Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO PAPEL DAS EMPRESAS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA NA DIVULGAÇÃO DOS INDICES ECONOMICOS E O REFLEXO NA ESTABILIDADE ECONOMICA E NO CONTROLE DA INFLAÇÃO.

Autor
João Alberto Souza (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MA)
Nome completo: João Alberto de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • CRITICAS AO PAPEL DAS EMPRESAS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA NA DIVULGAÇÃO DOS INDICES ECONOMICOS E O REFLEXO NA ESTABILIDADE ECONOMICA E NO CONTROLE DA INFLAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/1999 - Página 31308
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, EXERCICIO, PODER, AMBITO, CAPITALISMO, DEMOCRACIA, PARCERIA, EMPRESA, COMUNICAÇÕES, COMPETENCIA, TECNOLOGIA, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, AUMENTO, PODER DECISORIO, BANCOS, CAPITAL ESPECULATIVO, MERCADO INTERNACIONAL, ECONOMIA NACIONAL, POLITICA NACIONAL.
  • APREENSÃO, AUMENTO, INFLAÇÃO, FALTA, MELHORIA, RENDA, CONSUMIDOR, CRITICA, ATUAÇÃO, IMPRENSA, MANIPULAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA.
  • APOIO, SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, UNIÃO, COMBATE, AUMENTO, PREÇO.

O SR. JOÃO ALBERTO SOUZA (PMDB - MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no século passado, quando o capitalismo se uniu à democracia representativa, consagrou-se a estratégia da "mão invisível" no que diz respeito aos reais responsáveis pelas decisões no campo da economia: a estratégia da camuflagem dos verdadeiros donos do poder. Esses concebem as iniciativas a tomar, materializam-nas em decisões que são impostas à sociedade, mas não aparecem.

Nessas circunstâncias e para o público, os refletores apontam para uma classe que Antônio Gramsci chamou de "intelectuais orgânicos". Trata-se de jornalistas, engenheiros, economistas, líderes religiosos, cientistas, políticos, todos convocados para a tarefa de legitimar as determinações estabelecidas na surdina.

Hoje, a tarefa dos "intelectuais orgânicos" dispõe de um aliado com extraordinária capacidade de disseminação das notícias, das visões e das versões: as empresas de comunicação de massa, globalmente interligadas. São organizações poderosas, tecnologicamente muito bem equipadas, que divulgam a tese propícia, no momento aprazado, com grande competência e eficiência, de tal forma que se torna impossível a análise isenta do que é dito e mostrado.

Até há pouco, o setor industrial era o grande representante dos donos do poder. Hoje, perdeu o posto pelos banqueiros e especuladores internacionais. Ontem, o horizonte de uma nação mensurava-se pela capacidade produtiva instalada e pela oportunidade de emprego. Hoje, a riqueza econômica resume-se no cálculo dos lucros, nas taxas dos juros, nas variações cambiais e nas cotações da bolsa.

Dentro desse contexto, o comando dos segmentos mais importantes do complexo empresarial "...do país desloca-se para o estrangeiro e organiza-se numa rede de participações acionárias entrecruzadas, piramidais ou em cadeia, por efeito das sucessivas fusões e incorporações que marcam as etapas da concentração capitalista. O controle de nossa vida econômica e política passa, com isso, às mãos de entidades impessoais, irresponsáveis e sem-pátria: são grupos societários, consórcios, fundos de investimento ou de participação". (Fábio Konder Comparato, in Folha de S. Paulo, 16.11.99).

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, faço essas observações preliminares para comentar o que vem ocorrendo de uns tempos para cá no campo da estabilidade de nossa economia, da estabilidade do real, do controle da inflação e do estado de ânimo da população.

O aumento do preço dos gêneros de primeira necessidade e dos produtos de consumo em geral de longa data vem ocorrendo de maneira inexorável. Os consumidores, os que dependem do seu salário vivem, impotentes, esta dura verdade: os bens de consumo estão cada vez mais caros e o poder aquisitivo cada vez menor.

Essa verdade assumiu cores mais preocupantes a partir da divulgação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA relativo ao mês de outubro último, mês em que esse índice atingiu 1.19 por cento contra 0.31 por cento no mês de setembro.

O fato levou o próprio Presidente da República, em viagem a Cuba, a externar sua preocupação e a formular um apelo à população, para que resista à especulação, e aos empresários, para que entendam que não é o momento de aumentar os preços. "Aumentar os preços - disse o Presidente - significa aumento dos juros. Se crescem os juros, diminui a taxa de crescimento, o que não é bom para o Brasil".

