Discurso no Senado Federal

TRANSCURSO, HOJE, DO DIA INTERNACIONAL DA NÃO VIOLENCIA CONTRA A MULHER.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • TRANSCURSO, HOJE, DO DIA INTERNACIONAL DA NÃO VIOLENCIA CONTRA A MULHER.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/1999 - Página 31796
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • REGISTRO, DIA INTERNACIONAL, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, COMENTARIO, IMPORTANCIA, MOBILIZAÇÃO, FEMINISMO, BUSCA, MELHORIA, DIREITOS, EXERCICIO, CIDADANIA, PAIS.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, NUMERO, TELEFONE, DENUNCIA, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT - RS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sr as Senadoras, Srs. Senadores, hoje, os países, as sociedades e as mulheres, de forma especial, estão mobilizados em torno do Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher. A data foi instituída durante o Primeiro Encontro Feminista Latino-Americano e do Caribe, realizado em Bogotá, em 1981. O dia 25 de novembro foi escolhido em reverência à memória das irmãs Mirabal, brutalmente assassinadas na República Dominicana, durante o regime do ditador Trujillo, em 1960.  

Neste dia, em todo o mundo, as atenções se voltam para a reflexão, denúncia e busca de soluções que apontem para o fim da violência contra as mulheres. Esse debate é importante para avançarmos na compreensão da violência contra a mulher como uma questão de interesse público; também para apontar na direção da vigência de efetivos instrumentos legais e institucionais de defesa e garantia de direitos que impeçam o crescimento da violência. Temos a registrar e a lastimar o assassinato da Deputada Ceci Cunha, em Alagoas e, mais recentemente, da Prefeita Dorcelina Folador, de Mundo Novo, Mato Grosso do Sul.  

A violência contra as mulheres é uma regra em todo o mundo, acentuando-se nas regiões mais pobres, onde ocorrem inclusive outras formas de agressão além da física, sexual e psicológica. No Brasil, por exemplo, à violência doméstica e sexual somam-se outras formas de violação dos direitos, tais como: diferença de remuneração, dificuldade de acesso a serviços de saúde adequados, assédio sexual, entre outras. Tais práticas, sem dúvida, atentam contra a democracia e o avanço da igualdade, afetando o bem-estar, a segurança, as possibilidades de educação, desenvolvimento pessoal e a auto-estima das mulheres.  

A presença deste tema na pauta nacional é fundamental, pois esse assunto diz respeito diretamente a mais da metade da população brasileira, situação já agravada pelos números dessa realidade, inclusive em nosso País, onde, a cada quatro minutos, uma mulher é agredida. Setenta por cento desses casos de violência são praticados dentro dos lares, dos quais 65% são cometidas pelos integrantes do próprio núcleo familiar. Além desses, é grande o número de casos de assédio sexual no trabalho e de outras formas de violência não tão evidentes, na forma de observações maldosas, palavras e gestos que discriminam e agridem a mulher.  

Ao longo destes últimos anos, as mulheres têm denunciado as agressões de uma forma mais ampla, desinibida e rápida. Mas é preciso avançar mais, perder o medo, denunciar, assumir o papel de mulher que exige respeito, da cidadã que cobra do Estado e das organizações sociais o apoio legal, institucional, e, principalmente, a compreensão da sociedade e de sua família de que ela merece um espaço e deve ser valorizada. A luta contra a violência é uma responsabilidade de todos, mas deve ter, nas mulheres, a iniciativa principal.  

Sras e Srs. Senadores, hoje, inegavelmente, como resultado da luta das organizações femininas e de diversos setores da sociedade, podemos contar com leis e instrumentos que fizeram avançar a luta pela valorização das mulheres. Exemplo disso são as Delegacias das Mulheres, que, desde a década de 80, vêm prestando um grande serviço de apoio e de proteção às mulheres vítimas de violência, especialmente nas grandes cidades - mas, a exemplo das Casas de Abrigo, essas instituições são insuficientes e não contam com o apoio e os recursos necessários.  

As recentes alterações no Código Civil, outro acontecimento positivo, também fazem parte dos avanços no campo legal e institucional, elas removeram conceitos anacrônicos relativos às mulheres. No entanto, ainda existe uma grande incompatibilidade entre a lei e a prática social e também há necessidade de ampliação dos instrumentos legais de proteção à mulher.  

No primeiro caso, é fundamental uma cotidiana, constante e eficaz mobilização das mulheres e dos organismos ligados às questões a elas relacionadas de forma especial, no sentido de transformar em realidade os preceitos legais.  

Em relação à legislação, é importante, além da sugestão de novas propostas, a agilização daqueles projetos existentes no Congresso Nacional. Nesse sentido, a Bancada Feminina do Congresso Nacional – formada por Senadoras e Deputadas de vários Estados brasileiros – tem atuado de forma constante e integrada na aprovação de matérias em tramitação.  

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - V. Exª me permite um aparte, Senadora Emilia Fernandes?  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT - RS) - Com muito prazer, Senador Ney Suassuna.  

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Senadora Emilia Fernandes, quero exatamente prestar o depoimento de como esta Bancada, embora ainda pequena, tem atuado extraordinariamente, numa demonstração do valor das mulheres. Elas passaram tantos e tantos séculos sem ter muitas oportunidades, mas, a cada dia, se afirmam mais. Prova viva disso é a atuação da Bancada feminina no Senado e na Câmara. Parabenizo V. Exª, uma das Congressistas mais atuantes dessa Bancada.  

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT - RS) - Agradeço o aparte de V. Exª e o incorporo ao meu discurso com muita satisfação e em nome de toda a Bancada.  

