Pronunciamento de Alvaro Dias em 18/11/1999
Discurso no Senado Federal
INTERPELANDO O MINISTRO DE ESTADO DO ESPORTE E TURISMO, SR. RAFAEL GRECA, SOBRE A QUESTÃO DOS BINGOS.
- Autor
- Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
- Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
JOGO DE AZAR.:
- INTERPELANDO O MINISTRO DE ESTADO DO ESPORTE E TURISMO, SR. RAFAEL GRECA, SOBRE A QUESTÃO DOS BINGOS.
- Publicação
- Publicação no DSF de 19/11/1999 - Página 31209
- Assunto
- Outros > JOGO DE AZAR.
- Indexação
-
- CRITICA, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO ESPORTE E TURISMO (MET), DESCONHECIMENTO, FATO, OCORRENCIA, MINISTERIO.
- INTERPELAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO ESPORTE E TURISMO (MET), DEFINIÇÃO, EXPEDIENTE, UTILIZAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), INFLUENCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ASSINATURA, LIBERAÇÃO, JOGO DE AZAR, REFERENCIA, CRITICA, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB).
- DEFESA, NECESSIDADE, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APURAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, BINGO, QUEBRA, SIGILO BANCARIO, SIGILO, TELEFONE.
O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Senadores, Srs. Deputados, primeiramente quero afirmar que não venho como adversário do Ministro. Não entendo ser este o tribunal adequado para o julgamento desta questão. Não venho, portanto, para acusar ou julgar, apesar de ser adversário do Ministro. Reconheço, inclusive, que os seus companheiros, os seus colegas, têm o direito de defendê-lo. Somos adversários históricos, mas a minha preocupação não se prende ao plano eleitoral. Quero contribuir, como o quer esta Casa, para o esclarecimento de denúncias em respeito à opinião pública brasileira.
Percebi, desde o início da exposição do Ministro, que a sua preocupação não foi desmentir as denúncias. A sua preocupação foi, ao longo de todo tempo, repassar responsabilidade, lavar as mãos. O Ministro até afirmou no texto escrito, ao final do seu depoimento, que é possível que tenha sido enganado -afirmação do próprio Ministro Rafael Greca.
Em várias oportunidades, S. Exª afirmou não saber dos fatos. Isso surpreende, porque um Ministro de Estado, liderando um ministério pequeno, dá a impressão de não comparecer ao trabalho quando afirma não ter tomado conhecimento dos fatos. O Ministro não sabia quantos bingos haviam sido liberados; o Ministro não sabia quem estruturou, quem deu nova forma à estrutura do Indesp, quem elaborou o seu novo regimento; diz não conhecer as pessoas que participaram da elaboração da portaria da burla da Lei Pelé - não da portaria do aprimoramento da lei, como diz o Ministro ao citar Rui Barbosa, mas a portaria da burla de uma lei que, de forma exaustiva e insistente, proibia a utilização das tais máquinas eletrônicas programadas que, ao contrário do que diz o Ministro, são caça-níqueis
Portanto, não podemos submeter à opinião pública, para seu julgamento, apenas esta alternativa: a palavra do Ministro contra a palavra do jornalista; a palavra do Ministro contra a palavra do Professor Tubino; a palavra do Ministro contra a palavra do funcionário João Elias e daí por diante.
Mais do que nunca fica evidente a necessidade de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Somente ela vai permitir, através da investigação, da quebra do sigilo bancário e telefônico, a apuração das denúncias formuladas amplamente pela imprensa do País.
Quero dar mais uma oportunidade ao Ministro - o nosso objetivo é o esclarecimento - para que ele volte a temas aqui já focalizados. Por exemplo: a nova estrutura do Indesp enfeixa nas mãos do seu principal e dileto assessor, Luís Antônio Buffara, poderes amplos, sobretudo para a permissão dos bingos. Isso foi afirmado peremptoriamente na Comissão de Assuntos Sociais por vários dos depoentes - Professor Manoel Tubino e procuradores que ontem lá estiveram.
