Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A ASSISTENCIA GOVERNAMENTAL AOS PORTADORES DE DIABETES NO PAIS.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A ASSISTENCIA GOVERNAMENTAL AOS PORTADORES DE DIABETES NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/1999 - Página 31269
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, DIA INTERNACIONAL, COMBATE, DOENÇA GRAVE, DEFESA, AUMENTO, PREVENÇÃO, DOENÇA, BRASIL, ECONOMIA, GASTOS PUBLICOS.
  • NECESSIDADE, AUMENTO, INFORMAÇÃO, DOENÇA GRAVE, AMPLIAÇÃO, DEBATE, SOCIEDADE CIVIL, PODER PUBLICO.
  • ELOGIO, SERVIÇO MEDICO, SENADO, ACOMPANHAMENTO, DOENTE, DOENÇA GRAVE.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta semana, precisamente no dia 14 de novembro, foi feito um registro nacional e internacional do Dia Mundial de Combate ao Diabetes Mellitus , doença universal que, no nosso País, atinge mais de seis milhões de pessoas, sendo que metade da população portadora do diabetes não tem conhecimento disso. É uma doença que traz marcas profundas do ponto de vista da qualidade de vida, sacrificando muito os cofres públicos do nosso País em função de uma política não definida e não assegurada de prevenção dessa doença.  

Nos Estados Unidos, o diabetes mellitus representa a quarta causa de internação, a primeira causa de cegueira e a primeira causa de morte em pacientes que evoluem para uma doença renal terminal. É grande causa de neuropatias periféricas, e vale ressaltar ainda a existência de doenças cardiovasculares secundárias resultantes do diabetes mellitus . 

No nosso País, as estatísticas não são precisas, mas nos levam a concluir que talvez tenhamos de inverter o senso de prioridade na interpretação do combate, controle e prevenção dessa doença. Com isso, teremos a possibilidade de economizar centenas de milhões de reais que são gastos diretamente pelo Poder Público. Cumpre considerar também que a população vítima do diabetes mellitus tem hoje um gasto pessoal mensal regular incompatível com a renda média da maioria da população pobre do nosso País. Um paciente de diabetes não gasta menos de R$250 por mês em medicamentos quando o Poder Público não os oferece.  

Vale ressaltar ainda que apenas o Distrito Federal tem uma legislação clara, que permite aos portadores do diabetes o acesso gratuito à insulina e a alguns produtos de ordem específica para o tratamento da doença.  

O diabetes mellitus subdivide-se em dois aspectos epidemiológicos: o chamado Tipo I, em que o doente vai ter de utilizar insulina obrigatoriamente; e o diabetes Tipo II, em que a insulina não é necessariamente utilizada para controlar as taxas de açúcar no sangue.  

É uma doença que traz marcas profundas para seus portadores, alterando o comportamento psíquico-social do indivíduo e fazendo com que a vida do indivíduo que não controla sua doença, seja por ineficiência do Poder Público, seja pela falta de informação, seja pela perda da auto-estima, transforme-se em um verdadeiro calvário.  

Quem conhece um diabético sabe o que representa a formação da úlcera plantar, o chamado pé diabético, com as lesões que se manifestam, situação em que o indivíduo fica pelo menos imobilizado, ausente do seu serviço por no mínimo 90 dias. E a úlcera diabética, ou pé diabético, é uma das complicações mais comuns em diabetes no nosso País.  

Se pensarmos nas neuropatias diabéticas, que são manifestações periféricas, que dificultam o andar, trazendo dores, desconfortos, alterações de sensibilidade nos segmentos periféricos do indivíduo diabético, perceberemos um claro abalo em suas atividades sociais e no seu trabalho. Se pensarmos nas complicações cardiovasculares do diabetes, vamos ver que acidentes vasculares atingem a estrutura cardíaca do paciente e a estrutura periférica desse paciente e comprometem severamente sua qualidade de vida e a evolução dessa doença. É uma doença que agrava em muito a qualidade de vida e que reduz em muito a sobrevida da população doente que não se sujeita a um tratamento efetivo. Pode-se alcançar um resultado excelente com um tratamento bem feito.  

Do total de casos de diabetes, 90% são do Tipo II, chamado não-insulinodependentes – há, aí, um aspecto positivo –, mas de 5% a 10% deles são dos chamados insulinodependentes, ou Tipo I, que obrigatoriamente vão ter que fazer uso do hormônio que controla o tratamento, chamado insulina. Cumpre salientar que 2% dos diabéticos são do tipo secundário ou associados a outras síndromes. E ainda vale considerar o diabete gestacional, uma condição específica da gravidez, que atinge de 2 a 3% das mulheres grávidas do nosso País ou de qualquer região que tenha características semelhantes ao Brasil.  

O coeficiente de prevalência – número de casos existentes em determinado momento em relação à população focalizada – traduz a magnitude do problema. Entre a população de 30 a 69 anos, esse coeficiente é de 7,6%. A prevalência varia de 2,7% para o grupo etário de 30 a 39 anos até 17,4% para o grupo de 60 a 69 anos.  

Então, não fica dúvida de que é uma das doenças mais importantes que temos em nosso País e que mais agridem a nossa população.  

