Discurso no Senado Federal

IMPORTANCIA DE INVESTIMENTOS EM RECURSOS HUMANOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA ECONOMIA BRASILEIRA.

Autor
Gilberto Mestrinho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Gilberto Mestrinho de Medeiros Raposo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • IMPORTANCIA DE INVESTIMENTOS EM RECURSOS HUMANOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA ECONOMIA BRASILEIRA.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Carlos Patrocínio, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/1999 - Página 31581
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • APOIO, DISCURSO, ROBERTO SATURNINO, SENADOR, DEFESA, MANUTENÇÃO, PROGRAMA ESPECIAL, BENEFICIO, POS-GRADUAÇÃO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, FORMAÇÃO, RECURSOS HUMANOS, CONCORRENCIA, MERCADO INTERNACIONAL.
  • COMENTARIO, CORRELAÇÃO, NUMERO, PATENTE DE REGISTRO, DESENVOLVIMENTO, RECURSOS HUMANOS, PAIS.
  • COMENTARIO, DISCURSO, CARLOS PATROCINIO, SENADOR, DIFICULDADE, AGRICULTURA, PAIS, REUNIÃO, PAIS ESTRANGEIRO, DEBATE, SUBSIDIOS, APREENSÃO, PREJUIZO, BRASIL.
  • DEFESA, SUBSIDIOS, AGRICULTURA, AUMENTO, OFERTA, EMPREGO, CAMPO, PREVENÇÃO, FAVELA, CIDADE.

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para quem estava afastado há 36 anos da vida parlamentar, tem sido muito gratificante ouvir nesta Casa, durante várias sessões, diuturnamente, pronunciamentos dos mais variados, abordando assuntos distintos, mas todos voltados para o interesse público, para a realidade brasileira, para a busca de caminhos, de superação de crises, para justificação jurídica de posições, e sempre com o elevado espírito público de todos os Srs. Senadores e Srªs Senadoras.  

Na última segunda-feira, os pronunciamentos dos Senadores Saturnino Braga e Carlos Patrocínio, a meu julgamento, foram da maior importância. Embora tratando de assuntos aparentemente distintos, que ao ouvinte pouco atento pareciam não ter correlação, eles continham basicamente matérias da maior importância para a análise das causas do nosso subdesenvolvimento e do a cada dia mais acentuado gap, como dizem os economistas, entre a nossa economia e a dos países desenvolvidos.  

Abordou o Senador Saturnino Braga, em profundidade, a importância da manutenção do programa de bolsas de estudo para a formação de graduados em mestrado e doutorado, especialmente no treinamento especializado, de modo a prepararmos uma elite capacitada a buscar e difundir o conhecimento. Os eminentes Senadores sabem da quase obviedade de se falar nesse tema.  

Ingressamos em um mundo em que a principal ferramenta é o conhecimento aplicado e que somente chegaremos a ele através do treinamento. Com o treinamento, adquirimos a capacidade de observar os fatos, compreendê-los por meio de suas repetições e formularmos as teorias.  

Hoje, o treinamento assume uma importância maior que a formação escolar clássica. Nos países desenvolvidos, o empenho não é só na formação acadêmica; a preferência é dada em nível de "saber fazer", e isso é alcançado pelo treinamento. Daí a importância de uma boa formação de mestrado e de doutorado, instrumentada, para que o conhecimento seja objetivo, prático, crítico, voltado para a realidade, de modo a preparar profissionais capazes de contribuir para o desenvolvimento socioeconômico do País.  

É inexplicável que um País com a população que temos, com as potencialidades reais que apresentamos e com a destinação histórica que queremos busque fazer economia de "coto de vela" com a formação de recursos humanos, única forma de sairmos da crise e da triste condição em que nos encontramos de campeão das desigualdades sociais, enquanto países que até há pouco pareciam sem futuro hoje estão numa escala de desenvolvimento superior à nossa.  

Faz poucos dias, um analista internacional escrevia: "Na nossa era da economia do conhecimento, quando criar um bom programa de computador gera muito mais utilidades que montar milhares de automóveis, o indicador mais revelador do futuro econômico de um povo será o número de patentes que cada país registra anualmente".  

