, do Amazonas, do Acre e de outros Estados do Norte, para perceber claramente que a iniciativa privada só entra onde tem retorno assegurado.  

Que está acontecendo? Eu o desafiei, dizendo que lhe mandaria a relação de 30 municípios no Estado do Pará que não têm linha telefônica direta, onde funcionavam postos telefônicos e o cidadão poderia ter acesso a uma cabine telefônica, pagando na hora para telefonar para qualquer canto do País ou do mundo. Hoje, mais de 30 cidades no Estado do Pará tiveram esses postos simplesmente fechados pela empresa que comprou a Telepará no meu Estado. Os pequenos municípios, os distritos de vários municípios do Estado tiveram seus postos telefônicos fechados porque, economicamente, não interessa à empresa que comprou a Telepará mantê-los em funcionamento. Onde fica o interesse da comunidade? Como se pode isolar uma quantidade tão grande de pessoas, como foi feito com o sistema telefônico?  

O Ministro, naturalmente, está completamente desinformado ou tem apenas a informação do que é vantajoso. É claro, ampliaram-se as linhas de Belém, de Santarém, de Marabá e de outros lugares porque o processo tecnológico assim o permite. O preço das linhas baixou não em função do fato de passar a ser privado, mas fundamentalmente em razão do avanço da tecnologia em nosso País. É o mesmo que ocorre com o aparelho celular. Há cerca de seis anos, comprei o meu celular em Miami por US$2.300 e hoje custa, em qualquer loja brasileira, cerca de R$700,00. O que significa isso? Esse tipo de aparelho nunca foi fabricado pelo Estado e, sim, por indústrias e, se se tornou mais barato, foi em razão do avanço da tecnologia.  

No caso da Eletronorte, fiz uma indagação muito séria ao Ministro e já a fiz aqui, em tempos anteriores, ao próprio Ministro das Minas e Energia na Comissão de Infra-Estrutura do Senado. O Governo se comprometeu com o Fundo Monetário Internacional a vender a Eletronorte, a Hidrelétrica de Tucuruí, todo o sistema elétrico brasileiro. Já vendeu o sistema telefônico, as mineradoras, as siderúrgicas. Agora, falta vender o sistema elétrico. O sistema elétrico do norte do Brasil, que é uma região menos desenvolvida, por isso mesmo precisa da presença do Estado porque só ele tem condições de levar o conforto da energia que possibilita a industrialização, o crescimento econômico e a melhoria da qualidade de vida das pessoas nos vários cantos e recantos da Região Norte. Essa energia tem que ter a presença do Estado. Sem o Estado ela não pode chegar. Agora, o Governo decide que vai privatizar a Eletronorte e, conseqüentemente, todo o sistema energético do Norte do País, que é formado pela Hidrelétrica de Tucuruí, no caso do Pará, por um sistema isolado, no Amapá, e por outros sistemas isolados em Roraima, Acre, Rondônia e no Estado do Amazonas.  

Mostramos, em primeiro lugar, a incoerência do Governo. É a terceira proposta do Governo para vender a Eletronorte e já voltou atrás três vezes, numa demonstração de que ele mesmo, Governo, não sabe como fazer, não sabe por que está fazendo; está apenas cumprindo uma determinação do Fundo Monetário Internacional e dos chamados países desenvolvidos do Primeiro Mundo.  

Ora, na primeira proposta, qual foi a "brilhante" idéia do Governo comandada pelo BNDES? Temos seis sistemas elétricos isolados na Região Norte. Dos seis, cinco são deficitários. Apenas um dá lucro, que é a Hidrelétrica de Tucuruí; e o lucro da Hidrelétrica de Tucuruí é que mantém o déficit dos outros cinco sistemas energéticos dos Estados da Região Norte. Pois bem, a "brilhante" idéia do BNDES foi a seguinte: vamos separar, vamos cindir a Eletronorte, dividi-la em seis empresas independentes, e aí fica mais fácil vender Tucuruí. Ora, por quê? Porque Tucuruí é a única que permite lucro. Então, ficava muito fácil.  