Em relação ao diabetes neonatal, observa-se que a taxa de mortalidade de crianças recém-nascidas é muito elevada quando portadoras dessa manifestação clínica. Para os jovens, adolescentes e crianças que, a partir dos 5 anos, desenvolvem o chamado diabetes juvenil, afirma-se um verdadeiro calvário. Trata-se de manifestação extremamente dolorosa quando a doença não é judiciosamente acompanhada por profissionais de saúde e por serviços de saúde. Estes, sim, podem permitir a qualidade de vida e a prevenção das suas complicações.  

Eu creio que o mais importante é lembrar que esse dia de combate mundial que se travou contra o diabetes deve refletir que o Poder Público está agindo de maneira errada e precisa aproximar-se mais da população organizada, que se defende buscando o controle e a qualidade de vida para uma doença que não tem uma solução específica e garantida nos recursos da tecnologia médica de hoje.  

Dados do próprio Ministério da Saúde revelam que a população brasileira precisa ter certas condições que, lamentavelmente, ainda estão restritas e que não são acessíveis a todos os portadores do diabetes. Para os insulinodependentes, aqueles que precisam fazer uso da insulina, não há medidas disponíveis para prevenir a incidência da doença no momento. No caso dos não-insulinodependentes, dos que têm diabetes Tipo II, que não precisam da insulina, metade dos casos novos poderiam ser prevenidos evitando-se o excesso de peso, e 30% com o combate à vida sedentária por parte do grupo que fatalmente vai desenvolver a doença. Vale ressaltar que 3 milhões de pessoas irão desenvolver o diabetes muito em breve por não saberem que são intolerantes à glicose, comprometendo fatalmente sua qualidade de vida se não adotarem essas duas medidas simples: o controle de peso e a quebra da vida sedentária.  

Nos diabéticos, o controle da pressão arterial previne 80% dos acidentes vasculares cerebrais; previne 60% das amputações dos membros inferiores; previne 50% das doenças renais terminais; e previne 40% das doenças coronarianas. Vale ressaltar ainda que as doenças coronarianas são habitualmente traiçoeiras para os profissionais de saúde, porque são manifestações silenciosas. O doente diabético muitas vezes evolui para um infarte agudo do miocárdio sem saber disso, pois apresenta outras manifestações de doença que prejudicam a interpretação do médico e a própria interpretação do paciente do risco de evoluir para essa doença.  

Quando tivermos claro neste País que programas educativos podem reduzir pela metade o número de hospitalizações por diabetes e tivermos segurança de que isso representa uma economia de milhões de reais, que podem ser aplicados em finalidades prioritárias e de interesse, que o Poder Público e a medicina do nosso País não podem evitar, como questões de ordem social, vamos fazer muito mais pelos diabéticos.  

Há um dado que traz grande preocupação para a comunidade médica no Brasil: da população mundial, nós temos uma taxa, em regra, de que, dos diabéticos não-insulinodependentes, do Tipo II, 25% vão evoluir para o uso de insulina como tratamento necessário para garantir sua qualidade de vida. A proporção mundial é 25%, mas no nosso País, lamentavelmente, só se aplica essa regra para 8% dos chamados diabéticos do Tipo II. Essa distância entre a proporção mundial e a nacional – 25% para 8% – demonstra que os próprios médicos do Brasil não estão preparados adequadamente para conduzir o diabetes Tipo II.  

Por que isso acontece? Porque o sentimento de prioridade não chegou à comunidade científica brasileira de forma generalizada, não dominou o meio médico. Como conseqüência, as informações sobre a doença não foram suficientemente disseminadas, impedindo que o indivíduo tenha dados para questionar a sua unidade de saúde quanto ao fato de não estar usando a insulina, quando a média mundial é de 25%. Essa falta de informação impede que o cidadão possa questionar o acompanhamento recebido – determinante para a melhor ou pior qualidade de vida do paciente – e o tratamento dado à doença pelo profissional de saúde.  

É extremamente oportuna a união entre as organizações sociais e os movimentos populares para promover um grande debate nacional em torno do combate ao diabetes em nosso País, exigindo mais participação do Poder Público, mais parceria entre a sociedade organizada e os órgãos de saúde brasileiros.  

No auditório Nereu Ramos da Câmara dos Deputados, tive o prazer de abrir uma reunião, junto com o Deputado Jaques Wagner, para abordar a problemática do diabetes mellitus. Naquela oportunidade, tomei conhecimento de que o Senado Federal, através de seu Serviço Médico, deu um passo importante e que, portanto, merece ser elogiado: semanalmente reúne um grupo de pacientes que ali faz o acompanhamento da doença. Nessas reuniões faz-se um controle da qualidade de vida e da doença que está em curso nesse grupo de pacientes. Está de parabéns o Serviço Médico do Senado Federal.  

Todo serviço público, estadual e municipal, deveria adotar procedimento semelhante. Isso é de fundamental importância quando se sabe que metade dos casos pode ser prevenida com a disseminação de informações. Se descuidarmos dessa doença, corremos o risco de cair numa estatística que, seguramente, pode ser pior do que a estatística americana, que mostra que essa doença é a primeira causa de cegueira, de morte por doença renal terminal avançada, de amputação em membros inferiores, e é também uma doença que atinge, gravemente, o sistema cardiovascular e cerebral da população-alvo.

 

Era o que tinha a dizer.  

Muito obrigado.  

 

L e


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/1999 - Página 31269