Pronunciamento de Ney Suassuna em 25/11/1999
Discurso no Senado Federal
OMISSÃO DO GOVERNO FEDERAL NA QUESTÃO DA REFORMA TRIBUTARIA.
- Autor
- Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
- Nome completo: Ney Robinson Suassuna
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
REFORMA TRIBUTARIA.:
- OMISSÃO DO GOVERNO FEDERAL NA QUESTÃO DA REFORMA TRIBUTARIA.
- Aparteantes
- Casildo Maldaner.
- Publicação
- Publicação no DSF de 26/11/1999 - Página 31798
- Assunto
- Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
- Indexação
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- COMENTARIO, REALIZAÇÃO, DEBATE, NECESSIDADE, REFORMA TRIBUTARIA, DEFESA, IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, DESTINAÇÃO, MUNICIPIOS, PAIS.
- CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, ACOMPANHAMENTO, TRAMITAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, DEFESA, CONTINUAÇÃO, DEBATE, CONGRESSO NACIONAL, URGENCIA, BUSCA, IGUALDADE, ARRECADAÇÃO, TRIBUTOS, DESTINAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, PAIS.
O SR. NEY SUASSUNA
(PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr as e Sr
s. Senadores, na História da civilização já tivemos inúmeros conflitos para os quais se dá uma razão ou outra. Se nos lembrarmos da Guerra de Tróia, vamos recordar que as razões podiam ser até de ordem pessoal, na História, porque, na realidade, é o fato econômico que gera quase que a totalidade dos conflitos.
Estamos vivendo no Brasil, neste momento, uma guerra na área econômica. Que guerra? - perguntariam as Sr as e os Sr s. Senadores. A guerra da reforma tributária. Hoje, do bolo arrecadado, 70% fica com o Governo Federal, 26%, com os Estados que compõem a Federação e 4% com os Municípios.
Sr. Presidente, é muito pequeno o percentual destinado aos Municípios, que são a célula-mãe do País. Se olhássemos de um modo simplicista, o País nada mais é do que o somatório dos seus Municípios. O Brasil tem pouco mais de 5.000 Municípios e, de todo o bolo tributário apenas 4% são destinados aos Municípios.
Os Estados da Federação sofreram uma reforma tributária ao inverso: a cada momento, o Governo Federal arrancou dos seus direitos um pouco mais; foi o FEF, o Fundef, a Lei Kandir; o Fundo de Estabilização Fiscal – o antigo FSE tinha uma conotação social, que, aliás, de social nada tinha. Enfim, esses fundos e considerações – de forma inteligente, mas ardilosa – têm tirado dos Estados os seus recursos.
Hoje, toda a Nação mobiliza-se em relação a essa nova reforma tributária. É um momento em que todos os Estados, sem exceção, encontram-se numa situação financeira terrível. Não há Estado que não esteja passando dificuldades – seja São Paulo, com toda a sua potência, ou o menor dessa República. As dívidas que se acumularam durante anos são cobradas – com razão, pois devem ser pagas. Mas o percentual de pagamento dessas dívidas tem sido uma grande penalidade para os Estados da Federação.
Estamos vivendo uma época de muito desconforto para os Governadores. Estados pujantes – como o do meu amigo e nobre Senador Casildo Maldaner – não conseguem honrar a folha de pagamento, estando atrasados há dois meses. Mas há outros com um, seis ou oito meses em atraso. Dos 27 Estados, muitos deles apresentam esse problema com relação às folhas de pagamento do seu funcionalismo.
Quando analisamos as economias dos Estados, vemos que quase todos demonstram resultado primário extremamente negativo. Nós, da Comissão de Economia do Senado da República, começamos a ouvir os Governadores de todos os Estados. Todos vieram a esta Casa – na qual os Estados têm uma representação igualitária – para dizer das dificuldades que estão enfrentando. Não pode haver uma Federação forte com Municípios ou Estados fracos. A resistência de uma corrente é exatamente igual à do elo mais frágil.
Sabemos que a União também está vivendo momentos difíceis, mas, certamente, por termos um país centralizado –, onde existem medidas provisórias e a legislação auxilia sobremaneira o Presidente da República –, é muito mais fácil governar a República do que um Estado com dificuldades.