Isso foi denunciado por nós, aqui, no Senado da República. Fizemos uma convocação ao Ministro das Minas e Energia à Comissão de Infra-Estrutura. Fizemos ao Plenário, mas como o Plenário não aceitou, ele foi encaminhado à Comissão de Infra-Estrutura, e, nesses questionamentos, o Governo foi obrigado a perceber o erro que estava cometendo e voltar atrás.  

Após isso, já houve duas outras propostas do próprio Governo: a primeira, de vender o conjunto como um todo, não mais fazendo a cisão. Essa foi também descartada, porque o Governo julgou que teria prejuízo na venda da Eletronorte. Da segunda proposta ele também já desistiu. Então, há um total processo de indefinição.  

Deixamos uma pergunta no ar ao Ministro das Minas e Energia, Rodolpho Tourinho Neto, e, ontem, ao Sr. Aloysio Nunes Ferreira. Creio que o PSDB tem a mania de colocar na cabeça das pessoas a certeza absoluta das coisas. Eles são os deuses da certeza e do que é correto. Então, já entram para a conversa dizendo que foram eleitos para privatizar e não vão discutir privatização, porque o povo quer a privatização.  

Eu disse ao Ministro Aloysio Nunes que acho interessante essa ânsia privativista do Governo. No caso da Hidrelétrica de Tucuruí, há uma segunda etapa da hidrelétrica que está sendo construída agora. Ela é a maior hidrelétrica inteiramente nacional que funciona no nosso País, vai ter praticamente dobrada a sua capacidade. Não vai funcionar durante todo o ano, porque há um período de seca, mas no momento em que o rio estiver cheio ela vai dobrar a sua capacidade de produção de energia, pelo menos durante quatro meses do ano.  

O que acho interessante é que os dois maiores consumidores de energia da Hidrelétrica de Tucuruí são a Albrás-Alunorte, que funciona em Barcarena, que era um grupo controlado pela Vale do Rio Doce, mas que hoje é uma empresa privada, e o grupo Alcoa, no Maranhão. São duas indústrias de eletrointensivos, duas indústrias de produção de alumínio, que, sozinhas, consomem 40% de toda a energia produzida atualmente na Hidrelétrica de Tucuruí. O que é mais grave é elas são subsidiadas pelo Governo. Esse subsídio que o Governo dá às indústrias de eletrointensivos, no Maranhão e no Pará, consome 200 milhões de dólares de prejuízos anuais à Eletronorte.  

Pior do que isso, durante cinco anos assisti às negociações do Governo para fazer com que essas indústrias de eletrointensivos e outras indústrias locais pudessem comprar ou pudessem ter a concessão para, com recursos próprios, construírem a segunda etapa da Hidrelétrica de Tucuruí. Essa iniciativa fracassou. Ninguém quis construir a segunda etapa da Hidrelétrica de Tucuruí. Ninguém quis assumir 1 bilhão e 200 milhões de reais de investimento.  

Acho engraçada essa atitude do Governo Fernando Henrique. É preciso que se responda isso, porque ninguém, até agora, conseguiu me responder, nem o Ministro Tourinho, nem o Presidente da República, nem o Ministro Aloysio, ontem. Pois, se meu princípio é privatizar, se estou defendendo que tudo no País deva pertencer à iniciativa privada e não ao Estado, qual é a minha obrigação? De agora em diante, não terei mais o trabalho de construir. Vou conceder à iniciativa privada e ela constrói a obra.

 

Assim, durante cinco anos, o Governo tentou, com as indústrias de eletrointensivo – até porque o subsídio delas acaba no ano 2004 –, fazer com que construíssem a segunda etapa da hidrelétrica de Tucuruí. É interessante, Senador Pedro Simon, que todas as tentativas tenham fracassado. As indústrias de eletrointensivo não quiseram fazer a segunda etapa da hidrelétrica de Tucuruí. O Governo de Fernando Henrique, muito bonzinho, maravilhoso, decidiu ele mesmo, cheio de dinheiro – não há dinheiro para o povo, não há dinheiro para o funcionário, só para banqueiros e grandes empresários –, fazer a obra. Está investindo R$1,2 bilhão na segunda fase da hidrelétrica de Tucuruí.  