Por outro lado, Sr. Presidente, o investigador de Harvard Juan Henrique afirma: "O fator mais importante para geração de riquezas hoje em dia é a capacidade dos países de competir na economia do conhecimento e não na economia de manufaturados". E prossegue: "Os países capazes de criar novas tecnologias e patenteá-las poderão gerar muito mais riquezas".  

Segundo o analista Oppenheimer, o indicador básico do futuro econômico de cada país é o número de patentes que registra anualmente nos Estados Unidos para assegurar sua propriedade intelectual mundialmente.  

Assim, Sr. Presidente, Srs. Senadores, o que vale não é a mão-de-obra barata, mas a mão-de-obra inteligente, preparada, capaz. O que não é possível é querermos continuar na incômoda e triste situação de atraso em que nos encontramos.  

É desalentador que nações como a Coréia, que, em 1985, registrou apenas 50 patentes nos Estados Unidos, no ano passado alcançou 3400 registros, enquanto que o nosso País só registrou, no ano passado, 80 patentes. Vejam bem: a Coréia registrou 3400 patentes e o Brasil, 80 patentes! É certo que ficamos na frente do México, com 77 patentes, e da Argentina, com 60. Os demais países da América Latina nem aparecem na estatística, o que demonstra claramente o grau de atraso em que nos encontramos e a necessidade imperiosa que temos de despertar para a realidade e priorizarmos o que realmente é importante para o Brasil, que é o conhecimento.  

Por isso, a minha solidariedade ao lúcido apelo que fez aqui, na segunda-feira, o eminente Senador Saturnino Braga.  

O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Com todo o prazer, Senador Bernardo Cabral.  

O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Senador Gilberto Mestrinho, em primeiro lugar, quero destacar a grandeza com que V. Exª começou o seu discurso. No Parlamento, nem sempre é comum o reconhecimento dos pronunciamentos dos colegas, sobretudo quando não se detém na análise da densidade do discurso proferido. V. Exª sai desse caminho para registrar - e o faz com absoluta perfeição, porque não torpeça na razão, não confunde a verdade - que dois colegas seus fizeram pronunciamento que merece a sua homenagem. Observe que quando V. Exª refere-se ao conhecimento e à educação, V. Exª diz: o conhecimento objetivo, prático, crítico, próprio de quem é professor. V. Exª foi Deputado Federal e três vezes Governador e continua a ser chamado de professor pela quase unanimidade das pessoas com quem convive. De modo que, já não fosse o sobrenome Mestrinho – e aí o diminutivo não é para apequenar, mas para destacar o mestre –, V. Exª hoje traz para reflexão da Casa, além deste caminho, um assunto sério, que é o desprezo, o descaso e a absoluta falta de sensibilidade que nós todos, brasileiros – e aí a culpa também deve ser de cada um de nós –, temos com o registro das nossas patentes. A comparação com a Coréia, que é um país cuja dimensão territorial V. Exª assinala de vez em quando neste plenário, dá bem a medida do seu discurso. Peço que V. Exª não repare tê-lo interrompido, mas gostaria de registrar os meus cumprimentos ao pronunciamento de V. Exª.  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - A generosidade das palavras de V. Exª, nobre Senador, enriqueceram o meu pronunciamento e dele passam a fazer parte, com muito prazer.  

Por outro lado, o eminente Senador Carlos Patrocínio abordou a questão do agribusiness, como estão denominando a atividade econômica ligada ao campo. E o fez chamando a atenção para o tratamento que é dado à produção rural brasileira, para as dificuldades da sua inserção nos mercados internacionais e a política protecionista que os demais países dão à sua produção agroindustrial.  

Tem razão o nobre Senador pelo progressista Estado de Tocantins. Todos sabemos da saga que enfrentam no Brasil aqueles que se dedicam à atividade no campo. Internamente, isto é, dentro de nossas fronteiras, a luta é imensa: dificuldades de financiamento, taxas de juros cumulativas, precária rede de transportes, custo da atividade portuária, inadequadas leis ambientais, sem falar no preço dos insumos agrícolas e nos impostos asfixiantes.  

E por falar em insumos, adubos, defensivos, etc, cujos preços são baseados no dólar, que quase duplicou neste ano, ainda tivemos o problema da queda absurda – de mais de 30% – nas cotações das commodities nos mercados internacionais. Mesmo assim, foi a produção do campo que evitou um desastroso déficit na balança comercial no primeiro semestre. Os produtos agrícolas foram a grande alavanca, o sustentáculo do balanço de pagamentos no primeiro semestre.  