Portanto, as permissões dos bingos, que o Ministro desconhecia, foram permissões oferecidas pelo seu principal e dileto assessor, o seu representante maior na estrutura do Indesp. E ao contrário do que o Ministro afirmava à imprensa, não foram três, foram mais de cem.
A propósito dessa discussão, quero informar à Casa que apresentarei à Comissão de Assuntos Sociais requerimento convocando o jornalista Juca Kfouri para que ele possa esclarecer fatos, já que aqui foi citado e, na ausência, merece a oportunidade do esclarecimento.
Portanto, a estrutura, que é algo importante em uma administração pública, não pode ser modelada sem o conhecimento e a participação direta do Ministro. Seria como renunciar à função de Ministro ausentar-se da formatação da estrutura que dirige. Afirmar que o Indesp não é da responsabilidade do Ministro é também renunciar a parte da função de Ministro.
Foi exatamente em função dessa nova formatação que surgiu o balcão de atendimento especial, conforme denúncia de funcionários do Indesp. Também não vou discutir esse balcão, porque ele é parte integrante da ação cautelar e, provavelmente, da ação principal que será proposta no dia de amanhã pelos procuradores. Mas também quero dar oportunidade ao Ministro de esclarecer. Aliás, essa questão da portaria da burla foi realmente elaborada - e os documentos constam da ação cautelar - na Conab, com a participação de Alejandro Ortiz, representante de Lino Lauricelle, um dos chefões da máfia que contrabandeava toneladas de cocaína e heroína; Tiago Loureiro, que é também o proprietário do Instituto de Jogos Eletrônicos Ltda. e, através dos laboratórios de três universidades, tornou-se responsável pelo controle da habilitação dos modelos de máquinas eletrônicas.
Eu quero me reportar à medida provisória, de autoria do Ministro, encaminhada ao Presidente através da Exposição de Motivos nº 40. Essa medida provisória foi elaborada ardilosamente, segundo palavras da CNBB. Sei que o Ministro tem um grande respeito pela Igreja Católica.
A CNBB, em sua carta aberta ao Senhor Presidente da República, refere-se a essa proposta como “um ardilíssimo artifício utilizado para a obtenção da assinatura do Presidente”. Qual foi o ardilíssimo expediente utilizado pelo ardiloso Ministro, segundo a CNBB?
O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - (Fazendo soar a campainha.)
O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR) - No § 3º do art. 60 da Medida Provisória, quando se incluem as máquinas utilizadas nos sorteios e as eletrônicas programadas.
Portanto, confirma-se - e essa portaria tem a assinatura do Ministro Rafael Greca -, de forma indiscutível, a participação do Sr. Ministro na elaboração daquilo que S. Exª chama de aprimoramento da legislação e que eu, modestamente, afirmo ser uma forma de burla ou - como a CNBB diz - um artifício ardiloso para convencer o Presidente a assinar a liberação de forma absoluta dos jogos.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - (Fazendo soar a campainha.)
O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR) - Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, não saber de nada do que ocorre no Ministério é absoluta incompetência. Apesar de ser seu adversário, não ouso considerá-lo absolutamente incompetente. Por isso, V. Exª tem explicações a oferecer à opinião pública brasileira.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - Com a palavra o Ministro Rafael Greca.
O SR. MINISTRO (Rafael Greca) - Agradeço a última homenagem, apesar dos sucessivos sofismas.
Repito, Sr. Presidente e Sr. Senador Álvaro Dias, que a autarquia tem autonomia administrativa, financeira e orçamentária, e que o Ministro apenas orienta as políticas de esporte e turismo na sua formulação e aplicação. Repito que o meu único interesse nessa questão foi cumprir o relatório da Ciset, da Presidência da República, de dezembro de 1998, criando uma coordenação de bingos com nome e sobrenome, ao invés de um grupo de trabalho que tornasse tudo difuso em uma bacia de almas de difícil explicitação.