O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Ouço V. Exª com prazer.
O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Estou acompanhando o raciocínio de V. Exª, que é uma autoridade nesse campo, porque preside a Comissão de Economia do Senado, na qual passam todas as questões relacionadas a esse assunto. Comungo da idéia das dificuldades porque passam os Estados e também os Municípios. Com a estabilização, por meio do Plano Real, houve, sem dúvida alguma, em função dos custos, dos juros, um endividamento exorbitante. Tanto a dívida mobiliária quanto a dívida fundada dos Estados e dos Municípios extrapolaram em função do mercado que existiu para controlar a inflação, com isso os juros foram lá para cima. O Brasil, em 1993/1994, conseguiu pelo Plano Brady uma espécie de anistia no campo internacional porque não tinha como enfrentar a sua dívida. Os bancos americanos entenderam que havia "gordura excessiva" decorrente, por exemplo de multas por atraso. Houve, então, entendimento no sentido de, na repactuação, retirar o excesso. As multas por atraso foram anistiadas, assim como os valores agregados previstos nos contratos. No caso do Brasil, isso representou cerca de 30% da dívida externa. Penso, Senador Ney Suassuna, que devia haver um entendimento para buscar algo nesse sentido em relação aos Estados e Municípios, para que eles pudessem respirar. A repactuação com todas as "gorduras", com todos os custos embutidos, não resolve o problema deles; o problema continuará a existir. Este é o momento oportuno para se discutir para os Estados e Municípios algo parecido com o que o Brasil conseguiu em relação ao seu compromisso internacional. Ao lado disso, Senador Ney Suassuna, a proposta do ajuste fiscal, ou melhor, da responsabilidade fiscal dos Estados e dos Municípios, dos setores públicos, dos administradores públicos, deve também ser implantada para que no momento em que estivermos na estaca zero, isto é, com as contas equilibradas, não venham eventualmente alguns irresponsáveis, quer governadores, quer prefeitos, macular todo o saneamento havido e comprometer a situação dos futuros governantes. Concomitantemente ao desenvolvimento da tese que V. Ex.ª defende, da qual comungo, é preciso implantar no Brasil a responsabilidade fiscal. A preocupação de V. Ex.ª é também, sem dúvida alguma, a da Nação inteira.
O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, Senador Casildo Maldaner.
V. Exª vai verificar, seguindo meu raciocínio, que comungo inteiramente da sua opinião, mas algumas preocupações paralelas têm de ser bem observadas para que não descubramos um santo para cobrir outro.
Eu dizia que as guerras quase sempre têm conotação econômica. Por trás das mil razões de fachada, estão os motivos econômicos. Estamos vivendo a guerra da reforma tributária que na cabeça de cada um tem uma formatação diferente.
O Governo Federal, com toda a certeza, sonha em ter mais recursos do que os 70% que hoje detém, aliás, hoje ele tem mais do que 70% porque houve uma reforma tributária informal por intermédio da criação desses fundos.
Os Estados querem a reforma tributária porque sonham em ter um pouco mais dos 26% que têm, e as Prefeituras - esse deve ser o sonho dourado de cada prefeito - querem um pouco mais, ou muito mais, do que os 4% que hoje detêm.
O Governo Federal, de forma incompreensível, Sr. Presidente, deixou a reforma tributária correr de forma inteiramente solta, e ela recebeu 35 votos a 1! De repente, a reforma tributária foi votada com 35 votos a 1! E o Governo, que em nenhum momento tinha acompanhado o andamento dessa reforma, ao perceber que ela poderá ser votada e tornar-se lei se a Câmara Alta assim o determinar, após ela passar pelo Plenário da Câmara, bombardeia completamente tudo o que está acontecendo. Vejam o que aconteceu com o Projeto Mussa Demes na Comissão, de que participam eficientes companheiros nossos, como é o caso do Germano Rigotto, do Eduardo Paes e do Kandir. Não consigo entender, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como o Governo deixa toda uma reforma tramitar sem interferir e, de repente, se surpreende, da noite para o dia, e diz: "Mas isso não serve!" Este Governo tem maioria nas duas Casas. Jamais poderia haver uma votação de um assunto tão importante com a derrota do Governo por 35 a 1! E obteve um voto, Srªs e Srs. Senadores, porque o Parlamentar que assim votou queria o Imposto Único; do contrário a votação teria sido unânime. Isso nos deixa muito preocupados. Embora ainda não tenha a reforma tributária chegado ao Senado, nós já nos reunimos - para isso peço o testemunho do Senador Gilberto Mestrinho - com o Secretário da Receita Everardo Maciel e já pautamos, embora em reuniões oficiosas - refiro-me àqueles jantares de que participamos todas as quarta-feiras - o encontro com a Comissão do Deputado Mussa Demes. Já estamos preocupados; a Comissão de Assuntos Econômicos já está vivenciando o problema antes que ele chegue a esta Casa.