Do lado externo, além da queda de preços, a atividade enfrenta dificuldades com barreiras tarifárias protecionistas, elevados subsídios financeiros que os países desenvolvidos dão aos seus produtores, especialmente na Comunidade Econômica Européia, nos Estados Unidos, no Japão e, recentemente, até na China.  

No momento, nós poderíamos estar vivendo um alento, pois os preços do café e do açúcar, por exemplo, melhoraram no último trimestre. Os preços de outras commodities também estão melhorando no mercado externo. No entanto, passou a época de plantar, as safras estão montadas e foram até reduzidas este ano. E nós não poderemos obter maiores benefícios da melhoria de preços no mercado internacional.  

Mas a preocupação maior expressada pelo Senador Carlos Patrocínio é com as decisões a serem tomadas em Seattle, na Rodada do Milênio, que será realizada agora. Os países produtores de commodities, especialmente os integrantes da Comunidade Econômica Européia, mostram pouco interesse na reunião porque resistem em discutir a questão dos subsídios governamentais. Esses países adotam subsídios elevadíssimos para os produtos agropastoris, tendo como parâmetro os subsídios concedidos na França, com o objetivo não só de estimular a permanência do homem no campo, mas de manter marcado onde começa e onde termina cada cidade. Quem anda pela Europa de automóvel percebe isso bem.  

Com a política de subsídio, eles mantêm o homem no campo, para evitar aquilo que Ignacy Sachs chama de "refugiados do campo", isto é, as populações que, sem atividade econômica rentábil, migram para a periferia das cidades em busca de sobrevivência e favelizam as periferias por não conseguirem inserção no mercado de trabalho, como tem acontecido diariamente nas cidades brasileiras. E isso acontece por duas razões: primeiro, pela falta de qualificação técnica – a pequena qualificação para o trabalho na cidade; e, segundo, porque não há emprego.  

É a favelização e a miséria que evitam, na Europa, com o subsídio. E aqui no Brasil não permitem o menor movimento para ajudar a produção agropastoril, que tem uma carga terrível de impostos. E não é só no Brasil que isso acontece. Segundo levantamento feito há alguns anos pelo próprio Banco Mundial, os países emergentes do sul perderam, só com subsídios e barreiras tarifárias que lhes são impostas, especialmente commodities e têxteis, anualmente, mais de US$200 bilhões.

 

É a política de empobrecimento. Temos de fazer um esforço terrível contra a injustiça praticada com os países subdesenvolvidos, de modo que a nossa produção não basta para pagar sequer os juros da dívida, que, continuamente, são definidos na política de rolagem das dívidas quando o excesso de capital existente não está muito interessado na repatriação, mas sim nos juros constantes e cada vez maiores.  

O Sr. Carlos Patrocínio (PFL - TO) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Pois não, nobre Senador.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo. Fazendo soar a campainha.) - Antes de V. Exª iniciar o seu aparte, desejo prorrogar a Hora do Expediente pelo tempo necessário para que V. Exª conclua o seu discurso e para ouvirmos as comunicações inadiáveis.  

Informo ao Orador que o tempo de S. Exª já está esgotado.  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Muito obrigado pela paciência de V. Exª.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Apelo, portanto, para que, após esse aparte, não conceda novos apartes e, por favor, colabore com a Mesa, encerrando o seu discurso.  

O Sr. Carlos Patrocínio (PFL - TO) - Nobre Senador Gilberto Mestrinho, fico muito feliz por V. Exª trazer de novo à baila esse assunto, que é muito importante, principalmente agora, quando se realiza em Seattle, nos Estados Unidos, a Rodada do Milênio da Organização Mundial do Comércio. Tive oportunidade de fazer um despretensioso pronunciamento, e V. Exª o enriqueceu, e muito! Agora V. Exª o está repetindo, com números certamente muito mais bem pesquisados. Creio que é muito importante a presença de V. Exª neste momento na tribuna para chamar a atenção das autoridades brasileiras para o tema, sobretudo as que trabalham com o comércio exterior, as autoridades diplomáticas. Sempre entendi que a globalização é uma nova maneira de colonização. São os países grandes, poderosos, produtores, tentando, evidentemente, subjugar os países menores. É por isso que temos de ter uma participação efetiva, chamando a atenção das autoridades para que defendam conjuntamente todos os países em desenvolvimento, os países emergentes; para que defendam veementemente as nossas posições sobre as barreiras sanitárias, as barreiras tarifárias, e assim por diante. Eu gostaria de conversar mais com V. Exª a esse respeito, mas teremos novas oportunidades. Faço uma solicitação: que V. Exª volte novamente a essa tribuna para que possamos tratar deste assunto, que é atual e de extrema importância. Portanto, cumprimento V. Exª.  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Muito obrigado a V. Exª, nobre Senador Carlos Patrocínio.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - V. Exª me permite um aparte?  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Ouço agora o aparte do nobre Senador Tião Viana.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Nobre Senador Gilberto Mestrinho, solicito a V. Exª que não conceda mais apartes.  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Sr. Presidente, peço um pouco de paciência de V. Exª para, em seguida, concluir.  