Quero iluminar os porões, Senador Álvaro Dias. Tenho apreço por dias de justiça. Detesto o dia em que o Senhor foi proposto ao povo por Pilatos e contraposto a Barrabás. Detesto também a escolha do injusto no lugar do justo. Amo a justiça. O apreço de D. Damasceno e da CNBB por mim têm sido manifesto em sucessivas reuniões no Ministério para a preparação da grande comemoração nacional dos 500 anos do Brasil, e S. Exª Revmª, Secretário-Geral, nunca se reportou a qualquer condenação contra mim. Não sou réu, e isto aqui não é um tribunal. Sou um Ministro esclarecendo a República. Esta letra não é minha, esta assinatura é de Manoel Tubino, a data é 29 de junho de 1999. Ele manda colocar no âmbito da diretoria do Dr. Buffara a responsabilidade sobre bingos. Mas só manda depois que o Marcus Vinícius Mendes Bastos, meu consultor jurídico, no dia 24 de junho de 1999, escreveu o seguinte:
“Preliminarmente, tendo em vista que não consta dos autos expressa manifestação do Indesp no processo de regimento daquela autarquia, sugiro sua opinião a respeito.”
Instado pelo Ministério, o Sr. Tubino escolheu fazer o regimento que fez. Não fui eu. Não me meti no assunto. Em junho de 1999, estava junto ao Presidente Jorge Sampaio, de Portugal, e ao Primeiro-Ministro Antonio Guterres, negociando a ampla comemoração nacional que, se Deus quiser, vamos começar nos próximos dias para a futura e auspiciosa celebração dos 500 anos do Brasil.
Entendo, sim, do meu Ministério. Não faltei ao trabalho, montei um programa no âmbito do Palácio do Planalto de levantamento dos gargalos que impedem a difusão do turismo no Brasil. Dei ao Programa Nacional de Municipalização do Turismo uma amplitude nunca vista. Acertei com o Pronaf que as propriedades rurais possam receber financiamento de R$15 mil a partir dos próximos dias, desde que se abram para o turismo rural. Estou instruindo o Prodetur do Sul, o Prodetur do coração do Brasil, o Prodetur do Sudeste, o Prodetur do Nordeste. Alerto a Casa sobre a possibilidade de o Nordeste perder US$28 milhões por uma recente resolução do Banco Central que, no âmbito do BID, está colocando aquele programa em perigo. Alerto a Casa sobre a importância de se fazer a segunda fase do Prodetur do Nordeste. Estou desfavelizando o berço do Brasil, na cidade de Santa Cruz Cabrália, junto a Porto Seguro, com dois dos meus cooperadores lá trabalhando em irrestrita cooperação com o Governador César Borges e com a boa gente da Bahia.
O desenvolvimento do Proecotur da Amazônia vai abrir o nosso País para a imensa possibilidade do turismo de pesca e do ecoturismo. Estou desenvolvendo, em todas as regiões do País, esforços para que o BNDES passe a financiar os hotéis e os empreendimentos de infra-estrutura hoteleira com 15 anos de prazo e com imediata aceitação dos pedidos da hotelaria. Há R$500 milhões, por ordem do Presidente Fernando Henrique Cardoso, no BNDES, à disposição de quem queira fazer infra-estrutura turística neste País.
O lado que gosto é o lado luminoso do esporte. Odeio o porão, a delegacia, a habilitação de bingo. Gosto é do lado luminoso do meu Ministério. Estou, com o Lars Grael, transformando as penitenciárias em fábricas de material esportivo. Fui à Papuda na semana passada e também, no mesmo dia, à tarde, à cadeia pública de Pato Branco. Havia fábrica de material esportivo só na penitenciária do Paraná, agora já há em 13 Estados. Haverá, até o fim do ano, em 17 e, se Deus quiser, até março, nos 27 Estados da Federação.
O Esporte Solidário, que encontrei funcionando só em 20 Estados, até o final do ano atenderá 300 mil jovens, em 27 Estados da Federação. O Projeto Navegar, do meu estimado amigo Lars Grael, está tornando meninos da periferia de Brasília passíveis de se tornarem marinheiros ou guias turísticos. São 350 meninos cheios de alegria, cheios de luz, que usam o Clube Naval para entender que navegar é preciso.
