Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM A CREDIBILIDADE DO PROGRAMA BRASILEIRO DE PROTEÇÃO A TESTEMUNHA.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • PREOCUPAÇÃO COM A CREDIBILIDADE DO PROGRAMA BRASILEIRO DE PROTEÇÃO A TESTEMUNHA.
Publicação
Publicação no DSF de 01/12/1999 - Página 32408
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • IMPORTANCIA, PROGRAMA, PROTEÇÃO, TESTEMUNHA, OBJETIVO, COMBATE, CRIME ORGANIZADO.
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, JORGE MERES ALVES DE ALMEIDA, MOTORISTA, RECEBIMENTO, AMEAÇA, POSTERIORIDADE, DEPOIMENTO, DENUNCIA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), DROGA, CAMARA DOS DEPUTADOS, APREENSÃO, DESCUMPRIMENTO, PROMESSA, PROTEÇÃO, DENUNCIANTE, FAMILIA.
  • NECESSIDADE, AUMENTO, CONFIANÇA, EFICACIA, PROGRAMA, PROTEÇÃO, TESTEMUNHA, DEFESA, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO PENAL, REVISÃO, FAVORECIMENTO, CRIMINOSO, OMISSÃO, DENUNCIANTE.

O SR. CASILDO MALDANER (PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não há dúvida de que a proteção de testemunhas revelou-se um dos instrumentos mais eficazes no combate ao crime organizado nos Estados Unidos e em alguns países da Europa. A lei brasileira, que foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, em julho deste ano, inspira-se, portanto, na legislação de países que contam com uma rica experiência no combate ao crime organizado, conforme episódios famosos, já do conhecimento público.  

Foi graças ao programa de proteção a testemunhas que a Máfia sofreu os mais duros golpes de toda a sua história, tanto nos Estados Unidos quanto na Itália. "Os papéis Joe Vallachi" transformam-se em documento demolidor, que levou para o cárcere os maiores chefões mafiosos italianos e norte-americanos.  

A Máfia viria a sofrer um segundo golpe, também muito duro, quando o mafioso Tomaso Buscceta fez um acordo com o FBI norte-americano, revelando os nomes dos principais chefes da organização criminosa nos Estados Unidos, na Itália e em outros países, inclusive no Brasil. Em troca, o ex-mafioso foi submetido a uma operação plástica para ganhar novo rosto e nova identidade.  

Fiz essas considerações, Sr. Presidente, nobres Colegas, para mostrar a importância do aparato legal criado para assegurar proteção a testemunhas importantes na luta contra o crime organizado. Acontece que o jornal Folha de S. Paulo , em sua edição da última segunda-feira, dia 22 do corrente, publicou entrevista do motorista Jorge Meres Alves de Almeida, testemunha-chave da CPI do Narcotráfico, na qual ele se revela arrependido por ter-se prontificado a colaborar com as autoridades, alegando que se sente ameaçado e que o esquema de proteção a testemunhas no Brasil não funciona.  

Mais grave ainda é que a referida testemunha - cujos depoimentos já resultaram na cassação de um Deputado Federal e na prisão de mais de 30 pessoas - declara que fez as denúncias mediante uma promessa de segurança que não está sendo cumprida, tanto que não apenas se sente pessoalmente ameaçado, como sua esposa e suas duas filhas estão sendo protegidas por familiares. A própria Polícia Federal o teria colocado em uma cela na companhia de presos que o ameaçaram dizendo não gostarem de alcagüetes.  

Há mais revelações graves do criminoso arrependido nessa entrevista publicada pelo jornal paulista, como a de que a polícia do Pará, ao invés de garantir segurança para a sua esposa, apavorou-a dando tiros para o ar. Meres garante que esses policiais do Pará também estão envolvidos com o crime organizado, em cujas teias a CPI do Narcotráfico só desvendou, até agora, 40% de tudo o que precisava investigar.  

Sr. Presidente, nobres Colegas, essa entrevista com a principal testemunha de uma CPI, que conseguiu fazer revelações de tanta importância sobre o crime organizado no Brasil, não pode passar sem um registro adequado. Creio que está na hora de o Legislativo e o Executivo verificarem o que está errado com a legislação de proteção à testemunha, visando o seu aprimoramento.  

Ainda da CPI do Narcotráfico, na Câmara dos Deputados, foi a vez da Srª Alda Inês, que se negou a prestar informações, sob o argumento de que não confia no programa de proteção a testemunhas de crimes, negando, inclusive, seus depoimentos anteriores ao Ministério Público.  

O nosso companheiro Senador Renan Calheiros, autor da proposta e execução desse programa quando Ministro da Justiça, na semana passada, desta tribuna, fez correta avaliação da situação.  

Hoje, acredito serem necessárias algumas considerações sobre o assunto.  

A Lei nº 9.807, de 1999, está dividida em dois tópicos: a) a proteção à testemunha; b) a proteção aos réus colaboradores.  

A controvérsia está no segundo tópico, uma vez que o primeiro tópico tem o inequívoco apoio da sociedade, considerando que a testemunha não é partícipe do crime.  

A lei, em seu art. 13, dispõe:  

"Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:  

I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;  

II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada;  

III - a recuperação total ou parcial do produto do crime.  

Parágrafo único . A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso."  

Até esse ponto, a lei surge com o objetivo de ajudar, sem dúvida alguma.  

