Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DO QUADRAGESIMO ANIVERSARIO DA DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA.

Autor
Romero Jucá (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.:
  • COMEMORAÇÃO DO QUADRAGESIMO ANIVERSARIO DA DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA.
Publicação
Publicação no DSF de 24/11/1999 - Página 31465
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, DECLARAÇÃO, DIREITOS, CRIANÇA, ANALISE, EVOLUÇÃO, PROTEÇÃO, MENOR, AMBITO, DIREITO INTERNACIONAL.
  • CRITICA, DESCUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO, DIREITOS, CRIANÇA, BRASIL, MUNDO, NECESSIDADE, DEBATE, POLITICA SOCIAL.

O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, os tratados do Direito Internacional que se referem à criança têm uma posição especial e destacada no conjunto dos documentos relativos ao reconhecimento e à garantia dos direitos humanos. Já em 1924, a Assembléia da Liga das Nações adotava uma Declaração dos Direitos da Criança, antecipando-se em duas décadas à Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Organização das Nações Unidas em 1948.  

É certo que se, algum dia, os seres humanos deixassem de se sensibilizar com a sorte das crianças, seria difícil imaginar que fosse possível qualquer noção de fraternidade e solidariedade. Enquanto pessoas em condição especial, a qual se caracteriza, inclusive, por uma maior vulnerabilidade, é indiscutível que as crianças necessitam de cuidados também especiais. Sabemos, entretanto, o quanto as crianças têm pagado, ao longo da história e, ainda hoje, pelos erros que os adultos cometem.  

"A humanidade deve à criança o melhor de seus esforços". Assim a Assembléia de Genebra sintetizava, no Preâmbulo da citada Declaração de 1924, qual deveria ser a atitude dos adultos de todos os povos em relação às crianças. Essa primeira Declaração, entretanto, não apontava, de maneira clara, a responsabilidade dos Estados no sentido de garantir aqueles direitos reconhecidos em seus cinco artigos.  

A nova Declaração dos Direitos da Criança, proclamada pelas Nações Unidas em 20 de novembro de 1959, inspira-se explicitamente na Declaração de Genebra, mas amplia significativamente o seu escopo. A criança já não é tratada apenas como objeto privilegiado dos cuidados dos adultos, mas também como um sujeito detentor de direitos. O reconhecimento das necessidades específicas das crianças é enfatizado, como o direito de brincar e se divertir e o direito à educação, não sendo permitido que elas se empenhem "em qualquer ocupação ou emprego que (lhes) prejudique a saúde ou a educação ou que interfira em seu desenvolvimento físico, mental ou moral". O princípio 9º é enfático ao afirmar que "a criança gozará de proteção contra quaisquer formas de negligência, crueldade e exploração". É significativo ainda que se reconheça, já no preâmbulo da Declaração, o direito da criança a "uma infância feliz".  

Nesse mesmo preâmbulo, a Assembléia Geral da ONU "apela a que os pais, os homens e as mulheres na sua qualidade de indivíduos, e as organizações voluntárias, as autoridades locais e os governos nacionais reconheçam estes direitos e se empenhem pela sua observância". Faltavam ainda dispositivos que gerassem um efetivo comprometimento dos governos pelo cumprimento e garantia dos princípios adotados. Isto só veio a ocorrer após exatos 30 anos, quando a ONU adota a "Convenção sobre os Direitos da Criança". Em seus 45 artigos, a Convenção não apenas detalha tais direitos, como estabelece obrigações para os Estados Partes, inclusive o de prestar relatórios periódicos "sobre as medidas que tenham adotado com vista a tornar efetivos os direitos reconhecidos na Convenção e sobre os progressos alcançados no desempenho desses direitos".  

Constatamos, assim, que o Direito Internacional, no âmbito das Nações Unidas, evolui no sentido de exigir medidas e ações concretas para que os direitos das crianças não correspondam apenas a belas palavras e intenções. Se foram fatos extremamente significativos as proclamações desses direitos, em 1924 ou em 1959, devemos reconhecer que há muito mais a ser feito e a ser exigido do que a ser comemorado. Teríamos que ter os olhos bem vendados para não ver os desrespeitos e as atrocidades cometidos contra as crianças nos vários quadrantes do globo – e para constatar o quanto estão longe todas as crianças do mundo, sem qualquer distinção, de poderem gozar uma infância feliz.  

Não é diferente a situação da infância em nosso País. Houve, sem dúvida, nos últimos anos, alguns avanços consideráveis no que se refere à proteção e à garantia dos direitos das crianças. Podemos citar a diminuição da mortalidade infantil, a quase universalização do acesso à escola e uma série de projetos e iniciativas relevantes, que mostram que a sociedade como um todo começa a conscientizar-se de que somos responsáveis pelo que ocorre com todas as crianças brasileiras. Mas qualquer um pode notar, tanto pelos noticiários como simplesmente olhando as ruas das cidades, as condições adversas e cruéis com que se deparam muitas de nossas crianças. Sobretudo a dificuldade de retirarmos do estado de pobreza absoluta grande parte de nossa população faz com que um número imenso de crianças e adolescentes sigam um caminho sem perspectiva e sem esperança – o que significa, afinal, sonegar a esperança de um País melhor.  

Aproveitemos a oportunidade da passagem dos 40 anos da Declaração dos Direitos da Criança e dos 10 anos da Convenção sobre os Direitos da Criança para lembrar e alertar toda a sociedade, incluindo, certamente, os membros do Poder Legislativo, sobre nossa imensa responsabilidade para com a garantia de dignidade e de uma formação adequada, em todos os níveis, para as crianças brasileiras. E no ano que se aproxima, quando se completam os 10 anos de aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que possamos aprofundar a análise da situação da infância brasileira, que sabemos tão longe da ideal, propondo e implementando medidas mais concretas e efetivas para melhorá-la.  

Era o que tinha a dizer.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/11/1999 - Página 31465