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Não é isso, Senador. Terei, então, de cancelar os pedidos de comunicação inadiável. O prazo regimental destinado à Hora do Expediente já está esgotado. Apelo a V. Exª para que colabore com a Mesa em relação a isso.  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Sr. Presidente, V. Exª tem razão. Permita-me apenas ouvir o aparte do nobre Senador Tião Viana e, em seguida, concluirei.  

Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador Tião Viana.  

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Sr. Presidente, serei muito breve e utilizarei menos de um minuto. Entendo a preocupação correta da Mesa, de aproveitar o tempo da Ordem do Dia, mas eu não poderia deixar de registrar a minha admiração, em meu nome e em nome da Senadora Heloisa Helena, pelo pronunciamento do Senador Gilberto Mestrinho. S. Exª aponta como inadiável a presença da inteligência do Estado brasileiro nas questões que dizem respeito à soberania do seu povo e ao caminho do desenvolvimento tão sonhado, que se acompanha da justiça social e da possibilidade do verdadeiro enriquecimento do nosso País. Senador Gilberto Mestrinho, só posso lembrar a V. Exª que o Fundo Monetário Internacional, a OMC e o Banco Mundial não passam de instrumentos dos grandes países. Eles têm uma política muito bem definida e muito bem planejada. É por isso que não tenho grandes expectativas em Seattle, no encontro dos grandes, porque se eles, com os seus avanços tecnológicos, garantem superprodução nas suas estruturas econômicas, é porque querem que não haja competição dos países periféricos, nos quais se inclui o Brasil. Lamento profundamente que o Estado brasileiro não imagine que temos de ter um confronto com essas estruturas e não relações de subserviência. Parabéns a V. Exª e a minha admiração por um pronunciamento extremamente inteligente e oportuno.  

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Muito obrigado, nobre Senador Tião Viana.  

Apenas para concluir, Sr. Presidente. Os Senadores Carlos Patrocínio e Tião Viana abordaram o problema do colonialismo. Globalização é uma forma eufêmica de chamar o colonialismo.  

Em 1989, quando caiu o Muro de Berlim, entenderam que haviam sido sepultadas nos seus escombros as idéias de Marx e passaram a adotar as idéias de Schumpeter. Daí surgiu o consenso de Washington, onde ficou estabelecido que haveria dois mundos: o mundo dos sete desenvolvidos, que detêm 80% da renda mundial, e o mundo dos excluídos, que seríamos nós, condenados a ser simples fornecedores de matéria-prima, de algumas commodities que eles não produzissem. Ficaríamos, portanto, sempre no sacrifício.  

A reunião de Seattle, que será realizada no final deste mês, é perigosa para nós. Querem estabelecer não apenas barreiras tarifárias, mas barreiras sanitárias, barreiras ambientais e barreiras sociais, o que significará a exclusão dos mercados, com toda certeza, da produção do norte do Brasil e do Brasil Central. Esse é o risco que correremos em Seattle.  

V. Exª, nobre Senador Carlos Patrocínio, prestou um bom serviço à Nação denunciando isso, colocando a matéria em debate. Acredito que as autoridades brasileiras terão pelo menos um comportamento pró-ativo; não um comportamento reativo, de "deixar como está para ver como é que fica".  

Vamos procurar interferir para defender realmente o interesse nacional.  

Muito obrigado, Sr. Presidente. Infelizmente o tempo se esgotou, mas a paciência de V. Exª valeu.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/1999 - Página 31581