Ora, nós do Pará é evidente que estamos gostando porque é um investimento que movimenta recursos e gera empregos. A economia daquela região vive em função da obra. É algo positivo, não posso deixar de admitir. Mas o que não dá para entender de maneira alguma é como o Governo não foi capaz de conseguir a iniciativa privada para executar uma obra que seria da iniciativa privada e insiste em querer vender. Ou seja, vai realizar a obra e depois vender. O pior é que a hidrelétrica de Tucuruí originalmente custou exatos US$6 bilhões. Só a usina hidrelétrica de Tucuruí custou US$6 bilhões. A segunda fase é um investimento de R$1,2 bilhão. Estou falando US$6 bilhões sem levar em conta o custo financeiro desse empréstimo que foi tomado, sem levar em conta os juros, os serviços dessa dívida. Estou falando em custo do dinheiro que foi pego para fazer a obra, porque esse custo deve estar hoje em US$12 bilhões.  

Sabem, os senhores, quanto é a estimativa para se vender a hidrelétrica de Tucuruí? Um bilhão e meio de dólares. O Governo gasta US$12 bilhões para fazer a obra, está investindo agora mais R$1,2 bilhão, e pretende vender a hidrelétrica de Tucuruí por US$1,5 bilhão. E ainda o BNDES deverá emprestar dinheiro ao grupo que for comprar a hidrelétrica de Tucuruí.  

É muito difícil responder a indagações como essa, e é por isso que toda a Bancada da Amazônia está questionando a privatização da Eletronorte, questionando a venda da hidrelétrica de Tucuruí, pedindo um tempo, no mínimo. Se esse Governo tiver um mínimo de decência, ele haverá de dar mais um tempo para que essa decisão possa ser tomada. É inadmissível fazer as coisas às pressas por que o Presidente Fernando Henrique assumiu o compromisso com o Fundo Monetário Internacional, com o capital internacional ou com os chamados países desenvolvidos do Primeiro Mundo. Isso é inadmissível. Então, quero aqui deixar registrada esta minha manifestação.  

Senador Pedro Simon, considerando a importância da fala de V. Exª, deixarei para tratar da minha audiência com o Ministro Raul Jungmann numa próxima oportunidade. Considero importante o seu pronunciamento e acredito que o tema que abordo já tem uma importância muito grande para ser dividido com outra questão, que é, no caso, a questão do Pacal, na Rodovia Transamazônica.  

O meu desejo é que o Governo e seus integrantes percam a arrogância, percam essa coisa de achar que são senhores absolutos da verdade. O que se quer é discutir o processo. A comunidade científica, os políticos da nossa Região e até os políticos da base do Governo querem uma oportunidade de se manifestar sobre essa questão. O Governo não pode fazer as coisas fechado a sete chaves sem dividir a responsabilidade, porque é o nosso futuro, é o futuro da Amazônia, e o futuro da Amazônia é o futuro do Brasil, é o futuro desse planeta, porque é a Região mais cobiçada, mais vista, mais falada, mais comentada do todo o mundo nesse momento da nossa existência.  

Portanto, deixo aqui o meu apelo aos integrantes do PSDB, que percam a empáfia de quererem ser os donos da verdade e que não tenham a certeza de que o Governo os elegeu para privatizar o Brasil, para vender o Brasil, para entregar o Brasil ao capital internacional.  

O Governo os elegeu, evidentemente, na esperança de que houvesse uma melhora na vida do seu povo. Lamentavelmente não é isso a que estamos assistindo.  

Encerro por aqui minhas palavras para ouvir, com alegria, o Senador Pedro Simon.  

Muito obrigado.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/11/1999 - Página 30663