Os indicadores dos preços pagos ao consumidor demonstram que a inflação mensal está apresentando índices entre 0.8 por cento a 1.1 por cento superiores à expectativa do governo, que previu percentuais de 0.5 por cento ao mês. O Índice Geral de Preços - IGP relativo ao mês de outubro, medido pela Fundação Getúlio Vargas, registrou um aumento de 1.98 por cento, razão pela qual o Banco Central conteve nova queda nas taxas dos juros básicos da economia.

No início do mês de outubro, segundo o Índice de Preços por Atacado - IPA, os produtos alimentícios tiveram alta de 4.01 por cento, enquanto que os produtos agrícolas subiram de 1.84 por cento para 2.21 por cento. Na indústria, houve alta nos setores da metalurgia na ordem de 2.27 por cento e nos preços de papel e papelão, com alta de 2.80 por cento.

Os mais atingidos pelo aumento dos preços foram as famílias de menores salários, cuja cesta básica se tornou mais pesada. Para essas famílias, os artigos mais consumidos, carne de segunda, peixe, açúcar, farinha de mandioca e farinha de trigo acumulam aumentos que variam de 19 por cento a 33 por cento, percentuais que se posicionam bem acima da inflação de 7.27 por cento, acumulada de janeiro a outubro do ano em curso, de acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA.

Na verdade, nesse processo todo, o consumidor não tem tido melhoria de renda e a realidade suscita preocupação. Segundo o economista Dércio Garcia Munhoz, a inflação está de volta. "Primeiro, o governo não conseguiu mais segurar o câmbio artificialmente baixo. Isso pressionou os preços. Depois, aumentou a carga tributária e, aumentando o custo da empresas, colocou mais pressão sobre os preços. Nas privatizações das companhias de serviços públicos, como a telefonia e a eletricidade, o governo garantiu reajustes anuais para as novas controladoras. Se hoje - conclui o economista - está tudo novamente indexado, menos os salários, é óbvio que quem perde renda é justamente quem não tem a garantia da indexação" (In Correio Braziliense, 17 de novembro de 1999).

Aos fatores acima mencionados, devem ser acrescentados os aumentos do preço da gasolina e do álcool, este último caso emblemático no que diz respeito aos altos percentuais do aumento e às explicações "orgânicas" dadas à população.

A conseqüência imediata dessa situação reflete-se na redução dos bens de consumo essenciais. O consumidor brasileiro já começou a cortar no setor de alimentos. Segundo a Associação dos Supermercados do Rio - ASSERJ, em 12 meses, a venda de carne bovina registrou uma diminuição de 20 por cento.

No campo da assistência médica privada, a despesa, segundo a Fundação Instituto de Pesquisa Econômica - FIPE, em quatro anos, aumentou 172.5 por cento. Isso significa que os custos triplicaram desde o início do Plano Real. Tal situação representa uma tragédia para a grande maioria da população brasileira que não tem capacidade para enfrentar uma semelhante escalada de aumentos. Os preços da assistência médica vem crescendo mais do que qualquer indicador econômico. Nessa área, inclusive, existem oligopólios, como o dos medicamentos e oxigênio, que elevam os preços dos planos em oferta no mercado.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, a enumeração dos problemas poderia se estender por longos parágrafos. Não há necessidade disso, até porque as conseqüências todos as percebemos e sentimos. Sobre o problema, porém, quero manifestar minha preocupação diante de uma generalizada sensação de desânimo que pode se alastrar diante da verdade do aumento dos preços e da restrição dos salários, diante de circunstâncias e de declarações públicas que deixam o caminho aberto para a dúvida. De acordo com pesquisas conduzidas pela Vox Populi e pela Confederação Nacional dos Transportes - CNT, 75 por cento dos entrevistados "estão convencidos de que o dragão da inflação acordou..... Apenas 5 por cento disseram estar convencidos de que a constante remarcação dos preços não fará parte novamente do cotidiano nacional". (in Correio Braziliense de 17 de novembro de 1999).

Tenho confiança de que o governo está atento para o problema e não entregará a explicação ao discurso dos legitimadores orgânicos de plantão. Acredito no apelo formulado pelo Senhor Presidente da República: "Não vamos transformar uma pequena subida de preços eventual em um problema, vamos lutar para que não se torne um problema" (in Correio Braziliense de 17 de novembro de 1999).

O momento é delicado. Exige posicionamento e transparência por parte do governo, pois uma população sem esperança e descrente é caminho aberto para aventuras de horizontes obscuros. "Um governo democrático sempre será chamado a controlar o mercado para torná-lo tolerável para os eleitores comuns, já que estes, se estiverem insatisfeitos, apoiarão movimentos políticos antiliberais e talvez até antidemocráticos" (Dominique Makins e Fábio Santos, in República, n. 37, novembro de 1999).

Era o que tinha a dizer!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/1999 - Página 31308