Temos, então, que esses últimos são os requisitos ao perdão judicial.  

Já o art. 14 dispõe:  

"O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um a dois terços."  

Analisando as questões, constatamos que a lei confere ao réu o direito subjetivo de obter o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade quando primário e tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha os resultados já mencionados anteriormente.  

A respeito do tema, Sr. Presidente, nobres Colegas, o nobre Promotor no Estado de São Paulo Dr. Alexandre Demetrius Pereira fez os seguintes questionamentos:  

"Basta ao réu que praticou o roubo (crime da mais alta gravidade e que vem alarmando os grandes centros urbanos), ficando com parte dos bens roubados, dirigir-se à Delegacia de Polícia e dizer, por exemplo, onde se encontra o depósito das demais coisas roubadas, que, se forem parcialmente recuperadas, ensejarão o perdão judicial do acusado."  

E ele continua:  

"Figure-se ainda, no caso citado, que a polícia apreenda os bens no depósito, mas não consiga efetivamente identificar os demais co-autores: teremos bens apreendidos (parcialmente recuperados), autoria conhecida do roubo quanto ao delator e desconhecida quanto aos demais. Resultado? Crime sem punição, ante o perdão judicial a que fará jus o delator."  

Sr. Presidente, nobres Colegas, como se constata, deparamo-nos com dois problemas fáticos:  

1 - quanto à credibilidade do programa de proteção às testemunhas na solução dos ilícitos, onde o Estado tem responsabilidade de disponibilizar todos os recursos e mecanismos para o seu sucesso; e  

2 - que o Congresso Nacional reveja as possíveis falhas existentes na lei, vedando-lhe as brechas que favoreçam os criminosos que operam, de forma astuta, com essas omissões.  

A doutrina e o espírito da lei é boa. Porém, não podemos contrariar os interesses da sociedade, maior vítima desses beneficiados, cujo temor é a reincidência.  

Por isso, Sr. Presidente, nobres Colegas, trago à consideração da Casa, no dia de hoje, essas preocupações. Entendo - e não há a menor dúvida - que essa lei de proteção à testemunha, que foi sancionada em julho deste ano e que busca minimizar as culpas delegadas pela própria Magistratura a determinados réus, vem a colaborar no sentido de desvendar certos crimes, principalmente no caso de narcotráfico, de seqüestro.  

Isso tem uma importância extraordinária. Inclusive, há exemplos de sucesso nesse sentido, já constatados nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, principalmente na Itália. O Brasil procura adotar também teses assemelhadas para que haja um resultado melhor.  

Ainda somos jovens no que diz respeito a alguns privilégios dados a testemunhas ou a pessoas que participaram de certos crimes. Estes, com o tempo, poderão ajudar a identificar co-autores e vítimas com integridade física preservada, bem como a localizar produtos do roubo ou coisa parecida.  

Essas questões merecem uma análise cada vez maior. Como eu disse, somos jovens no que diz respeito à proteção a testemunhas. Por isso, precisamos continuamente aperfeiçoar o nosso entendimento a esse respeito, Sr. Presidente. E é importante oferecermos condições para tal.  

Recentemente, o Ministro da Justiça, acompanhado do Presidente da República, tentava encontrar meios para que pessoas condenadas, que se dispõem a colaborar, possam viver em locais mais seguros e não estejam nas valas comuns com outros criminosos.  

Isso tudo ajudará a sociedade a se sentir cada vez mais segura. E as autoridades policiais e judiciárias poderão cada vez mais desvendar crimes. Isso fará com que pessoas que pensam em praticar um delito, em cometer assaltos ou em entrar no crime organizado desistam da idéia, mesmo tendo resultados exitosos, mesmo tendo resultados satisfatórios, porque, num curto espaço de tempo, elas poderão ser entregues. Alguém do grupo poderá arrepender-se e sentir que aquela atitude foi equivocada. Muitas vezes, menores são usados para proteger os adultos, para proteger crimes organizados. Pode haver pessoas que queiram abrir o jogo por sentirem que há proteção; elas podem querer mudar de vida. Isso ajudará a desvendar crimes organizados no Brasil inteiro.  

Portanto, a questão da proteção à testemunha e a questão da diminuição da pena da pessoa que participou do crime são fundamentais. Mas é importante que o Legislativo e o Executivo se aperfeiçoem cada vez mais, para que, assim, esses problemas possam ser solucionados.  

Na semana passada, nesta Casa, o nosso eminente ex-Ministro da Justiça, Renan Calheiros, teceu comentários em relação a isso. Há poucos dias, o eminente Senador Bernardo Cabral, que foi Ministro da Justiça, também analisou essa questão. Existem vários Senadores debruçados sobre esse tema. Creio que, hoje, Sr. Presidente, a sociedade brasileira está mergulhada nessa matéria. Há algo que está em pauta, está em primeira mão. O Brasil está vivendo isso. Todo o mundo vem acompanhando os desdobramentos dessas questões no nosso País.

 

Creio que, se todos nós enfrentarmos essa situação, vamos oferecer cada vez mais segurança para a sociedade como um todo.  

Sr. Presidente, nobres Colegas, eram essas as considerações que eu não poderia deixar de expor nesta tarde.  

Muito obrigado.  

 

za½ ô


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/12/1999 - Página 32408