O apoio ao esporte olímpico nos deu as medalhas de Winnipeg. Fiz a Casa do Brasil em Winnipeg, e a infra-estrutura, mesmo num ano de necessário contingenciamento, já está com 195 obras prontas em 174 municípios. E o meu sonho é realizar, no próximo ano, 5 mil obras em 5 mil municípios, porque não falto ao serviço, Senador Álvaro Dias. E a autarquia tem autonomia administrativa, financeira e orçamentária.
A sua versão está o documento; contra a versão, o documento escrito. Está aberto no âmbito do Ministério, da consultoria jurídica o processo de elaboração dos diplomas legais que levei ao Senhor Presidente da República para Sua Excelência assinar. Se no Evangelho tem que me ser dado algum papel, certamente não é nem o de Pilatos, nem o de vendilhão, nem o de Barrabás.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - Com a palavra o Senador Álvaro Dias.
S. Exª dispõe de dois minutos.
O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR) - Sr. Presidente, não quis ser generoso ao oferecer uma nova oportunidade ao Ministro. Mas S. Exª não foi feliz, porque não aproveitou a oportunidade de assumir a sua responsabilidade como Ministro.
Foi V. Ex.ª quem afirmou estar ausente do trabalho ao insistentemente lavar as mãos sobre tudo o que acontece no seu Ministério. É como se estivessem assaltando a própria casa e se ignorasse a presença dos assaltantes.
A CNBB escreveu uma carta aberta ao Presidente da República. É impossível o Ministro desconsiderar uma crítica aberta da CNBB.
Não diria que o Ministro é irresponsável, mas, ao afirmar estar ausente de tudo que ocorre no Ministério, ele próprio se coloca como irresponsável ou inimputável.
Eu gostaria de concluir, Sr. Presidente, dizendo que felizmente esse assunto não se encerra aqui, porque não é privilégio do Ministro Rafael Greca ser a favor da Justiça. Eu também quero ver o mal à luz para que ele possa ser combatido. É por isso que desejamos a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito com amplos poderes, para sobretudo investigar essa conexão perigosa da máfia italiana com setores representados no Governo brasileiro.
A lavagem do dinheiro sujo proveniente da droga, da cocaína, do narcotráfico é uma denúncia séria do Ministério Público, com base no trabalho da Justiça italiana, que quebrou o sigilo telefônico de mafiosos, conferindo ligações perigosas com os seus representantes no Brasil, incrustados no esquema de jogos.
Apenas, para concluir, Sr. Presidente, quero afirmar que confio no trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal e certamente o Ministro Rafael Greca haverá também de respeitá-lo. Se se confirmar o que foi anunciado ontem, na Comissão de Assuntos Econômicos, na palavra de dois Procuradores do Ministério Público, que o Ministro será, a partir de amanhã, réu em uma ação civil pública por improbidade administrativa, veremos o Governo brasileiro denunciado pela Justiça. Na França, Ministro sob suspeita pede demissão; no Brasil, Ministro sob suspeita faz poesia na tribuna do Senado Federal.
O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - Concedo a palavra ao Ministro Rafael Greca.
O SR. MINISTRO (Rafael Greca) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não me furto não; oriento, esse é o meu papel. Tenho duas autarquias sob a minha supervisão e estou formulando a política nacional de turismo e de esportes. Determinei sindicância, auditoria e investigação da Polícia Federal. Não disponho de outros instrumentos. Percebo que o sonho dourado daqueles que me fazem oposição no Paraná é me carimbar uma CPI na testa. Quem sabe me tornar de “Ministro da alegria”, como já fui chamado, em um triste “Hildebrando esquartejador de pessoas”.
Ora, olhem o meu rosto, vejam a minha vida, visitem Curitiba, conheçam as lâmpadas que acendi, as igrejas que restaurei, os parques que fiz, as casas populares que ergui, o bairro novo que construí, os livros que escrevi, as escolas que prestigiei, percebam a luz dos 50 faróis do saber, as bibliotecas que construí, e percebam se tive tempo na vida para o mal. Ora, por favor!
Autarquia tem autonomia administrativa, financeira e orçamentária e o Ministro apenas orienta as políticas de esporte e de turismo.