Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI QUE CRIOU O PROGRAMA DE PROTEÇÃO AS VITIMAS E TESTEMUNHAS.

Autor
Renan Calheiros (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: José Renan Vasconcelos Calheiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI QUE CRIOU O PROGRAMA DE PROTEÇÃO AS VITIMAS E TESTEMUNHAS.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/1999 - Página 31794
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, CRIAÇÃO, PROGRAMA, PROTEÇÃO, AMEAÇA, VITIMA, TESTEMUNHA, ESPECIFICAÇÃO, FORNECIMENTO, SEGURANÇA, RESIDENCIA, CONTROLE, TELECOMUNICAÇÃO, ESCOLTA, PRESERVAÇÃO, IDENTIDADE, AUXILIO FINANCEIRO, ASSISTENCIA MEDICA.
  • APOIO, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, DESTINAÇÃO, PROGRAMA, PROTEÇÃO, AMEAÇA, VITIMA, TESTEMUNHA, CRIME.

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do Orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em julho deste ano, quando ainda ocupava a Pasta da Justiça, aprovamos e sancionamos a lei que criou o programa de proteção às vítimas e testemunhas ameaçadas. Naquela oportunidade, anunciamos – ainda para este ano – o remanejamento de R$1,3 milhão para os cinco meses restantes, uma quantia – reconheci na época – modesta para a dimensão do crime no País, mas fundamental para que pudéssemos dar partida ao Programa.  

Essa lei, inspirada em exemplos bem-sucedidos de países como Estados Unidos, Inglaterra, Itália e Holanda, concretizou evoluções significativas em matéria legislativa. Inquestionavelmente, representou um marco jurídico importante para o Brasil no combate ao crime organizado e ao narcotráfico.  

Entre outras providências, Sr. Presidente, a lei contemplou segurança na residência e controle de telecomunicações, escolta em deslocamentos, transferência de domicílio, preservação de identidade e imagem, ajuda financeira mensal, suspensão temporária de atividades profissionais, apoio e assistência medico-psicológica, além do sigilo dos atos relativos à proteção.  

Apoiei ainda, Srªs e Srs. Senadores, a redução de um a dois terços da pena para condenados que colaborassem com as investigações e o perdão judicial de toda pena em caso de réus primários, desde que estes efetivamente apresentassem elementos para esclarecer o delito, como identificação dos demais participantes, paradeiro de vítimas ou recuperação do produto do crime.  

O crime organizado, com tentáculos disseminados pelo País e que gradualmente vão sendo revelados pela CPI do Narcotráfico, tem o princípio da intimidação, da coação, da imposição do medo, do estado de terror às vitimas e da cumplicidade coletiva e passiva. A legislação de proteção às testemunhas e vítimas é o melhor instrumento jurídico para revogarmos uma outra lei que nunca foi votada ou sancionada - a lei do silêncio.  

A violência de alguns maus policiais, dos grupos de extermínio, das quadrilhas, do crime organizado, a violência contra adolescentes, crianças, no campo, a carcerária, contra mulheres e índios é um flagelo nacional sistematicamente denunciado pelo organismos mundiais de direitos humanos. A violência e o crime não têm causa única, a origem é multifacetada, mas certamente a impunidade robustece a delinqüência.  

A gênese da lei de proteção às vítimas e testemunhas ameaçadas é exatamente esta: acrescentar meios, por intermédio da prova testemunhal, para elucidarmos os crimes, desmantelarmos organizações criminosas e acabarmos com esse sentimento nefasto de impunidade que confere ao País títulos tão vergonhosos. A impunidade deforma o país e desacredita as instituições.  

Os criminosos ameaçam, agem impunemente, pressionam e matam. A sociedade emudece, está insegura, impotente. As vítimas e testemunhas ficam desprotegidas, abandonadas e desamparadas. Os corpos vulneráveis curvam-se ao poder ao poder paralelo dos criminosos. Nossos cidadãos transformam-se em mendigos empalidecidos pelo medo.  

A eficácia desta lei está subordinada ao grau de prioridade que ela terá do Governo Federal. Não basta termos a lei se não assegurarmos os recursos para sua execução. A parcimônia de verbas para o atendimento às vítimas e testemunhas poderá tornar a lei inócua e até mesmo ridicularizá-la. Não podemos admitir, depois de tantos esforços que fizemos, que esta lei seja uma mera matriz para enredos fictícios. É imperioso que eliminemos a burocracia no acesso e na liberação de recursos para o programa. Só assim realmente a proteção será dada a quem dela necessita.  