Ficamos felizes; a nossa luta não tem sido em vão. E não tem sido exatamente porque ela tem mudado a consciência, o coração, a ação e a decisão das mulheres, mas principalmente porque tem atingido os homens que, a exemplo de V. Exª, manifestam-se reconhecendo definitivamente a nossa importância.  

Somos apenas 30 Deputadas Federais e 6 Senadoras. Esse percentual é muito pequeno, não atinge 7%, anda em torno de 6%, portanto, precisamos que as mulheres adquiram uma mudança de consciência e que essa luta não seja apenas nossa mas da sociedade, de homens e mulheres com visão aberta, moderna, que reconhecem valores em todas as pessoas, uma ação que realizará grandes transformações. Nessa ação, a sua participação, Senador Ney Suassuna, é, sem dúvida, muito significativa.  

No Congresso, temos realizado um trabalho integrado. Temos nos reunido constantemente, abraçado causas da sociedade, acompanhado projetos. Estamos agora integrados ao Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, para que possamos, cada vez mais, fortalecer essa nossa luta. Inclusive, é importante registrar algumas medidas aprovadas recentemente que comprovam o resultado e o compromisso do Congresso Nacional com essa questão. Como exemplo, aprovamos um projeto que define critérios e formas de proteção à mulher no mercado de trabalho, assegurando-lhe condições de igualdade tanto no acesso quanto no exercício profissional. Também foi aprovado projeto que assegura o direito fundamental à cirurgia reparadora a mulheres acometidas de câncer de mama. O serviço público de saúde realizará a cirurgia reparadora, hoje disponível somente para as mulheres que têm condições de pagá-la. É nosso desejo, pois, que, com isso, seja igualada essa conquista em relação a todas as mulheres.  

Outra conquista importante - apesar de todo o questionamento - é o projeto aprovado ontem na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania que autoriza a criação de um número telefônico simplificado, de caráter nacional, para denúncias de violência contra a mulher.  

O projeto em questão é de minha autoria. Ele prevê a existência de um número telefônico nacional - único para o País -, gratuito, de três dígitos. De acordo com o projeto, os telefones deveriam ser operados pelas Delegacias da Mulher ou pelas Delegacias da Polícia Civil onde não exista esse serviço especializado. Dessa forma, abrangeremos mulheres, crianças e adolescentes.  

Neste momento, quando a violência está sendo fortemente debatida pela sociedade brasileira, quando acontecimentos estão sendo tão divulgados, esse número telefônico poderia ser transformado num instrumento nacional de denúncia contra a violência utilizado por homens, crianças, jovens, para que pudéssemos realmente combater os agressores, o que seria, indubitavelmente, um instrumento de intimidação às ações covardes que vêm sendo praticadas.  

O projeto, sem dúvida, objetiva cumprir - não é uma idéia nossa – a recomendação da Declaração sobre a Violência contra a Mulher, resultante da Conferência Mundial dos Direitos Humanos, realizada na Áustria, em 1993, e reafirmada na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, ocorrida em Beijing, China, em 1995. Portanto, a sua aprovação significa uma manifestação política do Senado Federal, que por meio da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, demonstrou sensibilidade e compromisso com as mulheres, jovens e meninas brasileiras, no combate à violência.  

Esperamos que o Executivo, que tem esse poder, não precisando aguardar a tramitação deste projeto no Congresso Nacional, antecipe-se e transforme em realidade o objetivo deste projeto, que seria colocado à disposição da sociedade brasileira.  

Dentro desse espírito de trabalho coletivo, é importante destacar a ação conjunta da Bancada Feminina com o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, ao longo dos anos, e que, principalmente este ano, vem-se aprofundando a partir da posse da nova diretoria da instituição, ocorrida em 19 de outubro. Em substituição à Rosiska Darcy de Oliveira, que desempenhou um excelente trabalho, passou a ocupar a Presidência do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher a Procuradora-Geral, Dr.ª Solange Bentes. Em sua gestão, a nova Presidente define como necessidade estratégica um trabalho integrado com a sociedade, instituições não-governamentais que tratam da questão de gênero e com a Bancada Feminina, o que já está ocorrendo - e pretendemos fortalecer cada vez mais -, com a realização de reuniões conjuntas e busca de alternativas e ações unitárias.  

Portanto, Sr. Presidente, Sr as e Sr s. Senadores, a violência contra a mulher em todos os seus aspectos é, antes de mais nada, uma agressão aos direitos humanos, à democracia e à vida. A sua erradicação, além do combate específico, exige a superação, de forma mais ampla, das políticas econômicas impostas aos países pobres, que aprofundam a recessão, a concentração de renda e a miséria. A violência, além das questões de gênero, também é fruto da exclusão, do desemprego, da desestruturação familiar e da desesperança que atinge a muitos homens e mulheres.

 

No momento em que o Brasil e os demais países se preparam para a reunião de avaliação dos cinco anos pós-Beijing, que ocorrerá no ano 2000, é importante que o País apresente um balanço concreto dos avanços alcançados e dos entraves ainda existentes à adoção das decisões sugeridas pela Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em 1995. Uma sociedade que se pretenda humana, desenvolvida, civilizada, não pode aceitar qualquer forma de violência - contra as crianças, contra os jovens e, especialmente, contra as mulheres. Portanto, vamos fazer deste Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher um momento de reafirmação do compromisso da sociedade brasileira com o debate, com a mobilização e, acima de tudo, com o combate à violência contra a mulher, compromisso que deve ser coletivo e diário.  

Obrigada, Sr. Presidente.  

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/1999 - Página 31796