Ora, estamos preocupados, e o Governo Federal, que detém a maior parte do bolo - bolo com o qual sonham todos os governadores e todos os prefeitos -, deixa o processo correr inteiramente à vontade e só na última hora, no dia posterior à votação, vem com todo o fôlego, com toda a energia, manifestar-se contra o resultado da votação nessa Comissão.
Então, pergunto aos meus Pares se o meu raciocínio não está correto. A conclusão que tiramos é a de que o Governo não tem nenhuma vontade de mexer nesse item por enquanto.
O Presidente do meu Partido, Senador Jader Barbalho, vai, com toda certeza, convocar os Governadores do PMDB, as Bancadas do PMDB na Câmara e no Senado para que debatamos e tomemos uma posição em relação a isso.
Na Comissão de Assuntos Econômicos, há três projetos em tramitação - e aí respondo ao nobre Senador Casildo Maldaner. Um reduz o percentual do pagamento da dívida dos Estados, de autoria do nobre Senador mineiro José de Alencar e foi distribuído ao nobre Senador Lúcio Alcântara. O segundo projeto dispõe exatamente sobre o que falou o nobre Senador Casildo Maldaner. É uma proposta semelhante ao Plano Brady, pela qual haveria o perdão de 40% da dívida dos Estados, de autoria do nobre Senador Roberto Saturnino. Outro também propõe que uma parcela da dívida seja diminuída pela redefinição da receita líquida dos Estados. Atualmente, o Estado cobra 13% de tudo o que entra no seu Tesouro, mesmo que seja verba vinculada, verba carimbada, para pagar a Prefeitura. Se entrar no cofre do Estado, paga 13%. E isso não é justo, pois a verba não é do Estado, apenas passa pelo Governo do Estado com o objetivo de pagar a Prefeitura. Como o fato que estou narrando, existem vários outros.
Nós, da Comissão, já debatemos e vamos continuar a debater. Muitos Senadores não gostaram muito quando começamos a chamar os Governadores. Mas a Comissão tomou essa decisão e assim continuará até que todas as regiões do Brasil sejam ouvidas. Esta é a Casa da Federação, é a Casa dos Estados. É claro, e aí complemento meu raciocínio, que temos de olhar também o interesse da República. Essa tem de ser uma equação em que todas as partes estejam satisfeitas. Para isso, deve haver, com certeza, recuos de cada parte. Recuos que, na verdade, serão progressos da convivência de uma República Federativa em que os Estados-Membros devem ter condições, mas que principalmente a célula
mater da Federação, que são os Municípios, de viver bem.
Se cada cidade brasileira, cada prefeitura, cada comunidade, cada célula da nossa sociedade estiver bem, esta será uma República feliz, e lá serão resolvidos os problemas principais do brasileiro: saúde, educação, assistência social. É lá, no Município, que isso tem que ocorrer.
É preciso, pois, que nos envolvamos – e o Senado da República já o está fazendo –, seja na Comissão, seja no Plenário, seja nos debates informais; é preciso que estejamos debatendo essa reforma tributária.
Com toda certeza, a atitude do Governo Federal não foi correta. Ele não participou da discussão, deixou ocorrer a votação e, no dia seguinte, transformou a proposta do Deputado Mussa Demes numa "Geni", em algo que não serve. Se o Governo tem maioria nas duas Casas, por que não acompanhou a tramitação, para que não tivéssemos os atritos que estamos tendo agora? Isto não cabe na minha cabeça e, tenho certeza, não cabe na cabeça de nenhum brasileiro que tem um pouco de raciocínio.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.
Muito obrigado.