Igualmente necessária será a ampliação dos recursos previstos para este programa. Deixamos, Sr. Presidente — repito —, R$1,3 milhão para cinco meses, mas as projeções, a partir da experiência do Cajob, em Pernambuco — pioneiro na assistência às vítimas e testemunhas no Brasil —, indicam a necessidade de aumentarmos os recursos para esse fim.  

Nos Estados Unidos, a título de exemplo, o programa já existe há 27 anos. O gasto anual é de US$20 milhões, o que equivale, hoje, aproximadamente, a R$40 milhões. Até hoje não houve nenhuma baixa no programa norte-americano. O número de vítimas e testemunhas assistidas gira em torno de 150 ao ano. Convém ressaltar que o programa norte-americano é exclusivamente estatal, portanto distinto do modelo adotado no Brasil.  

No Brasil, nos seis Estados onde o programa já foi adotado por meio de convênios do Ministério da Justiça, a curta experiência demonstra que a média de atendimentos será, pelo menos, de 50 pessoas ao ano. Projetando este número para os 27 Estados da federação, haverá, então, cerca de 1.300 pessoas inscritas no programa. Considerando-se o custo mensal mínimo em torno de R$300 para manutenção da assistência a uma família e o custo inicial de inscrição de R$500, haverá, então, a necessidade mínima de algo próximo a R$5,4 milhões, todos os anos. Devemos, obrigatoriamente, comparar este valor com o gasto anual do Brasil em decorrência da violência: R$84 bilhões, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento — BID.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Permite-me V. Exª um aparte?  

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Tenho a honra de ouvir o Senador Casildo Maldaner.  

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Senador Renan Calheiros, pensei, por duas vezes, se apartearia ou não V. Exª, que é um mestre nessa matéria. Ontem, ainda, analisei a questão do armamento no Brasil: cerca de 20 milhões de armas ilegais estão pelo País afora, quer dizer, há a morte gritante, as pessoas usam armas, pois há falta de fiscalização. E, hoje, V. Exª traz um tema que está muito em pauta: a necessidade de se oferecer mais proteção à testemunha, a implantação desse programa de forma mais acelerada. Se houver a reimplantação de um programa de proteção à testemunha, por certo haverão de ser desbaratas, neste País, quadrilhas de narcotráfico, de banditismo, de roubos, de assaltos. Com certeza, essa cruzada das "mãos limpas" para se implantar algo mais sagrado e puro no Brasil terá êxito, porque aqueles que mexem com isso terão que pensar 10 vezes antes de formar suas quadrilhas. E muito chama a atenção, não só de nós, mas de todo o Brasil, o fato de V. Exª analisar essa questão e trazer exemplos concretos de vários países do mundo, como os Estados Unidos. Além disso, V. Exª é uma autoridade no ramo, uma vez que viveu intensamente no Ministério da Justiça como Ministro. Não é por nada que V. Exª é considerado o Ministro da Cidadania no País. Assim, gostaria de me regozijar e de acompanhar de perto o pronunciamento de V. Exª com relação à proteção mais assegurada e rápida da testemunha no País.  

O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço o aparte do eminente Senador Casildo Maldaner e o incorporo, com muita satisfação, ao meu modesto pronunciamento. Realmente, Senador, se não estimularmos as vítimas e testemunhas, a fim de que falem, colaborem com o esclarecimento dos crimes, sinceramente, não avançaremos no rumo, que pretendemos, do combate eficaz ao crime e ao narcotráfico no Brasil.  

Só com este programa, com o combate sistemático à violência e à criminalidade, com a reforma do Judiciário, a mudança da lei de armas e a definição de fontes para segurança pública, inverteremos esta majestade sombria de sermos campeões mundiais de crimes e impunidade. A lei de proteção às vítimas e testemunhas ameaçadas é um de nossos melhores meios legais para combater o crime organizado, os matadores de aluguel, o tráfico de mulheres e crianças, o contrabando e o tráfico de drogas e armas.  

O Governo não deve hesitar, um segundo, na viabilização dos recursos para concretizar este programa, até porque, como todos sabem, dispõe dos recursos. Esta lei não pode transformar-se em mais uma esperança infértil, em mais um exemplo de lei que não sai do papel.  

Muito obrigado, Sr. Presidente.  

 

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/1999 - Página 31794